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sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Informativo STF 310 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF

Brasília, 26 a 30 de maio de 2003- Nº310.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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ÍNDICE DE ASSUNTOS
Bens Públicos de Uso Especial e Imunidade Carta Rogatória: Despesas Competência para Execução Contribuição Previdenciária do Estado de MG Crime Hediondo e Liberdade Provisória Depositário Infiel e Motivo de Força Maior Gratificação: Extensão aos Inativos ICMS: Repasse a Municípios Imunidade Parlamentar e Nexo de Causalidade Juntada do Incidente de Inconstitucionalidade Princípio da Segurança Jurídica Tutela Antecipada e Proventos de Aposentadoria Princípio da Segurança Jurídica (Transcrições)
PLENÁRIO
Tutela Antecipada e Proventos de Aposentadoria
O Tribunal, por maioria, manteve decisão do Min. Marco Aurélio, relator, que indeferira o pedido de suspensão dos efeitos da tutela antecipada concedida em primeiro grau de jurisdição e mantida pelo TRF da 5ª Região, a qual assegurara, à Associação dos Aposentados e Aposentáveis dos Correios e Telégrafos, a extensão, aos proventos de aposentadoria de seus associados, da gratificação de qualidade e produtividade, conferida aos trabalhadores da ativa. Afastou-se o alegado desrespeito à decisão do STF na medida liminar na ADC-4, tendo em conta que esta refere-se apenas a vencimentos e vantagens de servidores públicos, não alcançando matéria de natureza previdenciária. Vencidos os Ministros Gilmar Mendes e Nelson Jobim, por entenderem que a Lei 9.494/97 - que faz remissão direta ao art. 5º, parágrafo único e ao art. 7º, I, da Lei 4.348/64 - não alberga tal entendimento restritivo em relação a eventuais benefícios da inatividade. Pet (AgR) 2.693-PE, rel. Min. Marco Aurélio, 28.5.2003. (PET-2693)
Imunidade Parlamentar e Nexo de Causalidade
Ante a incidência da prescrição da pretensão punitiva, o Tribunal, concluindo julgamento iniciado em 7.5.2003 (ver Informativo 307), declarou extinto processo cuja denúncia fora oferecida pelo Ministério Público Federal contra deputado federal pela suposta prática de crime contra a honra do Procurador-Geral de Justiça do Estado do Paraná, em virtude de afirmações feitas em matéria jornalística sobre: a) a suposta utilização do cargo de Procurador-Geral para pressionar emissora de televisão a retirar do ar o programa do indiciado; b) a não apuração de alegada tortura que teria sido praticada por promotor de comarca do interior; e c) a alusão de desvio de dinheiro, pela Procuradoria-Geral de Justiça, em "diárias frias" a promotores. O Min. Gilmar Mendes assentou, à guisa de obter dictum, que as duas primeiras afirmações do deputado estariam abrangidas pela imunidade material do parlamentar (CF, art. 53), e que, nessas circunstâncias, não poderiam configurar, em tese, fato definido como crime. Inq 1.808-PR, rel. Ministra Ellen Gracie, 28.5.2003. (INQ-1808)
ICMS: Repasse a Municípios
Julgando o pedido formulado em ação direta (Lei 9.868/99, art. 12) ajuizada pelo Partido dos Trabalhadores - PT e pelo Partido Liberal - PL contra dispositivos da Lei 2.749/2002, do Estado do Amazonas - que dispõem sobre a apuração e distribuição de parcelas do produto de arrecadação do ICMS destinadas aos Municípios -, o Tribunal rejeitou a preliminar relativa à irregularidade da representação processual, visto bastar a expressa especificação dos poderes conferidos aos advogados para propor a ação, não sendo necessária a individualização dos dispositivos a serem examinados. Rejeitou-se, ainda, por maioria, vencido o Min. Marco Aurélio, a preliminar de inépcia da inicial, dado haver suficiente indicação dos dispositivos atacados, dos fundamentos jurídicos e do pedido. Em seguida, no mérito, o Tribunal declarou a inconstitucionalidade do inciso I e alíneas do art. 1º da Lei 2.749/2002, do Estado do Amazonas, e parágrafo único do mesmo artigo, uma vez que tais dispositivos, ao disporem sobre critérios de cálculo e repartição da parcela do valor adicionado, trataram de matéria reservada à lei complementar, conforme disposto no inciso I do art. 161 da CF. Prosseguindo, o Tribunal declarou a constitucionalidade do inciso II, alínea a do mencionado artigo 1º que, ao regular a repartição de um quarto dos valores de ICMS destinados aos Municípios, somente exercera a competência expressamente outorgada pela CF aos Estados, consoante previsto no inciso II do parágrafo único do art. 158. (CF, art. 158: Parágrafo único: "As parcelas de receita pertencentes aos Municípios, mencionadas no inciso IV, serão creditadas conforme os seguintes critérios: II - até um quarto, de acordo com o que dispuser lei estadual ou, no caso dos Territórios, lei federal.) ADI 2.728-AM, rel. Min. Maurício Corrêa, 28.5.2003. (ADI-2728)
Competência para Execução
Compete ao Presidente do STF executar e fazer executar as ordens e decisões do Tribunal, ressalvadas as atribuições dos Presidentes das Turmas e dos Relatores (RISTF, art. 13). Com esse entendimento, o Tribunal, apreciando agravo regimental, rejeitou a tese sustentada pela União no sentido de que seria da competência do Plenário, e não do Presidente, julgar o pedido por ela formulado nos embargos à execução em ação cível originária. Em seguida, após o voto do Min. Marco Aurélio, relator, conhecendo e provendo parcialmente o agravo na parte alusiva a incidência dos juros de mora, pediu vista o Min. Gilmar Mendes. ACO (AgR-Embargos à Execução) 342-DF, rel. Min. Marco Aurélio, 29.5.2003. (ACO-342)
Carta Rogatória: Despesas
Tendo em vista que o art. 12 da Convenção Interamericana sobre Cartas Rogatórias, promulgada pelo Decreto 1.899/96, prevê que "será facultativo para o Estado requerido dar tramitação à carta rogatória que careça de indicação do interessado que seja responsável pelas despesas e custas que houver", o Tribunal manteve decisão do Min. Marco Aurélio, Presidente, que, com base nos princípios da economia e da celeridade processuais, concedera a execução de carta rogatória para a citação de empresa domiciliada no Brasil para responder a processo perante a Justiça rogante, na qual não houve a indicação de pessoa que se responsabilize pelas custas. Salientou-se, ainda, que o mencionado art. 12, ao viabilizar o trânsito das cartas rogatórias independentemente da indicação do responsável pelas despesas e custas, revogou o art. 57 do RISTF ("sem o respectivo preparo, exceto em caso de isenção legal, nenhum processo será distribuído, nem se praticarão nele atos processuais, salvo os que forem ordenados de ofício pelo Relator, pela Turma ou pelo Tribunal."). CR (AgR) 10.292-EUA, rel. Min. Marco Aurélio, 29.5.2003.(CR-10292)
