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sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Informativo STF 316 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF


Brasília, 11 a 15 de agosto de 2003- Nº 316.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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ÍNDICE DE ASSUNTOS



Ação Rescisória e Suspensão de Execução
ADI e Direito de Greve
Alteração Constitucional: Não-Prejudicialidade
Contribuição Previdenciária do Estado do RS
Criação de Unidades de Conservação e Consulta Pública
Eleição Majoritária e Critério de Apuração de Votos
Gratificação de Incentivo e Extensão a Inativos
HC e Princípio do Juiz Natural
Imunidade Parlamentar Material
RE e Efeito Suspensivo
Recurso Administrativo e Efeito Suspensivo
Reforma Agrária e Notificação Prévia
Sindicato e Legitimidade Ativa
RE pela alínea a (Transcrições)
PLENÁRIO


Eleição Majoritária e Critério de Apuração de Votos

O Tribunal negou provimento a recurso ordinário em mandado de segurança interposto por candidato classificado em segundo lugar no primeiro turno das eleições para o cargo de governador do Estado do Maranhão, em que se pretendia a reforma de acórdão do TSE, que negara o pedido de realização de segundo turno. Tratava-se, na espécie, de decisão que, com base no § 3º do art. 175 do Código Eleitoral, declarara a nulidade dos votos recebidos por outro candidato, tido por inelegível anteriormente à data do pleito, o que implicou a vitória do primeiro colocado, por passar a contar com mais da metade dos votos válidos. O Tribunal, ressaltando que a decisão que decretara a inelegibilidade - cuja eficácia é imediata e implica a nulidade dos votos recebidos - fora proferida antes da data da eleição, afastou a tese sustentada pelo recorrente no sentido da aplicação analógica do § 4º do art. 175 à espécie, já que tal dispositivo somente é cabível na hipótese de eleições proporcionais (Código Eleitoral, art. 175: "Serão nulas as cédulas: ... § 3º Serão nulos, para todos os efeitos, os votos dados a candidatos inelegíveis ou não registrados. § 4º O disposto no parágrafo anterior não se aplica quando a decisão de inelegibilidade ou de cancelamento de registro for proferida após a realização da eleição a que concorreu o candidato alcançado pela sentença, caso em que os votos serão contados para o partido pelo qual tiver sido feito o seu registro.").
RMS 24.485-MA, rel. Min. Carlos Velloso, 7.8.2003. (RMS-24485)

ADI e Direito de Greve

Iniciado o julgamento de mérito de ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da República contra o Decreto 3.341/90, do Estado de Goiás, que prevê as medidas a serem adotadas nos casos de paralisação coletiva da atividade fiscal, estabelecendo o recrutamento de servidores, em qualquer dos campos da Administração Pública do Estado, necessários à retomada do processo de arrecadação e, ainda, o desconto nos vencimentos dos participantes das greves, dos dias correspondentes à paralisação. O Tribunal, preliminarmente, afastou a prejudicialidade da ação em face da nova redação dada ao inciso VII do art. 37 pela EC 19/98, uma vez que não houve modificação substancial em tal dispositivo que, na redação original, exigia lei complementar para a regulamentação do direito de greve dos servidores públicos. Após, o Min. Maurício Corrêa, relator, afastando a alegada ofensa aos artigos 9º, § 1º, 37, VII e 22 da CF/88, proferiu voto no sentido de julgar improcedente o pedido formulado, por entender que o Decreto impugnado não regulamentou o direito de greve dos servidores do fisco estadual, mas apenas disciplinou as conseqüências administrativas do ato paredista até a edição da lei específica exigida pela CF, nem usurpou a competência da União para legislar sobre direito do trabalho - já que os servidores do fisco estadual não estão sujeitos ao regime celetista -, salientando, ainda, que a questão relativa ao desconto nos vencimentos dos participantes se contém na competência do Poder Executivo para dispor sobre a organização e o funcionamento da Administração Pública, no que foi acompanhado pelo Min. Joaquim Barbosa. De outra parte, os Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto, votaram no sentido de julgar procedente o pedido, por entenderem que o Decreto impugnado invadira a competência legislativa da União e inviabilizara o exercício de um direito natural do trabalhador à paralisação. Após, o julgamento foi adiado em face do pedido de vista do Min. Cezar Peluso.
ADI 254-GO, rel. Min. Maurício Corrêa, 13.8.2003. (ADI-254)

Alteração Constitucional: Não-Prejudicialidade

Iniciado o julgamento de ação direta ajuizada pelo Partido dos Trabalhadores - PT contra o art. 51 e seus parágrafos, da Constituição do Estado de Santa Catarina - "Art. 51 - Em caso de relevância e urgência, o Governador do Estado poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato a Assembléia Legislativa, que, estando em recesso, será convocada extraordinariamente no prazo de cinco dias. § 1º - As medidas provisórias perderão a eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de trinta dias a partir de sua publicação, devendo a Assembléia Legislativa disciplinar as relações jurídicas dela decorrentes. § 2º - É vedada a edição de medida provisória sobre matéria que não possa ser objeto de lei delegada. § 3º - É vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de medida provisória não deliberada ou rejeitada pela Assembléia Legislativa. Preliminarmente, o Tribunal, por maioria, tendo em conta a superveniência da EC 32/2001, que deu nova redação ao art. 62 da CF, modificando o padrão de confronto, conheceu da ação apenas em relação ao caput do art. 51, por considerar que não houve alteração substancial na Constituição da questão nuclear posta na ação direta, relativa à possibilidade ou não da adoção de medidas provisórias por Estado-membro. Vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio, que julgava prejudicada a ação, pela ausência de padrão de confronto da norma impugnada com a CF/88. Após, o julgamento foi adiado, ficando reservada a sua continuidade, quanto ao mérito, para outra oportunidade.
ADI 2.391-SC, rel. Ministra Ellen Gracie, 13.8.2003. (ADI-2391)

