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sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Informativo STF 250 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF

Brasília, 12 a 16 de novembro de 2001- Nº250.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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ÍNDICE DE ASSUNTOS



Agravo: Cópia do Preparo do RE
Antecipação de Tutela: Requisito
Busca Pessoal: Ausência de Fundada Suspeita
Citação por Edital: Nulidade
Diferença de Vencimentos entre Magistrados
Dispensa de Testemunha e Inocorrência de Nulidade
Gratificação de Produtividade e Lei Local
Imunidade Tributária de Bem Locado
Independência das Instâncias Administrativa e Penal
Interceptação Telefônica e Incompetência do Juiz
Sociedade de Economia Mista e Tomada de Contas
Solicitação de Refúgio: Comprovação do Pedido
Prisão Ilegal e Prova Ilícita (Transcrições)
PLENÁRIO


Independência das Instâncias Administrativa e Penal

A rejeição de denúncia por insuficiência de provas não impede a responsabilização pelos mesmos fatos em instância administrativa, uma vez que as instâncias penal e administrativa são independentes. Com esse entendimento, o Tribunal indeferiu mandado de segurança impetrado por ex-prefeito, que teve rejeitada a denúncia contra ele apresentada por crime de peculato, mediante o qual se pretendia o arquivamento da tomada de contas especial do TCU sobre os mesmos fatos. Precedente citado: MS 21.708-DF (DJU de 18.5.2001).
MS 23.625-DF, rel. Min. Maurício Corrêa, 8.11.2001. (MS-23625)

Solicitação de Refúgio: Comprovação do Pedido

Para a aplicação do art. 34 da Lei 9.474/97, que determina a suspensão do processo de extradição pela superveniência da solicitação de refúgio do extraditando, faz-se necessária a devida comprovação do pedido de refúgio. Com esse entendimento, o Tribunal indeferiu habeas corpus impetrado contra ato do Min. Sydney Sanches, relator do pedido de extradição do paciente, que negara a suspensão do processo extradicional por ausência de prova de formulação do pedido de asilo político.
HC 81.176-AL, rel. Min. Nelson Jobim, 8.11.2001. (HC-81176)

Antecipação de Tutela: Requisito

O Tribunal manteve decisão do Min. Néri da Silveira, relator, que negara o pedido de antecipação de tutela em ação cível originária, ajuizada pelo Estado do Rio de Janeiro contra a União, consistente em ação de indenização em que se pretende o ressarcimento dos prejuízos tributários decorrentes da crise de energia elétrica e da instituição, pelo Governo Federal, do programa de racionamento (MP 2.152/2001), invocando-se, para tanto, a responsabilidade civil da União em razão de não ter adotado, oportunamente, as providências indispensáveis a não se verificar a atual crise (CF, art. 37, § 6º). O Tribunal entendeu inviável o pedido de antecipação de tutela - que tem por objeto determinar a redução mensal da parcela do refinanciamento da dívida do Estado do Rio de Janeiro com a União, previsto em contrato -, porquanto o mesmo não corresponde ao objeto da demanda pretendida, inexistindo a relação de pertinência entre a tutela definitiva (indenização) e a tutela antecipada (efeitos de ato jurídico perfeito), conforme determina o art. 273 do CPC ("O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, ...").
ACO (AgRg) 615-RJ, rel. Min. Néri da Silveira, 14.11.2001. (ACO-615)

Interceptação Telefônica e Incompetência do Juiz

A nulidade do processo criminal por incompetência do juízo processante não torna ilícitas as provas colhidas em interceptação telefônica que fora deferida por juiz que, à época da decisão, era competente. Com esse entendimento, o Tribunal, por maioria, indeferiu pedido de habeas corpus em que se pretendia ver reconhecida a ilicitude de informações colhidas em interceptações telefônicas, efetivadas mediante decisão de juiz federal que, depois, viria a se declarar incompetente. Considerou-se válidas as provas decorrentes da escuta telefônica uma vez que, ao tempo em que autorizada, o objeto do inquérito ainda compreendia crimes de interesse da União, não as invalidando a incompetência superveniente do juiz federal. Salientou-se não ser aplicável à espécie o precedente da Segunda Turma no RHC 80.197-GO (DJU de 29.9.2000), que considerara nulas as provas decorrentes de interceptação telefônica autorizada por juiz incompetente, uma vez que, naquele caso, a incompetência do juiz era anterior aos próprios fatos que foram objeto da apuração criminal. Vencido no ponto o Min. Marco Aurélio, que assentava a ilicitude da prova decorrente da escuta telefônica determinada pelo juízo federal, tido por incompetente. O Tribunal deferiu a ordem de habeas corpus apenas quanto à inépcia da denúncia na parte em que narrava os crimes de roubo e interceptação dolosa, estendendo-a aos demais réus.
HC 81.260-ES, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 14.11.2001. (HC-81260)
HC 81.261-ES, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 14.11.2001. (HC-81261)

Sociedade de Economia Mista e Tomada de Contas

Iniciado o julgamento de dois mandados de segurança em que se discute a aplicabilidade do instituto da tomada de contas especial ao Banco do Brasil S/A, sociedade de economia mista. Trata-se, na espécie, de julgamento conjunto de dois mandados de segurança impetrados pelo Banco do Brasil S/A contra atos do Tribunal de Contas da União - TCU (Decisões 854/97 e 664/98) que determinaram ao mesmo Banco que instaurasse, contra seus empregados, tomada de contas especial visando a apuração de fatos, identificação de responsáveis e quantificação de dano aos próprios cofres relativamente à assunção, por agência, de dívida pessoal de ex-gerente, e ao prejuízo causado em decorrência de operações realizadas no mercado de futuro de índices BOVESPA. Alega o impetrante a impossibilidade de ser aplicada a tomada de contas especial contra seus servidores por ser incompatível com o regime jurídico celetista ao qual estão submetidos, sustentando, ademais, que o prejuízo causado teria como vítima o acionista, sendo indireto o prejuízo ao erário. O Min. Carlos Velloso, relator, proferiu voto no sentido de indeferir a ordem sob o fundamento de que o inciso II do art. 71 da CF é expresso ao submeter à fiscalização do TCU as contas dos administradores e demais responsáveis por entidades da administração indireta ("Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: ... II - julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo poder público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público;"). Após os votos dos Ministros Ellen Gracie, Maurício Corrêa e Sydney Sanches, acompanhando o voto do Min. Carlos Velloso, relator, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Min. Ilmar Galvão.
MS 23.627-DF, rel. Min. Carlos Velloso, 14.11.2001. (MS-23627)
MS 23.875-DF, rel. Min. Carlos Velloso, 14.11.2001. (MS-23875)

