Jurisprudência Tributária
Tributário. Militares inativos. Contribuição. Lei n.º 3.675/60. Emendas Constitucionais n.º 20/98 e 41/03.
Tribunal Regional Federal - TRF4ªR
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2009.72.04.000330-7/SC
RELATOR: Des. Federal OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA
APELANTE: UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO: Procuradoria-Regional da Fazenda Nacional
APELADO: CARLOS AQUES
ADVOGADO: Enderson Luiz Vidal
REMETENTE: JUÍZO FEDERAL DA 01A VF E JEF CRIMINAL DE CRICIÚMA
EMENTA
TRIBUTÁRIO. MILITARES INATIVOS. CONTRIBUIÇÃO. LEI N.º 3.675/60. EMENDAS CONSTITUCIONAIS N.º 20/98 E 41/03.
1. O instituto da pensão por morte tem íntima relação com os militares. Basicamente, surgiu para amenizar os efeitos socioeconômicos das guerras sobre as famílias daqueles que combatiam. O tratamento diferenciado dos militares, portanto, tem sua origem que remonta a período anterior à própria concepção de previdência social.
2. Os militares inativos, diferentemente dos servidores civis, sempre contribuíram para a manutenção da sua previdência, conforme regras próprias e específicas. Aliás, a partir do momento em que a sociedade brasileira passou a discutir sobre a reforma da Previdência, ficou evidente que há, ao lado da Previdência Social dos trabalhadores e servidores públicos, duas categorias diferenciadas: magistrados e militares.
3. Ao contrário dos servidores públicos federais e dos trabalhadores da iniciativa privada, o militar nunca contribuiu para a sua aposentadoria, pois tal benefício inexiste na lei castrense. Ele sempre contribuiu apenas para a pensão militar, destinada a seus beneficiários. Assim, mesmo quando o militar passa à inatividade remunerada (por tempo de serviço ou decorrente de incapacidade física) continua contribuindo para a pensão militar, antigo montepio militar, criado há mais de um século pelo Decreto n.º 695/1890.
4. O regime especial dos militares, destarte, consolida-se em legislação infraconstitucional específica, não havendo qualquer ofensa ao princípio da isonomia.
5. O § 9º do art. 42 da Constituição Federal de 1988, em sua redação originária, recepcionou a sistemática própria e infraconstitucional (Lei n.º 3.765/60) quanto ao regime da pensão militar. Nesse sentido, conclui-se, também, que o sistema de cobrança regido pela Lei n.º 3.765/60 é compatível com o § 5º do art. 34 do ADCT, isto é, não ofendeu a nova sistemática constitucional, a qual, continuou remetendo a disciplina da matéria à seara infraconstitucional.
6. A partir da Emenda Constitucional n.º 03/93, todas as reformas constitucionais tiveram o objetivo de clarear a diferença entre os regimes dos servidores públicos latu sensu, isto é, ressaltaram a particularidade do sistema previdenciário dos militares. Elas afloraram a regra de que os militares inativos sempre tiveram que contribuir para financiamento das pensões militares.
7. Os militares possuem um regime previdenciário diferenciado, isso porque, em face das peculiaridades da carreira militar, a Emenda Constitucional n.º 18/98 os excluiu do gênero "servidores públicos", que até então abrangia as espécies servidores civis e militares. Assim, os militares passaram a constituir um conjunto diferenciado de agentes públicos, que se divide em militares das Forças Armadas (art. 142, § 3º) e militares dos demais entes federados (art. 42). As Emendas Constitucionais n.º 20, 41 e 47 não alteraram tal "divisão" operada pela Emenda Constitucional n.º 18/98, de modo que, hoje, os militares não estão sujeitos, a não ser de forma subsidiária, às regras de passagem para a inatividade destinadas aos servidores civis.