Imunidade Parlamentar Material

O Tribunal rejeitou queixa-crime apresentada contra então deputado estadual pela suposta prática dos crimes de injúria e de calúnia, decorrentes da divulgação, em jornal e na internet, de matéria cuja base seria o voto por ele proferido, na qualidade de membro da CPI instaurada para apurar a prostituição infanto-juvenil no Estado da Paraíba. Considerou-se que as manifestações do querelado encontravam-se vinculadas à sua atuação como parlamentar e, conseqüentemente, abrangidas pela imunidade material prevista no art. 53 da CF/88, com a redação dada pela EC 35/2001 ("Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos"). Precedente citado: Inq 1.739-PE (DJU de 9.5.2003).
Inq 1.955-PB, rel. Min. Joaquim Barbosa, 13.8.2003. (INQ-1955)

Criação de Unidades de Conservação e Consulta Pública

Tendo em conta a ausência de regulamentação do art. 22 da Lei 9.985/2000 à época da edição do decreto impugnado, bem como a inobservância da exigência legal da precedência de consulta pública para criação de unidade de conservação da natureza, o Tribunal, por maioria, deferiu mandado de segurança para determinar a desconstituição do decreto presidencial que, fundado no referido art. 22, ampliara os limites territoriais da área de preservação do Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, ficando ressalvada a possibilidade de edição de novo decreto. Considerou-se que o parecer apresentado pelo Conselho Consultivo do Parque, instituído por Portaria do IBAMA, não substitui a exigência legal de consulta pública, uma vez que seus membros não têm poderes para representar a população local. Vencido o Min. Cezar Peluso, que indeferia o writ, por entender cumprida na espécie a exigência legal, já que o Decreto 4.340/2002, que regulamentou a Lei 9.985/2000, admite outras formas de oitiva da população para esta finalidade (Lei 9.985/2000, art. 22: "As unidades de conservação são criadas por ato do Poder Público. ... § 2º A criação de uma unidade de conservação deve ser precedida de estudos técnicos e de consulta pública que permitam identificar a localização, a dimensão e os limites mais adequados para a unidade, conforme se dispuser em regulamento).
MS 24.184-DF, rel. Ministra Ellen Gracie, 13.8.2003. (MS-24184)

Recurso Administrativo e Efeito Suspensivo

Por ausência de direito líquido e certo, o Tribunal indeferiu mandado de segurança impetrado contra decreto presidencial que declarara de interesse social, para fins de reforma agrária, imóvel rural da impetrante, em que se sustentava a ofensa ao devido processo legal administrativo, pela circunstância de que o ato impugnado fora expedido na pendência do julgamento de recurso administrativo interposto contra o laudo produzido pela Superintendência Regional do INCRA. O Tribunal, considerando que a perda da propriedade decorre da decisão proferida na ação de desapropriação, salientou que o recurso administrativo, em regra, não possui efeito suspensivo, não impedindo, assim, a seqüência dos atos expropriatórios (Lei 9.784/99, art. 61: "Salvo disposição legal em contrário, o recurso não tem efeito suspensivo.").
MS 24.163-DF, rel. Min. Marco Aurélio, 13.8.2003. (MS-24163)

Reforma Agrária e Notificação Prévia

O Tribunal, por maioria, deferiu mandado de segurança impetrado contra decreto do Presidente da República que declarara de interesse social, para fins de reforma agrária, imóvel rural do impetrante, pela ausência de prévia notificação para a realização da vistoria, conforme previsto no § 2º do art. 2º da Lei 8.629/93, ofendendo, portanto, o devido processo legal e o direito ao contraditório e à ampla defesa. No caso concreto, fora expedida notificação para a primeira vistoria - que não se realizara na data designada, em face da presença de barreiras na área formadas por produtores rurais -, sendo efetuada nova vistoria dias depois, sem novo aviso prévio, e sem a presença dos proprietários ou de preposto habilitado a prestar informações. Afastou-se, na espécie, a alegação de que a tutela judicial obtida pelo INCRA - na qual se garantira autorização para a remoção das barreiras pelo uso de força policial - dispensara a exigência de nova notificação, já que tal decisão fora dirigida aos organizadores e participantes das barreiras, sendo certo, ainda, que a questão relativa à dispensa da obrigação legal de proceder à prévia notificação não fora objeto do pedido. Considerou-se, também, que o exercício ulterior do direito de defesa pelos proprietários, pela impugnação dos laudos da vistoria, não afasta a necessidade da prévia notificação, cuja finalidade é a de oportunizar o acompanhamento do levantamento de dados e viabilizar o exercício do contraditório, salientando-se, por fim, a inaplicabilidade na espécie do § 5º do art. 2º da mesma Lei. Vencidos os Ministros Joaquim Barbosa, que entendia inexistir direito líquido e certo a embasar a pretensão do impetrante, e Carlos Britto, por considerar que a notificação prévia constante do § 2º do art. 2º da citada Lei 8.629/93, não faz parte do devido processo legal, por não vincular o Poder Público à manifestação do proprietário, objetivando assegurar o ingresso do INCRA em propriedade particular. Precedentes citados: MS 23.562-TO (DJU de 17.11.2000), MS 22.700-MS (DJU de 8.9.2000), MS 22.164-SP (DJU de 17.11.95) e MS 22.319-SP (DJU de 14.2.97).
MS 24.547-DF, rel. Ministra Ellen Gracie, 14.8.2003. (MS-24547)

