Assédio moral. Não configuração.
Tribunal Regional do Trabalho - TRT5ªR
2ª. TURMA
RECURSO ORDINÁRIO Nº 0092900-67.2009.5.05.0019RECORD
RECORRENTES: TANIA MARIA ALVES DE JESUS FRANCISCO E RICARDO ELETRO DIVINÓPOLIS LTDA.
RECORRIDOS: OS MESMOS
RELATORA: DESEMBARGADORA DALILA ANDRADE
ASSÉDIO MORAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. Não deve ser reconhecido quando a prova produzida nos autos não confirma que a reclamante estava submetida a tratamento inadequado por parte de seu superior hierárquico, nem tampouco que havia excessiva cobrança pelo cumprimento de metas ou, ainda, ameaça constante de possível despedida, capaz de causar a autora abalo psicológico.
TANIA MARIA ALVES DE JESUS FRANCISCO E RICARDO ELETRO DIVINÓPOLIS LTDA., nos autos de n.º 0092900-67.2009.5.05.0019RECORD, em que litigam entre si, inconformados com a sentença de fls. 668/674, que julgou PROCEDENTE EM PARTE a reclamação, interpõem, dentro do prazo legal, RECURSO ORDINÁRIO, pelos motivos expendidos às fls. 676/686 e 687/690, respectivamente. A autora interpõe, ainda, RECURSO ADESIVO, às fls. 696/699. Contrarrazões às fls. 700/703 e 705/712. O Ministério Público do Trabalho não exarou parecer, tendo em vista que as matérias, objeto do presente apelo, não se enquadram entre as hipóteses descritas na Lei Complementar n.º 75/93 e no Provimento n.º 01/2005 da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho que justifiquem a sua intervenção. Por fim, não foi designado Desembargador Revisor, em face da alteração do caput e do § 1º do art. 135 do Regimento Interno desta Corte, por meio da Resolução Administrativa n.º 57/2009.
É o Relatório.
VOTO
RECURSOS DA RECLAMANTE E DO RECLAMADO
Em razão da conexão das matérias, os recursos serão apreciados conjuntamente
COMISSÃO SOBRE VENDAS. ALTERAÇÃO CONTRATUAL
Sustenta a reclamante que, a partir do final do ano de 2008, a empresa reduziu-lhe os percentuais pagos a título de comissão sobre a venda dos produtos, o que lhe ocasionou uma variação salarial prejudicial.
A demandante, na inicial, afirma que foi contratada em outubro de 2004, para trabalhar como vendedora, percebendo salário fixo acrescido de comissões sobre as vendas dos produtos da reclamada, nos seguintes percentuais: 0,8% para geladeiras, fogões e máquinas de lavar; 1% para portáteis (celular) e 2% para móveis.
Obtempera, ainda, que em maio de 2008, a acionada alterou unilateralmente o percentual dessas comissões, diminuindo-as, respectivamente, para 0,7%, 0,7% e 1,6%, o que ocasionou uma variação salarial no importe de R$ 2.000,00 (dois mil reais) mensais.
A acionada, na defesa, asseverou que não houve uma redução no percentual das comissões, salientando que o que houve foi apenas uma alteração na sua forma de pagamento, que passou a ser escalonada da seguinte forma: de 0,7% a 1%, no caso de venda de portáteis, de 0,7% a 1,0%, para a venda de geladeiras, fogões e outros produtos pesados e 1,6% a 2,4%, nas hipóteses de venda de bens móveis, a depender da faixa de desconto dada pelo vendedor.
Pois bem; conquanto o escalonamento sustentado pelo acionado, na verdade, autorize o entendimento de que realmente o percentual ajustado sobre as vendas sofreu diminuição, o que, efetivamente, constituiria alteração unilateral lesiva, muito comum na categoria dos profissionais que recebem salário à base de comissões, não é isso, entretanto, o que se infere dos documentos apresentados nos autos.