8. Os servidores militares, diferentemente dos civis, sempre contribuíram para o custeio de seu sistema previdenciário, o qual possui regras próprias e especiais. Na realidade, a contribuição para a pensão militar exigida mediante descontos em seus vencimentos, tem por finalidade e destinação a promoção e manutenção das pensões, não havendo, portanto, razão ao pleito dos autores para afastar essa hipótese, em face de sua previsão legal, nos termos do art. 3º-A da Lei n.º 3.765/60, que legitima a cobrança da referida contribuição, com alíquota de 7,5% (sete e meio por cento), a incidir sobre os proventos dos inativos.
9. Posteriormente, a Medida Provisória n.º 2.131/00, ao reestruturar as parcelas constantes dos proventos dos servidores, não provocou ofensa ao direito adquirido ou ao princípio da irredutibilidade de vencimentos, ainda que tenha majorado a alíquota de contribuição, uma vez que com esta houve uma majoração sensível do soldo de base.
10. É infundada qualquer alegação de tratamento isonômico entre o regime militar e outros regimes previdenciários. Cada regime tem suas características próprias e, por isso, merecem tratamento diferenciado.
11. A contribuição disciplinada pela Lei n.º 3.765/60 tem caráter atuarial. Antes da Constituição Federal de 1988, a pensão militar correspondia a 20 vezes o valor da contribuição. Após, ela passou a corresponder à totalidade dos vencimentos do militar. Assim, plenamente justificável o aumento da alíquota da contribuição, consoante a Medida Provisória n.º 2.215/01, sob pena de desequilíbrio atuarial e, por conseguinte, quebra do sistema.
12. Tendo em vista o resultado do julgamento, inverto os ônus sucumbenciais, condenando a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, restando suspensa a sua exigibilidade em face da concessão da AJG.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da União e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 29 de junho de 2010.
Desembargador Federal Otávio Roberto Pamplona
Relator
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Documento eletrônico assinado digitalmente por Desembargador Federal Otávio Roberto Pamplona, Relator, conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, e a Resolução nº 61/2007, publicada no Diário Eletrônico da 4a Região nº 295 de 24/12/2007. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://www.trf4.gov.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 3496321v2 e, se solicitado, do código CRC F0D78BDE.
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Data e Hora: 29/06/2010 18:19:34
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2009.72.04.000330-7/SC
RELATOR: Des. Federal OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA
APELANTE: UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO: Procuradoria-Regional da Fazenda Nacional
APELADO: CARLOS AQUES
ADVOGADO: Enderson Luiz Vidal
REMETENTE: JUÍZO FEDERAL DA 01A VF E JEF CRIMINAL DE CRICIÚMA
RELATÓRIO
Adoto o relatório da sentença:
"Trata-se de ação ordinária ajuizada por Carlos Aques, objetivando a condenação da ré à devolução dos valores pagos a título de contribuição previdenciária a partir de janeiro de 2004, nos percentuais de 7,5% e 1,5%, incidentes sobre os valores que excederem o limite máximo para o valor dos benefícios do regime geral de previdência social, preservada a base de cálculo prevista no art. 10 da Medida Provisória nº 2.215-10/2001. Ao final, pleiteou a procedência da ação, a condenação da ré ao pagamento das custas processuais, dos honorários advocatícios e a concessão da assistência judiciária gratuita. Juntou documentos nas fls. 12-19.
Deferido o benefício da assistência judiciária gratuita (fl. 21).
Citada, a União apresentou contestação (fls. 25-32), na qual, em síntese, aduziu (a) ocorrência da prescrição, uma vez que a demanda foi ajuizada sob a vigência da LC nº 118/05 e (b) legalidade e constitucionalidade da contribuição para a pensão militar em comento, tendo em vista que os servidores públicos estão submetidos a regime próprio e à legislação específica, não se aplicando à espécie o estabelecido na EC nº 41/2003. Por fim, requereu a improcedência da ação.
Manifestação à contestação nas fls. 36-40, onde o autor rebateu os argumentos da ré e reforçou os pontos suscitados na exordial. Juntou documentos nas fls. 41-66."
