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quinta-feira, 22 de julho de 2010

JURID - Habeas corpus. Tráfico internacional de animais silvestres. [22/07/10] - Jurisprudência


Habeas corpus. Prisão preventiva. Tráfico internacional de animais silvestres. Excesso de prazo.
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Tribunal Regional Federal - TRF2ªR

HABEAS CORPUS 2010.02.01.006884-4

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL MESSOD AZULAY NETO

IMPETRANTE: RENATO ANTUNES SOARES

IMPETRADO: JUIZO DA 4A. VARA FEDERAL CRIMINAL DO RIO DE JANEIRO

PACIENTE: TOMAS NOVOTNY - REU PRESO

ADVOGADO: RENATO ANTUNES SOARES

ORIGEM: QUARTA VARA FEDERAL CRIMINAL DO RIO DE JANEIRO (200951018040239)

EMENTA

HABEAS CORPUS - PRISÃO PREVENTIVA - TRÁFICO INTERNACIONAL DE ANIMAIS SILVESTRES - EXCESSO DE PRAZO.

I - O inciso LXXVIII do art. 5º da CF, inserido pela EC 45/05, eleva ao patamar de garantia fundamental a razoável duração do processo e os meios que assegurem a celeridade de sua tramitação.

II - De caráter subjetivo por excelência, os critérios utilizados para a aferição da razoabilidade e celeridade devem levar em conta as peculiaridades de cada caso;

III - Hipótese em que a atuação do ora paciente em muito difere da atuação dos demais co-réus colocados em liberdade até o momento, possuindo papel fundamental na estrutura da empreitada criminosa, se revelando vital para sua existência;

IV - Ausência de comprovação satisfatória a respeito dos meios que pretende utilizar para auferir recursos lícitos que lhe permitam se manter no país, caso seja posto em liberdade;

V - Prisão preventiva que se mantém como forma de se preservar a ordem pública.

VI - Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas:

Decide a Segunda Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, DENEGAR A ORDEM e acolher a proposta do Ministério Público Federal em sessão para se determinar o desmembramento do feito em relação ao ora paciente, para que possa se iniciar a instrução criminal em relação a ele, nos termos do Relatório e do Voto constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Rio de Janeiro, 06 de julho de 2010. (data de julgamento)

Des. Fed. MESSOD AZULAY NETO
Relator

RELATÓRIO

Trata-se de Habeas Corpus impetrado por RENATO ANTUNES SOARES em favor de TOMAS NOVOTNY, objetivando a revogação da prisão preventiva decretada em seu desfavor, em razão de operação levada a efeito pela Polícia Federal, que investiga quadrilha especializada em tráfico de animais silvestres.

Sustenta o impetrante, em síntese, a ausência dos requisitos autorizadores da custódia cautelar, bem como o excesso de prazo da custódia, aduzindo que o paciente encontra-se preso desde 11 de março de 2009, estando o feito ainda em sua fase inicial.

Acompanham a inicial os documentos de fls. 08/23.

Indeferida a liminar, foram solicitadas as informações, que vieram às fls. 33/36.

Parecer do Ministério Público Federal pelo não conhecimento do writ por falta de instrução da inicial ou, alternativamente, pela denegação da ordem (fls. 40/55).

É o relatório.

Des. Fed. MESSOD AZULAY NETO
Relator

2ª Turma Especializada

VOTO

Inicialmente, cumpre consignar que, não obstante a deficiência na instrução da inicial, as informações prestadas pela autoridade impetrada permitem a apreciação do pleito, razão pela qual deixo de acolher a manifestação do Ministério Público Federal pelo não conhecimento do writ.

Quanto ao mérito, a legalidade da prisão preventiva do paciente já foi objeto de Habeas Corpus nesta Corte, cuja ordem foi denegada em razão da necessidade de preservação da ordem pública, evitando-se a reiteração criminosa.

No que pertine à alegação de excesso de prazo, é cediço que o inciso LXXVIII do art. 5º da CF, inserido pela EC 45/05, eleva ao patamar de garantia fundamental a razoável duração do processo e os meios que assegurem a celeridade de sua tramitação.

De caráter subjetivo por excelência, os critérios utilizados para a aferição da razoabilidade e celeridade devem levar em conta as peculiaridades de cada caso.

Na presente hipótese, esta Turma, ao apreciar diversos Habeas Corpus impetrados em favor de outros co-réus, concedeu a ordem determinando a expedição de alvará de soltura, reconhecendo o desequilíbrio na equação entre o prazo da custódia cautelar e os motivos para sua manutenção.