Com efeito, observando-se o relatório analítico das comissões recebidas pela demandante, no período de 22/10/2007 a 14/04/2009 (fls. 302/575), verifica-se que não houve qualquer modificação no percentual relativo às comissões percebidas.
Decerto. De acordo com as vendas realizadas em dezembro de 2007, infere-se que existia uma variação entre o percentual da comissão de cada produto e o percentual ajustado, a depender da venda realizada. No dia 28/12/2007, por exemplo (fl. 316), a autora vendeu um "Rack Maval Destak" por R$ 69,00 (sessenta e nove reais), cuja comissão fixada era de 2,4%, mas a demandante recebeu a comissão ajustada, de 1,6%. Vendeu, ainda, no dia 21/12/2007 (fl. 316), um "Fogão Esmaltec Hawai" por R$ 275,00 (duzentos e setenta e cinco reais), cuja comissão era de 1,0% e a demandante recebeu 0,9%. Em 12/02/2008 (fl. 322), a acionante vendeu um "Lava Roupa Suggar", no montante de R$ 239,83 (duzentos e trinta e nove reais e oitenta e três centavos), cuja comissão era de 1,0% e a demandante percebeu 0,8%. Em 03/01/2008 (fl. 317) a reclamante vendeu um "Home Theater", no valor de R$ 169,00 (cento e sessenta e nove reais), cuja comissão estabelecida era de 0,8% e a reclamante recebeu exatamente esse percentual.
Analisando-se, agora, o relatório de vendas realizadas em 2009, justamente o período no qual, segundo afirma a demandante, houve uma redução no valor das comissões, verifica-se que, em 04/03/2009 (fl. 361), a demandante vendeu uma "TV Samsung 29", no valor de R$ 599,00 (quinhentos e noventa e nove reais), cuja comissão fixada era de 0,8% e a autora percebeu exatamente esse percentual, o mesmo do "Home Theater", vendido no início de 2008. Em 05/03/2009 (fl. 361), a autora vendeu, ainda, uma "Estante Kiplac Elegance", por R$ 395,00 (trezentos e noventa e cinco reais), cuja comissão estabelecida era de 2,4% e a ajustada foi de 1,6%, exatamente o percentual aplicado em 2007, para a venda do "Rack Maval Destak".
Esses exemplos, portanto, extraídos dos relatórios apresentados pela empresa, demonstram que não houve variação no percentual das comissões ajustadas pelas partes, as quais dependiam do percentual de desconto oferecido pelo próprio vendedor.
Registre-se, não fora isso, que a demandante impugnou os relatórios acima indicados, mas não produziu qualquer prova que demonstrasse a falsidade dos referidos documentos.
Anote-se, ainda, que a prova oral produzida pela reclamante nada salientou a respeito do percentual relativo às comissões.
De outro modo, os recibos salariais de fls. 627637 demonstram que não houve a redução salarial informada na inicial. Pelo contrário. De acordo com o recibo relativo a março de 2008 (fl. 631), a autora percebeu, a título de comissão, R$ 584,91 (quinhentos e oitenta e quatro reais e noventa e um centavos). Já em setembro de 2008 (fl. 634), recebeu a demandante, a título de comissão, R$ 642,61 (seiscentos e quarenta e dois reais e sessenta e um centavos.
Diante, assim, dos fatos acima narrados, a manutenção da sentença se impõe, no particular.
MULTA DO ART. 477 DA CLT
Advoga a demandante, ainda, que foi dispensada em 15/04/2009, mas suas parcelas rescisórias somente foram pagas em 22/05/2009, mais de um mês após o término do contrato de trabalho celebrado entre as partes.
Sem razão.
Consoante se infere do documento de rescisão juntado pela própria recorrente, à fl. 12, seu desligamento da empresa ocorreu em 14/04/2009 e a sua rescisão contratual foi homologada, pelo sindicato da categoria profissional da autora em 22/04/2009, dentro, portanto, do prazo a que alude o § 6º, letra "b", do art. 477 da CLT.