Sobreveio sentença que, afastando a prejudicial de prescrição, JULGOU PROCEDENTES os pedidos iniciais, com fulcro no artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, para condenar a parte ré a devolver os valores descontados a título de contribuição previdenciária, nos percentuais de 7,5% (sete vírgula cinco por cento) e 1,5% (um vírgula cinco por cento), incidentes sobre os proventos inferiores ao limite máximo estabelecido para o valor dos benefícios do regime geral de previdência social, ocorridos a partir da entrada em vigor das alterações trazidas pela Emenda Constitucional nº 41/2003 (19-12-2003).
Irresignada, apelou a União defendendo a extinção do direito de pleitear a restituição de valores recolhidos a mais de cinco anos contados da data do ajuizamento da ação. Sustenta ser devida a contribuição porque os militares estão sujeitos a regime especial, consolidado na legislação infraconstitucional autorizada pelo parágrafo 9º do artigo 42 da CF em sua redação original, e, posteriormente, após a EC 18/98, pelo inciso X do parágrafo 3º do artigo 142 da Constituição Federal, que continua recepcionando a Lei 3.765/60. Afirma que, a EC 41/03 em nada alterou o regime de previdência dos militares, que não se incluem no gênero de servidores públicos cujo regime jurídico é estabeleceido nos artigos 39 a 41 da CF, não havendo qualquer violação ao art. 5º da CF.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Prescrição
A contribuição objeto do caso sub judice está submetida ao regime de lançamento por homologação e não ao de ofício, isso porque o lançamento é competência administrativa específica, a qual, não havendo previsão expressa na legislação, permanece, no âmbito da União, no Ministério da Fazenda, órgão encarregado da política, administração, fiscalização e arrecadação tributária e aduaneira, como previsto, entre outros, no Decreto n.º 3.366/00, editado pelo Presidente da República com base nos incisos IV e VI do art. 84 da Constituição Federal. Assim, ao reter a contribuição, os agentes administrativos militares apenas cumprem a regulamentação aplicável ao tributo em questão, pois, nos termos dos arts. 81 da Lei n.º 5.787/72 e 14 do Decreto n.º 92.512/86, dispositivos que regeram a matéria no período controvertido, os Ministérios militares não participam da relação jurídico-tributária nem detêm competência regulamentar no que se refere à contribuição em causa, não estando incumbidos da administração tributária.
Dessa forma, conclui-se que a matéria é regulada pelo disposto no art. 150 do CTN.
Pois bem, com o advento da Lei Complementar n.º 118/05, a qual introduziu em nosso sistema tributário regra de interpretação com eficácia retroativa, o termo inicial do prazo para a propositura de ação judicial visando à restituição ou à compensação de tributos sujeitos a lançamento por homologação recolhidos indevidamente passou a ser a data do pagamento antecipado do tributo (arts. 3º e 4º).
Nada obstante, por ocasião do julgamento do Incidente de Inconstitucionalidade na Apelação Cível n.º 2004.72.05.003494-7/SC, em que foi relator o eminente Des. Federal Antônio Albino Ramos de Oliveira, cuja decisão foi publicada no Diário Eletrônico de 29-11-2006, este Tribunal, por sua Corte Especial, concluiu pela inconstitucionalidade da expressão "observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, I, da Lei n.º 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional", constante do art. 4º, segunda parte, da Lei Complementar n.º 118/05.
Assim, restou sedimentado que, nas demandas ajuizadas até 08-06-2005, incide a regra dos "cinco mais cinco" para a restituição de tributo sujeito ao lançamento por homologação (art. 150, § 4º c/c o art. 168, I, do CTN), ou seja, de dez anos a contar do fato gerador.
Para as ações ajuizadas após o término da vacatio legis da referida lei complementar, no entanto, o prazo prescricional de cinco anos conta-se da data do pagamento antecipado do tributo (art. 150, § 1º e 168, inciso I, ambos do CTN, c/c art. 3º da Lei Complementar n.º 118/05).
