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terça-feira, 14 de outubro de 2008

Informativo STF 60 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF

Brasília, 17 a 21 de fevereiro de 1997 - Nº 60


Este Informativo, elaborado pela Assessoria da Presidência do STF a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas na semana pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.


ÍNDICE DE ASSUNTOS

Contribuição Social

Custas em Ação Penal Pública

Decisão Ultra-Petita

Exercício Arbitrário das Próprias Razões

Habeas Corpus e Autoridade Coatora

Habeas Corpus: Competência

Intimação da Sentença de Pronúncia

Intimação de Defensor Público

Lex Mitior e Retroatividade

Ofensa Propter Officium

Peculato e Verba Repassada pela União

Protesto por Novo Júri: Admissibilidade

Receptação e Competência

Remoção de Preso

Revisão Geral de Remuneração (28,86%)


PLENÁRIO


Revisão Geral de Remuneração (28,86%)

Conhecido e provido recurso ordinário em mandado de segurança impetrado perante o STJ por servidores públicos federais, visando à obtenção de reajuste de remuneração idêntico ao concedido pela Lei 8627/93 a servidores militares e civis integrantes, estes, de diversas carreiras e órgãos da Administração (ativos e inativos). O mesmo reajuste fora estendido à época, por decisões administrativas, aos servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário da União. RMS 22.307-DF, rel. Min. Marco Aurélio, 19.2.97.


Peculato e Verba Repassada pela União

Na vigência da CF/88, compete à Justiça Federal o julgamento de servidor estadual acusado de haver-se apropriado de verba repassada ao Estado pela União, mediante convênio, com o fim de ser aplicada no Sistema Único de Saúde - SUS. Com esse entendimento, o Tribunal conheceu e deu provimento a recurso extraordinário interposto pelo Ministério Público Federal contra acórdão do TRF da 4ª Região que, baseando-se em antigos precedentes do STF, tomados em face da CF/69 (RREE 76789-RN, 78125-RN, 85644-ES, 75491-PR), afirmara, na hipótese, a competência da Justiça Estadual. RE 196.982-PR, rel. Min. Néri da Silveira, 20.2.97.


Contribuição Social - 1

Concluindo o julgamento de dois recursos extraordinários em que se discutia sobre se o dispositivo legal que elevou de 8% para 10% a alíquota da contribuição social instituída pela Lei 7689/88 - dispositivo, esse, que resultara da conversão em lei da MP 86, de 25.09.89 - poderia ser aplicado no próprio exercício de 1989, alcançando o lucro apurado em 31 de dezembro daquele ano, o Tribunal, por maioria de votos, admitiu essa possibilidade, afirmando ainda, também por maioria, a aptidão das medidas provisórias para instituir e majorar tributos.


Contribuição Social - 2

Quanto ao termo inicial do prazo de noventa dias previsto no art. 195, § 6º, da CF, o Tribunal entendeu que, não tendo sofrido a MP 86/89 alteração significativa no Congresso Nacional ao ser convertida na Lei 7856/89, deve ele ser contado, na espécie, da data da publicação da medida provisória, e não da lei de conversão, na linha da orientação adotada no julgamento plenário do RE 169.740-PR (DJ de 17.11.95), RE 197.790-MG, rel. Min. Ilmar Galvão, e RE 181.664-RS, rel. orig. Min. Carlos Velloso; rel. p/ ac., Min. Ilmar Galvão, 19.2.97.


PRIMEIRA TURMA


Intimação da Sentença de Pronúncia

A declaração do acusado de estar ciente da sentença de pronúncia e a circunstância de o recurso interposto contra essa decisão conter a sua assinatura ao lado da de seu defensor não suprem a falta de intimação prevista no art. 414 do CPP ("A intimação da sentença de pronúncia, se o crime for inafiançável, será sempre feita ao réu pessoalmente."). Com este entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus impetrado contra decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo que não conhecera de recurso em sentido estrito interposto pela defesa do paciente por não haver sido este intimado na forma do art. 414. HC 74.711-SP, rel. Min. Moreira Alves, 18.2.97.


Lex Mitior e Retroatividade

O art. 91 da Lei 9099/95 ("Nos casos em que esta Lei passa a exigir representação para a propositura da ação penal pública, o ofendido ou seu representante legal será intimado para oferecê-la no prazo de trinta dias, sob pena de decadência."), enquanto norma penal mais benéfica, é aplicável a qualquer tempo antes do trânsito em julgado da condenação. Habeas corpus deferido para, anulado o julgamento da apelação, determinar que o tribunal de origem intime o ofendido para o fim previsto no citado dispositivo. HC 74.334-RJ, rel. Min. Sydney Sanches, 18.2.97.


Intimação de Defensor Público

A exemplo do que sucede em relação às intimações dos membros do Ministério Público, a simples entrega dos autos no protocolo do órgão encarregado da assistência judiciária não basta para satisfazer a exigência de intimação pessoal, prevista no art. 5º, § 5º, da Lei 1060/50 ("Nos Estados onde a Assistência Judiciária seja organizada e por eles mantida, o Defensor Público, ou quem exerça cargo equivalente, será intimado pessoalmente de todos os atos do processo, em ambas as instâncias, ..."). Com base nesse entendimento, a Turma deferiu pedido de habeas corpus impetrado contra decisão do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo que não conhecera, por intempestividade, de recurso interposto pela Procuradoria de Assistência Judiciária Criminal do Estado em favor do paciente. HC 74.628-SP, rel. Min. Moreira Alves, 18.2.97.


Custas em Ação Penal Pública

A determinação de que a parte comprove o preparo do recurso no ato de sua interposição (CPC, art. 511, caput) não se aplica ao processo penal. Com base nesse entendimento, e reafirmando a orientação acolhida pela jurisprudência do STF, no sentido de que, nas ações penais públicas, o processamento dos recursos interpostos independe do pagamento de custas, a Turma deferiu pedido de habeas corpus impetrado contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba que julgara deserto recurso interposto em favor do paciente. Precedentes citados: HC 61.215-RJ (RTJ 109/536); RE 102.968-MS (RTJ 115/838); HC 74.338-PB (v. Informativo 46). HC 74.868-PB, rel. Min. Octavio Gallotti, 18.2.97.