PRIMEIRA TURMA
Juntada do Incidente de Inconstitucionalidade
A Turma deliberou afetar ao Plenário o julgamento de agravo regimental em recurso extraordinário em que se propõe a revisão da orientação do STF segundo a qual, na hipótese de a decisão recorrida estar fundamentada em precedente do órgão especial ou do plenário que declarou incidentalmente a inconstitucionalidade de norma federal, deve o recorrente fazer prova do inteiro teor deste acórdão para que seu recurso extraordinário, interposto com base no art. 102, III, b, da CF, seja conhecido. Cuida-se de agravo regimental contra decisão do Min. Sepúlveda Pertence, relator, que negara seguimento a recurso extraordinário em virtude de a fundamentação do acórdão que reconhecera a inconstitucionalidade do art. 3º, I, da Lei 8.200/91, ter se respaldado em aresto do órgão plenário, não acostado aos autos. O Min. Gilmar Mendes, convocado para participar da Sessão nos termos do art. 41 do RISTF, proferiu voto no sentido de dispensar a exigência de juntada do aresto que serviu de fundamento ao acórdão recorrido nas hipóteses em que já houver o pronunciamento do STF sobre a questão, tal como ocorre no caso concreto, por entender que, se o parágrafo único do art. 481 do CPC permite que, nesses casos, o órgão fracionário não submeta ao plenário da Corte o incidente de inconstitucionalidade, exigir-se a juntada do inteiro teor do acórdão proferido pelo Tribunal a quo no incidente de inconstitucionalidade para o conhecimento do recurso extraordinário fundado no art. 102, III, b, da CF, resultaria em desmedida valoração do julgamento do órgão especial do Tribunal de origem sobre a decisão do STF, em manifesta desconsideração deste pronunciamento. RE (AgR) 196.752-MG, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 30.5.2003.(RE-196752)
Contribuição Previdenciária do Estado de MG
Considerando que a CF/88, somente após a superveniência da EC 20/98, não autoriza a cobrança de contribuição previdenciária sobre servidores aposentados e pensionistas, a Turma deu provimento a agravo regimental em recurso extraordinário interposto pelo Estado de Minas Gerais para reconhecer a constitucionalidade da cobrança de contribuição previdenciária de inativos pela Lei estadual 12.278/96 no período anterior à promulgação da Emenda Constitucional 20/98. Precedente citado: ADI (MC) 1.441-DF (DJU de 18.10.96). RE (AgR) 372.356-MG, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 30.5.2003. (RE-372356)
Gratificação: Extensão aos Inativos
A Turma manteve acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul que, nos termos do art. 40, § 8º, da CF, assegurara o direito de servidores inativos do Município de Porto Alegre ao recebimento da "gratificação de incentivo técnico" instituída pela Lei municipal 7.690/95. Considerou-se estar demonstrado que a mencionada gratificação fora concedida de forma geral, não configurando verba exclusiva dos servidores em atividade. RE 366.400-RS, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 30.5.2003. (RE-366400)
SEGUNDA TURMA
Depositário Infiel e Motivo de Força Maior
A Turma deferiu habeas corpus impetrado contra decisão do Colégio Recursal Cível da Comarca de Barretos que decretara a prisão civil do paciente por considerá-lo depositário infiel, já que não entregara veículo de propriedade de sua esposa - e do qual fora nomeado depositário - quando da penhora em ação de execução por quantia certa de título extrajudicial. A Turma considerou que o paciente não entregara o bem por motivo de força maior, tendo em conta que o veículo já era objeto de garantia de contrato de alienação fiduciária, antes mesmo da efetivação da penhora. Precedente citado: HC 77.053-SP (DJU de 4.9.1998). HC 83.056-SP, rel. Min. Maurício Corrêa, 27.5.2003. (HC-83056)
Bens Públicos de Uso Especial e Imunidade
Tendo em conta que os imóveis da Companhia Docas do Estado de São Paulo - CODESP - delegatária do serviço de exploração do Porto de Santos -, são bens de uso especial e, portanto, estão acobertados pela imunidade tributária recíproca prevista no art. 150, VI, a da CF, a Turma deu provimento ao recurso extraordinário para reformar acórdão do Tribunal de Alçada do Estado de São Paulo que entendera incidente o IPTU sobre o patrimônio do referido porto. Precedente citado: RE 253.394-SP (DJU de 11.4.2003). RE 265.749-SP, rel. Min. Maurício Corrêa, 27.5.2003. (RE-265749)
Crime Hediondo e Liberdade Provisória
A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus no qual se alegava ausência de fundamentação da sentença que, em virtude da condenação do paciente pela prática de crime hediondo e visando a garantia da ordem pública, negara ao réu o direito de apelar em liberdade. Considerou-se que, em se tratando de crime hediondo, a fundamentação é de ser exigida quanto à decisão que admite a liberdade, e não quanto à que decreta a prisão. Vencido o Min. Celso de Mello, por entender que os fundamentos invocados para a decretação da prisão - sem alusão ao art. 2º, § 2º da Lei 8.072/90 e com apoio unicamente no art. 312 do CPP - encontravam-se destituídos de base empírica derivada da existência de fatos concretos que indicassem a necessidade de tal medida, no que foi acompanhado pelo Min. Maurício Corrêa. (Lei 8.072/90, art. 2º, § 2º: "Em caso de sentença condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar em liberdade."). Precedentes citados: HC 70.634-PE (DJU de 24.6.94); HC 81.392-DF (DJU de 1º.3.2002); HC 69.667-RJ (RTJ 148/429). HC 82.770-RJ, rel. orig. Celso de Mello, red. p/ acórdão Min. Gilmar Mendes, 27.5.2003. (HC-82.770)
Princípio da Segurança Jurídica
A Turma, resolvendo questão de ordem, referendou a decisão do Min. Gilmar Mendes, relator, que, com base no princípio da segurança jurídica, concedera efeito suspensivo ao recurso extraordinário interposto contra acórdão do TRF da 4ª Região que indeferira a transferência da requerente de uma universidade federal para outra, solicitada em virtude da mudança de domicílio decorrente de sua aprovação em concurso público na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT, tendo em conta a peculiar situação jurídica da requerente, prestes a concluir o curso de direito na Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS. Leia na seção de Transcrições deste Informativo o inteiro teor da decisão monocrática do Min. Gilmar Mendes que concedera efeito suspensivo ao citado recurso extraordinário. Pet (QO) 2.900-RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 27.5.2003. (PET-2900)