HORAS EXTRAS
O reclamado insurge-se contra o deferimento das horas extras.
Para tanto, obtempera que a real carga de trabalho da autora é aquela registrada nos controles de freqüência, assinalando, ademais, que o labor extraordinário foi devidamente quitado ou compensado, sob o sistema denominado "banco de horas", nos moldes previstos nas normas coletivas.
A autora, por sua vez, não se conforma com a limitação do labor extraordinário ao período comprovado pela primeira testemunha por ela trazida a Juízo, sustentando incidir, na hipótese, a regra estabelecida na Orientação Jurisprudencial nº 233 da SDI-1 do c. TST.
Pois bem; os registros de ponto foram impugnados pela demandante, por não refletirem a jornada por ela efetivamente cumprida.
Diante desse fato, cumpria à reclamante provar que trabalhava no horário declinado na exordial. Desse ônus, como observou a n. Juíza a quo, desincumbiu-se a autora parcialmente, por meio da sua prova oral produzida, a qual demonstrou que os horários consignados nos espelhos de ponto não eram os efetivamente cumpridos por ela.
Decerto. De acordo com a testemunha ouvida pela reclamante - Amanda Araújo Silva - que laborou por cerca de dezoito meses juntamente com a demandante, na loja situada na Calçada, "o horário da loja era às 09 horas, no entanto chegavam cerca de 30 minutos antes para arrumar a sessão; o horário de saída era às 17h; no entanto, deixavam os serviços às 17:30h por que ficava arrumando a sessão; na realidade, os 30 minutos a que se reportou, seja no início seja no término da jornada, era para além da arrumação da sessão participarem de reuniões, orações ou qualquer outra necessidade; nos sábados iniciavam os serviços às 07h por que tinham reunião, deixando os serviços por volta das 14:30h; esse horário se deu por cerca de um ano quando trabalharam no primeiro turno; depois passaram para o segundo turno, trabalhando das 10 horas às 19:00 horas, sendo que iniciavam os serviços cerca de 30 minutos antes e saiam cerca de 30 minutos depois; esse horário era de segunda a sexta; nos sábados continuaram chegando às 07h por que tinham que participar da reunião e saiam no fechamento da loja por volta das 16h" (fls. 662/663).
Da análise das informações prestadas pela testemunha, entendeu a n. Magistrada primária, com acerto, que de fevereiro a setembro de 2007, quando a autora laborava na empresa no "primeiro turno", seu horário era das 08h30min às 17h30min, com uma hora de intervalo, de segunda a sexta-feira e, aos sábados, das 08h30min até as 14h30min. A partir de outubro de 2007, até 14.08.2008, quando a demandante passou a trabalhar "no segundo turno", sua carga horária era das 09h30min às 19h30min, com uma hora de intervalo, de segunda a sexta-feira e das 07h00min às 16h00min, nos dias de sábado.
Saliente-se, não fora isso, que não há previsão na norma coletiva que autorize a implementação do sistema de compensação por meio de "banco de horas".
Com efeito, a Convenção Coletiva juntada às fls. 604/612 não consigna uma cláusula sequer a esse respeito e o contrato de experiência de fl. 124 registra, como horário de trabalho, a jornada de 09h00min às 13h00min e das 15h00min às 19h00min, de segunda à sexta, carga diversa da anotada nos registros de fls. 176/301.
Desse modo, diante da prova oral produzida pela autora, que demonstrou que os horários anotados nos cartões de ponto não refletiam a jornada por ela efetivamente cumprida, bem ainda em face da inexistência, nos autos, de qualquer acordo para compensação de horas de trabalho, não há como se reformar a sentença, no particular.
No que se refere à pretensão da autora, também não tem razão.