Remoção de Preso

A possibilidade admitida pelo art. 86 da Lei de Execuções Penais ("As penas privativas de liberdade aplicadas pela Justiça de uma unidade federativa podem ser executadas em outra unidade, em estabelecimento local ou da União") não se constitui em direito subjetivo do sentenciado, subordinando-se, antes, às conveniências da administração da justiça. Precedentes citados: HC 69.978-SP (DJ de 25.6.93); HC 71.076-GO (DJ de 6.5.94). HC 74.814-RO, rel. Min. Ilmar Galvão, 18.2.97.


Ofensa Propter Officium

Tratando-se de ofensa dirigida a juiz de direito em razão de seu ofício, a ação penal pode ser iniciada pelo próprio ofendido, ou pelo Ministério Público mediante representação, cabendo ao juízo de primeiro grau - e não ao Tribunal de Justiça, cuja competência se limita ao conhecimento da exceção de verdade - o seu julgamento. Precedente citado: Inq 726-RJ (AgRg) (RTJ 154/410). HC 74.649-SP, rel. Min. Ilmar Galvão, 18.2.97.


Decisão Ultra-Petita

Deferido habeas corpus impetrado contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que, ultrapassando os limites do pedido formulado em recurso interposto pelo Ministério Público - aplicação a adolescente infrator da medida prevista no inciso V do art. 112 do Estatuto da Criança e do Adolescente (inserção em regime de semiliberdade) -, determinara, em prejuízo do paciente, a sua internação em estabelecimento educacional. HC 74.804-SP, rel. Min. Octavio Gallotti, 18.2.97.


SEGUNDA TURMA


Habeas Corpus: Competência

Julgando tratar-se de pedido substitutivo de recurso ordinário constitucional (CF, art. 105, II, a: "Compete ao Superior Tribunal de Justiça: II - julgar, em recurso ordinário: a) os habeas corpus decididos em única ou última instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão for denegatória;"), a Turma não conheceu de habeas corpus contra acórdão de tribunal regional federal que confirmara, em agravo regimental, despacho denegatório de medida liminar em habeas corpus. Em conseqüência, determinou-se a devolução dos autos ao STJ, reformando decisão ali proferida que tivera por aplicável à espécie o art. 102, I, i, da CF. HC 74.847-RS, rel. Min. Carlos Velloso, 18.2.97.


Habeas Corpus e Autoridade Coatora

Tratando-se de inquérito instaurado mediante requisição de autoridade judiciária (CPP, art. 5º, II), a coação alegada em sede de habeas corpus é de se atribuir ao juiz requisitante e não ao delegado de polícia. Na espécie, cuida-se de recurso ordinário contra decisão do STJ que não conheceu de habeas corpus sob o fundamento de que a simples "solicitação" de abertura de inquérito policial pelo Corregedor-Geral de Justiça do Estado do Mato Grosso não o converteria em autoridade coatora para atrair a competência daquela Corte para julgar o writ (CF, art. 105, I, a). Considerando o caráter obrigatório da referida "solicitação" - vez que a autoridade policial não poderia eximir-se de cumpri-la -, a Turma conheceu do recurso e lhe deu provimento para cassar o acórdão recorrido e determinar que o STJ prossiga no julgamento do habeas corpus. RHC 74.860-MT, rel. Min. Carlos Velloso, 18.2.97.


Receptação e Competência

Quando a autoria do furto ou do roubo de que proveio o objeto do crime de receptação for ignorada ou não comprovada, a competência para julgar este delito será do juízo da comarca em que ele tiver sido consumado. Com base nesse entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus em que se pretendia ver reconhecida a incompetência absoluta do juízo da comarca de Campo Grande-MS - local em que se consumara a receptação imputada ao paciente -, sob o argumento de que o veículo objeto desse crime havia sido furtado no Rio de Janeiro. Precedente citado: CJ 2.925 (DJ de 3.12.64). HC 74.007-MS, rel. Min. Carlos Velloso, 18.2.97.


Protesto por Novo Júri: Admissibilidade

O § 1º do art. 607 do CPP, que não admite o "protesto por novo júri, quando a pena for imposta em grau de apelação", não subsiste em face da revogação do art. 606, do mesmo Código, pela Lei 263, de 23.2.48. Afirmando embora este entendimento, a Turma acabou indeferindo o habeas corpus que o sustentava, pelo fato de o paciente não haver observado a forma e o prazo previstos no § 2º do art. 607 ("O protesto invalidará qualquer outro recurso interposto e será feito na forma e nos prazos estabelecidos para interposição da apelação."). Precedentes citados: HC 54.079-SP (RTJ 77/779); HC 48.924-SP (RTJ 58/798). HC 74.633-SP, rel. Min. Marco Aurélio, 18.2.97.


Exercício Arbitrário das Próprias Razões

Não configura o delito de falsidade ideológica (CP, art. 299), mas sim o de exercício arbitrário das próprias razões (CP, art. 345), a simulação de dívida por um dos ex-cônjuges com o fim de subtrair à partilha bem disputado por ambos. Com base nesse entendimento, a Turma assentou a ilegitimidade ativa do Ministério Público tendo em vista tratar-se de crime de ação penal privada (CP, art. 345, par. único) e, conseqüentemente, declarou extinta a punibilidade do paciente pela decadência do direito de queixa. HC 74.672-MG, rel. Min. Marco Aurélio, 18.2.97.