PRIMEIRA TURMA


Agravo: Cópia do Preparo do RE

A Turma negou provimento a agravo regimental interposto contra decisão do Min. Ilmar Galvão, relator, que, dando provimento a agravo de instrumento, determinara o processamento de recurso extraordinário para melhor exame da matéria constitucional. Sustentava-se a inexistência, no traslado, de peça essencial ao conhecimento do mencionado agravo de instrumento, qual seja, a cópia da guia de recolhimento do preparo do recurso extraordinário. A Turma, considerando que a alegada peça essencial diz respeito ao exame do próprio recurso extraordinário, cuja verificação dos pressupostos de cabimento será feita em momento oportuno, entendeu pela incidência na espécie do disposto no art. 305 do RISTF uma vez que não caracterizada a hipótese de discussão de tempestividade do agravo, ou de defeito na sua formação (RISTF, art. 305: "Não caberá recurso da deliberação da Turma ou do Relator que remeter o processo ao julgamento do Plenário, ou que determinar, em agravo de instrumento, o processamento de recurso denegado ou procrastinado."). Precedente citado: AG (AgRg) 280.191-RJ (DJU de 26.10.2001).
AG (AgRg) 323.929-RS, rel. Min. Ilmar Galvão, 13.11.2001. (AG-323929)

Citação por Edital: Nulidade

A Turma deferiu habeas corpus para declarar nulo o processo instaurado contra policial militar pela prática de homicídio, a partir da denúncia, tendo em vista a nulidade da citação feita por edital. Na espécie, embora constasse nos autos o endereço correto do paciente, o primeiro mandado de citação fora dirigido a endereço antigo e o segundo, no endereço correto, fora entregue à sua mãe apesar de a mesma haver afirmado que a ausência do paciente seria momentânea - com base nisso e na informação da Justiça Militar de que o paciente seria foragido pela prática do crime de deserção, fora determinada a citação por edital. A Turma considerou, ainda, que, tendo o paciente nomeado advogado para defendê-lo durante o inquérito policial, o juiz não poderia nomear-lhe um defensor dativo, o que resultou em prejuízo para a sua defesa. Precedentes citados: HC 72.035-RJ (RTJ 156/182) e RHC 61.083-PB (RTJ 108/1047)
HC 81.151-DF, rel. Min. Ilmar Galvão, 13.11.2001. (HC-81151)

Busca Pessoal: Ausência de Fundada Suspeita

Por ausência de justa causa, a Turma deferiu habeas corpus para determinar o arquivamento do termo circunstanciado de ocorrência por meio do qual se autuara o paciente pela prática do crime de desobediência (CP, art. 330), em razão de o mesmo haver se recusado a ser revistado por policial militar quando chegava à sua casa. Considerou-se que a motivação policial para a revista - consistente no fato de o paciente trajar "blusão" passível de encobrir algum tipo de arma - não seria apta, por si só, a justificar a fundada suspeita de porte ilegal de arma, porquanto baseada em critérios subjetivos e discricionários (CPP, art. 244: "A busca pessoal independerá de mandado, no caso de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida...").
HC 81.305-GO, rel. Min. Ilmar Galvão, 13.11.2001. (HC-81305)

Imunidade Tributária de Bem Locado

Tendo em vista a orientação firmada pelo Plenário no julgamento do RE 237.718-SP (DJU de 6.9.2001) - no sentido de que a imunidade das entidades de assistência social prevista no art. 150, VI, c, da CF, abrange o IPTU incidente sobre imóvel alugado a terceiro, desde que a renda seja aplicada em suas finalidades essenciais - e considerando o entendimento de que a referida imunidade também alcança as instituições de educação nas mesmas circunstâncias, a Turma, por identidade de razão, manteve acórdão do Tribunal de Alçada do Estado de São Paulo que reconhecera o direito do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial - SENAC à imunidade relativa ao ITBI sobre imóvel adquirido para o fim de locação a terceiro.
RE 235.737-SP, rel. Min. Moreira Alves, 13.11.2001. (RE-235737)

SEGUNDA TURMA


Diferença de Vencimentos entre Magistrados

Considerando a auto-aplicabilidade do art. 93, V, da CF, na redação anterior à EC 19/98, ("os vencimentos dos magistrados serão fixados com diferença não superior a dez por cento de uma para outra das categorias da carreira, não podendo, a título nenhum, exceder os dos Ministros do Supremo Tribunal Federal"), a Turma manteve acórdão do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba que reconhecera o direito de juízes de primeiro grau ao reajuste de seus vencimentos a partir de fevereiro de 1993 - data em que houve aumento dos vencimentos dos desembargadores por uma lei complementar estadual sem a observância da diferença máxima de 10 % -, para que fosse observada a referida gradação prevista na norma constitucional. Em conseqüência, a Turma entendeu não recebida pela CF/88 a segunda parte do art. 63 da LOMAN - LC 35/79 (" ... os juízes vitalícios dos Estados têm os seus vencimentos fixados com diferença não excedente a vinte por cento de uma para outra entrância, atribuindo-se aos da entrância mais elevada não menos de dois terços dos vencimentos dos desembargadores."). Precedente citado: ADIn 764-PI (RTJ 153/756).
RE 272.219-PB, rel. Min. Maurício Corrêa, 13.11.2001. (RE-272219)

Dispensa de Testemunha e Inocorrência de Nulidade

A Turma indeferiu habeas corpus em que se pretendia a anulação de julgamento realizado pelo tribunal do júri em razão da ausência da oitiva de testemunhas consideradas essenciais pela defesa, que não teriam sido intimadas corretamente. Considerou-se o fato de que o defensor constituído, quando do julgamento, consentira expressamente com a dispensa das testemunhas faltantes, não tendo feito nenhum protesto quando da homologação da desistência da oitiva pelo juiz, assim como da suposta nulidade da intimação ocorrida antes do julgamento, não restando, ainda, demonstrado o prejuízo decorrente da alegada nulidade, já que as referidas testemunhas foram inquiridas em juízo, tendo sido suas declarações, constantes dos autos, levadas em consideração em plenário. Salientou-se, ademais, que, mesmo sendo desnecessária pela jurisprudência da Corte a consulta aos jurados, esses concordaram, aos menos tacitamente, com a dispensa da inquirição das testemunhas ao declararem estarem habilitados a julgar a causa.
HC 80.996-RJ, rel. Min. Celso de Mello, 13.11.2001. (HC-80996)