Inicialmente, cumpre anotar que, nos termos da OJ nº 233 da SDI I do c. TST, in verbis: "Horas extras. Comprovação de parte do período alegado. A decisão que defere com base em prova oral ou documental não ficará limitada ao tempo por ela abrangido, desde que o julgador fique convencido de que o procedimento questionado superou aquele período".
Na hipótese apresentada, todavia, não há como se aplicar a regra em debate.
E isto justamente porque, conforme assinalou a demandante, na sua inicial, ela exerceu a função de vendedora em várias lojas do reclamado, com horários diferenciados. Nas lojas das Mercês e do Iguatemi, por exemplo, afirma a autora que trabalhou das 08h00min às 20h00min. Na da Calçada, de outro modo, seu horário dependia do turno em que trabalhou - primeiro ou segundo, conforme salientado por sua testemunha.
Por essa razão, diante da diversidade das lojas por onde laborou a reclamante e, ainda, dos horários por ela própria informados, relacionados a cada estabelecimento do acionado, não há como se utilizar a testemunha da autora como base para o deferimento das horas extras de todo o período do vínculo de emprego.
A sentença, assim, deve ser mantida também no particular.
REPOUSO SEMANAL REMUNERADO. DIFERENÇAS
No tocante ao repouso semanal remunerado, contudo, tem razão a reclamante.
O pagamento de diferenças de repouso semanal remunerado em decorrência das horas extras decorre de lei, ex vi letra "a" do art. 7º, da Lei n.º 605/49.
O repouso semanal remunerado, com efeito, é calculado sobre o salário. Compondo as horas suplementares a sua remuneração, porque a ela se integra dada a habitualidade, por força do que dispõe o art. 457, da CLT, o repouso pago não levou em consideração as horas extras trabalhadas, o que importa deferimento das diferenças daí advindas.
Nesse sentido é, também, a Súmula n.º 172 do c. TST.
De outro giro, se a base de cálculo do repouso semanal remunerado se modifica, a composição da remuneração deve sofrer a mesma alteração, repercutindo, via de conseqüência, em outras parcelas, não havendo que se falar em bis in idem, pois o principal - repouso semanal remunerado - não se confunde com os acessórios - diferenças decorrentes das repercussões legais das parcelas originais.
Impõe-se, nessas circunstâncias, determinar a integração do repouso semanal remunerado ao salário, para os efeitos postulados na letra "c" da inicial, no período fixado pela sentença de 1º Grau para o deferimento das horas extras.
INTERVALO INTRAJORNADA E DOMINGOS E FERIADOS
A n. magistrada a quo indeferiu o pedido de pagamento da indenização de que trata o artigo 71, parágrafo 4º. da CLT, por entender que ficou provado, nos autos, que a reclamante usufruía de uma hora de intervalo para almoço e descanso, durante a sua jornada.
Entendeu, não fora isso, ser indevida a dobra dos domingos e feriados, positivando que quando a reclamante trabalhava em dia de domingo gozava da respectiva folga. No que diz respeito aos feriados, considerou a pretensão inepta, porque formulada genericamente.
Irresignada, pontuou a reclamante que a própria sentença primitiva registra que a autora laborava aos sábados sem o gozo de intervalo intrajornada, devendo, por essa razão, ser deferida a indenização correspondente ao intervalo suprimido.
Registra, no que concerne aos domingos e feriados, que o réu não possuía sistema de banco de horas e, por isso, em razão da não quitação dessas verbas, pelo acionado, é credora das dobras pleiteadas.
Assiste-lhe razão, mas apenas em parte.
Pois bem; os registros de ponto não foram considerados documentos hábeis para provar a jornada de trabalho da autora.