PRIMEIRA TURMA


Sindicato e Legitimidade Ativa

A Turma deu provimento a recurso ordinário em mandado de segurança para anular acórdão do STJ que negara legitimidade ativa a sindicato para impetração de ação mandamental ajuizada contra ato de ministro de Estado, que provocara a demissão de dirigente sindical no gozo de estabilidade provisória. Entendeu-se que, na espécie, não se trata da defesa de direito subjetivo e individual de um dos filiados do sindicato e sim, de direito próprio da entidade sindical a justificar, assim, a sua legitimidade para a causa,por defender direito próprio de manter íntegra a sua diretoria. RMS deferido para que o STJ, vencida a preliminar, prossiga no julgamento do mandado de segurança como entender de direito.
RMS 24.309-DF, rel. Min. Marco Aurélio, 14.8.2003. (RMS-24309)

Gratificação de Incentivo e Extensão a Inativos

A Turma manteve acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco que, nos termos do art. 40, § 8º, da CF, assegurara o direito de policiais inativos do mencionado Estado ao recebimento da gratificação de incentivo instituída pela Lei Complementar estadual 27/99. Considerou-se estar demonstrado que a mencionada gratificação fora concedida de forma geral, não configurando verba exclusiva dos servidores em atividade. Precedentes citados: RE 244.697-SP (DJU de 31.8.2001); RE 259.258-SP (DJU de 27.10.2000); RE 244.081-SP (DJU de 10.11.200).
AI 437.175-AgR-PE, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 12.8.2003. (AI-437175)

Contribuição Previdenciária do Estado do RS

Iniciado o julgamento de agravo regimental interposto pelo Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul - IPERGS contra decisão do Min. Sepúlveda Pertence, relator, que dera provimento a recurso extraordinário para reformar acórdão do Tribunal de Justiça local, que autorizara a incidência da contribuição previdenciária sobre os proventos de pensionista. Após o voto do Min. Sepúlveda Pertence, relator, dando parcial provimento ao recurso para determinar a restituição dos valores pagos a tal título somente com relação ao período posterior à EC 20/98, no que foi acompanhado pelo Min. Joaquim Barbosa, e dos votos dos Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto, que negavam provimento ao agravo regimental por entenderem que, quando admitido o servidor, não havia a incidência da contribuição social e, por isso, a lei posterior que a criou modificara situação em curso protegida pela Constituição, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Min. Cezar Peluso. Precedentes citados: ADI 1.441-MC-DF (DJU de 18.10.96) e RE 372.356-AgR-MG (DJU de 20.6.2003).
RE 340.878-AgR-RS, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 12.8.2003. (RE-340878)

Ação Rescisória e Suspensão de Execução

A Turma referendou decisão proferida pelo Min. Marco Aurélio, relator, que, à vista da excepcionalidade do caso concreto, deferira ação cautelar para suspender a execução movida contra a requerente, ante a demonstração da insubsistência do título executivo judicial, pelo provimento obtido em sede de ação rescisória, ainda não transitada em julgado. Ação cautelar deferida para suspender a execução em curso, até julgamento final do recurso extraordinário interposto contra o acórdão do TST que julgou procedente a ação rescisória.
AC 23-SP, rel. Min. Marco Aurélio, 12.8.2003. (AC-23)

SEGUNDA TURMA

RE e Efeito Suspensivo

A Turma, resolvendo questão de ordem, referendou decisão proferida pelo Min. Gilmar Mendes, relator, que, tendo em conta a peculiar situação jurídica do requerente e com base no princípio da segurança jurídica, concedera efeito suspensivo a recurso extraordinário para impedir o licenciamento do requerente das fileiras da Corporação da Polícia Militar do Distrito Federal. Trata-se, na espécie, de agravo regimental em recurso extraordinário interposto contra decisão que,entendendo legal a restrição de idade para ingresso na carreira de policial militar, cassara a segurança concedida para anular o ato de eliminação do requerente de certame.
Pet 2.922-QO-DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 12.8.2003. (PET-2922)

HC e Princípio do Juiz Natural

Iniciado o julgamento de habeas corpus em que se pretende seja feita nova distribuição da ação penal instaurada contra o paciente pela suposta prática do delito previsto no art. 307 do CTB - "violar a suspensão ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor (...)" -, sob alegação de ofensa aos princípios do juiz natural e do juiz imparcial, pela circunstância de que a ação penal fora distribuída ao mesmo magistrado que, em outra ação penal, suspendera a sua habilitação para dirigir veículo automotor. O Min. Carlos Velloso, relator, salientando o fato de que a distribuição ocorrera aleatoriamente, o que afastaria a alegada ofensa ao princípio do juiz natural, e entendendo inaplicável, no caso, o disposto no art. 252, III, do CPP, que se refere a impedimento de juiz no mesmo processo, mas em outra instância, proferiu voto no sentido do indeferimento do writ. O Min. Carlos Velloso, em seu voto, rejeitou, também, as alegações de excesso da acusação e de inépcia da denúncia. Após, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Min. Gilmar Mendes. Precedentes citados: HC 73.099-SP (DJU de 17.5.96) e HC 68.223-DF (DJU de 31.5.91).
HC 83.020-SP, rel. Min. Carlos Velloso, 12.8.2003. (HC-83020)