Gratificação de Produtividade e Lei Local

A Turma não conheceu de recurso extraordinário interposto pelo Estado do Maranhão contra acórdão do Tribunal de Justiça local que reconhecera a servidores estaduais aposentados como integrantes do Grupo de Tributação, Arrecadação e Fiscalização - TAF, o direito à percepção da gratificação de produtividade, criada pela Lei Delegada Estadual 145/84 e estendido aos inativos aposentados antes da sua instituição pela Lei Delegada Estadual 158/84. Considerou-se, na espécie, que a Corte estadual assentara sua decisão nas referidas leis locais, que dispunham expressamente a respeito da extensão do benefício aos aposentados anteriormente ao seu advento, incidindo o disposto no Verbete 280 da Súmula do STF ("Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário"), e a jurisprudência da Corte que afasta o cabimento de recurso extraordinário em hipótese de violação indireta ou reflexa à Constituição.
RE 116.370-MA, rel. Min. Néri da Silveira, 13.11.2001. (RE-116370)

Sessões

Ordinárias

Extraordinárias

Julgamentos

Pleno

14.11.2001

------

07

1a. Turma

13.11.2001

------

68

2a. Turma

13.11.2001

------

101



C L I P P I N G D O D J

16 de novembro de 2001

ADIn N. 1.540-MS
RELATOR: MIN. MAURÍCIO CORRÊA
EMENTA: MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PROMOÇÃO DE POLICIAL-MILITAR AO GRAU HIERÁRQUICO IMEDIATAMENTE SUPERIOR PELO MESMO ATO QUE O TRANSFERE PARA A RESERVA REMUNERADA: ART. 57, CAPUT E §§ 1º, 2º, 3º E 4º DA LEI COMPLEMENTAR Nº 53, DE 30.08.90, COM A REDAÇÃO DADA PELO ART. 1º, III, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 68, DE 08.07.93. PRELIMINAR DE CONHECIMENTO.
1. A regulamentação das promoções dos policiais-militares é tratada em leis que dispõem sobre normas gerais de organização das polícias-militares, as quais, por sua vez, estão sob reserva de lei federal (CF, art. 22, XXI).
O Estado-membro pode legislar sobre a matéria desde que de forma similar ao que dispuser a lei federal; no caso, esta proíbe a concessão do especial privilégio impugnado (art. 24 do Decreto-lei nº 667/69 e art. 62 do Estatuto dos Militares - Lei nº 6.880/80).
2. O impugnado art. 57 afronta diretamente à lei federal, e não à Constituição, e, em conseqüência, sendo o caso de ilegalidade, não pode ser objeto de ação direta de inconstitucionalidade.
3. Ação direta de inconstitucionalidade não conhecida, ficando prejudicado o pedido de medida cautelar.

ADIn N. 1.783-BA
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: Ministério Público dos Estados: Procurador-Geral de Justiça: nomeação a termo por dois anos (Constituição, art. 128, § 3º): é inconstitucional a previsão em lei estadual de que, vago o cargo de Procurador Geral no curso do biênio, o provimento se faça para completar o período interrompido e não para iniciar outro de dois anos: implicações da previsão de que a nomeação se faça sempre para o tempo certo de um biênio com a mecânica das garantias da independência do Chefe do Ministério Público: ação direta julgada procedente.
* noticiado no Informativo 245

HABEAS CORPUS N. 80.877-PA
RELATOR: MIN. MAURÍCIO CORRÊA
EMENTA: HABEAS-CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. TRÁFICO DE INFLUÊNCIA. CRIME FORMAL. LESÃO A INTERESSES DO ESTADO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.
1. O bem jurídico tutelado pelo artigo 332 do Código Penal é o prestígio da Administração Pública, sendo a Justiça Federal o juízo natural para o processamento e julgamento do feito.
2. Não procede a alegação de ausência de prejuízo para o Estado a justificar a incompetência da Justiça Federal, posto que o citado delito se consuma com a simples exigência da quantia pactuada em troca da influência a ser exercida.
Habeas-corpus indeferido.
* noticiado no Informativo 243

MS N. 22.864-DF - medida liminar
RELATOR: MIN. SYDNEY SANCHES
EMENTA: - DIREITO CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL.
REELEIÇÃO. PROPOSTA DE EMENDA CONSTITUCIONAL. PROCESSO LEGISLATIVO.
1. Mandado de Segurança impetrado por Senadores, para que seja impedida a votação, em 2° turno, no Senado Federal, de proposta de Emenda Constitucional n° 7, que "visa a introduzir na Carta Magna o instituto da reeleição para os cargos de Presidente da República, Governadores de Estado e Prefeitos Municipais".
2. Alegação de que a tramitação do Projeto estaria viciada, desde a votação, em 1° e 2° turnos, na Casa de Origem (Câmara dos Deputados - P.E.C. n° 1, de 1995), já que dois Deputados teriam admitido o recebimento de vantagens indevidas, em troca do voto favorável; e três outros teriam sido cooptados, pela mesma forma.
3. Invocação do direito ao "devido processo legiferante" e do princípio constitucional da moralidade.
4. Questão de Ordem: pedido de medida liminar submetido, pelo Relator, à consideração do Plenário: cabimento (artigos 21, III e IV, e 22, parágrafo único, letra "b", do RISTF.
5. Medida liminar indeferida pelo Plenário.
1. É facultado ao Relator, em qualquer processo de competência do Plenário, submeter, ao exame deste, questão de ordem, inclusive sobre concessão, ou não, de medida liminar, em Mandado de Segurança, quando, "em razão de relevância da questão jurídica, convier pronunciamento" do referido órgão (artigos 21, incisos III e IV, e 22, parágrafo único, "b", do RISTF).
2. Caracteriza-se tal relevância quando a decisão da Corte pode interferir na atuação de um dos Poderes da República, como ocorre durante a tramitação de Proposta de Emenda Constitucional, em uma das Casas do Congresso Nacional, hipótese "sub-judice".
3. Ausentes provas cabais, no sentido técnico, ou seja, obtidas em procedimento adequado e com observância do princípio do contraditório, não podem supri-las os indícios e circunstâncias, apontados na inicial, ao menos para evidenciar, "prima facie", o direito dos impetrantes, líquido e certo, à suspensão do processo legislativo em questão.
4. Questão de Ordem resolvida, com o indeferimento da medida liminar. Tudo por maioria de votos.
* noticiado no Informativo 74