A reclamante, por sua vez, no seu depoimento pessoal, esclareceu que "inicialmente trabalhou das 08h às 17:30/18h; de segunda a sexta; dia de sábado das 08h às 13:30/14h por um ano e dois meses; que nesse horário trabalhou na loja das Mercês, saindo em janeiro de 2006", registrando, ainda, que "depois foi trabalhar na loja do Iguatemi de fevereiro de 2006 a abril de 2007; nesse período trabalhou de 08 horas e 30 minutos até às 19:30/20h; com uma hora de intervalo, de segunda a sábado". Afirmou, não fora isso, que "quando trabalhou nas Mercês tinha duas horas de intervalo". Positivou, também, que "depois do Iguatemi foi trabalhar na filial da calçada e lá cumpriu o seguinte horário: inicialmente das 08 horas e 30 minutos às 18:30/19h, com uma hora de intervalo de segunda a sexta e aos sábados até às 14h". Anotou, afinal, que "trabalhou nesse horário até setembro de 2006; a partir de então das 09:30 às 19:30/20:00 horas, de segunda a sexta; aos sábados até a hora do fechamento que se dava por volta das 16h; nos sábados não usufruía de intervalo" (fls. 661/662, grifos nossos).
De acordo, assim, com as próprias alegações da autora, no tocante ao período em que trabalhou na loja da Calçada, "no primeiro turno", a jornada realizada aos sábados iniciava-se às 08h30min e finalizava-se às 14h00min, razão pela qual não há que se falar em intervalo para almoço e refeição, nos termos do art. 71 da CLT.
Em relação ao trabalho realizado no "segundo turno", pontuou a testemunha ouvida pela demandante que, nos dias de sábado, a jornada se alongava até as 16h00min, mas gozavam de intervalo intrajornada de uma hora, como se observa de parte do seu interrogatório a seguir transcrito: "nos sábados continuaram chegando às 07h por que tinham que participar da reunião e saiam no fechamento da loja por volta das 16h; a reunião tinha uma duração de cerca de 02 horas; mesmo participando do segundo turno, em dias de sábados iniciavam o serviço no mesmo horário do pessoal do primeiro turno por que já estavam no estabelecimento; usufruíam de uma hora de intervalo" (fls. 662/663, grifos nossos).
Diante das afirmações da autora e, ainda, das alegações da testemunha por ela ouvida, improcede a indenização perseguida.
Em relação aos domingos e feriados trabalhados, contudo, tem razão a demandante.
A autora assinalou, na sua inicial, que havia um feirão por mês na empresa, que durava cerca de quatro dias, de quarta-feira a domingo, salientando, ademais, que não recebia a dobra dos domingos laborados.
Ressaltou, ainda, que trabalhou em feriados, sem receber o pagamento respectivo.
O acionado, na defesa, positivou que o labor eventual prestado aos domingos e feriados foi devidamente registrado nos controles de freqüência, acrescentando, ainda, que ou eles eram compensados ou quitados.
Ocorre, porém, que as Convenções Coletivas de Trabalho colacionadas aos autos somente autorizam a compensação da duração diária de trabalho mediante manifestação escrita do empregado ou instrumento individual ou plúrimo, onde conste a jornada a ser cumprida e aquela que será compensada (cláusula oitava, fl. 58).
Todavia, não veio aos autos qualquer acordo para compensação de horas e os recibos salariais de fls. 136/169 não consignam pagamento sob esse título.
De outro modo, o preposto do réu, em seu depoimento, salientou que "no Iguatemi a reclamante trabalhava de segunda a sábado das 09h às 17 horas com uma hora de intervalo; em domingos de acordo com escalas no mesmo horário" Anotou, não fora isso, que "a reclamante trabalhava de um a dois domingos por mês; acontecia feirão uma vez no ano; tem início na quinta e termina no domingo; normalmente acontece no início do ano" (grifos nossos, fl. 662).