Sessões

      Ordinárias

      Extraordinárias

      Julgamentos

Pleno

      19.02.97

      20.02.97

      07

1a. Turma

      18.02.97

      -------------

      40

2a. Turma

      18.02.97

      -------------

      22


CLIPPING DO DJ

21 de fevereiro de 1997


AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA N. 415-2
RELATOR: MIN. NÉRI DA SILVEIRA

EMENTA: - Ação Cível Originária. Questão de limites entre os Estados do Acre, do Amazonas e de Rondônia. Ação proposta pelo Estado do Acre contra Amazonas e Rondônia. 2. Competência do Supremo Tribunal Federal para processar e julgar, originariamente, a demanda (Constituição, art. 102, I, letra "f"). Exame da matéria relativa à competência para causas de limites territoriais entre Estados da Federação, desde a Constituição de 1891 (Constituição de 1891, art. 59, I, letra "c"; Constituição de 1934, art. 76, I, letra "d"; Constituição de 1937, art. 101, I, letra "c"; Constituição de 1946, art. 101, I, letra "e"; Constituição de 1967, art. 114, letra "d"; Emenda Constitucional nº 1, de 1969, art. 119, I, letra "d"). Posição da doutrina e jurisprudência americanas sobre a espécie. 3. Ação de limites entre os Estados litigantes deduzida à vista do art. 12, § 5º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição de 1988. Análise das normas transitórias sobre questões de limites entre os Estados, nos regimes das Constituições de 1934 (art. 13 e parágrafos, do ADCT), 1937 (art. 184 e parágrafos) e 1946 (art. 6º e parágrafos, do Ato das Disposições Transitórias). A Constituição de 1937 (art. 184) e o uti possidetis. 4. Natureza e extensão do art. 12, § 5º, do Ato das Disposições Transitórias da Constituição de 1988. Anteriormente à Constituição de 1988, mediante convênio celebrado entre os Estados do Acre, do Amazonas e de Rondônia e a Fundação IBGE, não só se criara uma comissão tripartite com representantes dos Estados aludidos, colimando solver seus problemas de limites, mas, também, a Fundação IBGE, no âmbito das atribuições que lhe conferiu o Decreto-Lei nº 161, de 13.2.1967, se comprometeu a realizar, - como efetivamente realizou, - os trabalhos de levantamentos cartográficos e geodésicos atinentes aos limites territoriais, entre si, das mencionadas Unidades da Federação. Demonstração dos procedimentos seguidos e dos resultados apurados, com debates na comissão tripartite. Conclusões do IBGE sobre os limites territoriais do Acre e Amazonas, do Acre e Rondônia e do Amazonas e Rondônia, ainda em 1987. "Nota Técnica da Diretoria de Geociências do IBGE", de 25 de novembro de 1987. 5. Configuram-se, no caso concreto, assim, os pressupostos à incidência do parágrafo 5º do art. 12, do ADCT de 1988, segundo o qual "ficam reconhecidos e homologados os atuais limites do Estado do Acre com os Estados do Amazonas e de Rondônia, conforme levantamentos cartográficos e geodésicos realizados pela comissão tripartite integrada por representantes dos Estados e dos serviços técnico-especializados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística." 6. Inviabilidade de pretender, na presente demanda, discutir os limites territoriais dos Estados em apreço, fora do contexto resultante da aplicação da regra do parágrafo 5º do art. 12, do Ato das Disposições Transitórias da Constituição de 1988, o que conduz à verificação última do que se contém nos levantamentos cartográficos e geodésicos apontados nos relatórios e notas dos serviços técnico-especializados do IBGE, acima aludidos, precisando-lhes a compreensão e tornando, desse modo, possível a sua definitiva execução. 7. Não altera a conclusão, quanto à incidência do art. 12, § 5º, do ADCT da Constituição de 1988, a circunstância de a comissão tripartite não haver adotado soluções definitivas e consensuais em torno de certos pontos litigiosos dos limites dos três Estados, diante dos estudos técnicos do IBGE. Se tal houvesse sucedido, antes da conclusão dos trabalhos constituintes, decerto, a regra transitória em alusão (art. 12, § 5º) não teria sentido, porque, então, por via do acordo, os Estados em foco teriam encontrado solução às divergências concernentes aos respectivos limites territoriais. A norma constitucional transitória veio precisamente pôr fim aos dissídios de limites existentes. Possibilidade de execução, em concreto, pelo IBGE, dos limites traçados. 8. Ação julgada procedente, em parte, com base no art. 12, § 5º, do ADCT aludido, determinando-se a execução, pelo IBGE, dos traçados de limites entre os Estados litigantes, na conformidade de seus levantamentos cartográficos e geodésicos realizados antes da Constituição de 1988, à vista do convênio mencionado. 9. Não conhecimento do pedido de indenização, diante da natureza da demanda. 10. Condenação do Estado do Acre a pagar honorários advocatícios, em face do princípio da sucumbência, ao Estado de Rondônia, eis que, quanto a esse, foi julgada improcedente a ação, compensando-se as verbas respectivas, a esse título, relativamente ao Estado do Amazonas, por serem, autor e réu, parcialmente sucumbentes.

ADIn N. 1526-5 - questão de ordem
RELATOR: MIN. MAURÍCIO CORRÊA

EMENTA: (...)
1. Impugnação, pela CNTI, de normas relativas à aposentadoria dos magistrados classistas temporários da Justiça do Trabalho, recrutados entre os trabalhadores na indústria. (...)
3. Questão de ordem resolvida no sentido de não reconhecer o vínculo de pertinência temática: o juiz classista temporário, nestas funções, é órgão da magistratura, e não trabalhador da indústria; a defesa de interesses de parcela da magistratura não integra os objetivos institucionais da requerente.
4. Ação direta de inconstitucionalidade não conhecida.