ADIn (EDcl) N. 1.105-DF - questão de ordem
RELATOR: MIN. MAURÍCIO CORRÊA
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS PELA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. LEGITIMIDADE. QUESTÃO DE ORDEM. INTERVENÇÃO DE TERCEIROS, DE TERCEIRO PREJUDICADO E DE ASSISTENTE. INADMISSIBILIDADE. PRECEDENTES.
1. Ação direta de inconstitucionalidade. Intervenção de terceiros e assistência. Impossibilidade: Lei 9.868/99, artigo 7º, e RISTF, artigo 169, § 2º. Recurso interposto por terceiro prejudicado. Não-cabimento. Precedentes.
2. Embargos de declaração opostos pela Ordem dos Advogados do Brasil. Legitimidade. Questão de Ordem resolvida no sentido de que é incabível a interposição de qualquer espécie de recurso por quem, embora legitimado para a propositura da ação direta, nela não figure como requerente ou requerido.
Embargos de declaração não conhecidos.
* noticiado no Informativo 238

RE N. 212.198-RS
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
CONCURSO PÚBLICO - CAPACITAÇÃO MORAL - PROCESSO-CRIME - PRESCRIÇÃO. Uma vez declarada a prescrição da pretensão punitiva do Estado, descabe evocar a participação do candidato em crime, para se dizer da ausência da capacitação moral exigida relativamente a concurso público.
* noticiado no Informativo 237

RE N. 228.800-DF
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: Bens da União: (recursos minerais e potenciais hídricos de energia elétrica): participação dos entes federados no produto ou compensação financeira por sua exploração (CF, art. 20, e § 1º): natureza jurídica: constitucionalidade da legislação de regência (L. 7.990/89, arts. 1º e 6º e L. 8.001/90).
1. O tratar-se de prestação pecuniária compulsória instituída por lei não faz necessariamente um tributo da participação nos resultados ou da compensação financeira previstas no art. 20, § 1º, CF, que configuram receita patrimonial.
2. A obrigação instituída na L. 7.990/89, sob o título de "compensação financeira pela exploração de recursos minerais" (CFEM) não corresponde ao modelo constitucional respectivo, que não comportaria, como tal, a sua incidência sobre o faturamento da empresa; não obstante, é constitucional, por amoldar-se à alternativa de "participação no produto da exploração" dos aludidos recursos minerais, igualmente prevista no art. 20, § 1º, da Constituição.
* noticiado no Informativo 243

Acórdãos publicados: 190


T R A N S C R I Ç Õ E S

Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
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Prisão Ilegal e Prova Ilícita (Transcrições)


Prisão Ilegal e Prova Ilícita (Transcrições)

HC 80.949-RJ*

RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE

EMENTA: I. Habeas corpus: cabimento: prova ilícita.
1. Admissibilidade, em tese, do habeas corpus para impugnar a inserção de provas ilícitas em procedimento penal e postular o seu desentranhamento: sempre que, da imputação, possa advir condenação a pena privativa de liberdade: precedentes do Supremo Tribunal.
II. Provas ilícitas: sua inadmissibilidade no processo (CF, art. 5º, LVI): considerações gerais.
2. Da explícita proscrição da prova ilícita, sem distinções quanto ao crime objeto do processo (CF, art. 5º, LVI), resulta a prevalência da garantia nela estabelecida sobre o interesse na busca, a qualquer custo, da verdade real no processo: conseqüente impertinência de apelar-se ao princípio da proporcionalidade - à luz de teorias estrangeiras inadequadas à ordem constitucional brasileira - para sobrepor, à vedação constitucional da admissão da prova ilícita, considerações sobre a gravidade da infração penal objeto da investigação ou da imputação.
III. Gravação clandestina de "conversa informal" do indiciado com policiais.
3. Ilicitude decorrente - quando não da evidência de estar o suspeito, na ocasião, ilegalmente preso ou da falta de prova idônea do seu assentimento à gravação ambiental - de constituir, dita "conversa informal", modalidade de "interrogatório" sub-reptício, o qual - além de realizar-se sem as formalidades legais do interrogatório no inquérito policial (C.Pr.Pen., art. 6º, V) -, se faz sem que o indiciado seja advertido do seu direito ao silêncio.
4. O privilégio contra a auto-incriminação - nemo tenetur se detegere -, erigido em garantia fundamental pela Constituição - além da inconstitucionalidade superveniente da parte final do art. 186 C.Pr.Pen. - importou compelir o inquiridor, na polícia ou em juízo, ao dever de advertir o interrogado do seu direito ao silêncio: a falta da advertência - e da sua documentação formal - faz ilícita a prova que, contra si mesmo, forneça o indiciado ou acusado no interrogatório formal e, com mais razão, em "conversa informal" gravada, clandestinamente ou não.
IV. Escuta gravada da comunicação telefônica com terceiro, que conteria evidência de quadrilha que integrariam: ilicitude, nas circunstâncias, com relação a ambos os interlocutores.
5. A hipótese não configura a gravação da conversa telefônica própria por um dos interlocutores - cujo uso como prova o STF, em dadas circunstâncias, tem julgado lícito - mas, sim, escuta e gravação por terceiro de comunicação telefônica alheia, ainda que com a ciência ou mesmo a cooperação de um dos interlocutores: essa última, dada a intervenção de terceiro, se compreende no âmbito da garantia constitucional do sigilo das comunicações telefônicas e o seu registro só se admitirá como prova, se realizada mediante prévia e regular autorização judicial.
6. A prova obtida mediante a escuta gravada por terceiro de conversa telefônica alheia é patentemente ilícita em relação ao interlocutor insciente da intromissão indevida, não importando o conteúdo do diálogo assim captado.
7. A ilicitude da escuta e gravação não autorizadas de conversa alheia não aproveita, em princípio, ao interlocutor que, ciente, haja aquiescido na operação; aproveita-lhe, no entanto, se, ilegalmente preso na ocasião, o seu aparente assentimento na empreitada policial, ainda que existente, não seria válido.
8. A extensão ao interlocutor ciente da exclusão processual do registro da escuta telefônica clandestina - ainda quando livre o seu assentimento nela - em princípio, parece inevitável, se a participação de ambos os interlocutores no fato probando for incindível ou mesmo necessária à composição do tipo criminal cogitado, qual, na espécie, o de quadrilha.
V. Prova ilícita e contaminação de provas derivadas (fruits of the poisonous tree).
9. A imprecisão do pedido genérico de exclusão de provas derivadas daquelas cuja ilicitude se declara e o estágio do procedimento (ainda em curso o inquérito policial) levam, no ponto, ao indeferimento do pedido.