Nesse sentido, uma vez que o reclamado, na defesa e o preposto, no seu depoimento, assinalaram que havia trabalho em domingos e feriados, bem ainda que não reside, nos autos, acordo para compensação de horas de trabalho, nem registro de pagamento dos domingos e feriados trabalhados, impõe-se o pagamento das dobras dos domingos e feriados laborados, durante todo o vínculo de emprego, os quais deverão ser apurados por meio de liquidação articulada, considerando que os espelhos de ponto não foram reputados válidos para a comprovação da jornada de trabalho da autora.
BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA
O n. Juiz de primeiro grau indeferiu os benefícios da justiça gratuita porque a reclamante não contou com a assistência do seu sindicato de classe, com o que não se conforma a recorrente.
E com absoluta razão, uma vez que a autora declarou, desde a inicial, que não tinha condições de arcar com as despesas do processo, sem prejuízo do seu próprio sustento e da sua família, fl. 01, preenchendo, assim, os requisitos previstos nos artigos 1º da Lei n.º 7.115, de 29.8.1993, e 4º, § 1º, da Lei n.º 1.060, de 05.2.1950, para o deferimento dos benefícios da justiça gratuita.
Anote-se, ainda, que a circunstância de não estar assistido pelo seu sindicato de classe não impede a concessão da gratuidade judiciária.
Como bem assinalou o saudoso Valentim Carrion in Comentários à CLT, 21ª edição, pág. 575, assistência judiciária "é o benefício concedido ao necessitado de, gratuitamente, movimentar o processo e utilizar os serviços profissionais de advogado e dos demais auxiliares da Justiça, inclusive os peritos". E justiça gratuita, isenção do pagamento de emolumentos dos serventuários, custas e taxas, "espécie do qual Assistência judiciária é gênero". Daí a afirmação daquele doutrinador sobre a impossibilidade de o art. 14 da Lei n.º 5.584/70 ser interpretado no sentido de excluir a aplicação da Lei n.º 1.060/50 ao processo do trabalho, tornando a assistência judiciária exclusiva dos sindicatos.
Por tais razões, defiro, em favor da autora, os benefícios da justiça gratuita.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
No tocante a este ponto, não tem razão a reclamante.
E justamente porque os honorários advocatícios, nesta Justiça (excetuada a hipótese de dissídios baseados na Emenda Constitucional n.º 45/2004, em que figurem partes que não detenham a qualidade de empregado e empregador, únicos aos quais é assegurado, pela lei, o jus postulandi, na forma do art. 791 da CLT), não decorrem pura e simplesmente da sucumbência, devendo o reclamante: a) estar assistido pelo seu sindicato de classe e b) comprovar a percepção de salário inferior ao dobro do mínimo legal, ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do seu próprio sustento ou de sua família, de acordo com a orientação traçada na Súmula n.º 219 do c. TST.
No caso de que se cuida, conquanto a reclamante tenha declarado o seu estado de miserabilidade, não se encontra assistida pelo seu sindicato da categoria profissional, mas sim por advogado particular, conforme se infere da procuração de fl. 11.
DANOS MORAIS
Debate-se a reclamante contra a sentença que rejeitou a argüição de dano decorrente de assédio moral no trabalho.
Sustenta que seu gerente, superior hierárquico, agiu com extremo rigor objetivando o cumprimento de metas de vendas, ameaçando-a caso não conseguisse vender o sistema de garantia estendida de aparelhos elétricos e expondo-a a constrangimentos diante de clientes e dos seus colegas de trabalho.
Sua pretensão não procede.
Pois bem; o assédio moral caracteriza-se por uma conduta abusiva e reiterada, seja do empregador que se utiliza da sua superioridade hierárquica para constranger seus subalternos, seja dos empregados entre si com a finalidade de excluir alguém indesejado do grupo por motivos de competição ou discriminação.
No primeiro caso, que é justamente a hipótese sustentada pela demandante, a doutrina dá ao fenômeno o nome de assédio vertical, bossing ou mobbing descendente, que diz respeito à extrapolação do poder diretivo conferido ao empregador com o intuito de humilhar e constranger o empregado no ambiente de trabalho, violando direitos personalíssimos seus, como a honra, liberdade e dignidade humana, consagrados na Constituição Federal.