Nestas ocasiões, restou consignado que, não obstante a inexistência de paralisação injustificável do feito, a ausência de periculosidade dos réus, e o fato de que o período em que os mesmos estiveram presos serviu para desarticular a organização criminosa, não mais autorizavam a manutenção da custódia cautelar, que já se estendia por mais de um ano.

No caso vertente, tais argumentos não socorrem ao paciente.

Sua atuação nos fatos delituosos é diversa da atuação dos demais co-réus.

Observe-se a respeito o que restou consignado no voto condutor do acórdão proferido nos autos do Habeas Corpus nº 2009.02.01.003743-2, onde se discutiu a legalidade de sua prisão preventiva:

"No que pertine à legalidade da custódia cautelar, observe-se, primeiramente, que a decisão que a decretou descreve a atuação do paciente nos seguintes termos:

"No curso das investigações foi constatado que Tomas, que atualmente reside no Brasil, é o elo entre os caçadores/comerciantes ilegais de animais silvestres localizados no Brasil, e um grupo de europeus que negociam os animais contrabandeados do Brasil na Europa.

Tomas também tem envolvimento com o tráfico internacional de seres humanos, aliciando mulheres no Brasil para prostituição da Europa."

Nas transcrições das conversas telefônicas interceptadas, revelaram-se diálogos cujos trechos a seguir transcritos são importantes para a caracterização do fumus boni iuris (fls. 80/83):

"2- Ligação do dia 28.03.2008 às 09:58:22 entre Tomas e Siomara no telefone (21) 8196-5964

(...)

S: Essa Triston e esse casal de Congo é do Carlos Serventini?

T: Sim, sim

(...)

S: Mas ele ta querendo muito dinheiro nessas Triston. Não vale, ta querendo sessenta mil (R$60.000,00)

T: Ah entendi e Congo?

S: Congo ele ta querendo dezoito mil (R$18.000,00), dezesseis, dezoito mil o casal.

T: É muito

S: É muita coisa

(...)

T: Ele me disse que foi operado do joelho e ele tem agora, depende precisa de dinheiro uma coisa. E que vendo desse cinco pássaros juntos. Dois casal, um casal Triston, um casal Congo plus mais um macho congo

S: Mas tudo bem, passa só um e-mail pra mim

(...)

Tomas - confirmamos Petrei

S: Agora a Juba eu to com dois criadouros né Tomas, eu vou fazer uma contra proposta, vou ver se melhoro o preço ta bom?

T: Olha eu te explicar uma coisa, quando sair um casal até oito mil e quinhentos é bom. Porque no nosso país vc compra com documentação onze mil quinhentos doze mil reais. Entendeu? Quando oito, oito e quinhentos a pessoa compra.

(...)."

"47- Ligação do dia 09.04.2008 às 12:14:40 entre Tomas e Siomara no telefone (21) 8196-5964 e interlocutor (11) 4436-1713

S: Deixa eu te perguntar uma coisa Londres, Frankfutr, Paris ou Milão não ta certo?

T: Não melhor não mas quando não tem jeito sim

S: Ta eu arrumei pra Londres e Frankfurt agora também arrumei pra Zurique

T: Zurique melhor

S: Zurique e também to vendo aqui agora pra Moscou ou Iugoslávia

T: Perfeito eu prefiro Zurique, Moscou ou Iugoslávia

S: Ta esses daí ta certo só te pedindo pra calcular, ver tudo direitinho, dia de saída. Ver tudo direitinho mas dá pra mandar sim.

T: OK e pergunta também quanto é o valor de...por aves ou por quilo. Como eles cobra.

S: eles cobram por metro cúbico

(...)

T:Eu vou ligar pra pessoa e mais tarde te ligo.

S:Ta então Zurique pode ser

T:E vc vai arrumar a documentação tudo né?

S:Já vi tudo disso aí. A documentação ta ok. Agora o que vai acontecer é que eu vou perder as aves se eu não pagar isso sim.

Tomas: Sim sim, ok.

(...)"

"Ligação do dia 20.01.2009 às 09:51:34h entre tomas e Paulo no telefone (21) 81873370 e interlocutor 55 00 351963260557

(...)

T: Você viu e-mail?

P; Vi sim cara. E assim, repara só. As Leari (Ave, Anadhorhyncus leari, ameaçada de extinção)..

T: Sim

P: E a guaruba (Ave, nome científico: Aratingua Garouba, ameaçada de extinção).

T: Sim.

P: è muito arriscado fazer a viagem assim, tão pequeninas e ta muito frio, é muito arriscado, entendeu?

T: Entendi. Quanto tempo vai demorar ainda?

P: Cara, que penso...não sei. Para fazer a viagem tranqüilo é preciso um mês.