Sessões

Ordinárias

Extraordinárias

Julgamentos

Pleno

13.8.2003

14.8.2003

8

1a. Turma

12.8.2003

----

74
2a. Turma

12.8.2003

----232


C L I P P I N G    D O    D J

15 de agosto de 2003

CC N. 7.134-RS
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: Conflito negativo de competência entre juiz federal e o Tribunal Superior do Trabalho. 2. reclamação trabalhista. 3. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. 4. Alegado vínculo sob o molde de contrato de trabalho. 5. Entendimento desta Corte, no sentido de que, em tese, se o empregado público ingressa com ação trabalhista, alegando estar vinculado ao regime da CLT, compete à Justiça do Trabalho a decisão da causa (CC 7.053, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJ de 7.6.2002; CC 7.118, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, DJ de 4.10.2002). 6. Conflito de competência julgado procedente, ordenando-se a remessa dos autos ao TST.
* noticiado no Informativo 312

HC N. 83.069-MG
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: Estupro: extinção da punibilidade pelo casamento da ofendida com terceiro (CPen, art. 107, VIII): não incidência na hipótese de violência real.
O estupro com violência real - a cuja caracterização basta que o dissenso da ofendida haja sido vencido mediante emprego efetivo da força física - basta a afastar a extinção da punibilidade pelo casamento da ofendida com terceiro, sendo irrelevante que do fato não haja resultado lesões corporais de natureza grave.

RE N. 114.507-QO-SP
RELATOR: MIN. NÉRI DA SILVEIRA
EMENTA: - Recurso extraordinário. Questão de ordem. 2. Questão de ordem submetida pelo Presidente da Turma, em face da inviabilidade de ser proferido o voto-vista por Ministro que se aposentou. 3. "Quorum" suficiente para a decisão - art. 134 do RISTF -, visto que três membros da Turma proferiram voto. 4. Proclamada a decisão de não conhecimento do recurso, por maioria, em face dos votos proferidos. 5. Questão de ordem acolhida. Julgamento considerado encerrado, em face da verificação de quorum suficiente para a decisão, eis que três membros da Turma proferiram voto. Não se verifica, na espécie, hipótese de renovação de julgamento.
* noticiado no Informativo 261


Acórdãos Publicados: 107

T R A N S C R I Ç Õ E S



Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
_______________________________________
RE pela alínea a (Transcrições)

(v. Informativo 315)

RE N. 298.694-SP*

RELATOR : MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
Confirmação de Voto: Cuida-se de RE, a, do Município de São Paulo, por violação do art. 5º, XXXVI, CF, porque a decisão a quo teria reconhecido indevidamente a existência de direito adquirido.

O acórdão recorrido, relatei - julgou procedente ação ordinária de cobrança proposta pelos recorridos, servidores públicos municipais, e lhes reconheceu o direito ao reajuste de seus vencimentos, em fevereiro de 1995, conforme a sistemática das Leis municipais 10688/88 e 10722/89, expressamente revogadas pela L. mun. 11.722, de 13.02.95, que - assentou a decisão - ao retroagir os seus efeitos a 1º de fevereiro, atingiu direito adquirido dos autores, pois já anteriormente implementadas as condições de reajuste previstas na legislação revogada.

No julgamento da apelação do Município, houve voto parcialmente vencido (f. 33) - "pois, em termos de vencimentos de servidores públicos, o direito a sua percepção só se adquire dia a dia, com a realização efetiva do trabalho sob a regência da lei que se quer aplicar": donde reduzir a procedência da ação ao correspondente aos treze dias do mês de fevereiro, trabalhados antes da vigência da lei nova.

Em embargos infringentes, manteve-se, contudo, a procedência integral da ação.

Por decisão singular, dera provimento ao RE do Município, mas a reconsiderei, em agravo regimental, para submetê-lo ao Plenário.

Do meu voto, extrato:

- Sigo convencido do equívoco de minha primeira decisão, quando filiei a espécie ao acórdão do MS 21216 e não ao meu próprio despacho, na SS 1160.
O MS 21216 - que tivera inicialmente como similar a este caso - é o relativo ao Plano Collor I - vale dizer, à MPrv. 154, de 15.03.90 - e tinha por objeto a pretensão dos servidores a que os vencimentos de abril daquele ano sofressem o reajuste de 84,32% porque já vencido o período de apuração do índice de inflação passada, conforme a legislação anterior (L. 7830).
Insista-se em que, na espécie, diversamente, a lei revogatória do sistema de reajuste baseada na inflação do mês anterior, a incidir sobre os vencimentos de fevereiro de 1995, colheu esse último quase na metade de seu curso, em 13 de fevereiro daquele ano.
Donde, a impertinência a este feito do precedente do Plano Collor. Impertinência que ressalta do voto-condutor do MS 21216, do em. Ministro Octavio Gallotti, em passagem recordada em um dos memoriais - RTJ 134/1112, 1119:

"Há, primeiramente, que distinguir entre as noções de retroatividade da lei, de um lado e seu efeito imediato, de outro.
Na espécie em julgamento, basta reconhecer efeito imediato à Medida Provisória nº 154, de 16 de março de 1990 (convertida na Lei nº 8.030/90), para que possa ela alcançar, validamente, o resultado que, só a partir de 1º de abril seguinte, teria vindo a produzir-se.
Retroatividade haveria, aí sim, quando a remuneração correspondente a dias já trabalhados (ainda que não efetivamente paga) houvesse sido atingida por lei superveniente, o que não é o caso dos autos.
Não há falar, portanto, em ofensa a direito adquirido, tampouco em desfazimento de situação definitivamente constituída. A revogação precedeu a própria aquisição e não somente o exercício do direito.
Para a aquisição do direito, ou seja, para o ingresso deste no patrimônio do pretenso titular, seria mister que, antes da revogação, se houvessem reunido e consumado todos os elementos isto é, os fatos idôneos à sua constituição ou produção. Ou seja, no caso concreto, que algum serviço houvesse sido prestado, sob a égide de lei anterior. Tal porém, não chegou a suceder, eis que não havia principiado, ainda, o mês de abril, quando tolhidos os efeitos da lei revogada, os quais, só a partir daquele mês viriam a produzir-se".