CONFLITO DE COMPETÊNCIA N. 7039-1 *
RELATOR: MIN. OCTAVIO GALLOTTI

EMENTA: - Tendo sido dirimido, pela instância constitucional competente (Superior Tribunal de Justiça), o conflito de competência entre a Justiça do Trabalho e a comum, não cabia ao Tribunal Regional do Trabalho pretender renová-lo perante o Supremo Tribunal Federal.
Conflito de que, em conseqüência, não se conhece, restituídos os autos à Corte suscitante, para que prossiga no julgamento do feito.
* noticiado no Informativo 43

HABEAS CORPUS N. 69646-5
REL. P/ ACORDÃO: MIN. CELSO DE MELLO

EMENTA: (...)
A identificação da maior ou da menor abrangência temática dos recursos penais interpostos pelo Ministério Público há de ser aferida em face da extensão material indicada pelo Parquet em sua petição recursal (CPP, art. 578), sendo irrelevante, para esse efeito, o conteúdo das razões ulteriormente deduzidas pelo órgão da acusação estatal. Precedentes.

HABEAS CORPUS N. 74106-1
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO

(...)
PRISÃO - SENTENÇA DE PRONÚNCIA - NATUREZA. A ordem de prisão formalizada quando da sentença de pronúncia mostra-se preventiva, submetendo o órgão investido do ofício judicante à observância do disposto no artigo 312 do Código de Processo Penal. Cumpre fundamentá-la.
PRISÃO PREVENTIVA - EXCESSO DE PRAZO. Uma vez configurado o excesso de prazo, cabe, em prol da intangibilidade da ordem jurídica constitucional, afastar a custódia preventiva. Idas e vindas do processo, mediante declarações de nulidade, não justificam a permanência do acusado sob a custódia do Estado.

HABEAS CORPUS N. 74183-5
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO

(...)
CONTINUIDADE DELITIVA - CRITÉRIOS - UNIDADE DE DESÍGNIO - AUSÊNCIA - REITERAÇÃO DE DELITOS - IRRELEVÂNCIA. Os pressupostos da continuidade delitiva são objetivos. Consideram-se a prática de dois ou mais crimes da mesma espécie e as condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes. Descabe potencializar a vida pregressa do agente e o número de delitos por ele cometidos para, a partir da óptica da habitualidade criminosa, afastar a incidência do preceito do artigo 71 do Código Penal. Tanto vulnera a lei aquele que inclui no campo de aplicação hipótese não contemplada como o que exclui caso por ela abrangido.

HABEAS CORPUS N. 74254-8 *
RELATOR: MIN. MOREIRA ALVES

EMENTA: "HABEAS CORPUS"
Como bem acentua o parecer da Procuradoria-Geral da República, ambas as Turmas desta Corte têm entendido que a imposição da prestação de serviços à comunidade como condição para o "sursis" não constitui constrangimento ilegal, por não ocorrer o bis in idem. Assim, no HC 72.233, Segunda Turma, e nos HC 72.683 e 73.110, Primeira Turma, sendo relatores, respectivamente, os Srs. Ministros Maurício Correa, Sydney Sanches e Octávio Gallotti.
"Habeas corpus" indeferido.
* noticiado no Informativo 44

HABEAS CORPUS N. 74502-4
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO

EMENTA: - PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. QUESTÃO NOVA.
I. - Por conter questão nova, que não foi posta ao exame do Tribunal estadual, o habeas corpus não pode ser conhecido, sob pena de supressão de instância.
II. - Remessa dos autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, para julgamento da questão levantada perante o Supremo Tribunal Federal, ainda não apreciada por aquele Tribunal.
III. - H.C. não conhecido.

HABEAS CORPUS N. 74503-2
RELATOR: MIN. MOREIRA ALVES

EMENTA: Habeas corpus.
- Tratando-se de alegação de nulidade que poderia ter sido declarada de ofício quando do julgamento da apelação, o Tribunal que julgou o recurso, omitindo-se a respeito, se tornou o órgão coator, se ocorrente essa nulidade.
- Inocorrência da alegada colidência de defesas.
Habeas corpus conhecido, mas indeferido.

HABEAS CORPUS N. 74552-1 *
RELATOR: MIN. OCTAVIO GALLOTTI

EMENTA: - Pretensão de aplicação retroativa de dispositivos da Lei nº 9.099-95.
Sendo a sua vigência posterior ao julgamento da apelação, não se configura, no caso, coação atribuível ao Tribunal estadual, cabendo, ao Juízo de Execução, quando provocado, decidir sobre o cabimento da pretensão (Súmula nº 611 do Supremo Tribunal).
* noticiado no Informativo 57

HABEAS CORPUS N. 74683-7 *
RELATOR: MIN. ILMAR GALVÃO

EMENTA: HABEAS CORPUS. DECISÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUE, MEDIANTE EMPATE NA VOTAÇÃO, CONCEDEU INDULTO A CO-RÉU, SEM REPARAR O DANO. PEDIDO DE EXTENSÃO DENEGADO.
A Turma julgadora, com o quorum completo, não fica constrangida a estender a outros co-réus decisão que em circunstância especialíssima - o empate na votação - concedeu indulto a um deles. A regra do art. 580 do Código de Processo Penal não comporta a extensão pretendida.
O condicionamento do benefício do indulto ao ressarcimento do dano resultante da ação delituosa é prática efetiva em nosso sistema penal, que se orienta no sentido de estimular a composição dos danos materiais resultantes do delito, mesmo antes do julgamento condenatório definitivo. No caso, o seqüestro dos bens do paciente, na linha do que vem decidindo a Primeira Turma, não constitui óbice suficiente para afastar a obrigação indenizatória.
Habeas corpus indeferido.
* noticiado no Informativo 57