Voto: I - Preliminarmente, tenho o habeas corpus, como admissível, em tese, para impugnar a inserção da prova ilícita em procedimento penal e postular o seu desentranhamento.
2. Decidiu-o esta Turma, não faz muito, para ordenar - afastando preliminar acolhida no Tribunal a quo - o conhecimento de impetração dirigida contra decreto judicial de quebra de sigilo bancário de indiciado, que se tachava de ilegal - cf. HC 79191, 1ª T, 04.05.99, Pertence, RTJ 171/258:
[...]
3. Na fundamentação do acórdão - depois de recordar precedentes do Tribunal na demarcação, nem sempre fácil dos âmbitos do habeas corpus e do mandado de segurança - diferenciei o caso daquele do qual, por votação majoritária, não conhecera o Plenário, porque impetrado contra requisição por CPI de registros telefônicos (HC 75232, 07.05.97, red. ac. Maurício, Inf. STF 70):
[...]
4. Posteriormente, o Plenário não teve dúvidas em conhecer de habeas corpus contra despacho do relator de processo penal originário de competência do Tribunal, que decretara a quebra do sigilo bancário do denunciado (HC 80100, Pl, Gallotti, 24.05.00, DJ 08.09.00).
5. Ora, se cabe o habeas corpus para impedir por ilicitude a realização da prova ordenada, no curso do processo como no do inquérito, dispenso-me da demonstração de sua admissibilidade - quiçá com maior razão - para questionar a licitude da prova já realizada e pleitear o seu desentranhamento.
6. Recentemente, aliás, a Turma - malgrado não me acompanhasse o voto que trancava o processo por inextrincavelmente baseada a denúncia em provas oriundas de busca e apreensão ilegal - concedeu parcialmente a ordem para determinar fossem elas retiradas dos autos do processo (HC 80420, 1ª T, 28.06.01, Ellen Gracie, Inf. STF 234).
7. Recorda, aliás, Magalhães Gomes Fº, que a solução tem expressa previsão legal no art. 375 C. Pr. Pen. Militar, que - depois de prescrever a inadmissibilidade em juízo da "correspondência particular, interceptada ou obtida por meios criminosos" - ordena seja ela "desentranhada dos autos, se tiver sido junta": é dispositivo que se pode estender por analogia a todo e qualquer registro documental de prova ilícita.
8. Conheço do habeas corpus .
II
9. Não ameaçarei a Turma com considerações acadêmicas, malgrado a temática do caso pudesse provocá-las, para quem, como eu, a ela atribui excepcional relevância na efetivação de valores constitucionais eminentes do Estado de Direito Democrático.
10. Ninguém aqui desconhece a disceptação, ainda insepulta, entre as duas posturas básicas acerca da admissibilidade no processo das provas ilícitas - como tais consideradas as que obtidas com violação de direitos fundamentais.
11. A primeira - por séculos predominante - fiel à velha máxima male captum bene retentum: ao juiz só caberia decidir da existência, ou não, do crime e não, de como lhe chegaram - lícita ou ilicitamente - as provas do fato.
12. Se ilicitamente obtidas, que se aplicassem ao responsável pela ilicitude as sanções civis, administrativas ou penais cabíveis.
13. De outro lado, os que - desde as decisões pioneiras da Suprema Corte dos Estados Unidos - partem da unidade da ordem jurídica e da necessidade de impor contenção eficaz à tentação da violência de todos os organismos policiais e negam se possam admitir no processo provas obtidas por meios tão ou mais criminosos que os delitos a reprimir.
14. Pelos últimos, valha por todos a lição, na doutrina alemã, de Amelung - colacionada por Costa Andrade- segundo a qual "o Estado cairá em contradição normativa e comprometerá a legitimação da própria pena, se, para impor o direito, tiver de recorrer, ele próprio, ao ilícito criminal. Pois, argumenta, 'o fim da pena é a confirmação das normas do mínimo ético, cristalizado nas leis penais. Esta demonstração será frustrada se o próprio estado violar o mínimo ético para lograr a aplicação de uma pena. Desse modo, ele mostra que pode valer a pena violar qualquer norma fundamental cuja vigência o direito penal se propõe precisamente assegurar".
15. Testemunham os doutores a prevalência hodierna da tese da proscrição da admissibilidade processual da prova ilícita.
16. Mas a questão, sobretudo nos casos limites, ainda provoca resistências compreensíveis.
17. E delas advém - quando não a recusa frontal do princípio de exclusão da prova ilícita - o apelo, sempre que se cuide da apuração de crimes graves, à necessidade de temperar a sua aplicação, em cada caso, à luz do princípio da proporcionalidade.
18. Apelo esse freqüentemente enriquecido com a invocação de parte significativa da doutrina e da jurisprudência alemãs, minudentemente resenhadas por Costa Andrade.
19. Na questão, entretanto - como em tantas outras - a recepção desavisada de teorias jurídicas estrangeiras é extremamente perigosa, pela diversidade dos dados dogmáticos de que partem, em relação ao nosso ordenamento.
20. Basta notar que, na Alemanha, a solução do problema da admissibilidade, ou não, da prova ilícita no processo não arranca de norma constitucional específica mas, ao contrário, busca fundamento em princípios extremamente fluídos da Lei Fundamental, a exemplo daquele da dignidade da pessoa humana.
21. Na ordem constitucional brasileira, ao contrário - inspirada no ponto pelo art. 32, 6, da Constituição portuguesa -, a opção pelo repúdio à prova ilícita é inequívoca:
"Art. 5º (...)
LVI. São inadmissíveis no processo as provas obtidas por meios ilícitos."
22. Guarda da Constituição - e não dos presídios - é dessa opção clara, inequívoca, eloqüente, da Constituição - da fidelidade à qual advém a nossa própria legitimidade - é que há de partir o Supremo Tribunal Federal.
23. Ora, até onde vá a definição constitucional da supremacia dos direitos fundamentais, violados pela obtenção da prova ilícita, sobre o interesse da busca da verdade real no processo, não há que apelar para o princípio da proporcionalidade, que, ao contrário, pressupõe a necessidade da ponderação de garantias constitucionais em aparente conflito, precisamente quando, entre elas, a Constituição não haja feito um juízo explícito de prevalência.
24. Esse o quadro constitucional, não tem mais lugar a nostalgia, embora inconsciente, do dogma vetusto das inquisições medievais, para as quais "in atrocissimus leviores conjecturae sufficiunt et licent judiciura transgredi".
25. Certo, a Constituição reservou a determinados crimes particular severidade repressiva (art. 5º, XLII, XLIII e XLIV).