Tem-se, pois, que, naquele acórdão, o início do mês de trabalho foi posto como o momento da aquisição do direito à aplicação da lei de reajuste mais favorável ao servidor, então vigente.
Certo, no referido MS 21.216, não se discutiu - porque irrelevante ante o quadro de fato, se - acaso sobreviesse a lei nova ao início do mês trabalhado, o direito adquirido alcançaria a remuneração total dele ou apenas o dos dias anteriormente trabalhados.
Questão similar - como notei na SS 1.160 - foi suscitada na aplicação do Dl 2.425, de 7.4.88 - portanto, já no curso do primeiro mês sobre cujos vencimentos deveria incidir a regra antecedente de reajuste - não obstante, no art. 1º, o diploma já sobre ele prescrever que devesse incidir a nova fórmula.
O Tribunal - primeiro, em deliberação administrativa, depois, em inumeráveis acórdãos - negou o direito adquirido ao reajuste antigo sobre os vencimentos integrais do mês, mas o reconheceu sobre 7/30 deles, correspondentes aos dias trabalhados até o decreto-lei.
Na esfera jurisdicional, o leading case - RE 146.749, Pl., 24.2.94, Moreira Alves - recebeu esta ementa - RTJ 158/228:

"Suspensão, em 07.04.88, pelo artigo 1º, "caput", do Decreto 2.425/88, dos reajustes, pela Unidade de Referência de Preços (URP), dos vencimentos de abril e maio de 1988.
- A jurisprudência desta Corte se firmou no sentido de que não há direito adquirido a vencimentos de funcionários públicos, nem direito adquirido a regime jurídico instituído por lei. Precedentes do S.T.F.
Conseqüentemente, diploma legal novo, que reduza vencimentos (inclusive vantagens), se aplica de imediato, ainda que no mês em curso, pois alcança o período de tempo posterior à sua vigência, dado que não há, no caso, direito adquirido.
- No caso, sendo de aplicação imediata o artigo 1º, "caput", do Decreto-Lei nº 2.425/88, e estabelecendo ele, apenas, que o reajuste mensal previsto no artigo 8º do Decreto-Lei nº 2.335/87 não se aplicaria nos meses de abril e maio de 1988 (o que implica dizer que ele não determinou a redução dos vencimentos a que os servidores já faziam jus, mas apenas estabeleceu que aquele reajuste não seria aplicado nos referidos meses), os funcionários têm direito apenas ao reajuste, calculado pelo sistema do artigo 8º, § 1º, do Decreto-Lei nº 2.335, com relação aos dias do mês de abril anteriores ao da publicação desse Decreto-lei (ou seja, os sete primeiros dias do mês de abril de 1988, uma vez que o referido artigo 1º, "caput', entrou em vigor no dia oito de abril de 1988, data em que foi publicada, pois não sofreu alteração na republicação feita no dia onze do mesmo mês), bem como ao de igual valor, não cumulativamente, no mês de maio seguinte.
Recurso extraordinário conhecido e, em parte, provido."

Embora tendo composto a maioria, não nego peso à objeção - então veiculada em votos vencidos - da injuridicidade do seccionamento do mês - cuidando-se de vencimentos mensais - para fazer incidir duas leis sucessivas no cálculo da remuneração correspondente.
O problema, contudo, a meu ver, perde relevo, quando se cuida, como sucede no caso, de um problema de sucessão de leis já ocorrida sob a Constituição de 1988, que estendeu a todos os servidores públicos a garantia da irredutibilidade de vencimentos, antes circunscrita aos magistrados.
Foi o que notei no voto que proferi no mesmo RE 146.749, com o qual acompanhei a maioria formada na linha do voto do Ministro Moreira Alves.
Aduzi então - RTJ 158/228,241:

"Senhor Presidente, no julgamento do Mandado de Segurança nº 21.216, relativo ao chamado Plano Collor, fiquei vencido na companhia dos eminentes Ministros Carlos Velloso e Paulo Brossard. Mas, no meu voto, ao contrário do Ministro Carlos Velloso, deixei claro que não o fundava no princípio do direito adquirido, e sim no da irredutibilidade de vencimentos que a Constituição de 88 estendera a todos os servidores públicos.
Entendia, então, que o momento da incidência do princípio da irredutibilidade de vencimentos é aquele da fixação do vencimento, pouco importando que esta fixação se faça mediante expressão nominal de uma quantia monetária ou pela incidência de regra de reajuste automático, conforme a inflação apurada em determinado período.
Disso, com todas as vênias, continuo convencido.
Sucede que o caso concreto há de ser visto à luz do regime constitucional decaído: o da Carta de 69, onde essa irredutibilidade de vencimentos não era assegurada aos servidores públicos.
Por isso, na sessão administrativa de 14 de outubro de 1991, a diferença entre o meu voto caso idêntico ao presente, porque também atinente ao Decreto-Lei nº 2.425 de 88 - no qual votei com a maioria, porque inexistente, então, o princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos dos servidores em geral - no caso subseqüente relativo ao chamado "Plano Verão", de janeiro de 1989, quando já vigente a irredutibilidade de vencimentos.
Explicito, assim, apenas as razões do meu voto na decisão administrativa que, com todas as vênias, não tenho motivos novos para alterar agora."