RECLAMAÇÃO N. 449-0 (AgRg)
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

EMENTA: (...)
- A Lei nº 8.038/90 estabelece que qualquer interessado poderá impugnar o pedido do reclamante (art. 15). O interessado - vale dizer, aquela pessoa que dispõe de interesse jurídico na causa - qualifica-se como sujeito meramente eventual da relação processual formada com o ajuizamento da reclamação.
A intervenção do interessado no processo de reclamação é caracterizada pela nota da simples facultatividade. Isso significa que não se impõe, para efeito de integração necessária e de válida composição da relação processual, o chamamento formal do interessado, pois este, para ingressar no processo de reclamação, deverá fazê-lo espontaneamente, recebendo a causa no estado em que se encontra.
O interessado, uma vez admitido ao processo de reclamação - e observada a fase procedimental em que este se acha -, tem o direito de ser intimado dos atos e termos processuais, assistindo-lhes, ainda, a prerrogativa de fazer sustentação oral, quando do julgamento final da causa. Precedente.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N. 164715-9 *
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE

EMENTA: Direito do Trabalho: legislação federal sobre reajuste de salário ("gatilho salarial"): incidência direta sobre as relações contratuais trabalhistas do Estado-membro e suas autarquias.
No âmbito da competência privativa da União para legislar sobre Direito do Trabalho - que abrange as normas de reajuste salarial compulsório - a lei federal incide diretamente sobre as relações contratuais dos servidores dos Estados, dos Municípios e das respectivas autarquias: uma coisa é repelir - por força da autonomia do Estado ou da vedação de vinculações remuneratórias -, que a legislação local possa atrelar os ganhos dos servidores estaduais, estatutários ou não, a vencimentos da União ou índices federais de qualquer sorte. Outra coisa bem diversa é afirmar a incidência direta sobre os salários de servidores locais, regidos pelo Direito do Trabalho, de lei federal sobre reajustes salariais: aqui, o problema não é de vinculação; nem de usurpação ou renúncia indevida à autonomia do Estado; é, sim, de competência da União para legislar sobre Direito do Trabalho.
* noticiado no Informativo 35

RECURSO EXTRAORDINÁRIO N. 172720-9 *
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO

INDENIZAÇÃO - DANO MORAL - EXTRAVIO DE MALA EM VIAGEM AÉREA - CONVENÇÃO DE VARSÓVIA - OBSERVAÇÃO MITIGADA - CONSTITUIÇÃO FEDERAL - SUPREMACIA.
O fato de a Convenção de Varsóvia revelar, como regra, a indenização tarifada por danos materiais não exclui a relativa aos danos morais. Configurados esses pelo sentimento de desconforto, de constrangimento, aborrecimento e humilhação decorrentes do extravio de mala, cumpre observar a Carta Política da República - incisos V e X do artigo 5º, no que se sobrepõe a tratados e convenções ratificados pelo Brasil.
* noticiado no Informativo 18

RMS N. 21943-6
RELATOR: MIN. MAURÍCIO CORRÊA

EMENTA: (...)
1. Os servidores públicos não podem receber remuneração maior que a de seus paradigmas, no âmbito de cada Poder.
2. A Retribuição Adicional Variável - RAV, instituída pela Lei nº 7.711/88 deve ser incluída no respectivo teto, bem como a Gratificação de Estímulo à Fiscalização e à Arrecadação - GEFA, prevista no art. 13 da Lei Delegada nº 13, de 27.08.92, quando recebida, por não constituírem vantagem pessoal percebida pelo servidor.
3. Excluem-se do cálculo elaborado para a aplicação do teto, as parcelas de caráter eminentemente pessoal representadas pelo adicional por tempo de serviço, salário-família (art. 42, parágrafo único da Lei nº 8.112/90 e art. 1º, III, "e" da Lei 8.852/94, e, ainda, o adicional de 20% a que se refere o artigo 184, da Lei nº 1.711/52.
4. Recurso parcialmente provido.

Acórdãos publicados: 121




TRANSCRIÇÕES

Com a finalidade de proporcionar aos leitores do Informativo STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.


IPTU e Progressividade
RE 153.771-MG *
Ministro Moreira Alves (relator p/ o acórdão)



1. O eminente relator, Ministro Carlos Velloso, não conhece do presente recurso extraordinário, porque, fazendo ampla exposição relativa à progressividade do IPTU, sustenta que "o que está na Constituição, ao que me parece, é que é possível distinguir a progressividade fiscal - C.F., art. 145, § 1º, art. 156, § 1º - da progressividade- sanção inscrita no art. 182, § 4º, II", e depois de salientar que

"... forte na Constituição, art. 145, § 1º, as alíquotas do IPTU deverão ser progressivas, forma, aliás, de se emprestar a esse imposto caráter de pessoalidade, dado que a progressividade, segundo M.DUVERGER, lembra Hugo de Brito Machado, 'constitui um dos meios mais eficazes de personalização do imposto' ('Hacienda Pública', trad. de José Luiz Ruiz Travessi, Barcelona, 1958, p. 321). Essa progressividade assentar-se-á, especificamente, no disposto no art. 156, § 1º, da Constituição, certo que a 'função social' ali inscrita não é a mesma 'função social' do § 2º do art. 182 da Constituição: a primeira, do art. 156, § 1º, independe do plano diretor, porque localizada no campo tributário e não está jungida ao reordenamento de áreas urbanas. Ela se assenta, a função social do art. 156, § 1º, numa política redistributivista, ou a progressividade assentada no art. 156, § 1º, visa a realizar uma política redistributivista, na linha da lição de WILLHERM GERLOFF ... porque se reconhece estar a renda distribuída de modo inconveniente à vista das aspirações éticas da sociedade',

conclui:
"No caso, conforme está no acórdão recorrido 'o imposto variou de alíquota, levando-se em consideração o valor venal, a zona de situação, e o fato de existir ou não edificação'.
Não praticou, portanto, o Município de Belo Horizonte, ao instituir a progressividade fiscal inscrita na Lei municipal nº 5.641, de 1989, inconstitucionalidade. Ao contrário, a lei mencionada está na linha do que dispõem os artigos 145, § 1º, e 156, § 1º, da Constituição Federal".

2. Com a devida vênia do eminente relator, não me parece que assim seja.
Passo portanto, a examinar os artigos 145, § 1º, 156, § 1º, e 182, §§ 1º e 4º, todos da Constituição Federal.