26. Mas, como observa Magalhães Gomes Filho, por sua natureza, as restrições que estabelecem são taxativas: delas, não se podem inferir, portanto, exceções a garantia constitucional - qual, a da vedação da prova ilícita -, estabelecida sem limitações em função da gravidade do crime investigado.
27. De resto, graduar a vedação da admissibilidade e valoração da prova ilícita, segundo a gravidade da imputação, constituiria instituir a sistemática violação de outra garantia constitucional - a presunção de inocência - em relação a quantos fossem acusados ou meramente suspeitos da prática de determinados crimes.
28. Abstraio-me, por conseguinte, no caso, de qualquer consideração da extrema gravidade dos delitos, da participação nos quais é suspeito o paciente, pois delas não pode resultar emprestar-se menor peso à vedação constitucional da prova ilícita.
29. Não obstante haver tido por necessária a explicitação dessas premissas do meu voto, espero que o caso não nos obrigue a repisar polêmicas ainda vivas em torno da delimitação de zonas cinzentas na temática da inadmissibilidade no processo da prova ilícita (cujo exemplo mais patente gira em torno da contaminação das que dela sejam derivadas: depois da acidentada decisão do HC 69912 (DJ 26.11.93), a tese dos "fruits of the poisonous tree", acolhida por 5 votos contra 4 no HC 73351, Pl, 10.05.96, Galvão, (RTJ 168/543) foi afinal afirmada pela maioria absoluta mínima do STF, no HC 72588, 12.06.96, Corrêa (DJ 04.08.00); mas não desconheço as oscilações ulteriores na aplicação da tese por ambas as Turmas.
30. O caso, a meu ver, não reclama o mergulho em águas tão revoltas.
III
31. Começo a análise do pedido pela transcrição do que a autoridade policial denomina de "conversa informal na sede desta DRE, gravada em fita K7", na qual o paciente teria revelado o modus operandi da quadrilha da qual faria parte e revelado os seus projetos imediatos.
32. Pareceu aos julgados das instâncias precedentes - incluído o acórdão do STJ - que, para desmentir o consentimento do paciente na gravação, seria necessário um exame de provas, que o habeas corpus não comporta.
33. Assim não me parece.
34. Há evidências documentais de que a autorização do paciente não existiu, ou, se existiu, não tem valia.
35. Primeiro, é a autoridade policial mesma - na representação ao Juiz pela prisão temporária dos suspeitos - que confessa estar o paciente preso, sem flagrante nem ordem judicial, quando da conversa gravada - f. 84:
"...segundo Ana Cristina, ela teria um encontro hoje, às 14:00 horas, na estação de Copacabana do metrô.
Assim sendo, policiais desta unidade rumaram para aquela unidade logrando êxito em deter "Chico", conduzindo-o a esta Delegacia".
36. Já decidiu esta Turma que confissão sob prisão ilegal é prova ilícita e inválida a condenação nela fundada (HC 70277, 1ª T, 14.12.93, Pertence, RTJ 154/58; Lex 187/295).
37. A fortiori, a confissão que se colha em "conversa informal" do ilegalmente detido com policiais, sem forma nem figura de interrogatório.
38. Há mais, porém. A afirmação do assentimento do paciente à gravação - que surge apenas no processo de habeas corpus -, é previamente desmentida pelo relatório do Detetive interlocutor da "conversa informal", que o Delegado encaminhara ao Juiz, quando requereu a prisão temporariamente.
39. Leio - f. 87:
"que, em conversa informal, confidenciou-nos (...). Tais esclarecimentos constam de fita gravada nesta sede, haja vista que o mesmo se nega a prestar tais esclarecimentos oficialmente."
40. Depois disso - como está no acórdão do STF - emprestar "fé pública" às informações da autoridade policial, quando já requerido o habeas corpus, com todas as vênias, é abrir o flanco para o mais escancarado desrespeito à Justiça...
41. Não tenho dúvidas em considerar inequivocamente provadas tais circunstâncias de fato, assim, susceptíveis de embasar o juízo do habeas corpus.
42. Entretanto, é possível prescindir de tais fatos evidentes sem prejudicar a declaração da ilicitude da prova resultante dessa gravação de "conversa informal", na Delegacia, entre indiciado e agentes policiais.
43. Regulando o inquérito, dispõe o C. Pr. Pen. que, entre outras diligências de investigação, deve a autoridade que o dirija "ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do Título VII deste Livro" - é dizer, das regras que disciplinam o interrogatório do acusado pelo Juiz (arts. 185 ss) - "devendo o respectivo termo ser assinado por 2 (duas) testemunhas que lhe tenham ouvido a leitura".
44. São requisitos do interrogatório policial, da ausência dos quais pode decorrer a nulidade do ato e a conseqüente desconsideração dos elementos informativos nele colhidos, se invocados pela acusação: é o que Ada Grinover - na senda de Nuvolone - chama "prova ilegítima" - a tomada com inobservância de imperativos ou vedações processuais, para distingui-la da prova ilícita.
45. O interrogatório é a única forma legal de tomada, no inquérito policial, de declarações do indiciado: nele, não há espaço para acolher como declarações do indiciado - e menos ainda para validar eventual confissão nelas contida -, o registro, gravado ou não, de "conversa informal" dele com policiais.
46. A Constituição, no entanto, aditou outra exigência essencial à valoração no processo de declarações do indiciado ou do réu, ao erigir, como garantia fundamental do acusado:
"Art. 5º (...)
LXIII. o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado..."
47. Elevando aí o nemo tenetur se detegere à alçada de garantia fundamental - além da inconstitucionalidade superveniente, consensualmente admitida, da parte final do art. 186 C.Pr.Pen-, a Constituição - na linha da construção da jurisprudência americana, a partir dos famosos casos Escobedo vs Illinois (378 U.S. 478 (1964) e Miranda vs Arizona (384 U.S. 436 (1969) -, impõe ao inquiridor, na polícia ou em juízo, o dever de advertência ao interrogado de seu privilégio contra a auto-incriminação.
48. A falta da advertência - e, como é óbvio, da sua documentação formal - faz ilícita a prova que, contra si mesmo, forneça o acusado, ainda quando observadas as formalidades procedimentais do interrogatório.
49. Acentuou, por isso, Ada Grinover que "o interrogatório sub-receptício do indiciado ou acusado, clandestinamente gravado, constitui inequivocamente prova ilicitamente obtida, não só em face dos princípios gerais (...), mais ainda por contrariar frontalmente as regras de advertência quanto ao direito ao silêncio ..."