Sessões

Ordinárias

Extraordinárias

Julgamentos

Pleno

28.5.2003

29.5.2003

25

1a. Turma

----

30.5.2003

89

2a. Turma

27.5.2003

----

150

C L I P P I N G    D O    D J
de 30 de maio 2003 ADI N. 132-RO RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE EMENTA: I - Crime de responsabilidade: tipificação: competência legislativa da União mediante lei ordinária: inconstitucionalidade de sua definição em constituição estadual. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (malgrado a reserva pessoal do relator) está sedimentada no sentido de que é da competência legislativa exclusiva da União a definição de crimes de responsabilidade de quaisquer agentes políticos, incluídos os dos Estados e Municípios. 2. De qualquer sorte, a Constituição da República reserva a tipificação dos crimes de responsabilidade à lei ordinária: é regra de processo legislativo que, dada a sua implicação com o regime constitucional de separação e independência dos poderes, se imporia à observância do Estado-membro, ainda quando detivesse competência para legislar na matéria. II - Assembléia Legislativa: sujeição à sua prévia aprovação, pela Constituição do Estado, da escolha pelo Governador dos "administradores dos municípios criados e não instalados" e de "titulares de outros cargos que a lei determinar": constitucionalidade. III - Ministério Público: atribuição para "adquirir bens e serviços e efetuar a respectiva contabilização": constitucionalidade, dado cuidar-se de corolário de sua autonomia administrativa (e financeira), não obstante sua integração na estrutura do Poder Executivo. IV - Ministério Público: constitucionalidade da outorga de "eficácia plena e executoriedade imediata" às decisões "fundadas em sua autonomia", se, no contexto, o dispositivo tem por objeto exclusivo atos administrativos da instituição. V - Polícias estaduais: regra constitucional local que subordina diretamente ao Governador a Polícia Civil e a Polícia Militar do Estado: inconstitucionalidade na medida em que, invadindo a autonomia dos Estados para dispor sobre sua organização administrativa, impõe dar a cada uma das duas corporações policiais a hierarquia de Secretarias e aos seus dirigentes o status de secretários. VI - Polícia Civil: direção: inconstitucionalidade da regra impositiva não só de que a escolha recaia em Delegado de carreira - como determinado pela Constituição da República -, mas também de que seja o escolhido integrante da sua classe mais elevada. VII - Polícia Militar: atribuição de "radiopatrulha aérea": constitucionalidade. O âmbito material da polícia aeroportuária, privativa da União, não se confunde com o do policiamento ostensivo do espaço aéreo, que - respeitados os limites das áreas constitucionais das Polícias Federal e Aeronáutica Militar - se inclui no poder residual da Polícia dos Estados. * noticiado no Informativo 307 ADI (MC) N. 1.439-DF RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO EMENTA: DESRESPEITO À CONSTITUIÇÃO - MODALIDADES DE COMPORTAMENTOS INCONSTITUCIONAIS DO PODER PÚBLICO. - O desrespeito à Constituição tanto pode ocorrer mediante ação estatal quanto mediante inércia governamental. A situação de inconstitucionalidade pode derivar de um comportamento ativo do Poder Público, que age ou edita normas em desacordo com o que dispõe a Constituição, ofendendo-lhe, assim, os preceitos e os princípios que nela se acham consignados. Essa conduta estatal, que importa em um facere (atuação positiva), gera a inconstitucionalidade por ação. - Se o Estado deixar de adotar as medidas necessárias à realização concreta dos preceitos da Constituição, em ordem a torná-los efetivos, operantes e exeqüíveis, abstendo-se, em conseqüência, de cumprir o dever de prestação que a Constituição lhe impôs, incidirá em violação negativa do texto constitucional. Desse non facere ou non praestare, resultará a inconstitucionalidade por omissão, que pode ser total, quando é nenhuma a providência adotada, ou parcial, quando é insuficiente a medida efetivada pelo Poder Público. SALÁRIO MÍNIMO - SATISFAÇÃO DAS NECESSIDADES VITAIS BÁSICAS - GARANTIA DE PRESERVAÇÃO DE SEU PODER AQUISITIVO. - A cláusula constitucional inscrita no art. 7º, IV, da Carta Política - para além da proclamação da garantia social do salário mínimo - consubstancia verdadeira imposição legiferante, que, dirigida ao Poder Público, tem por finalidade vinculá-lo à efetivação de uma prestação positiva destinada (a) a satisfazer as necessidades essenciais do trabalhador e de sua família e (b) a preservar, mediante reajustes periódicos, o valor intrínseco dessa remuneração básica, conservando-lhe o poder aquisitivo. - O legislador constituinte brasileiro delineou, no preceito consubstanciado no art. 7º, IV, da Carta Política, um nítido programa social destinado a ser desenvolvido pelo Estado, mediante atividade legislativa vinculada. Ao dever de legislar imposto ao Poder Público - e de legislar com estrita observância dos parâmetros constitucionais de índole jurídico-social e de caráter econômico-financeiro (CF, art. 7º, IV) -, corresponde o direito público subjetivo do trabalhador a uma legislação que lhe assegure, efetivamente, as necessidades vitais básicas individuais e familiares e que lhe garanta a