3. Reza o § 1º do artigo 145:
"§ 1º. Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte."

Desse dispositivo decorre que a Constituição, adotando a distinção clássica segundo a qual os impostos podem ter caráter pessoal ou caráter real (é a classificação que distingue os impostos em pessoais e reais), visa a que os impostos, sempre que isso seja possível, tenham o caráter pessoal, caso em que serão graduados - e um dos critérios de graduação poderá ser a progressividade - segundo a capacidade econômica do contribuinte.
Por outro lado, em face desse dispositivo, não se pode pretender que a expressão "sempre que possível" se refira apenas ao caráter pessoal do imposto, e que, por isso, o princípio da capacidade contributiva seja aplicável a todos os impostos ainda quando não tenham caráter pessoal, como sustentam Américo Lacombe e José Maurício Conti, citados no voto do eminente relator. De feito, a parte final do dispositivo em causa repele essa conclusão, porque a Constituição atribui à administração tributária a faculdade de identificar o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte, "especialmente para conferir efetividade A ESSES OBJETIVOS", ou seja, ao objetivo de que os impostos, se possível, tenham caráter pessoal e ao de que esses impostos com caráter pessoal sejam graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, certo como é que essa faculdade de identificação só tem sentido quando se trata de imposto de caráter pessoal, ou seja - na definição de GIANINI (Istituzioni di Diritto Tributario, reimpressão da 9ª ed., p.159, Dott A Giuffrè Editore, Milano, 1974) -, "aqueles que alcançam o conjunto de rendimentos ou de bens do contribuinte, ou também uma parte destes, mas enquanto dizem respeito a uma dada pessoa, levando em conta, em medida mais ou mesmo ampla, as suas condições". O mesmo não ocorre, evidentemente, com os impostos de caráter real que - também na definição de GIANINI (Ob. Cit., ibidem) - são os que "alcançam bens singulares ou rendimentos ou também grupos de bens ou de rendimentos, considerados na sua objetividade, sem levar em conta a condição pessoal do sujeito passivo do imposto". Por isso mesmo, VICTOR UCKMAR (Princípios Comuns de Direito Constitucional Tributário, trad. MARCO AURÉLIO GRECO, § 12, p. 82, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 1976), tratando do princípio constitucional da igualdade tributária no tocante à capacidade contributiva, se refere ao "EVIDENTE ABSURDO DE ALÍQUOTAS PROGRESSIVAS PARA OS IMPOSTOS REAIS". Igualmente, VINCENZO CARULLO (La Costituzione della Repubblica Italiana, p. 184, Dott. Cesare Zuffi-Editore, Bologna, 1950), comentando o artigo 53 da Constituição Italiana que preceitua que "todos são obrigados a concorrer para as despesas públicas em razão de sua capacidade contributiva" e que "o sistema tributário é informado por critérios de progressividade", acentua: "Naturalmente, não queremos dizer - nem o poderemos - que todos os impostos indistintamente devem ser progressivos, porque bem sabemos como isso seria IMPOSSÍVEL ou cientificamente errado: porque bem sabemos que A PROGRESSÃO NÃO CONDIZ COM OS IMPOSTOS DIRETOS REAIS e pode encontrar só inadequada e indireta aplicação nos impostos sobre consumos e nos impostos indiretos em geral". No mesmo sentido, ZINGALI (apud COCIVERA, Principi di Diritto Tributário, I, ps. 253/254, nota 60, Dott. A Giuffrè Editore, Milano, 1974), que dá como uma das características do imposto real a de que ele "não pode ser organizado em forma progressiva (sendo a progressividade das alíquotas fundadas sobre o conceito de capacidade contributiva)". Essa também a posição de BERLIRI (Principi di Diritto Tributario, I, 2ª ed., ps. 268/269, GIUFFRÈ Editore, Milano, 1967, ao advertir: "Um outro elemento que caracteriza a capacidade contributiva é a sua relação com a pessoa do contribuinte. A capacidade contributiva, propriamente enquanto capacidade, é alguma coisa de subjetivo e não de objetivo: a mesma quantidade de renda ou de patrimônio exprime uma diversa possibilidade de contribuir para as despesas públicas se possuída por Tício, pai de 12 filhos ou por Gaio, solteiro; por Semprônio, jovem em pleno vigor das forças, ou por Mévio, velho paralítico e necessitado de contínua assistência médica. Tal íntima conexão entre a riqueza e seu possuidor resulta clara do confronto entre o art. 15 do Estatuto Albertino - que falava de haveres - e o artigo 53 da Constituição que fala justamente de capacidade contributiva. Aliás, num sistema inspirado em critérios de progressividade é natural que a imposição tenha caráter pessoal e não real". Não é diversa a lição de GIANINI (Comentario Sistematico alla Costituzione Italiana diretto da PIERO CALAMANDREI e ALESSANDRO LEVI, vol. I, p. 284, G.Barbèra, Editore, Firenze, 1950), ao comentar os preceitos da Constituição italiana sobre as relações tributárias, salienta, com relação à progressividade: "Pode somente afirmar-se que a não todos os tributos é aplicável o critério da progressividade (exatamente por isso a Constituição refere o critério mesmo ao sistema tributário): que os impostos diretos reais, enquanto alcançam objetivamente os rendimentos singulares (dos terrenos, das construções, etc.) devem ser necessariamente proporcionais, pois de outro modo se verificaria a incongruência de alcançar mais gravemente o possuidor de um rendimento derivado de uma fonte de renda que não o possuidor de uma renda igual, mas produzida por fontes de renda diversas; que o campo em que deve sobretudo operar a progressão é o do imposto pessoal sobre o rendimento geral do sujeito". Também na Suíça, BLUMENSTEIN (Sistema di Diritto delle Imposte, Trad. FRANCESCO FORTE, § 10, II, 2, Dott. A Giuffrè Editore, Milano, 1954) acentua que "a distinção entre impostos subjetivos e objetivos (pessoais e reais) decorre do fato de que para determinados tipos pode prestar-se atenção à capacidade econômica pessoal do sujeito, enquanto para outros conta só a existência de um determinado objeto de imposto". Na Alemanha, CREZELIUS (Steuerrecht II - Besonderes Steuerrecht, § 30, 1, p. 416, Verlag C.H.Beck, München, 1991), estudando o imposto imobiliário (Grundsteuer), que também é da competência dos municípios, salienta que ele pertence à espécie dos impostos reais, e acrescenta: "abarca-se, assim, um determinado objeto do imposto por seu valor ou com sua renda, sem que dependa da capacidade de prestação econômica ou pessoal daquele a quem, juridicamente no tocante ao imposto imobiliário, o imóvel é imputado"; no mesmo sentido, STEINBERG (verbete Grundsteuer, in Handwörterbuch des Steuerrechts und der Steuerwissenschaften, A-K, p. 549, C.H. Beck'sche Verlagsbuchhandlung, München, 1972). O francês PAUL HUGON (O Imposto - Teoria Moderna e Principais Sistemas, p. 85, Editora Renascença S/A, São Paulo, 1945, dissertando sobre as vantagens e desvantangens dos impostos reais, adverte que "ele agrava igualmente, por exemplo, os rendimentos de um prédio, seja qual for a situação econômica e social do proprietário: seja rico ou de posses médias, nacional ou estrangeiro, celibatário ou chefe de família; esteja a casa hipotecada ou não, etc.", esclarecendo: "ele se estabelece, pois, sem atender à capacidade contributiva". E, no Brasil, dentre outros, ZELMO DENARI (Curso de Direito Tributário, 3ª ed., p. 72, Forense, Rio de Janeiro, 1993) observa, quanto ao imposto real, que "de índole objetiva, abstrai a capacidade contributiva do contribuinte", sendo que "como exemplos temos o imposto territorial, rural e o imposto predial".

