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quinta-feira, 15 de julho de 2010

JURID - Rescisão contratual indireta. Ato lesivo. Superior. [15/07/10] - Jurisprudência


Rescisão contratual indireta. Prática de ato lesivo da honra e boa fama por superior hierárquico.
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Tribunal Regional do Trabalho - TRT6ªR

PROC. Nº. TRT- 01690-2008-143-06-00-3.

ÓRGÃO JULGADOR: PRIMEIRA TURMA.

RELATOR: DESEMBARGADOR NELSON SOARES JÚNIOR.

RECORRENTE: RONALDO ANTÔNIO DA SILVA.

RECORRIDA: EMPRESA AUTO VIAÇÃO PROGRESSO S.A.

ADVOGADOS: JACILEIDE BERNARDO NUNES BEZERRA E ALEXANDRE JOSÉ DA TRINDADE MEIRA HENRIQUES.

PROCEDÊNCIA: 3ª VARA DO TRABALHO DE JABOATÃO (PE).

EMENTA: RESCISÃO CONTRATUAL INDIRETA. PRÁTICA DE ATO LESIVO DA HONRA E BOA FAMA POR SUPERIOR HIERÁRQUICO. CARACTERIZAÇÃO. Em se tratando de rescisão indireta do contrato de trabalho -- hipótese em que há obrigação apenas de narração do fato que, em tese, enquadra-se nas alíneas do artigo 483 da CLT, uma vez que lhe é aplicável a máxima "da mihi factum, dabo tibi jus" --, o afastamento do recorrente do emprego não equivale "a um pedido de demissão" (como entendeu erroneamente o juízo de primeiro grau), mas sim ao exercício de um direito inerente ao princípio da dignidade humana. Recurso ordinário acolhido.

Vistos etc.

Cuida-se de recurso ordinário de Ronaldo Antônio da Silva, interposto por intermédio de advogados, por meio do qual ele postula a reforma da sentença da Excelentíssima Juíza do Trabalho da 3ª Vara do Trabalho de Jaboatão (PE), proferida nos autos da reclamação proposta em face da Empresa Auto Viação Progresso S.A., que implicou o acolhimento parcial dos pedidos.

O recorrente não se conforma com o indeferimento dos pedidos de pagamento de indenização de dano moral, verbas rescisórias, indenização de seguro-desemprego, horas extraordinárias, repercussões, domingos e feriados. Sustenta, em síntese, a caracterização do dano moral, pelo fato de o superior hierárquico o haver ofendido com palavras de calão (obscenas e grosseiras); a responsabilidade direta e indireta da recorrida pela rescisão do contrato de trabalho; e a demonstração, por meio dos controles de horários apresentados pela recorrida, de jornadas extravagantes e de trabalho em domingos e feriados. Pede o provimento do recurso pelas razões documentadas às fls. 386/96.

Contrarrazões às fls. 399/404.

Inexistindo obrigatoriedade, não determinei a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho.

É o relatório.

VOTO:

O recurso ordinário merece acolhimento no concernente aos pedidos relacionados à responsabilidade pela cessação da relação de emprego (indenização de aviso prévio, multa de 40% sobre o montante atualizado dos depósitos do FGTS e indenização compensatória do seguro desemprego), porquanto, em se tratando de rescisão indireta do contrato de trabalho -- hipótese em que há obrigação apenas de narração do fato que, em tese, enquadra-se nas alíneas do artigo 483 da CLT, uma vez que lhe é aplicável a máxima "da mihi factum, dabo tibi jus" --, o afastamento do recorrente do emprego não equivale "a um pedido de demissão" (como entendeu erroneamente o juízo de primeiro grau), mas sim ao exercício de um direito inerente ao princípio da dignidade humana.