Não se desconhece, por certo, o entendimento adotado pela Corte Especial do Colendo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do AI nos Embargos de Divergência em REsp n.º 644.736/PE, ocorrido em 06-06-2007, cujo acórdão foi publicado em 27-08-2007, o qual difere daquele adotado pela Corte Especial deste Tribunal apenas no que concerne à aplicação de regra de direito intertemporal segundo a qual "o termo inicial do novo prazo será o da data da vigência da lei que o estabelece, salvo se a prescrição (ou, se for o caso, a decadência ), iniciada na vigência da lei antiga, vier a se completar, segundo a lei antiga, em menos tempo".
Todavia, existindo precedente desta Corte a respeito da matéria, conforme referido anteriormente, tal decisão vincula os seus membros relativamente à questão nele debatida, nos termos do art. 151 do Regimento Interno, devendo prevalecer sobre qualquer outro, exceto do Pretório Excelso.
Dessa forma, tendo a ação sido ajuizada em 17.02.09, encontra-se fulminada a pretensão da parte autora de discutir os recolhimentos efetuados anteriormente a 17.02.04.
Da Contribuição Previdenciária - Lei 3.765/60
Controverte-se nos presentes autos acerca do direito da parte autora à restituição dos valores descontados de seus proventos a título de contribuição previdenciária, nos percentuais de 7,5% e 1,5%, incidentes sobre os proventos inferiores ao limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral da previdência a partir da entrada em vigor da EC/41, de 31.12.03.
De início, cumpre registrar que esta Turma vinha julgando no sentido da invalidade da alteração do art. 3.º da Lei n.º 3.675/60, promovida pela Medida Provisória n.º 2.215-10/01, pelos fundamentos constantes, dentre outros, no Agravo de Instrumento n.º 2004.04.01.020851-8/RS, de relatoria do Juiz Federal Márcio Antônio Rocha.
Todavia, tal entendimento foi alterado, passando-se a adotar a atual orientação do egrégio Superior Tribunal de Justiça.
A título ilustrativo, cito o julgado no Mandado Segurança n.º 7.842/DF - Rel. Min. Eliana Calmon - 20-09-04 - 1.ª Seção, que restou assim ementado:
ADMINISTRATIVO - MILITARES - SISTEMA PREVIDENCIÁRIO ESPECIAL - MAJORAÇÃO DE ALÍQUOTA: MP 2.131/2000 - ADEQUAÇÃO DO MANDADO DE SEGURANÇA - LEGITIMIDADE PASSIVA. 1. Não cabe manado de segurança contra lei em tese, mas é pertinente o uso da via mandamental contra lei de feito concreto, aplicável independentemente de ato administrativo posterior. 2. A impetração tem como alvo norma de caráter geral que atinge a categoria, devendo dirigir-se contra quem tem o poder de ordenar sua aplicação. 3. O regime previdenciário dos militares sempre foi alimentado pela contribuição dos inativos, o que não se alterou com a EC 20/98, mantido o regime especial de previdência para a categoria (Lei 3.765/60. Art. 3º). 4. Majoração de alíquota que se compatibiliza com o sistema especial. 5. Segurança denegada. (grifo nosso)
Naquela ocasião, a eminente Ministra-Relatora Eliana Calmon assim se manifestou, in verbis:
"Os servidores militares na inatividade, diferentemente dos servidores civis, sempre contribuíram para a manutenção da sua previdência, que tem regras próprias e específicas. Aliás, a partir do momento em que a sociedade brasileira passou a discutir sobre a reforma da Previdência, ficou evidente que há, ao da Previdência Social dos trabalhadores e servidores públicos, duas categorias diferenciadas: magistrados e militares.
O entendimento esboçado pelos litigantes quando do advento da EC 20/98, que, na visão dos mesmos, estabeleceu uma unidade no regime previdenciário, é um equívoco, porque se assim fosse, cairiam por terra todas as leis especiais que regem a matéria, como por exemplo o Decreto 695/90, que vige até hoje e regula o montepio da família militar, ou a Lei 3.765/60, que dispõe, de forma absolutamente diferenciada, sobre as pensões militares.
Essas normas continuam em vigência, exatamente porque não houve alteração alguma com a edição da EC 20/98.