revisão periódica do valor salarial mínimo, em ordem a preservar, em caráter permanente, o poder aquisitivo desse piso remuneratório. SALÁRIO MÍNIMO - VALOR INSUFICIENTE - SITUAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO PARCIAL. - A insuficiência do valor correspondente ao salário mínimo, definido em importância que se revele incapaz de atender as necessidades vitais básicas do trabalhador e dos membros de sua família, configura um claro descumprimento, ainda que parcial, da Constituição da República, pois o legislador, em tal hipótese, longe de atuar como o sujeito concretizante do postulado constitucional que garante à classe trabalhadora um piso geral de remuneração (CF, art. 7º, IV), estará realizando, de modo imperfeito, o programa social assumido pelo Estado na ordem jurídica. - A omissão do Estado - que deixa de cumprir, em maior ou em menor extensão, a imposição ditada pelo texto constitucional - qualifica-se como comportamento revestido da maior gravidade político-jurídica, eis que, mediante inércia, o Poder Público também desrespeita a Constituição, também ofende direitos que nela se fundam e também impede, por ausência de medidas concretizadoras, a própria aplicabilidade dos postulados e princípios da Lei Fundamental. - As situações configuradoras de omissão inconstitucional - ainda que se cuide de omissão parcial, derivada da insuficiente concretização, pelo Poder Público, do conteúdo material da norma impositiva fundada na Carta Política, de que é destinatário - refletem comportamento estatal que deve ser repelido, pois a inércia do Estado qualifica-se, perigosamente, como um dos processos informais de mudança da Constituição, expondo-se, por isso mesmo, à censura do Poder Judiciário. INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO - DESCABIMENTO DE MEDIDA CAUTELAR. - A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de proclamar incabível a medida liminar nos casos de ação direta de inconstitucionalidade por omissão (RTJ 133/569, Rel. Min. MARCO AURÉLIO; ADIn 267-DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO), eis que não se pode pretender que mero provimento cautelar antecipe efeitos positivos inalcançáveis pela própria decisão final emanada do STF. - A procedência da ação direta de inconstitucionalidade por omissão, importando em reconhecimento judicial do estado de inércia do Poder Público, confere ao Supremo Tribunal Federal, unicamente, o poder de cientificar o legislador inadimplente, para que este adote as medidas necessárias à concretização do texto constitucional. - Não assiste ao Supremo Tribunal Federal, contudo, em face dos próprios limites fixados pela Carta Política em tema de inconstitucionalidade por omissão (CF, art. 103, § 2º), a prerrogativa de expedir provimentos normativos com o objetivo de suprir a inatividade do órgão legislativo inadimplente. IMPOSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, POR VIOLAÇÃO POSITIVA DA CONSTITUIÇÃO, EM AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO (VIOLAÇÃO NEGATIVA DA CONSTITUIÇÃO). - A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, fundada nas múltiplas distinções que se registram entre o controle abstrato por ação e a fiscalização concentrada por omissão, firmou-se no sentido de não considerar admissível a possibilidade de conversão da ação direta de inconstitucionalidade, por violação positiva da Constituição, em ação de inconstitucionalidade por omissão, decorrente da violação negativa do texto constitucional. * noticiado no Informativo 32 ADI N. 1.474-AP RELATOR: MIN. GILMAR MENDES EMENTA: Ação direta de inconstitucionalidade, 2. Emenda no 5, que acresce o art. 54 às Disposições Transitórias da Constituição do Estado do Amapá. 3. Alegação de contrariedade aos arts. 74 e 235, III, da Constituição Federal. 4. Prerrogativa exclusiva do Governador do Estado para nomear Conselheiros do Tribunal de Contas. 5. Competência do Chefe do Poder Executivo Estadual apenas para a primeira investidura, tal como o modelo ortodoxo previsto pela Constituição Federal. 6. Caráter transitório do parâmetro de controle. 7. Parâmetro que já deixou de produzir efeitos. 8. Ação julgada prejudicada. * noticiado no Informativo 279 ADI (MC) N. 1.630-RS RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO PENSÃO - VALOR. Ao primeiro exame, conflita com o § 5º do artigo 40 da Constituição Federal preceito de Carta estadual em que se remete ao legislador ordinário a fixação de limite estranho ao texto do inciso XI do artigo 37 da Constituição Federal, prevendo a extinção da cota individual de pensão com a perda da qualidade de pensionista (§§ 3º e 4º do artigo 41 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 16, de 23 de maio de 1997. * noticiado no Informativo 77 ADI N. 2.334-DF RELATOR: MIN. GILMAR MENDES EMENTA: Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Decretos de caráter regulamentar. Inadmissibilidade. 3. Não configurada a alegada usurpação de competência privativa da União por Lei estadual. 4. Competência concorrente que permite ao Estado regular de forma específica aquilo que a União houver regulado de forma geral (art. 24, inciso V, da Constituição). 