E para que se afira a responsabilidade do agente de reparar o dano moral causado é necessária a presença de uma ação ou omissão que se traduza em elemento danoso, nexo de causalidade e a lesão sofrida.
Nesse contexto, cumpre examinar se, no exercício do poder de direção que lhe é assegurado, o reclamado lesionou direitos personalíssimos da autora quando da definição das metas e no estabelecimento de estratégias de treinamento e motivação para as vendas.
De acordo com o depoimento pessoal da demandante, "a empresa fixava metas a cumprir; seja dos produtos comercializados como de serviços como garantias estendidas, caminhão da sorte, seguro residência e seguro cartão". Nos termos expostos, assinalou, ainda, a acionante que "para controlar as metas existiam reuniões aos sábados às 07h da manhã; nessa reunião participavam todos os empregados; o nível da reunião dependia do gerente; na loja da calçada havia um gerente que era grosseiro e fazia a cobrança das metas citando nomes de forma intransigente e humilhando os vendedores; o gerente questionava muito, sobretudo, em relação à depoente, por que batia a meta da venda e não a meta dos serviços; o nome do gerente era Marcos Bispo; chegava a comentar na reunião da loja da depoente a respeito do aspecto físico dos empregados de outra loja, chamando a atenção que o pessoal da loja em que a depoente trabalhava era um pessoal arrumado com vendedoras maquiadas e bem apresentadas, enquanto que as vendedoras da outra loja ela as denominava de "mocréias", ponderando que estas cumpriam as metas dos serviços e as vendedoras da loja da depoente não cumpriam" (fls. 661/662, grifos nossos).
A testemunha conduzida pela reclamante, contudo, asseriu que "a empresa fixava metas seja para vendas de móveis como de serviços; o último gerente tinha nome Marcos; a reunião era comandada pelo Sr. Marcos". Registrou que "o gerente questionava a respeito das metas de serviços, citando nomes; o gerente olhava para os vendedores comparando com a lista de vendas, tecia os comentários, seja para o vendedor que tinha o maior número de vendas como para o vendedor que tinha o menor número". Obtemperou, contudo, que "não se recorda se já houve a citação do nome da reclamante nas reuniões; o citado gerente já chegou a citar comentários a respeito das vendedoras da outra loja, comparando com as vendedoras da loja em que a reclamante trabalhava dizendo que enquanto as "mocréias" cumpriam as metas (isto se referindo às vendedoras da outra loja) as vendedoras da loja em que a depoente trabalhava com a reclamante, que ele as taxou de "modelos" não estavam cumprindo as metas". Assinalou, ainda, a referida testemunha, que "às vezes o Sr. Marcos citava alguns palavrões, mas não era se reportando a vendedores" (fls. 662/663, grifos nossos).
Analisando-se o depoimento da demandante e o da prova oral por ela produzida, infere-se que não restou demonstrado que o gerente da reclamante submetia-a a tratamento inadequado, constrangendo-a diante de seus colegas, com a excessiva cobrança pelo cumprimento de metas
Conforme assinalaram, o gerente fazia apenas questionamentos sobre as vendas. A testemunha ouvida, de outro modo, "não se recorda se já houve a citação do nome da reclamante nas reuniões".
Ora, muitas vezes, o empregador, para não arcar com os valores devidos em decorrência da despedida sem justa causa, ou mesmo enfraquecer sua autoridade dentro do grupo de trabalho, tenta convencer o empregado a pedir demissão criando, nesse propósito, situações constrangedoras como a de retirar sua autonomia, transferir suas atividades para outras pessoas, isolá-lo no ambiente de trabalho, desautorizá-lo ou humilhá-lo na frente de outros colegas, cobrando-lhe produtividade além do razoável ou destratá-lo, para o atingimento de metas fixadas pela empresa.