Assim sendo, ao advento da MP 2.131/2000 e da mesma norma que tomou o número 2.215, em 31/8/2001, foi a majoração de alíquota, constante do art. 10, que alterou a redação do art. 3º da Lei 3.765/60 (...)."
Na mesma oportunidade, pronunciou-se o eminente Ministro Franciulli Netto:
"Não prospera a assertiva dos impetrantes no sentido de que a Emenda Constitucional n. 20/98, que alterou a redação do artigo 201 da Constituição Federal, aplica-se também aos militares, de forma que a contribuição só incidiria sobre a remuneração dos militares do serviço ativo.
Com efeito, os militares não se vinculam ao Regime Geral de Previdência Social, aplicado aos servidores civis, mas têm previdência própria, permanecendo em vigência as leis especiais que regem a matéria, como a Lei n. 3.765/60, que dispõe sobre as pensões militares. Dessa forma, a majoração da pensão militar não importa em violação à Emenda Constitucional n. 20/98."
De fato, não há inconstitucionalidade na cobrança da contribuição previdenciária prevista na Lei n.º 3.765/60, seja na forma original, seja após a reestruturação provocada pela Medida Provisória n.º 2.215-10/01. Para entendermos esta conclusão, calha traçar uma análise histórico-legislativa sobre a matéria.
Mauro Ribeiro Borges (in Previdência Funcional. Curitiba, Juruá, 2006, p. 167 e ss.) afirma que, no regime funcional (servidores públicos), a instituição da pensão por morte precedeu a da própria aposentadoria, isso porque era comum que os Estados atribuíssem uma renda vitalícia às esposas de oficiais, soldados e servidores mais graduados, e, como se sabe, abstraídas essas possibilidades, o comum era que, na ausência do trabalhador, sua família ou dependentes fossem relegados a sua própria sorte.
A maioria dos servidores públicos civis, ao serem inativados, permaneciam na folha de pagamento dos respectivos entes federados, porque não havia, após o óbito, qualquer garantia de subsistência para sua dependentes. Diante dessa realidade no Brasil, foram constituídas, a partir da primeira metade do século XX, as chamadas Caixas de Assistência, que desaguaram nos Institutos de Previdência e Assistência, cuja atribuição era, numa concepção contributiva, a concessão e manutenção, em favor de dependentes dos servidores, da pensão por morte.
No Regime Geral, como o trabalhador, ao perder sua capacidade produtiva era demitido, não mais permanecendo na folha de pagamento de seu empregador, subsistia a necessidade de se ter um mecanismo destinado à minimização dos efeitos socioeconômicos desse evento, bem como daqueles decorrentes de seu óbito. Assim, a estruturação das Caixas de Assistência e Pensão, que desaguaram nos Institutos de Pensão e Aposentadoria, também tinha, na sua origem, a obrigação de concessão da aposentadoria. De qualquer modo, o foco central daquelas Caixas e Institutos era a concessão da pensão por morte, uma vez que a expectativa de sobrevida do trabalhador era muito exígua.
Do exposto, constata-se que o instituto da pensão por morte tem íntima relação com os militares. Basicamente, surgiu para amenizar os efeitos socioeconômicos das guerras sobre as famílias daqueles que combatiam.
O tratamento diferenciado dos militares, portanto, tem sua origem que remonta a período anterior à própria concepção de previdência social.
Nesse termos, os militares inativos, diferentemente dos servidores civis, sempre contribuíram para a manutenção da sua previdência, conforme regras próprias e específicas. Aliás, a partir do momento em que a sociedade brasileira passou a discutir sobre a reforma da Previdência, ficou evidente que há, ao lado da Previdência Social dos trabalhadores e servidores públicos, duas categorias diferenciadas: magistrados e militares. A toda evidência, portanto, não merece acolhida a insurgência dos recorrentes, que vislumbram ofensa ao princípio da isonomia.