5. Não conhecimento da ação quanto aos Decretos nos 27.254, de 9.10.2000 e 29.043, de 27.8.2001, e improcedência quanto à Lei do Estado do Rio de Janeiro no 3.438, de 7.7.2000. * noticiado no Informativo 305 ADI N. 2.576-RO RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 1º, PAR. ÚNICO E ART. 3º, § 2º DA LEI COMPLEMENTAR Nº 248/2001, DO ESTADO DE RONDÔNIA. SERVIDORES PÚBLICOS ESTADUAIS. INICIATIVA DE LEI RESERVADA AO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. DISPOSITIVOS ACRESCENTADOS POR EMENDA PARLAMENTAR. ART. 61, § 1º, II, c DA CF. VEDAÇÃO DE EMENDA QUE IMPORTE NO AUMENTO DA DESPESA PREVISTA. ART. 63, I DA CARTA MAGNA. Dispondo sobre a lotação dos Defensores Públicos no Estado (art. 1º, par. único) e sobre a extensão da Gratificação criada aos assistentes jurídicos do ex-Território de Rondônia, trataram estes preceitos, inegavelmente, de matéria atinente à organização e remuneração do regime de pessoal do Estado, cuja elaboração normativa, sem a iniciativa do Governador, afronta a reserva prevista no art. 61, § 1º, II, c, da CF, comando que a jurisprudência desta Corte decidiu ser de observância obrigatória para os Estados e Distrito Federal, por encerrar corolário do princípio da independência dos Poderes. Precedentes: ADI nº 873, Rel. Min. Maurício Corrêa, ADI nº 1.064, Rel. Min. Ilmar Galvão, ADI nº 1.249, Rel. Min. Maurício Corrêa e ADI nº 805, Rel. Min. Sepúlveda Pertence. A extensão da referida gratificação prevista no caput do art. 3º da LC nº 248/2001 representa um aumento na despesa com o funcionalismo público para o Estado, contrariando o disposto no art. 63, I da CF. Ação direta julgada procedente. * noticiado no Informativo 305 AO (QO) N. 870-RS RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO EMENTA: - CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL: AÇÃO PROMOVIDA POR EX-JUIZ CLASSSISTA DO TRT/4ª Região: PERCENTUAL DE 11,98%: CONVERSÃO PARA U.R.V. C.F., art. 102, I, n. I. - Se não é objeto da causa uma vantagem ou um direito peculiar, próprio, da magistratura, mas vantagem ou direito que abrange, também, os servidores do Legislativo e do Ministério Público, não compete ao Supremo Tribunal Federal julgar, originariamente, a causa. II. - Inteligência da norma de competência inscrita no art. 102, I, n, da Constituição Federal. III. - Precedentes do S.T.F. IV. - Competência, no caso, do Juízo Federal de 1º grau. IF N. 1.207-SP RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO EMENTA: INTERVENÇÃO FEDERAL. 2. Precatórios judiciais. 3. Não configuração de atuação dolosa e deliberada do Estado de São Paulo com finalidade de não pagamento. 4. Estado sujeito a quadro de múltiplas obrigações de idêntica hierarquia. Necessidade de garantir eficácia a outras normas constitucionais, como, por exemplo, a continuidade de prestação de serviços públicos. 5. A intervenção, como medida extrema, deve atender à máxima da proporcionalidade. 6. Adoção da chamada relação de precedência condicionada entre princípios constitucionais concorrentes. 7. Pedido de intervenção indeferido. RE (AgR-EDv) N. 228.296-MG RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO E M E N T A: EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA - DESCUMPRIMENTO, PELA PARTE EMBARGANTE, DO DEVER PROCESSUAL DE PROCEDER AO NECESSÁRIO PREPARO - OCORRÊNCIA DA DESERÇÃO - EXTINÇÃO ANÔMALA DO PROCEDIMENTO RECURSAL - RISTF, ART. 335, § 3º - DERROGAÇÃO PELO ART. 511 DO CPC, NA REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 8.950/94 - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. - O art. 511 do CPC, na redação dada pela Lei nº 8.950/94, derrogou o § 3º do art. 335 do RISTF, de tal modo que se impõe, à parte recorrente, no próprio ato de interposição dos embargos de divergência, o dever de comprovar a efetivação do respectivo preparo, sob pena de deserção. Precedentes. - A deserção, por traduzir matéria de ordem pública, pode ser conhecida, "ex officio", pelo Tribunal, que deverá decretá-la, para que produza os seus regulares efeitos jurídicos (RT 503/129), independentemente de formal provocação de qualquer dos sujeitos processuais (RTJ 151/278-279), gerando, desse modo, com o seu reconhecimento, a extinção anômala do procedimento recursal. Precedentes. RE N. 195.056-PR RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO EMENTA: - CONSTITUCIONAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPOSTOS: IPTU. MINISTÉRIO PÚBLICO: LEGITIMIDADE. Lei 7.374, de 1985, art. 1º, II, e art. 21, com a redação do art. 117 da Lei 8.078, de 1990 (Código do Consumidor); Lei 8.625, de 1993, art. 25. C.F., artigos 127 e 129, III. I. - A ação civil pública presta-se a defesa de direitos individuais homogêneos, legitimado o Ministério Público para aforá-la, quando os titulares daqueles interesses ou direitos estiverem na situação ou na condição de consumidores, ou quando houver uma relação de consumo. Lei 7.374/85, art. 1º, II, e art. 21, com a redação do art. 117 da Lei 8.078/90 (Código do Consumidor); Lei 8.625, de 1993, art. 25. II. - Certos direitos individuais homogêneos podem ser classificados como interesses ou direitos coletivos, ou identificar-se com intereses sociais e individuais indisponíveis. Nesses casos, a ação civil pública presta-se a defesa dos mesmos, legitimado o Ministério Público para a causa. C.F., art. 127, caput, e