Com efeito, a par do afastamento dos serviços caracterizar-se como um fato necessário à caracterização da gravidade da falta empresarial -- pois, como advertiu o Ministro Mozart Victor Russomano, os casos previstos nas letras "d" e "g" do artigo 483 da CLT "(...) constituem exceções à regra geral, isto é, à regra de que o trabalhador indiretamente despedido deve deixar o emprego (...)" (Cf. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993, vol. I, p. 574) --, existe prova testemunhal de que o recorrente assim procedeu porque o superior hierárquico, Cláudio José da Silva, ofendeu-o com palavras obscenas e grosseiras (fl. 300).

Essa conclusão é inexorável, não obstante o superior hierárquico do recorrente haja negado a ofensa em juízo -- oportunidade em que mentiu, quando disse nunca haver discutido com ele, pois perante a Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em Pernambuco declarou, expressamente, "Não vou dizer que não houve desentendimento entre eu e Ronaldo" (cf. documento juntado às fls. 11 e 13, reproduzido às fls. 226/7) --, porque, consoante também alertou o jurista supracitado, "Tudo quanto, por gestos ou por palavras, importar em expor outrem ao desprezo de terceiros será considerado lesivo da boa fama. Tudo quanto, por qualquer meio, magoá-lo em sua dignidade pessoal será ato contra a honra" (Cf. op. e loc. citados, p. 564).

Nesse sentido decidimos no julgamento do processo nº TRT-00448-2009-009-06-00-4, de que fui relator, havendo o acórdão recebido esta ementa:

"RESCISÃO CONTRATUAL. CULPABILIDADE. NEXO ETIOLÓGICO. Não havendo demonstração de que a rescisão do contrato de trabalho fora causada pelo recorrido -- conforme a recorrente asseverou na contestação, uma vez que os elementos de convicção revelam que o fato decorreu de imputação caluniosa por parte de preposto dela --, não há modificação a ser feita na sentença, que acarretou a condenação ao pagamento das verbas rescisórias, porquanto, a teor do disposto no artigo 483 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), 'o empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando: (...) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama'. Recurso ordinário não acolhido."

Ante esse quadro, o inconformismo do recorrente merece também acolhimento no pertinente ao pedido de indenização de dano moral, uma vez que, conforme se colhe desta lição de Paul Durand e R. Jaussaud, a ultrapassagem do direito de comando constitui ato ilícito: "Os poderes do empregador são (...) determinados pela finalidade do direito de direção. Eles lhe são proporcionados para atingir uma boa organização do trabalho na empresa. Legítimo neste domínio, a autoridade cessa de sê-lo fora destes limites" (cf. "Traité de Droit du Travail", vol. I, Paris, 1947, pp. 431/2. Apud: FILHO. EVARISTO DE MORAIS. Pareceres de Direito do Trabalho. São Paulo: LTR, 1976, p. 60). (Sublinhei).

Nesse sentido decidimos no julgamento do processo nº TRT-01073-2008-017-06-00-3, de que fui relator, oportunidade em que, após a apreciação do fato constitutivo do direito, arrematei: "Portanto, a transgressão do poder diretivo empresarial é, por si, suficiente ao reconhecimento do direito da parte recorrente, de ressarcimento do prejuízo não-patrimonial sofrido (artigo 186 do Código Civil, porque, como o Ministro Orosimbo Nonato já afirmara em 1950, no julgamento do Recurso Extraordinário nº. 11.786 pelo Supremo Tribunal Federal, com amparo nas observações de Pacchioni (citado por Zulmira Pires de Lima e Aguiar Dias), "a noção do dano moral é negativa: é o que incide apenas na personalidade moral da vítima."

Portanto, em se tratando de lesão à esfera subjetiva do recorrente, que ocorreu no seu âmago (afetando-lhe a auto-estima), é insuscetível de prova: conforme o Ministro Francisco Rezek advertiu no julgamento do RE n°. 99.501 pelo Supremo Tribunal Federal, exigência nesse sentido acarreta "(...) um conceito abstruso e contaminado de dano moral", porque "(...) não comporta prova individualizada e muito menos reclama reflexos patrimoniais (...)" (Cf. Supremo Tribunal Federal. Revista Trimestral de Jurisprudência. Brasília: Imprensa Nacional, vol. 109, nº 2, p. 00744).