É significativo notar, aliás, que, no voto condutor desse RE 146749, o Ministro Moreira Alves já vinculara a limitação do direito dos servidores em geral ao reajuste dos sete dias já trabalhados à redutibilidade dos seus vencimentos. Acentuou S. Exa. - RTJ 158/228, 237:

"... diploma legal novo, que reduza vencimentos (inclusive vantagens), se aplica de imediato, ainda que no mês em curso, pois alcança o período de tempo posterior à sua vigência, dado que não há direito adquirido a vencimentos, nem direito adquirido a regime jurídico de constituição de vencimentos. Em se tratando de aplicação imediata da norma legal, não alcança ela, evidentemente, os vencimentos já pagos, ou os devidos pro labore facto.
Por outro lado, não há como sustentar-se que esses princípios se aplicam ao direito a vencimentos e não ao direito a reajuste decorrente de correção monetária. Reajuste por causa de correção monetária nada mais é do que a atualização da expressão monetária dos vencimentos, e, se estes podem ser reduzidos para o futuro, é óbvio que podem sê-lo com a sua expressão monetária atualizada ou não."

Essa continua sendo a minha convicção, o que me faz descartar a solução intermediária de procedência parcial da ação para reconhecer aos recorridos o direito à fórmula revogada de reajuste apenas sobre os dias de fevereiro de 1995 anteriores à lei que a revogou.
Se há garantia constitucional de irredutibilidade de vencimentos - que é modalidade qualificada de direito adquirido -, o direito adquirido a determinado reajuste - que, não fora ela, poderia adstringir-se aos dias trabalhados antes da revogação da lei que o prescrevia - projeta-se para o futuro, de modo a assegurar o servidor contra a redução do estipêndio reajustado.
Assim, se a legislação precedente chegou a incidir sobre a remuneração de determinado dia - o que se ajusta à jurisprudência firmada no mencionado precedente (RE 146.749, Pl., 24.2.94, Moreira Alves) - a Constituição garante prospectivamente a irredutibilidade do valor nominal alcançado segundo o sistema antigo.
Por isso é que o Dl. 2.245/88 - ele mesmo, no art. 4º - excluiu de sua incidência, no próprio mês de sua publicação, os vencimentos já irredutíveis segundo a ordem constitucional pretérita: os dos membros do Poder Judiciário e os dos Tribunais de Contas.
A Constituição superveniente - sob a qual se deu a sucessão de leis de que trata o presente caso -, estendeu, contudo, a mesma garantia de irredutibilidade a todos os servidores públicos.
Desse modo - embora se lhe transfira a base constitucional, do art. 5º, XXXVI para o art. 37, XV, da Lei Fundamental - está correto o dispositivo do acórdão recorrido.
Portanto, não conheço do RE: é o meu voto.

Pediu vista o em. Ministro Moreira Alves, que - sem dissentir, no mérito, da fundamentação do meu voto -, dele, no entanto, discordou, quanto à possibilidade, no RE, a, de não conhecer do recurso, por fundamento diverso daquele que lastreou o acórdão.

Aduziu S. Exa.:

"Pedi vista para examinar a possibilidade, em recurso extraordinário, dessa transferência de fundamento para dar como correto o dispositivo do acórdão recorrido que não assentou nele até porque não foi ele objeto de discussão na causa, tendo o recurso extraordinário atacado o fundamento do acórdão recorrido que foi exclusivamente o da existência, no caso, de direito adquirido ao reajuste.
Sobre essa questão preliminar, não me parece possível, em recurso extraordinário que foi interposto pela letra "a" do inciso III do artigo 102 da Constituição, se deixe de examinar o fundamento dele (inexistência, no caso, de direito adquirido, e, portanto, má aplicação do artigo 5º, XXXVI, da Carta Magna) que ataca o fundamento exclusivo do acórdão recorrido (reconhecimento da existência de direito adquirido) que lhe serviu de base para chegar ao seu dispositivo que dá pela procedência da ação dos servidores.
Com efeito, o recurso extraordinário se destina a julgar a tese jurídica do acórdão recorrido. Por isso, se o acórdão recorrido não atacá-la, mas versar outra tese jurídica, não pode ele ser conhecido e provido (pela letra "a" do incido III do artigo 102 da Constituição, o conhecimento do recurso implica necessariamente o seu provimento) por falta de prequestionamento dessa questão; se o acórdão recorrido, porém, se basear numa tese jurídica (assim, por exemplo, na existência de direito adquirido) e o recurso extraordinário com base nessa mesma letra "a" atacá-la indicando o dispositivo constitucional do direito adquirido como tendo sido mal aplicado, terá ele de ser julgado com base nessa questão (existir, ou não, direito adquirido) e não com base em outra questão (como a irredutibilidade de vencimentos) que não foi versada nem no acórdão nem no recurso extraordinário. O princípio "iura novit curia" não se aplica a recurso extraordinário pela natureza extraordinária dele.
Observo, ademais, que, no caso, não há sequer que se pretender que a irredutibilidade de vencimento é modalidade qualificada de direito adquirido, pois são garantias constitucionais diversas, e para uma ser modalidade qualificada de outra é preciso que a modalidade qualificada nada mais seja do que a modalidade simples agravada, o que evidentemente não ocorre quando as modalidades são diferentes.
Por assim entender, e considerando que esta é uma questão preliminar, voto no sentido de que o julgamento do presente recurso extraordinário, interposto pela letra "a" do incido III do artigo 102 da Constituição, tem que se adstringir a examinar o seu objeto (inexistência de direito adquirido), em face da tese jurídica sustentada pelo acórdão recorrido (existência de direito adquirido) devendo ser conhecido e provido se, no caso, não houver direito adquirido, e não ser conhecido se, no caso, houver direito adquirido."