Ora, no sistema tributário nacional, é o IPTU inequivocadamente um imposto real, porquanto tem ele como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de imóvel localizado na zona urbana do Município, sem levar em consideração a pessoa do proprietário, do titular do domínio útil ou do possuidor, tanto assim que o Código Tributário Nacional ao definir seu fato gerador e sua base de cálculo não leva em conta as condições da pessoa do sujeito passivo. E mais: no artigo 130 estabelece que "os créditos tributários relativos a impostos cujo fato gerador seja a propriedade, o domínio útil ou a posse de bens imóveis, ... , sub-rogam-se na pessoa dos respectivos adquirentes, salvo quando conste do título a prova de sua quitação", o que implica dizer que, se não constar do título de transmissão a prova da quitação desses impostos (inclusive, portanto, o IPTU), o sujeito passivo do imposto devido anteriormente à transmissão do imóvel passa a ser o adquirente, o que importa concluir que essa obrigação tributária, nesse caso, de certa forma, se aproxima da obrigação ob ou propter rem, também denominada obrigação ambulatória, porque o devedor não é necessariamente o proprietário, titular do domínio útil ou possuidor ao tempo em que ocorreu o fato gerador e nasceu a obrigação tributária, mas pode ser o que estiver numa dessas posições quando da exigibilidade do crédito tributário, circunstância esta que mostra, claramente, que nesses impostos não se leva em consideração a capacidade contributiva do sujeito passivo, até porque, no momento da ocorrência do fato gerador anterior à transmissão, o futuro adquirente não era titular de direito real ou tinha a posse para daí se inferir, por presunção, que ele tivesse capacidade contributiva, que obviamente tem de ser aferida quando do fato gerador e não posteriormente a ele.
Ademais, o caráter real do IPTU foi exacerbado pelo artigo 156, § 1º, da atual Carta Magna.
Com efeito, BALEEIRO (Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar, 5ª ed., ps. 363 e 365, Forense, Rio de Janeiro, 1977), que, entre os impostos reais, cita o imposto territorial, porque "paga, por exemplo, o solo, imposto territorial a tantos cruzeiros por hectare ou a 1% sobre o seu valor venal, pouco importando que o proprietário seja celibatário, ausente, rico, que o conserve na expectativa de valorização ou para caçadas", observa:
"Em regra geral, só os impostos pessoais se ajustam adequadamente à aplicação de critérios progressivos medidos pela capacidade contributiva, se bem que esta se possa presumir da natureza, valor ou aplicação específica de determinada coisa, no sentido de que a possui, compra ou prefere o indivíduo de maiores recursos econômicos. Mas imposto sobre coisa, em princípio, exclui, por exemplo, a progressividade em atenção à pessoa, SALVO CASOS DE APLICAÇÃO EXTRAFISCAL."

Essa exceção se explica, porque, em se tratando de aplicação extrafiscal de imposto, não está em jogo a capacidade contributiva do contribuinte que só é levada em conta com relação a impostos pessoais com finalidade fiscal.
Assim, a Constituição de 1988, ao estabelecer, no artigo 156, § 1º, que o IPTU "PODERÁ SER PROGRESSIVO NOS TERMOS DE LEI MUNICIPAL, DE FORMA A ASSEGURAR O CUMPRIMENTO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE", só admitiu essa progressividade extrafiscal em atenção à coisa (a função social do direito de propriedade sobre o imóvel), não permitindo sequer a possibilidade de, com relação a esse imposto, se impor uma progressividade vinculada a situações pessoais do contribuinte, o que demonstra inequivocamente - e isso decorre até da circunstância de ter sido esse dispositivo colocado no capítulo concernente ao sistema tributário nacional - a exacerbação do caráter real desse imposto, o qual passou a alcançá-lo ainda quando utilizado para finalidade extrafiscal. Daí, terem razão os autores nacionais [...] que sustentam que, em face da Constituição de 1988, a única progressividade admitida para o IPTU é a extrafiscal destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade.
Portanto, sob o império da atual Constituição, não é admitida a progressividade fiscal do IPTU, quer com base exclusivamente - como pretendem, entre outros, ELIZABETH NAZAR CARRAZA e ROQUE CARRAZA, citados no voto do eminente relator - no seu artigo 145, § 1º, porque esse imposto tem, como disciplinado no sistema tributário brasileiro, caráter real que é incompatível com a progressividade decorrente de capacidade econômica do contribuinte, quer com arrimo - como pretende o eminente relator - na conjugação desse dispositivo constitucional (genérico) com o artigo 156, § 1º (específico), pela singela razão de que este último dispositivo, por admitir a progressividade para fins extrafiscais ("de forma a assegurar o cumprimento da função social da propriedade"), não pode, obviamente, servir de esteio para justificar progressividade fiscal.
Resta, pois, saber se a progressividade, a que alude o artigo 156, § 1º, da Constituição de 1988 e que é extrafiscal, é, ou não, a mesma progressividade também extrafiscal disciplinada no artigo 182, §§ 2º e 4º da mesma Carta Magna.
Rezam os referidos dispositivos constitucionais, o primeiro inserto no Título VI ("Da tributação e do orçamento") e o segundo no Título VII ("Da ordem econômica e financeira"): [...]