Nesse passo, convém também registrar, para evitar equívocos desnecessários por parte da recorrida, que a valoração do dano moral nada tem que ver com o prejuízo financeiro, porquanto não mais subsiste, no Brasil, a jurisprudência restritiva que vinculava essa espécie de dano à diminuição patrimonial (cf., dentre outros, RE nº. 215.984, relator Ministro Carlos Velloso, em "DJU" de 28-06-2002, p. 00143; e RE nº. 222.795, relator o Ministro Néri da Silveira, em "DJU" de 24-05-2002, p. 00069): entre nós, conforme arremate de Pedro Frederico Caldas, foram "Superadas as dúvidas e vacilações quanto à possibilidade de indenização do dano moral puro (...)" (Cf. CALDAS. Pedro Frederico. Vida Privada, Liberdade de Imprensa e Dano Moral. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 130).

Como corolário, sopesando a gravidade do dano moral sofrido pelo recorrente, a natureza pedagógica e repressivo-compensatória do instituto e os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, dou provimento ao recurso ordinário, no particular, para condenar a recorrida ao pagamento da indenização correspondente a R$5.000,00 (cinco mil reais).

Por outro lado, o inconformismo do recorrente é também procedente no pertinente ao pedido de pagamento de horas extraordinárias, repercussões, domingos e feriados, porque a recorrida não comprovou os respectivos pagamentos -- sendo irrelevante, portanto, o fato de ele não haver comprovado a irrealidade dos horários de trabalho descritos nos respectivos controles.

De fato, além de a recorrida não haver demonstrado o fato extintivo a que fez alusão na contestação (refiro-me ao pagamento das "horas suplementares"), era comum a extrapolação da duração semanal de quarenta e quatro horas de serviço, conforme se verifica dos documentos às fls. 235/88.

Demais, na hipótese em apreciação, não existia autorização normativa para compensação anual de horas extraordinárias: conforme a recorrida reconheceu na contestação, por meio de negociação coletiva, estabeleceu-se que seriam horas suplementares as excedentes das quarenta e quatro horas semanais (fl. 103).

Convém salientar, aliás, que não houve a concessão de folgas compensatórias do trabalho em todos os domingos e feriados -- fato que se constata não só dos controles de horários de trabalho (fls. 248/9, por amostragem), mas também da prova testemunhal, pois "era muito raro receber folgas compensatórias" (fl. 301).

Com essas considerações, dou provimento parcial ao recurso ordinário, para incluir na condenação os valores correspondentes a indenização de dano moral (cinco mil reais), indenização de aviso prévio, frações de férias e 13º salário (um duodécimo de cada), multa de 40% sobre o montante atualizado dos depósitos do FGTS, indenização do seguro desemprego (Súmula nº 389, item II, do TST), horas extraordinárias (excedentes das quarenta e quatro horas semanais), repercussões (postuladas na inicial), domingos e feriados (não compensados), e arbitrar esse acréscimo em R$20.000,00 (vinte mil reais) e o valor das custas complementares em R$400,00 (quatrocentos reais): é como voto.

ACORDAM os Desembargadores da Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Sexta Região, por unanimidade, dar provimento parcial ao recurso ordinário, para incluir na condenação os valores correspondentes a indenização de dano moral (cinco mil reais), indenização de aviso prévio, férias e 13º salário (um duodécimo de cada), multa de 40% sobre o montante atualizado dos depósitos do FGTS, indenização do seguro desemprego (Súmula nº 389, item II, do TST), horas extraordinárias (excedentes das quarenta e quatro horas semanais), repercussões (postuladas na inicial), domingos e feriados (não compensados), e arbitrar esse acréscimo em R$20.000,00 (vinte mil reais) e o valor das custas complementares em R$400,00 (quatrocentos reais).

Recife, 10 de junho de 2010.

Nelson Soares Júnior - Desembargador relator.




JURID - Rescisão contratual indireta. Ato lesivo. Superior. [15/07/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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