art. 129, III. III. - O Ministério Público não tem legitimidade para aforar ação civil pública para o fim de impugnar a cobrança e pleitear a restituição de imposto - no caso o IPTU - pago indevidamente, nem essa ação seria cabível, dado que, tratando-se de tributos, não há, entre o sujeito ativo (poder público) e o sujeito passivo (contribuinte) uma relação de consumo (Lei 7.374/85, art. 1º, II, art. 21, redação do art. 117 da Lei 8.078/90 (Código do Consumidor); Lei 8.625/93, art. 25, IV; C.F., art. 129, III), nem seria possível identificar o direito do contribuinte com "interesses sociais e individuais indisponíveis." (C.F., art. 127, caput). IV. - R.E. não conhecido. * noticiado no Informativo 174 RE N. 228.321-RS RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS: EMPRESÁRIOS. AUTÔNOMOS e AVULSOS. Lei Complementar nº 84, de 18.01.96: CONSTITUCIONALIDADE. I. - Contribuição social instituída pela Lei Complementar nº 84, de 1996: constitucionalidade. II. - R.E. não conhecido. * noticiado no Informativo 180 RE (AgR) N. 238.649-SP RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IMPOSTO SOBRE A VENDA A VAREJO DE COMBUSTÍVEIS. ART. 156, III DA CONSTITUIÇÃO (REDAÇÃO ANTERIOR À EC 3/93). Tributo incidente sobre a venda a varejo de combustíveis líquidos e gasosos, exceto óleo diesel, que não se encontra configurada na espécie, porquanto tratar-se de venda mensal de 150.000 litros a empresa que transforma o combustível em produto diverso, a ser comercializado com outras indústrias. Caracterizada, portanto, hipótese de operação a atacado, conforme Resoluções do Conselho Nacional do Petróleo - CNP. Precedente: RE 140.612. Agravo regimental improvido. HC N. 82.561-PR RELATOR: MIN. ILMAR GALVÃO EMENTA: HABEAS CORPUS. ACÓRDÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, QUE INDEFERIU MEDIDA ANÁLOGA POR NÃO SER POSSÍVEL A UTILIZAÇÃO DO WRIT COMO SUCEDÂNEO DO RECURSO ESPECIAL OU COMO MEIO DE REVISÃO CRIMINAL DE DECISÃO DE TRIBUNAL DE SEGUNDO GRAU. Fundamento que não se sustenta, porquanto a decisão de Tribunal que conhece da apelação, em sentido amplo, interposta pela defesa, substitui a sentença condenatória, tornando-se a referida Corte coatora para todos os efeitos, na medida em que houve a devolução plena da matéria relativa à ação penal. Habeas corpus concedido em parte para determinar que, afastados os óbices suscitados, prossiga a Corte impetrada no julgamento do writ. * noticiado no Informativo 304 RE (QO) N. 348.714-RS RELATOR: MIN. MOREIRA ALVES EMENTA: Recurso extraordinário. Questão de ordem. Retificação de erro material. - Em se tratando de evidente erro material que pode ser corrigido de ofício, resolve-se esta questão de ordem no sentido de que seja retificada a conclusão do julgamento do presente recurso extraordinário, para dele não se conhecer, uma vez que, no caso, a competência é da Justiça Comum Estadual. RHC N. 82.824-SP RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE EMENTA: I. Defesa: pedido de adiamento da sessão de julgamento indeferido sem motivo adequado, impedindo a sustentação oral: nulidade. II. Nulidade: prejuízo. Não tendo o réu sido absolvido, presume-se que a falta de sustentação oral acarretou prejuízo à sua defesa. * noticiado no Informativo 302 HC N. 81.855-SP RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRONÚNCIA. QUALIFICADORAS. LIBELO. NULIDADE. I. - Na sentença de pronúncia, as qualificadoras só devem ser afastadas quando manifestamente improcedentes. II. - Improcedência da alegação de nulidade do libelo acusatório, por estar em desconformidade com a pronúncia. III. - H.C. indeferido. * noticiado no Informativo 288 HC N. 82.949-RJ RELATOR: MIN. GILMAR MENDES EMENTA: Habeas corpus. 2. Processo penal. 3. Fundamentação da prisão preventiva. 4. Fuga do distrito da culpa. 5. Ameaça de testemunha. 6. O excesso de prazo restou superado com a sentença de pronúncia. 7. Precedentes. 8. Ausência de constrangimento ilegal. 9. Habeas corpus indeferido. HC N. 83.041 RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO EMENTA: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. QUESTÃO NOVA. INTERROGATÓRIO. AUSÊNCIA DE ADVOGADO. I. - Por conter questões novas, não apreciadas pelo Superior Tribunal de Justiça, o habeas corpus não pode ser conhecido, sob pena de supressão de instância. II. - A ausência de advogado no interrogatório do réu não vicia o ato, mesmo porque o defensor do acusado não pode, de qualquer modo, intervir ou influir nas perguntas e nas respostas. CPP, art. 187. III. - H.C. conhecido, em parte, e, nessa parte, indeferido. HC N. 83.042-RS RELATOR: MIN. GILMAR MENDES EMENTA: Habeas Corpus. 2. Roubo (art. 157, § 2º, incs. I e II, c/c o art. 61, inc. I, todos do Código Penal). 3. Alegada nulidade do processo a partir do interrogatório do acusado, tendo em vista não ter sido o paciente assistido por advogado. 4. Alegada violação ao princípio constitucional do contraditório. 5. A ausência de advogado no interrogatório judicial do acusado não infirma a validade jurídica desse ato processual. Precedentes: HC 68929, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 28.8.92; RHC 80091, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 16.6.00; HC 69372, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 7.5.93. 6. Habeas Corpus indeferido. Acórdãos Publicados: 102