50. Mas a clandestinidade da gravação a que alude a mestra insigne no contexto de trabalho dedicado às gravações clandestinas - se a torna indiscutível - e a tenho como presente no caso - não é essencial à ilicitude da prova advinda do "interrogatório sub-reptício": à luz da garantia do art. 5º, LXIII, basta, à caracterização da ilicitude da prova, a manifesta ausência da advertência do direito a ficar calado, que a Constituição ordena.
51. Certo, a Turma já se ocupou da alegação de ilicitude da gravação ambiental de conversação entre indiciados e policiais e denegou, em 03.11.92, o HC 69.818, de que fui relator: cuidava-se, porém, de impetração em favor de co-réu delatado pelos participantes da conversa gravada. Donde, a ementa - RTJ 148/213:
[...]
52. É, com efeito, da teoria dos privilégios, conforme a construção dos tribunais norte-americanos - entre os quais se situa o "privilege against self-incrimination" da V Emenda - que só o titular o possa invocar e não, terceiros.
53. No caso, ao contrário, a gravação documenta confissões incriminatórias do próprio interlocutor.
54. De deferir, pois o desentranhamento do K-7 que contém a gravação da dita "Conversa informal", assim como a parte do laudo pericial que registra a sua transcrição.
IV
55. O mesmo laudo pericial inclui a transcrição de outro diálogo: o que se teria travado, por telefone, entre o paciente e o indigitado chefe da quadrilha investigada.
56. Das circunstâncias desse telefonema já se deu conta pormenorizada no relatório: no mesmo dia da sua detenção e condução à Delegacia e da "conversa informal" lá entabulada, o paciente - que, durante ela se teria disposto a isso - foi levado a um telefone público, do qual ligou para o seu suspeitado comparsa, no estrangeiro, e com ele teria mantido diálogo sobre negócios criminosos, o qual foi gravado pelos policiais que o acompanhavam.
57. Da participação ativa do paciente no fato, pretendeu o acórdão do STJ, ora questionado, configurasse o episódio a gravação de conversa telefônica por um dos interlocutores, que, afirma, a jurisprudência daquele Tribunal considera "lícita como prova no processo penal".
58. No Supremo Tribunal, não tem voga a afirmação apodítica dessa licitude, (à qual é certo, em termos, já me filiei): a hipótese de gravação de comunicação telefônica própria, sem ciência do interlocutor, tem sido aqui examinada caso a caso, e ora reputada prova ilícita, por violação da privacidade (assim, v.g., no Caso Collor, Apn 307, Galvão, RTJ 162/3, (ementa, 1.1) e p. 33ss), ora, considerada lícita, se utilizada na defesa de direito do autor ou partícipe da gravação, em especial, se vítima ou destinatária de proposta criminosa do outro (v.g., HC 74.678, 1ª T, Moreira, 10.06.97, e EDHC 74.678, 1ª T, Moreira, 02.09.97, Inf. STF 75; RE 212.081, 1ª T., Gallotti, 5.12.97, DJ 27.03.98; HC 74.356, 1ª T, Gallotti, 10.12.96, RTJ 165/934; HC 69.204, 2ª T, Velloso, 26.05.92, RTJ 144/213 e HC 75.338, Pl, Jobim, 11.03.98, RTJ 167/206).
59. A referência a tais precedentes, no entanto, tem sabor de mera informação, pois sem pertinência à espécie.
60. É impossível, data venia, a identificação, para fins de tratamento jurídico, entre a gravação de conversa própria, de um lado, e a escuta e gravação por terceiro de comunicação telefônica alheia, ainda quando a possibilite ou nela consinta um dos sujeitos do diálogo.
61. A distinção - assente na doutrina - é irrecusável.
62. No juízo sobre a licitude da primeira - a gravação de conversa própria - simplesmente não se põe a questão da incidência da garantia do sigilo da comunicação telefônica (CF, art. 5º, XII), que reclama ciência do seu conteúdo por terceiro.
63. Por isso, sói afirmar-se - em si mesma, tão lícita quanto o arquivamento de uma carta missiva - é a divulgação por um dos interlocutores da conversa mantida com alguém que pode pôr em cheque direitos fundamentais do outro, de modo especial, os atinentes à honra, à privacidade ou à intimidade (CF, art. 5º, X).
64. De todo diverso é o regime constitucional da captação e eventual gravação por terceiro - simultaneamente ao seu desenrolar - da conversa telefônica alheia, ainda que ciente ou até cooperador um dos participantes dela.
65. Aqui, rege a situação a garantia constitucional do sigilo das comunicações telefônicas.
66. Com efeito, é consensual entre os doutores - salvo, entre nós, a respeitável, mas solitária posição de Greco Filho - que - embora tecnicamente dela se possa diferenciar - a escuta por terceiro se compreende, para fins de direito, no âmbito do conceito de interceptação telefônica e, como tal, o seu registro só se admitirá como prova se, para realização dela, houve prévia autorização judicial, conforme a lei que hoje a disciplina (L. 9.296/96).
67. "A partir del concepto general" elucida Raúl Cervini)- "debe subrayarse que la comunicación constitucionalmente relevante es antes que nada um proceso (...), que queda protegido por el ordenamiento jurídico frente a cualquier interceptación, suponga ésta mera retención o suspensión del curso de la comunicación o, en otro caso, incluso el conocimiento por tercero de su contenudo."
68. Eloqüente a lição de Ada Grinover, que, a respeito do art. 1º da L. 9.296/96, acentua, para demarcar a "interceptação de comunicações telefônicas de qualquer natureza", objeto da lei, que "somente a 'terzietà', referida pela doutrina italiana, é capaz de caracterizar a interceptação".
69. E - depois de recordar, para mostrar a adequação do critério da "terceiridade" - à lei brasileira, o art. 151, § 1º, II e III, C.Pen, que, na tipificação das violações de comunicações ali incriminadas, alude à "conversação telefônica entre outras pessoas" -, conclui ser "irrelevante indagar a respeito da existência do conhecimento e consentimento de um dos interlocutores."
70. "É possível" - explica - "que nenhum deles esteja a par da operação técnica, ou que consinta com ela", mas, malgrado a diferença conceitual acentuada pela doutrina entre "interceptação", no primeiro caso, e "escuta telefônica", no outro, "em ambos os casos a 'terzietà' está presente, e tratar-se-á de interceptação, subsumível à lei", diferentemente, acentua, da "gravação de conversa telefônica própria".
71. Se, assim, é a captação por terceiro - intervindo no processo do telefonema em curso -, conteúdo da comunicação que distingue a interceptação vedada, não há porque excluir da proteção constitucional a escuta, apenas porque um dos sujeitos da conversação esteja ciente da sua captação por outrem e, eventualmente, de sua gravação.
