Pedido de demissão. Empregado com mais de um ano de trabalho. Inexistência de assistência sindical ou ministerial.
Tribunal Regional do Trabalho - TRT6ªR
PROC. Nº TRT- 0214500-61.2008.5.06.0181.
ÓRG. JULGADOR: PRIMEIRA TURMA.
RELATOR: DESEMBARGADOR NELSON SOARES JÚNIOR.
RECORRENTES: JOSÉ CICINATO DA SILVA FILHO E GUGEL E PESSOA LTDA.
RECORRIDO: OS MESMOS.
ADVOGADOS: MARISTELA RAMOS DE SOUZA E CHARLES ROGER ARAÚJO VIERIA.
PROCEDÊNCIA: VARA DO TRABALHO DE IGARASSU(PE).
EMENTA: PEDIDO DE DEMISSÃO. EMPREGADO COM MAIS DE UM ANO DE TRABALHO NA EMPRESA. INEXISTÊNCIA DE ASSISTÊNCIA SINDICAL OU MINISTERIAL. NULIDADE ABSOLUTA. Mesmo que a assinatura constante do pedido de demissão pertencesse ao reclamante (fato que não há possibilidade de afirmar em razão da contestação e da ausência de prova), o ato seria absolutamente nulo, por força do disposto no § 1º do artigo 477 da CLT, uma vez que praticado sem a assistência do respectivo sindicato ou do Ministério do Trabalho e Emprego.
Vistos etc.
Cuida-se de recursos ordinários, interpostos respectivamente por José Cicinato da Silva Filho e pela empresa Gugel e Pessoa Ltda., por intermédio de advogados, por meio dos quais eles postulam a reforma da sentença do Excelentíssimo Juiz da Vara do Trabalho de Igarassu (PE), proferida nos autos da reclamação do primeiro recorrente, que implicou o acolhimento parcial dos pedidos.
O reclamante insurge-se não só contra a condenação ao pagamento de multa, mas também contra o indeferimento dos pedidos de pagamento de verbas rescisórias (multa de 40% sobre o montante atualizado dos depósitos do fundo de garantia do tempo de serviço - FGTS e aviso prévio) e de horas extraordinárias. Sustenta, em síntese, a inexistência de tipificação como litigante de má-fé; a ocorrência de julgamento além do pedido; a falsidade da assinatura constante do documento à fl. 71 (pedido de demissão); e a comprovação, por meio de prova testemunhal, das jornadas extravagantes descritas na petição inicial. Pede provimento do recurso pelas razões documentadas às fls. 109/13.
A reclamada, por seu turno, não se conforma com a condenação ao pagamento de multa e com o reconhecimento de tempo de serviço superior ao descrito na contestação. Afirma, em suma, que, diversamente do entendimento expressado pelo juízo de primeiro grau, não confessou nem participou de fraude contra o programa assistencial do seguro-desemprego: narrou simplesmente que o reclamante, ao postular o retorno ao trabalho, solicitou-lhe a não-anotação do contrato na CTPS pelo fato de, na época, estar recebendo aquela espécie de benefício assistencial. Salienta que o disposto no artigo 876, parágrafo único, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), não autoriza a prolação de decisão com inobservância dos limites da lide, e que o período contratual, reconhecido pelo juízo de primeiro grau, é maior que o declarado pelo reclamante na inicial. Cita jurisprudência e pede provimento do recurso pelas razões documentadas às fls. 156/60.
Contrarrazões às fls. 133/7 e 169.
Inexistindo obrigatoriedade, não determinei a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho.
É o relatório.
VOTO:
DO RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE.
O inconformismo do reclamante é procedente no concernente à condenação ao pagamento de multa, porque, não obstante haja alterado a verdade dos fatos (pois afirmou a existência de dois contratos sucessivos e a prova revelou a unidade da relação de emprego), o julgamento tipificou-se como além dos limites da lide, uma vez que o fundo de natureza contábil-financeira (Fundo de Amparo ao Trabalhador), beneficiário da supracitada multa, não é parte do processo.
Saliento que, em razão da fraude perpetrada pelas partes contra o programa assistencial do governo federal, o juízo de primeiro grau determinou a expedição de ofícios ao Ministério Público do Trabalho e ao Ministério do Trabalho e Emprego, os quais, certamente, adotarão as providências necessárias ao ressarcimento do erário e à repressão do comportamento fraudulento.
Por outro lado, o reclamante tem igualmente razão no tocante à responsabilidade da reclamada pela rescisão do contrato de trabalho, porquanto, havendo contestado a assinatura do pedido de demissão (documento juntado à fl. 71), ela não se desobrigou do respectivo ônus subjetivo da prova, a teor do disposto no artigo 389, inciso II, do Código de Processo Civil.
Aliás, em sendo certo que a relação de emprego operou no período de 1º de abril de 2005 até 30 de maio de 2008 -- lapso de tempo superior a um ano --, mesmo que a assinatura constante do documento pertencesse ao reclamante, o ato seria absolutamente nulo, por força do disposto no § 1º do artigo 477 da CLT, uma vez que praticado sem a assistência do respectivo sindicato ou do Ministério do Trabalho e Emprego.
De outra parte, o reclamante tem parcial razão no tocante ao pedido de pagamento de diferenças de horas extraordinárias, porque, consideradas as jornadas descritas na contestação pela reclamada (trabalho das segundas às sextas-feiras das 7 às 19 horas, com intervalo das 11 às 15 horas; e, aos sábados, das 7 às 11 horas), a conclusão é de que existem prestações a serem quitadas.