T R A N S C R I Ç Õ E S
Princípio da Segurança Jurídica (Transcrições)
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica. _______________________________________ Princípio da Segurança Jurídica (Transcrições) Pet (MC) 2.900-RS* RELATOR: MIN. GILMAR MENDES DECISÃO: Cuida-se de ação cautelar com pedido de concessão de efeito suspensivo ao recurso extraordinário, interposto por Roberta de Leon Valiente, contra acórdão da 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que indeferiu a sua transferência de uma instituição de ensino superior federal para outra, pleiteada em razão da assunção de cargo, para o qual foi aprovada em concurso público. Preliminarmente, cabe anotar que, embora tenha sido apresentada, tão-somente, a petição de fls. 2-6, dou por sanada a deficiência de instrução dos autos, por já se encontrar nesta Corte o recurso extraordinário a que ela se refere. A requerente, por ter sido nomeada para trabalhar em Porto Alegre, em decorrência de sua aprovação no concurso público para o cargo de técnico operacional júnior na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, em 1999, mudou seu domicílio para Porto Alegre. Assim, pleiteou a transferência do curso de Direito da Universidade de Pelotas - UFPEL, onde se encontrava matriculada no 4º (quarto) semestre, para a Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS, com base no princípio constitucional estabelecido, principalmente, nos arts. 205 c.c. 206, I e IV, e 37 c.c. 5º, XXXIII. O pleito foi indeferido, administrativamente, ao entendimento de que não se tratava "de funcionária pública federal removida ex-officio, não se enquadrando, portanto, na Lei 9.536/97 para ingresso na UFRGS" (fls. 21). Daí ter impetrado mandado de segurança, acolhido em sentença datada de 21.12.2000, "(a) para reconhecer que a impetrante tem direito a transferir-se e a freqüentar o curso de direito na UFRGS, a partir deste semestre; (b) determinar à autoridade impetrada que imediatamente providencie a transferência da parte impetrante, permitindo que a mesma realize a matrícula, freqüente as atividades discentes e todas as demais decorrentes da sua condição de estudante, tudo nos termos da fundamentação" (fls. 64). O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ao julgar a apelação em mandado de segurança, reformou a sentença de 1º grau, forte no argumento de que a impetrante não provara a existência de vagas na universidade para a qual pretendia ingressar e, também, por considerar inaplicável a transferência compulsória, disciplinada pela Lei nº 9.536, de 1997, aos empregados de empresa pública que não gozam de "status" de funcionário ou servidor público federal. Ainda, nos termos do parágrafo único do artigo 1º da Lei nº 9.536, de 1997, assentou-se que a mudança de cidade para assunção de cargo em razão de concurso público não dá direito à transferência compulsória de matrícula (fls. 96). Contra essa decisão, houve a interposição de recurso extraordinário, com fundamento no art. 102, III, "a", da Constituição Federal, em que se alega a violação dos arts. 5º, XXXIII; 37; 205 e 206, I e IV, da Carta Magna. Conforme a narrativa da requerente, o inconformismo se deve ao desrespeito à norma geral estabelecida na Constituição de que "o ensino é público e obrigatório em todos os níveis e para todos os cidadãos". E que, "diante do fato concreto a mínima providência deveria ter sido a verificação sobre a existência ou não de vagas, o estudo minucioso das particularidades (motivos do requerimento) e somente após, expedida a decisão, sobre a possibilidade ou não da transferência". Alega, ainda, que o fato de a requerida impedir a continuidade de seus estudos em universidade pública e gratuita, "sem demonstrar impossibilidade por falta de vagas no semestre pretendido e sob alegação de que esta transferência não é obrigatória, segundo a Lei 9.536/97 e Instrução Normativa nº 001/2000, reprisa-se, é verdadeiro acinte aos princípios constitucionais norteadores da Administração Pública, especificamente: estudo público gratuito direito de todos e dever do Estado", causando prejuízos à sua profissionalização e realização pessoal. No âmbito da cautelar, a matéria evoca, inevitavelmente, o princípio da segurança jurídica. A propósito do direito comparado, vale a pena trazer à colação clássico estudo de Almiro do Couto e Silva sobre a aplicação do aludido: "É interessante seguir os passos dessa evolução. O ponto inicial da trajetória está na opinião amplamente divulgada na literatura jurídica de expressão alemã do início do século de que, embora inexistente, na órbita da Administração Pública, o principio da res judicata, a faculdade que tem o Poder Público de anular seus próprios atos tem limite não apenas nos direitos subjetivos regularmente gerados, mas também no interesse em proteger a boa fé e a confiança (Treue und Glauben)dos administrados. (...) Esclarece OTTO BACHOF que nenhum outro tema despertou maior interesse do que este, nos anos 50 na doutrina e na jurisprudência, para concluir que o princípio da possibilidade de anulamento foi substituído pelo da impossibilidade de anulamento, em homenagem à boa fé e à segurança jurídica. Informa