T: Um mês?

P: É cara.

T:E outros? Orocoritas?

P: Tenho vinte a comer já.

T: E quanto você tem?

P: Vinte, vinte comendo.

T: Vinte?

P: Vinte, exatamente.

T:E vc quer desse 20 trocar por esse outra quer eu escrevi pra você?

P: Cara eu queria fazer a troca, mas queria fazer com as Leari, entendeu?

T: Há entendi.

(...)

T: e desses Leari? Não pode viajar, ele vai encontrar com você metade do caminho na França por exemplo.

P: Vem cá cara. Poder eu posso, o problema é que já viu se morre um pássaro desse, por que aqui a procura esta muito baix, obriga-me a fazer uma viagem com calor, entendeu? Dar papas de três em três horas é complicado, mesmo com os caras é complicado entendeu?

T:Entendi. Que você acha agora, o que vamos fazer?

P: Olha, eles não estão interessados em larocoritas?

T: Tem lógico.

(...)"

Por seu turno, já tendo sido ofertada denúncia em desfavor do ora paciente, observa-se que aquela peça, após revelar que existem várias conversas telefônicas que registram sua participação nos fatos delituosos em questão, afirma o seguinte:

"Verifica-se, portanto, do conjunto probatório formado pelas ligações telefônicas acima transcritas, bem como as seguintes, que constam do Relatório Policial, à cuja leitura ora remetemos, que TOMAS teve papel ativo no esquema, auxiliando seus comparsas a receptar e exportar animais silvestres para o exterior: Estava em constante contato com DANIEL, que o ajudava a fornecer os animais e ovos; com SIOMARA, que auxiliava a os acondicionar e a fornecer a documentação e com os estrangeiros, que levavam as aves e ovos para o exterior.

Em seu interrogatório policial, TOMAS negou comercializar animais silvestres, entretanto confirmou que faz importação e exportação de pássaros bem como tradução (português para checo e alemão) para terceiros de negócios relativos à saída e entrada de animais silvestres, tais como tartaruga, papagaio, macaco e araras, como fez para ROLAND MASSER, com quem encontrava-se num hotel em Copacabana e no Centro, tendo o acompanhado ao aeroporto, tendo ciência que, ao deixar ROLAND no aeroporto este foi preso transportando ovos raros e que seu destino seria a Suíça.

(...)Informou, ainda, que há dois anos presta apoio para comercialização de animais silvestres; que conhece SIOMARA, que foi funcionária do IBAMA e posteriormente dona de "pet shop", sem contudo ter realizado transação comercial remunerada com SIOMARA.

Tal afirmação não procede, eis que foi encontrado em sua casa um caderno contendo anotações com valores, em nome de SIOMARA. (...)"

Ao que tudo indica, a denúncia revela, ainda, que foram apreendidos na residência do paciente incubadora e instrumento para verificação de ovos, tendo o mesmo justificado que lhe teriam sido entregues por JOSEF SIN, com o objetivo de fornecer a "pet shops"."

Como se vê, a atuação do ora paciente em muito difere da atuação dos demais co-réus colocados em liberdade até o momento, em sua maioria caçadores com grau de instrução mínima, que por falta de outra oportunidade caçam passarinhos para garantir um sustento básico para a família, ou mesmo comerciantes de feiras livres. Diferentemente, o paciente possui papel fundamental na estrutura da empreitada criminosa, se revelando vital para sua existência, conforme se depreende das transcrições acima.

Assim, sua liberdade, neste momento, ainda representa risco para a ordem pública.

Outro elemento importante para a manutenção de sua segregação cautelar é o fato de que, de acordo com as informações prestadas pelo MM. Juízo impetrado, instada no curso da instrução, a defesa não logrou comprovar de forma satisfatória com que recursos lícitos pretendia o paciente subsistir no país caso fosse posto em liberdade, o que, evidentemente, indica a existência de risco para a aplicação da lei penal, bem como para a ordem pública, levando-se em consideração sua nacionalidade estrangeira e o fato de ser acusado de viver exclusivamente às custas do tráfico internacional de animais silvestres.

Assim sendo, a custódia cautelar do paciente, tal como decretada e mesmo levando-se em conta o prazo de sua duração, não padece de ilegalidade passível de ser sanada pela via do presente Habeas Corpus.

Cumpre registrar, por fim, ser inadequada a via eleita para apreciação do pedido de devolução dos computadores apreendidos, razão pela qual deixo de fazê-lo.

Por todo o exposto, DENEGO A ORDEM.

É como voto.

Des. Fed. MESSOD AZULAY NETO
Relator

2ª Turma Especializada




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