Com efeito, além de ser verossímil a afirmativa do reclamante de que a quantidade de horas extraordinárias era remunerada pela reclamada de forma aleatória -- pois ela não apresentou os controles para efeito de comparação --, proporcionava-lhe o gozo de intervalos de jornadas superiores ao previsto em lei -- os quais se caracterizavam como tempo à disposição do empregador, sendo suscetíveis, portanto, de remuneração como horas extraordinárias (Súmula nº 118 do TST).
Portanto, as diferenças de horas extraordinárias e as repercussões hão de ser calculadas com base nas jornadas descritas pela reclamada, na contestação, porque, diversamente do que disse o reclamante, não existe prova de jornadas das 5 às 19 horas: sequer o depoimento dele foi nesse sentido.
Dessa forma, dou provimento parcial ao recurso ordinário do reclamante, para anular a multa relativa ao FAT e incluir na condenação os valores correspondentes à indenização do aviso prévio (com o cômputo do respectivo prazo para todos os efeitos legais), à multa de 40% sobre o montante atualizado dos depósitos do FGTS, às diferenças de horas extraordinárias e às repercussões postuladas na inicial.
DO RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA.
O inconformismo da reclamada é procedente no concernente à condenação ao pagamento de multa, porque, não obstante haja alterado a verdade dos fatos (pois afirmou a existência de dois contratos sucessivos e a prova revelou a unidade da relação de emprego), o julgamento tipificou-se como além dos limites da lide, uma vez que o fundo de natureza contábil-financeira (Fundo de Amparo ao Trabalhador), beneficiário da supracitada multa, não é parte do processo.
Aliás, como o juízo de primeiro grau condenou-a, de ofício, ao recolhimento das contribuições previdenciárias incidentes "(...) sobre os salários pagos durante o período clandestino (...)", declaro, igualmente de ofício, a incompetência da Justiça do Trabalho para a respectiva execução.
Nesse sentido, para efeito de ilustração, cito o acórdão desta Primeira Turma, proferido no julgamento do processo nº TRT-01190.2007-003.06.00.3, de que fui relator, assim ementado:
"JUSTIÇA DO TRABALHO. COMPETÊNCIA PARA EXECUÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES, PARA CUSTEIO DA SEGURIDADE SOCIAL, NÃO DECORRENTES DE SENTENÇA TRABALHISTA. INEXISTÊNCIA. PRECEDENTE DO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. No julgamento do RE nº 569.056 (relator o Ministro MENEZES DIREITO) -- oportunidade em que foi aprovada a edição de súmula vinculativa sobre a matéria --, o plenário do Supremo Tribunal Federal proclamou, sem discrepância de votos, a incompetência da Justiça do Trabalho para executar contribuições para custeio da seguridade social, correspondentes a tempo de serviço clandestino, e, incidentemente, que o fato gerador é o pagamento ou o crédito da remuneração devida ao trabalhador pela prestação dos serviços, a teor do artigo 195, inciso I, letra "a", da Constituição da República. Agravo de petição parcialmente acolhido."
De outra parte, o recurso ordinário da reclamada merece também provimento no pertinente à condenação relativa à anotação da CTPS do reclamante, porque o juízo de primeiro grau, no particular, a condenou em objeto diverso daquele que lhe foi demandado (artigo 460 do CPC).
Com efeito, malgrado a declaração da unidade da relação de emprego seja uma decorrência direta da atividade cognoscitiva exercida pelo juízo de primeiro grau (e, portanto, insuscetível de qualquer limitação, uma vez que é fruto do princípio do livre convencimento motivado, positivado no artigo 131 do CPC), o mesmo não se há de dizer em relação à condenação, porque o reclamante limitou o pedido de anotação da CTPS ao período de 2 de fevereiro a 30 de maio de 2008 (fl. 6).
Com essas considerações, dou provimento ao recurso da reclamada, para anular a multa relativa ao FAT, limitar a condenação correspondente à anotação da CTPS do reclamante ao período de 2 de fevereiro a 30 de maio de 2008 e declarar, de ofício, a incompetência da Justiça do Trabalho para executar contribuições previdenciárias incidentes "(...) sobre os salários pagos durante o período clandestino": é como voto.
ACORDAM os Desembargadores da Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Sexta Região, por unanimidade, dar provimento parcial ao recurso ordinário do reclamante, para anular a multa relativa ao FAT e incluir na condenação os valores correspondentes à indenização do aviso prévio (com o cômputo do respectivo prazo para todos os efeitos legais), à multa de 40% sobre o montante atualizado dos depósitos do FGTS, às diferenças de horas extraordinárias e às repercussões postuladas na inicial -- arbitrando esse acréscimo em R$10.000,00 (dez mil reais) e o valor das custas complementares em R$200,00 (duzentos reais); e, ainda por unanimidade, dar provimento ao recurso da reclamada, para anular a multa relativa ao FAT, limitar a condenação correspondente à anotação da CTPS do reclamante ao período de 2 de fevereiro a 30 de maio de 2008 e declarar, de ofício, a incompetência da Justiça do Trabalho para executar contribuições previdenciárias incidentes "(...) sobre os salários pagos durante o período clandestino".
Recife, 1º de julho de 2010.
Nelson Soares Júnior - Desembargador relator.
JURID - Pedido de demissão. Inexistência de assistência sindical. [23/07/10] - Jurisprudência
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