ainda que a prevalência do princípio da legalidade sobre o da proteção da confiança só se dá quando a vantagem é obtida pelo destinatário por meios ilícitos por ele utilizados, com culpa sua, ou resulta de procedimento que gera sua responsabilidade. Nesses casos não se pode falar em proteção à confiança do favorecido. (Verfassungsrecht, Verwaltungsrecht, Verfahrensrecht in der Rechtssprechung des Bundesverwaltungsgerichts, Tübingen 1966, 3. Auflage, vol. I, p. 257 e segs.; vol. II, 1967, p. 339 e segs.). Embora do confronto entre os princípios da legalidade da Administração Pública e o da segurança jurídica resulte que, fora dos casos de dolo, culpa etc., o anulamento com eficácia ex tunc é sempre inaceitável e o com eficácia ex nunc é admitido quando predominante o interesse público no restabelecimento da ordem jurídica ferida, é absolutamente defeso o anulamento quando se trate de atos administrativos que concedam prestações em dinheiro, que se exauram de uma só vez ou que apresentem caráter duradouro, como os de índole social, subvenções, pensões ou proventos de aposentadoria." Depois de incursionar pelo direito alemão, refere-se o mestre gaúcho ao direito francês, rememorando o clássico "affaire Dame Cachet": "Bem mais simples apresenta-se a solução dos conflitos entre os princípios da legalidade da Administração Pública e o da segurança jurídica no Direito francês. Desde o famoso affaire Dame Cachet, de 1923, fixou o Conselho de Estado o entendimento, logo reafirmado pelos affaires Vallois e Gros de Beler, ambos também de 1923 e pelo affaire Dame Inglis, de 1935, de que, de uma parte, a revogação dos atos administrativos não cabia quando existissem direitos subjetivos deles provenientes e, de outra, de que os atos maculados de nulidade só poderiam ter seu anulamento decretado pela Administração Pública no prazo de dois meses, que era o mesmo prazo concedido aos particulares para postular, em recurso contencioso de anulação, a invalidade dos atos administrativos. HAURIOU, comentando essas decisões, as aplaude entusiasticamente, indagando: 'Mas será que o poder de desfazimento ou de anulação da Administração poderá exercer-se indefinidamente e em qualquer época? Será que jamais as situações criadas por decisões desse gênero não se tornarão estáveis? Quantos perigos para a segurança das relações sociais encerram essas possibilidades indefinidas de revogação e, de outra parte, que incoerência, numa construção jurídica que abre aos terceiros interessados, para os recursos contenciosos de anulação, um breve prazo de dois meses e que deixaria à Administração a possibilidade de decretar a anulação de ofício da mesma decisão, sem lhe impor nenhum prazo'. E conclui: 'Assim, todas as nulidades jurídicas das decisões administrativas se acharão rapidamente cobertas, seja com relação aos recursos contenciosos, seja com relação às anulações administrativas; uma atmosfera de estabilidade estender-se-á sobre as situações criadas administrativamente.' (La Jurisprudence Administrative de 1892 a 1929, Paris, 1929, vol. II, p. 105-106.)". Na mesma linha, observa Couto e Silva em relação ao direito brasileiro: "MIGUEL REALE é o único dos nossos autores que analisa com profundidade o tema, no seu mencionado 'Revogação e Anulamento do Ato Administrativo' em capítulo que tem por título 'Nulidade e Temporalidade'. Depois de salientar que 'o tempo transcorrido pode gerar situações de fato equiparáveis a situações jurídicas, não obstante a nulidade que originariamente as comprometia', diz ele que 'é mister distinguir duas hipóteses: (a) a de convalidação ou sanatória do ato nulo e anulável; (b) a perda pela Administração do benefício da declaração unilateral de nulidade (le bénéfice du préalable)'. (op. cit., p.82). (SILVA, Almiro do Couto e. Os princípios da legalidade da administração pública e da segurança jurídica no estado de direito contemporâneo. Revista da Procuradoria-Geral do Estado. Publicação do Instituto de Informática Jurídica do Estado do Rio Grande do Sul, V. 18, Nº 46, p. 11-29, 1988)." Considera-se, hodiernamente, que o tema tem, entre nós, assento constitucional (princípio do Estado de Direito) e está disciplinado, parcialmente, no plano federal, na Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999 (v.g. art. 2º). Em verdade, a segurança jurídica, como subprincípio do Estado de Direito, assume valor ímpar no sistema jurídico, cabendo-lhe papel diferenciado na realização da própria idéia de justiça material. Tendo em vista todas essas considerações e a peculiar situação jurídica da ora recorrente, prestes a concluir o curso de direito na UFRGS (conforme consta das razões recursais, em outubro de 2002, a requerente cursava o 8º semestre), defiro a tutela cautelar, ad referendum da 2ª Turma, para dar efeito suspensivo ao recurso extraordinário, até seu final julgamento nesta Corte. Oficie-se. Publique-se. Brasília, 8 de abril de 2003. Ministro GILMAR MENDES Relator * decisão pendente de publicação Assessora responsável pelo Informativo Maria Ângela Santa Cruz Oliveira informativo@stf.gov.br

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Informativo STF - 310 - Supremo Tribunal Federal

 

 

 

 

 

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