72. É patente - para o interlocutor insciente da intromissão de terceiro na recepção da mensagem que pretende dirigida apenas ao interlocutor de seu telefonema -, a afronta à garantia constitucional do sigilo de sua comunicação telefônica.
73. E aí não importa indagar do conteúdo captado por terceiro da mensagem telefônica da parte insciente da escuta, equiparada a essa à interceptação.
74. "Por el contrario" - nota Cervini, em passagem extremamente significativa - "el secreto de las comunicaciones aparece em las Constituciones modernas - e incluso se infiere en la de Brasil - com uma construción rigurosamente formal. No se dispensa el secreto en virtude del conteudo de la comunicación, ni tiene nada que ver su protección con el hecho - a estos efectos juridicamente indiferente - de que lo comunicado se inscriba o no en el ámbito de la privacidad. Para la Carta Fundamental, toda comunicación es secreta, como expresión transcendente de la libertad, aunque sólo algunas de ellas pueden catalogarse de privadas".
75. Cita, a respeito, o mestre uruguaio, preciosa sentença do Tribunal Constitucional da Espanha, na qual se notou que, só desvinculando o direito ao sigilo das comunicações da questão substantiva do conteúdo da comunicação, "é que se pode evitar cair na inaceitável aleatoriedade em seu reconhecimento, que resultaria da confusão entre esse direito e o que protege a intimidade das pessoas".
76. De certo, é de replicar-se que essas considerações são impertinentes a este habeas corpus, onde quem impugna a licitude da prova resultante da gravação do telefonema não é o receptário da ligação, insciente da trama, mas o paciente, que nela teve participação ativa e, portanto, nela teria aquiescido.
77. Em princípio, correta a objeção, que tem por si a observação, sempre lúcida, de Luiz Flávio Gomes.
78. Na espécie, contudo, é preciso ter em conta a medida em que caiba dar relevo à participação do paciente no evento.
79. De logo, reafirmo a convicção de que, no dia do telefonema, o paciente estava ilegalmente preso: reporto-me ao que demonstrado no capítulo anterior deste voto, com referência à "conversa informal", que precedeu e no curso da qual se teria comprometido ele ao telefonema para o comparsa delatado.
80. Para mim, é quanto basta para duvidar da existência e, de qualquer modo, negar validade jurídica ao seu aparente assentimento na empreitada de captação das mensagens do seu suspeitado comparsa e chefe na organização criminosa.
81. De outra banda - sendo inequívoca a ilicitude do registro da conversa, em relação ao co-indiciado alcançado no exterior - e insciente de cuidar-se de uma manobra policial - resta indagar até que ponto o mesmo elemento de informação seria lícito como prova contra quem, como o paciente, dela tivesse participado.
82. Ao meu ver, há que distinguir duas situações diversas.
83. A primeira é aquela em que os fatos revelados no diálogo captado pelo terceiro incrimina apenas um dos dois interlocutores, seja ele o ciente ou o insciente da escuta ou, comprometendo a ambos, diz respeito a condutas independentes de cada um deles.
84. Então, a ilicitude da prova se restringe àquele dos partícipes do diálogo cujo direito ao sigilo da comunicação foi quebrado com a escuta.
85. Aí, sim, tem plena aplicação a observação de Luiz Flávio Gomes, de que na interceptação em sentido estrito - aquela que se "concretiza sem que nenhum dos comunicadores tenha conhecimento da captação por terceiro - a ofensa do direito ao sigilo alcança os dois, ao passo que, na escuta telefônica, um dos comunicadores sabe da captação e aí, conclui, a ofensa acontece apenas contra o outro.
86. Pode acontecer, porém - é a segunda situação a que me referi - que, no fato ou fatos cuja prova se obtenha mediante a escuta, a participação de ambos os sujeitos da comunicação seja incindível ou mesmo necessária à composição do tipo criminal probando.
87. Pense-se no adultério, para a prova do qual o amante se disponha a colaborar com o marido, mediante telefonema, gravado por esse, à mulher, que nele confesse a relação adúltera.
88. O mesmo sucede, no caso, com a quadrilha - objeto principal do inquérito a que respondem o paciente e o seu interlocutor no telefonema internacional gravado: estou em que, esse o quadro, a incindibilidade das participações individuais no fato único implica a incindibilidade da ilicitude da prova, ainda quando se pudesse reputar livre a cooperação do paciente na escuta do seu próprio telefonema para o comparsa.
89. A mim, contudo, vale repisar, basta-me estar o paciente ilegalmente preso, na ocasião, para subtrair qualquer efeito à sua participação na escuta telefônica não autorizada e, conseqüentemente, para estender-lhe a ilicitude da prova, que, portanto também deve ser excluída dos autos.
V
90. Da ilicitude das gravações e transcrições decorre imediatamente - e não por contaminação - a do relatório escrito de um (f. 86-88) e as declarações reduzidas a termo de outro dos policiais que participaram tanto da "conversa informal", quanto da escuta telefônica e que se referem ao conteúdo de ambas as operações ilegais.
91. Há, por fim, um pedido genérico de que se declarem imprestáveis todas as peças decorrentes das gravações ilícitas e das informações nelas colhidas.
92. Nesse ponto, a impetração é inatendível, seja pela imprecisão do seu objeto, seja pelo estágio de procedimento, ainda em curso o inquérito policial.
93. Só a partir de eventual denúncia ou sentença condenatória e do aproveitamento relevante numa ou noutra de elementos derivados das provas ilícitas é que poderá reacender-se oportunamente a questão dos fruits of the poisonous tree
VI
94. De tudo, Sr. Presidente, - com escusas compungidas pela extensão do voto - defiro parcialmente o habeas corpus para declarar a ilicitude e determinar o desentranhamento dos autos do inquérito das duas fitas K-7 e do laudo pericial de 04.04.99, que as transcreve; da informação do Detetive Franklin Miranda Monteiro ao Delegado titular da Delegacia de Repressão a Entorpecentes, datada de 25.02.99, e do termo de declarações do Detetive Paulo Roberto Rodrigues, de 04.03.99: é o meu voto.

*acórdão pendente de publicação

 
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Informativo STF - 250 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

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