Indiquei adiamento e, após repensar a questão, data venia, insisto no meu voto.

De logo, reafirmo que a irredutibilidade de vencimento é, sim, forma qualificada e específica, da garantia do direito adquirido.

Com efeito, a conclusão pela incidência da garantia da irredutibilidade tem como premissa necessária que o servidor haja reunido os pressupostos da fixação dos seus vencimentos em certa quantia: logo, de haver consumado a aquisição do direito à sua percepção, que se estende prospectivamente ao de não a ver reduzida por lei posterior.

Nesse sentido, é significativo o voto do em. Ministro Ilmar Galvão no RE 258980, no qual - porque também argüida a regra da irredutibilidade pelos servidores, então vencidos, no Tribunal a quo - S. Exa., com o respaldo do Ministro Moreira Alves, deu provimento ao RE, para declarar inconstitucional o mesmo dispositivo de lei local.

Embora nominalmente adstrito à regra da irredutibilidade, o raciocínio do Ministro Galvão deixa clara a sua imbricação com a lógica do direito adquirido:

"Ocorre, entretanto, que, no art. 2º, mandou a referida Lei nº 11.722/95 que os ditos vencimentos fossem reajustados em 6%, a partir de 1º de fevereiro do mesmo ano.
Resta saber se essa norma resultou em ofensa ao princípio da irredutibilidade de remuneração, consagrado no art. 37, XV, da Constituição, como alegado no recurso.
A resposta há de ser positiva, visto que, obviamente, se a nova lei foi editada em meados do mês de fevereiro, quando já se achavam realizados todos os elementos tidos pela lei anterior como necessários à apuração do novo percentual de reajuste a ser aplicado aos vencimentos relativos ao referido mês que, nos dizeres dos recorrentes, sem contradita do recorrido, se estimava em 81% - reajustamento esse que se achava pendente apenas de ato declaratório do Prefeito, considerados os limites previstos no art. 3º do mencionado diploma legal -, é fora de dúvida que os servidores, então, já faziam jus a novos padrões remuneratórios calculados pelo referido índice, o qual não poderia ter sido substituído pelo de 6%, fixado, mediante critérios diversos, pelo art. 2º da nova lei, sem ofensa direta ao princípio da irredutibilidade consagrado no art. 37, XV, da Constituição Federal."

Seja como fôr - no ponto nuclear da dissonância do voto do Ministro Moreira Alves -, ouso manter minha posição de que, mesmo no RE, a, ao Supremo Tribunal é dado manter o dispositivo do acórdão recorrido, ainda que por fundamento diverso daquele que o tenha lastreado.

Reporto-me, no ponto, à decisão do RE 85944 ED, de que fui relator e no qual, com a sempre honrosa concordância do Ministro Moreira Alves, a Turma assentou, como consignado na ementa:

"Embargos declaratórios são admissíveis, em tese, para que o órgão julgador se pronuncie sobre matéria que o embargante não suscitou anteriormente por falta de interesse. É o que sucede quando, da negação da tese do acórdão recorrido, não resulte necessariamente a inversão do resultado da causa, ante a existência de motivos alheios à fundamentação da decisão impugnada que, não obstante rejeitada esta, induzam a manter o dispositivo do julgado.
Em tais hipóteses, não fica o STF subordinado a que o argumento capaz de justificar a manutenção do resultado favorável ao recorrido haja sido por ele suscitado. No recurso extraordinário, ao contrário do recorrente, ao recorrido - vencedor na instância a qua - não se impõe o ônus do prequestionamento, nem sequer o de aventar, nas contra-razões, os motivos, posto que estranhos aos da decisão recorrida, de que possa resultar a manutenção desta, salvo se se trata de matéria a respeito da qual a lei exija a iniciativa da parte interessada."

A dificuldade, quando se cuida de RE pela letra a, parece decorrer do dogma de que, então, conhecido, deva ele necessariamente ser provido.

Ouso entender chegada a hora de rever a máxima, construída por motivos pragmáticos, que tenho recordado.

Já denunciada pelo notável Castro Nunes, a confusão entre a admissibilidade e o provimento do RE, a, tem sido objeto de crítica veemente e de inequívoca procedência de Barbosa Moreira.