No presente caso, porém, nenhuma das situações apontadas foi demonstrada. A demandante foi despedida sem justa causa, não foi isolada e suas atividades não foram transferidas a outros funcionários. Tampouco foi maltratada pelo seu superior hierárquico ou pressionada excessivamente para cumprir as metas fixadas.
Registre-se que se existiram ofensas, estas, em verdade, não foram dirigidas à reclamante, mas sim direcionadas às vendedoras de outras lojas.
De outro giro, conforme consignou a própria reclamante, o gerente pontuou que "o pessoal da loja em que a depoente trabalhava era um pessoal arrumado com vendedoras maquiadas e bem apresentadas"
Não demonstrado, assim, o assédio moral praticado contra a reclamante, improcede a indenização por danos morais postulada, na forma preconizada na sentença de 1º Grau.
MULTA NORMATIVA
As normas coletivas contêm cláusula prevendo o pagamento de multa para a hipótese de descumprimento de quaisquer de suas obrigações, seja ela de dar ou de fazer (ex: cláusula décima quarta, instrumento de fl. 40), e o acionado descumpriu as Convenções Coletivas no tocante às horas extras e aos domingos e feriados.
Assim, em face do descumprimento das vantagens previstas nos instrumentos coletivos, segue-se que é devida à autora a verba em destaque, na proporção de uma multa normativa para cada período de vigência das Convenções Coletivas.
Do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso do reclamado e DOU PROVIMENTO PARCIAL ao recurso da reclamante para, nos termos da fundamentação supra, deferir-lhe: a)diferenças reflexas do repouso semanal remunerado, decorrentes das horas extras, para os efeitos postulados na letra "c" da inicial, no período fixado pela sentença de 1º Grau no tocante às horas extras; b) o pagamento das dobras dos domingos e feriados trabalhados, durante todo o vínculo de emprego, apurados por meio de liquidação articulada; c) os benefícios da justiça gratuita e, afinal, d) multa normativa, na proporção de uma para cada período de vigência das Convenções Coletivas. Acresço à condenação o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), para efeito de recolhimento de custas processuais e depósito recursal.
ISTO POSTO, ACORDAM OS DESEMBARGADORES DA 2ª. TURMA DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 5ª REGIÃO, UNANIMEMENTE, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DO RRECLAMADO. AINDA POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO RECURSO DA RECLAMANTE, PARA, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO EXPOSTA PELA EXMA DESEMBARGADORA RELATORA, DEFERIR À RECLAMANTE: A)DIFERENÇAS REFLEXAS DO REPOUSO SEMANAL REMUNERADO, DECORRENTES DAS HORAS EXTRAS, PARA OS EFEITOS POSTULADOS NA LETRA "C" DA INICIAL, NO PERÍODO FIXADO PELA SENTENÇA DE 1º GRAU NO TOCANTE ÀS HORAS EXTRAS; B) O PAGAMENTO DAS DOBRAS DOS DOMINGOS E FERIADOS TRABALHADOS, DURANTE TODO O VÍNCULO DE EMPREGO, APURADOS POR MEIO DE LIQUIDAÇÃO ARTICULADA; C) OS BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA E, AFINAL, D)MULTA NORMATIVA, NA PROPORÇÃO DE UMA PARA CADA PERÍODO DE VIGÊNCIA DAS CONVENÇÕES COLETIVAS. ACRESCE-SE À CONDENAÇÃO O VALOR DE R$ 5.000,00 (CINCO MIL REAIS), PARA EFEITO DE RECOLHIMENTO DE CUSTAS PROCESSUAIS E DEPÓSITO RECURSAL.//
Salvador, 23 de julho de 2010 (sexta-feira).
JURID - Assédio moral. Não configuração. [29/07/10] - Jurisprudência
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