De fato, ao contrário dos servidores públicos federais e dos trabalhadores da iniciativa privada, o militar nunca contribuiu para a sua aposentadoria, pois tal benefício inexiste na lei castrense. Ele sempre contribuiu apenas para a pensão militar, destinada a seus beneficiários. Assim, mesmo quando o militar passa à inatividade remunerada (por tempo de serviço ou decorrente de incapacidade física) continua contribuindo para a pensão militar, antigo montepio militar, criado há mais de um século pelo Decreto n.º 695/1890.
O regime especial dos militares, destarte, consolida-se em legislação infraconstitucional específica.
A Constituição Federal de 1988, em sua redação original, ao tratar da Ordem Social, estabeleceu um regime de previdência social financiado, entre outras fontes, por trabalhadores, vedando expressamente a contribuição incidente sobre aposentadorias (art. 195, II, da CF). Reforçou a linha de princípio adotada ao garantir o mesmo regime de previdência contributiva aos servidores titulares de cargos efetivos (art. 40, caput, da CF). Restou omissa, entretanto, em relação à previdência dos militares. Estes foram considerados servidores públicos na acepção ampla do termo, cidadãos que desenvolvem atividade de interesse público e que têm parte da sua remuneração destinada ao custeio da previdência, exatamente como os servidores civis. Em específico quanto aos militares, dispôs, em seu artigo 42, da seguinte forma:
Art. 42. São servidores militares federais os integrantes das Forças Armadas e servidores militares dos Estados, Territórios e Distrito Federal os integrantes de suas polícias militares e de seus corpos de bombeiros militares.
§ 1º - As patentes, com prerrogativas, direitos e deveres a elas inerentes, são asseguradas em plenitude aos oficiais da ativa, da reserva ou reformados das Forças Armadas, das polícias militares e dos corpos de bombeiros militares dos Estados, dos Territórios e do Distrito Federal, sendo-lhes privativos os títulos, postos e uniformes militares.
§ 2º - As patentes dos oficiais das Forças Armadas são conferidas pelo Presidente da República, e as dos oficiais das polícias militares e corpos de bombeiros militares dos Estados, Territórios e Distrito Federal, pelos respectivos Governadores.
§ 3º - O militar em atividade que aceitar cargo público civil permanente será transferido para a reserva.
§ 4º - O militar da ativa que aceitar cargo, emprego ou função pública temporária, não eletiva, ainda que da administração indireta, ficará agregado ao respectivo quadro e somente poderá, enquanto permanecer nessa situação, ser promovido por antigüidade, contando-se-lhe o tempo de serviço apenas para aquela promoção e transferência para a reserva, sendo depois de dois anos de afastamento, contínuos ou não, transferido para a inatividade.
§ 5º - Ao militar são proibidas a sindicalização e a greve.
§ 6º - O militar, enquanto em efetivo serviço, não pode estar filiado a partidos políticos.
§ 7º - O oficial das Forças Armadas só perderá o posto e a patente se for julgado indigno do oficialato ou com ele incompatível, por decisão de tribunal militar de caráter permanente, em tempo de paz, ou de tribunal especial, em tempo de guerra.
§ 8º - O oficial condenado na justiça comum ou militar a pena privativa de liberdade superior a dois anos, por sentença transitada em julgado, será submetido ao julgamento previsto no parágrafo anterior.
§ 9º - A lei disporá sobre os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do servidor militar para a inatividade.
§ 10 - Aplica-se aos servidores a que se refere este artigo, e a seus pensionistas, o disposto no art. 40, §§ 4º e 5º (grifo meu)
Percebe-se que é clara a redação do dispositivo (§ 9º) que recepcionou a sistemática própria e infraconstitucional (Lei n.º 3.765/60) quanto ao regime da pensão militar. No que se relaciona ao tipo de lei (ordinária ou complementar), cabe, aqui, aplicar a interpretação clássica dada pelo STF de que "quando a CF não expressa literalmente a necessidade de lei complementar, em regra, é exigida lei ordinária". Disse-se em regra, porque às vezes o constituinte erroneamente emprega o termo, o que se corrige com uma interpretação sistêmica. Não é o caso em análise, pois a interpretação sistêmica reforça a necessidade de lei ordinária apenas. Logo, descabe aduzir, como fazem os apelantes, contrariedade à mens legis, apurável "pela interpretação integrativa dos textos constitucionais com o princípio da igualdade".