Vale a longa transcrição do douto e lúcido jurisconsulto:

"Em hipótese alguma, é dado à Corte deixar de observar a necessária precedência do juízo de admissibilidade sobre o juízo de mérito, e menos ainda misturá-los. Sempre é de rigor, primeiro, apurar se o recurso é ou não admissível (quer dizer, cabível e revestido dos outros requisitos de admissibilidade), e por conseguinte se dele se há ou não de conhecer, no caso afirmativo, depois, já no plano do mérito, investigar se o recurso é ou não procedente (em outras palavras: se o recorrente tem ou não razão em impugnar a decisão do órgão inferior), e por conseguinte se se lhe deve dar ou negar provimento. Não obstante a técnica peculiar (e imprópria) usada pelo legislador constituinte, ao redigir a letra a do art. 102, nº III, e os dispositivos correspondentes em Constituições anteriores (cf., supra, o comentário n 319 ao art. 541), o julgamento dos recursos nela fundados há de obedecer à mesma sistemática, sem desprezar a distinção entre as duas etapas. É inadequada a maneira por que o Supremo Tribunal Federal costuma pronunciar-se acerca desses recursos, dizendo que deles "não conhece" quando entende inexistir a alegada infração. Desde que se examine a federal question suscitada pelo recorrente, isso significa que se julga o recurso de meritis, pouco importando que se acolha ou se repila a impugnação feita à decisão recorrida; em casos tais, o que se deve dizer é que se conheceu do recurso e, respectivamente, que se lhe deu ou negou provimento.
A praxe até agora adotada leva a conseqüências absurdas. Uma delas consiste em que, quando se manifesta divergência entre os Ministros, os que reconhecem a ofensa à Constituição dão provimento ao extraordinário, enquanto os que a negam declaram "não conhecer" do recurso; ora, tomados os votos ao pé da letra, estar-se-ia diante de deliberação sui generis, onde alguns votantes se encontram ainda no plano da preliminar, ao passo que outros já ingressaram no do mérito... É impossível, a todas as luzes - e vem a pêlo recordar a norma do art. 560, caput, do Código -, que se invistam ambos os planos ao mesmo tempo!
Ademais, ao ângulo prático, surgem corolários de extrema gravidade, como por exemplo o que ocorre quando tenha havido adesão. Se o Supremo Tribunal Federal, resolvendo a questão federal em sentido contrário ao pleiteado pelo recorrente principal, disser (com locução imprópria) que não conhece do recurso, ficará impedido, no rigor da lógica, de apreciar o extraordinário adesivo. Ora, a não ser que faltasse a este mesmo algum requisito de admissibilidade, o recorrente adesivo tinha o direito de ver julgado no mérito o seu recurso, desde que admissível (embora não necessariamente fundado) o do litigante adverso. Da forma como se expressa a Corte, uma de duas: ou se prejudica o recorrente adesivo, deixando de conhecer-se do seu recurso em casos em que todos os pressupostos do conhecimento estarão satisfeitos, ou então, para evitar o prejuízo, terá de conhecer-se do recurso adesivo apesar de não se ter conhecido do principal, sempre que essa decisão de não conhecimento (ou antes, sempre que essa decisão dita inadequadamente de não conhecimento) haja apreciado a federal question que o recorrente principal suscitara. Em mais de um julgamento, optou o Supremo Tribunal Federal pela segunda solução, buscando apoio em suposta distinção entre não conhecimento por motivo de ordem processual e não conhecimento por motivo de mérito. Menos mal para o recorrente adesivo; mas a construção padece de clamoroso artificialismo: por definição, "não conhecer" de um recurso significa, nada mais, nada menos, que abster-se de examinar-lhe o mérito, de sorte que "não conhecimento por motivo de mérito" constitui pura contradição nos termos, em que é constrangedor ver incidir a mais alta corte judiciária do país."

Ainda, porém, que se pretenda manter a praxe, o certo é que nem dela decorre que, acaso errôneo o fundamento do acórdão recorrido, atacado no RE, esteja o Supremo Tribunal jungido a dele conhecer e lhe dar provimento, ainda que entenda haver fundamento constitucional para manter-lhe o dispositivo, não obstante a erronia da motivação.

A solução contrária, data maxima venia, implicaria impor ao Tribunal - ao qual se confiou, "precipuamente, a guarda da Constituição" (CF, art. 102) - constrangimento ao qual não se submetem outras instâncias.

Bastar pensar no caso do Superior Tribunal de Justiça, como recordei ao indicar o adiamento desta decisão.

Com efeito, não cabe àquela alta Corte superior julgar o recurso fundado na argüição de inconstitucionalidade de lei.

Não obstante, no julgamento do recurso especial por contrariedade à lei federal, se o STJ, malgrado o reconhecimento de sua violação, entender que a norma ordinária é incompatível com a Constituição, ninguém lhe contesta a autoridade para declarar incidentemente a inconstitucionalidade da lei invocada e, por isso, manter a decisão recorrida.

Constituiria paradoxo verdadeiramente "Kafkaniano" que, diferentemente, ao STF - guarda da Constituição - não fosse dado, no julgamento do RE, declarar que a lei questionada é, sim, inconstitucional, embora por fundamento diverso do acolhido pelo acórdão recorrido, e, em conseqüência, estivesse vinculado a aplicar a norma legal que considera incompatível com a Carta Magna.

Advogado, Procurador-Geral e juiz deste Tribunal, desde a sua chegada às sessões da Corte, como Procurador-Geral da República, faz 32 anos, acostumei-me a respeitar as manifestações do em. Ministro Moreira Alves, indiscutível líder intelectual da Casa, nessas décadas.

Sirvo-me desta primeira oportunidade depois da aposentadoria de S. Exa., para reiterar o testemunho de sua grandeza.

Não obstante, neste caso, peço todas as vênias e persisto no meu voto para ou não conhecer do recurso extraordinário ou dele conhecer, mas, para negar-lhe provimento: é o meu voto.

* acórdão pendente de publicação


Assessora responsável pelo Informativo

Graziela Maria Picinin
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Informativo STF - 316 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

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