Como se vê, o artigo 156, I, § 1º, da Constituição só permite a progressividade do IPTU - progressividade essa que será instituída nos termos da lei municipal, uma vez que esse imposto é da competência do município - para o fim extrafiscal de assegurar o cumprimento da função social da propriedade. Trata-se, evidentemente, tendo em vista a modalidade de imposto em causa, da função social da propriedade urbana. Ora, a função social da propriedade, como bem salienta MARCO AURÉLIO GRECO (obra citada, p. 333), não está diretamente ligada à qualidade inerente a certos bens ou às faculdades atribuídas ao proprietário, "mas está ligada ao uso, à utilização concreta que é dada àquele determinado bem", ou seja, diz respeito ao exercício do direito de propriedade, atuando como limitação ao conceito individualista desse direito. Como é limitação imposta pela própria Constituição Federal (depois de o inciso XXII do artigo 5º declarar que "é garantido o direito de propriedade", o inciso XXIII desse mesmo artigo preceitua que "a propriedade atenderá a sua função social"), se a Carta Magna não estabelecer os seus contornos, caberá exclusivamente à lei federal fazê-lo, uma vez que se trata de precisar um conceito constitucional que obviamente não pode variar de município para município, como poderia ocorrer se a cada um dos nossos 5.500 municípios fosse permitido, em suas leis, estabelecê-lo diferentemente, conforme a maior ou menor imaginação criadora de cada um deles. A Constituição de 1988, porém, preferiu conceituar o que se deveria entender por função social da propriedade imobiliária, quer rural, quer urbana. Fê-lo no lugar próprio, ou seja, no título concernente à ordem econômica e financeira, onde, depois de acentuar, no artigo 170, incisos II e III, que, dentre os princípios gerais da atividade econômica, que "tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social", se encontram a propriedade privada e a função social da propriedade, incluiu os capítulos relativos à política urbana e à política agrícola e fundiária. Neste último, no artigo 186, tendo em vista que a função social da propriedade - como salientamos acima - diz respeito ao exercício dela, preceituou que a função social da propriedade rural é cumprida quando ela "atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: I - aproveitamento racional e adequado; II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores". Já naquele, no artigo 182, § 2º, também partindo da premissa de que a função social da propriedade é ínsita ao exercício dela, dispôs que "a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor", e, em seguida, no § 4º, complementou esse conceito e estabeleceu os meios de coerção indireta, e não propriamente sanções, para que a função social da propriedade urbana fosse alcançada, facultando "ao poder público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de: I - parcelamento ou edificação compulsórios; II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo; III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais". A interpretação sistemática da Constituição conduz inequivocamente à conclusão de que o IPTU com finalidade extrafiscal a que alude esse inciso II do § 4º do artigo 182 é a explicitação especificada, inclusive com limitação temporal, do IPTU com finalidade extrafiscal aludido no artigo 156, I, § 1º, até porque não tem sentido que se admitam, no mesmo texto constitucional, com a finalidade extrafiscal de atender à mesma função social da propriedade, um IPTU sem limitações que não as decorrentes da vontade de cada município e outro IPTU com as limitações expressamente estabelecidas pela Carta Magna, podendo um excluir o outro, ou ser instituídos cumulativamente. Por outro lado, essa exegese não é infirmada pela circunstância de a Constituição, no § 4º do artigo 182, haver limitado a finalidade extrafiscal do IPTU ao solo urbano não edificado, seja ele subutilizado, seja ele não utilizado, porque foi essa a opção adotada pelo constituinte, como o foi também a de estabelecer a progressividade extrafiscal, em se tratando de IPTU, como progressividade temporal.

Portanto, é inconstitucional qualquer progressividade, em se tratando de IPTU, que não atenda exclusivamente ao disposto no artigo 156, § 1º, aplicado com as limitações expressamente constantes dos §§ 2º e 4º do artigo 182, ambos da Constituição Federal.
Atendo-me, porém - já que se trata de controle difuso - ao pedido formulado neste mandado de segurança, o qual se refere, apenas, ao IPTU incidente sobre o lote nº 19 do quarteirão nº 50 do bairro Belvedere (BH), declaro a inconstitucionalidade, por adotar progressividade não admitida pela atual Constituição, do sub-item 2.2.3 do setor II da Tabela III (alíquotas do IPTU) da Lei 5.641, de 22.12.89, do município de Belo Horizonte, o qual estabelece: [...]

4. Em face do exposto, e com a devida vênia do eminente relator, conheço do presente recurso extraordinário e lhe dou provimento, para deferir a segurança, declarando inconstitucional o sub-item 2.2.3 do setor II da Tabela III da Lei 5.641, de 22.12.89, do município de Belo Horizonte.

* acórdão ainda não publicado.


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