Nesse sentido, conclui-se, também, que o sistema de cobrança regido pela Lei n.º 3.765/60 é compatível com o § 5º do art. 34 do ADCT, isto é, não ofendeu a nova sistemática constitucional, a qual, gize-se, continuou remetendo a disciplina da matéria à seara infraconstitucional.
A partir da Emenda Constitucional n.º 03/93, todas as reformas constitucionais sobre o ponto tiveram o objetivo de clarear a diferença entre os regimes dos servidores públicos latu sensu, isto é, ressaltaram a particularidade do sistema previdenciário dos militares. Elas afloraram a regra de que os militares inativos sempre tiveram que contribuir para financiamento das pensões militares.
O já citado autor Mauro Ribeiro Borges (in Previdência Funcional. Curitiba, Juruá, 2006, p. 102 e ss.) afirma que o regime de previdência dos militares ainda está contido no regime funcional de previdência social dos servidores, consoante art. 3º da Lei n.º 9.717/98. Todavia, os militares possuem um regime diferenciado, isso porque, em face das peculiaridades da carreira militar, a Emenda Constitucional n.º 18/98 os excluiu do gênero "servidores públicos", que até então abrangia as espécies servidores civis e militares. Assim, os militares passaram a constituir um conjunto diferenciado de agentes públicos, que se divide em militares das Forças Armadas (art. 142, § 3º) e militares dos demais entes federados (art. 42).
Tal autor afirma não terem as emendas constitucionais de n.º 20, 41 e 47 alterado tal "divisão" operada pela Emenda Constitucional n.º 18/98, de modo que, hoje, os militares não estão sujeitos, a não ser de forma subsidiária, às regras de passagem para a inatividade destinadas aos servidores civis.
Aos militares das Forças Armadas, a Emenda Constitucional n.º 20/98 determinou, mediante alteração do inc. IX do § 3º do art. 142 da Constituição Federal de 1988, a aplicação do contido no § 9º do art. 40, ou seja, o aproveitamento do tempo de serviço ou contribuição federal, estadual ou municipal, para efeitos de aposentadoria e disponibilidade. Determinou, ainda, que se aplicassem a esse conjunto as regras insertas no art. 142, §§ 2º e 3º da Constituição Federal, ressalvando que lei estadual dispusesse sobre as matérias contidas no inc. X do § 3º do art. 142, isto é, sobre as condições de passagem para inatividade. Por fim, alterando o § 2º do art. 42, determinou que se aplicasse aos militares dos Estados, Distrito Federal e Território as regras contidas nos §§ 7º e 8º do art. 40 da Constituição Federal.
A Emenda Constitucional n.º 41 voltou a alterar a redação do art. 42 da Constituição Federal de 1988, oportunidade em que o constituinte derivado optou por excluir do § 2º daquele dispositivo o comando de aplicabilidade, aos militares estaduais, dos §§ 7º e 8º do art. 40, determinando que se aplique aos pensionistas dos militares estaduais, o que for determinado em lei específica de cada um dos entes federados.
Assim, conforme se depreende, não se verifica qualquer ofensa ao princípio da igualdade. Ora, os servidores militares, diferentemente dos civis, sempre contribuíram para o custeio de seu sistema previdenciário, o qual possui regras próprias e especiais. Na realidade, a contribuição para a pensão militar exigida mediante descontos em seus vencimentos, tem por finalidade e destinação a promoção e manutenção das pensões, não havendo, portanto, razão ao pleito dos autores para afastar essa hipótese, em face de sua previsão legal, nos termos do art. 3º-A da Lei n.º 3.765/60, que legitima a cobrança da referida contribuição, com alíquota de 7,5% (sete e meio por cento), a incidir sobre os proventos dos inativos.
Por tudo que foi exposto, revela-se infundada a tese de tratamento isonômico entre o regime militar e outros regimes previdenciários, com a qual o autor pretende afastar a incidência da contribuição sub judice. A fim de evidenciar com maior clareza tal situação, cumpre elencar, a título de exemplo, algumas diferenças consideráveis entre o regime dos servidores federais (civis) e o dos militares:
a) o militar passa para a inatividade com proventos integrais, aos 30 anos de serviço (art. 50, inciso II, da Lei n.º 6.880/80), independentemente de idade; o servidor público precisa contribuir por 35 anos, além de se aposentar com 60 ou 55 anos (dependendo do sexo);
b) os militares somente passam a contribuir para a pensão depois de completar 2 anos de serviço (art. 1º, b, da Lei n.º 3.765/60); o servidor civil contribui para a previdência desde a sua admissão no serviço público;
c) os militares contribuíam, antes da Medida Provisória n.º 2.215/01, com apenas dois dias de soldo; os servidores civis sempre contribuíram sobre toda a remuneração;
d) com as alterações de tal Medida Provisória, os militares passaram a contribuir sobre toda a remuneração. Antes disso, ao passarem para a reserva, recebiam proventos sem que ao longo da carreira tivessem contribuído para o regime previdenciário, que jamais existiu no tocante aos militares. A contribuição de dois dias do soldo para a pensão militar tinha natureza diversa, seu objetivo era deixar o benefício da pensão aos dependentes do militar, correspondente a um posto acima ou dois postos acima do militar quando da ativa, conforme o tempo de serviço;
e) assim, os servidores civis sempre contribuíram para o regime previdenciário para poderem se aposentar com proventos integrais; o militar, ao contrário, passava para a inatividade recebendo proventos sem qualquer contribuição para este fim.
Outro ponto importante ainda a ressaltar é o caráter atuarial da contribuição disciplinada pela Lei n.º 3.765/60. Antes da Constituição Federal de 1988, a pensão militar correspondia a 20 vezes o valor da contribuição. Após, ela passou a corresponder à totalidade dos vencimentos do militar. Destarte, mostra-se justificável o aumento da alíquota da contribuição, consoante a Medida Provisória n.º 2.215/01, sob pena de desequilíbrio atuarial e, por conseguinte, quebra do sistema.
Conclusão:
Merece, pois, ser reformada a sentença para julgar improcedentes os pedidos.
Em face da decisão supra, inverto os ônus sucumbenciais e condeno a parte autora a arcar com o pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que, dada a singeleza da demanda e tendo em vista que a atuação da ré resumiu-se à contestação e apelação, arbitro em R$1.000,00, corrigidos pelo IPCA-e, restando suspensa a sua exigibilidade em face da concessão da AJG.
Junte-se aos autos cópia do inteiro teor da Arguição de Inconstitucionalidade na Apelação Cível n.º 2004.72.05.003494-7/SC, inclusive dos embargos de declaração contra ela opostos.
Dispositivo:
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da União e à remessa oficial.
Desembargador Federal Otávio Roberto Pamplona
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/06/2010
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2009.72.04.000330-7/SC
ORIGEM: SC 200972040003307
RELATOR: Des. Federal OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA
PRESIDENTE: LUCIANE AMARAL CORREA MÜNCH
PROCURADOR: Dr(a)LUIZ CARLOS WEBER
APELANTE: UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO: Procuradoria-Regional da Fazenda Nacional
APELADO: CARLOS AQUES
ADVOGADO: Enderson Luiz Vidal
REMETENTE: JUÍZO FEDERAL DA 01A VF E JEF CRIMINAL DE CRICIÚMA
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/06/2010, na seqüência 128, disponibilizada no DE de 18/06/2010, da qual foi intimado(a) UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL), o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 2ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA UNIÃO E À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO: Des. Federal OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA
VOTANTE(S): Des. Federal OTÁVIO ROBERTO PAMPLONA
: Des. Federal LUCIANE AMARAL CORRÊA MÜNCH
: Juiza Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
MARIA CECÍLIA DRESCH DA SILVEIRA
Diretora de Secretaria
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JURID - Tributário. Militares inativos. Contribuição. [23/07/10] - Jurisprudência
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