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quinta-feira, 15 de julho de 2010

JURID - ACP. Desocupação de área [15/07/10] - Jurisprudência


Novos invasores de favela devem ser retirados.
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Processo 001.07.205155-9
Ação Civil Pública/Lei Especial
5ª Vara da Fazenda Pública
Controle: 2007/000115

30/06/2010


Sentença de Mérito (Art. 269, III e V do CPC)


EMENTA: CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E CIVIL. BEM DE USO COMUM DO POVO. INVASÃO, OCUPAÇÃO E CONSTRUÇÃO DE BARRACOS HABITACIONAIS POR PARTICULARES. ILEGALIDADE. AJUSTE COM A FINALIDADE DE SOLUCIONAR O PROBLEMA. HOLOGAÇÃO JUDICIAL. NOVA INVASÃO. MEDIDA PROIBITIVA.

I - A rua, logradouro público, é bem de uso comum do povo, acessível à livre circulação de pessoas e veículos.

II - É absolutamente ilegal a invasão coletiva, posse e construção de qualquer tipo de moradia habitacional na extensão de ruas urbanas, sem autorização do órgão competente e em evidente desrespeito à legislação, inclusive se caracterizando o delito de esbulho possessório previsto no artigo 161, inciso II, do Código Penal.

III - A ação civil pública é procedimento adequado para coibir a ocupação ilícita de terreno pertencente ao poder público municipal, notadamente quando há evidente degradação do meio ambiente.

IV - Deve receber a chancela judicial o acordo realizado entre o Ministério Público e a Administração objetivando a desocupação de área pública invadida por pessoas carentes de recursos financeiros, que são instaladas de forma digna em casas construídas pelo Município e doadas às famílias beneficiadas.

V - A atitude de novos esbulhos e turbações, mesmo após a providência louvável do item anterior, deverá ser coibida, inclusive com o uso da força policial, se necessário.


RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, por intermédio da Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente, ajuizou ação civil pública contra o MUNICÍPIO DO NATAL, argumentando, em síntese, que a Associação dos Moradores do Parque das Colinas provocou o Ministério Público, informando que catadores de lixo invadiram um trecho da Rua Francisco Luciano de Oliveira, no cruzamento da Rua Professor Sandoval Cavalcante de Albuquerque, nesta Capital, causando transtornos à comunidade e ao meio ambiente com o acúmulo de lixo, surgimento de ratos e presença frequente de animais soltos. Notificada, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (SEMURB) esclareceu já haver expedido 22 intimações e respectivos autos de infrações, estando no aguardo dos prazos de defesa pelos invasores. Em seguida a Promotoria realizou audiência para discutir o assunto com os representantes da associação, da SEMURB e da Secretaria Municipal de Trabalho e Assistência social (SEMTAS), quando ficou convencionada a adoção das medidas necessárias à retirada das pessoas do local invadido, denominado "favela via sul", com a consequente construção de casas populares para abrigar as famílias que ocupavam ilegalmente àquela área pública, no entanto, como nenhuma providência concreta foi efetivada achou por bem provocar o Judiciário, buscando a prestação jurisdicional com a finalidade de resolver o problema, na defesa do interesse público e da preservação do meio ambiente que está sendo agredido pela ação humana dos transgressores.

Por decisão datada de 02.05.2007, concedi a medida liminar suscitada na inicial, determinando que o Município-réu, por intermédio das Secretarias Municipais de Meio Ambiente e Urbanismo (SEMURB) e de Trabalho e Assistência Social (SEMTAS), no prazo de 60 (sessenta) dias procedesse à retirada de todas as pessoas que invadiram e ocupavam ilegalmente os espaços públicos do local denominado favela "via sul", na Rua Francisco Luciano de Oliveira, com a Rua Professor Sandoval Cavalcante de Albuquerque, Parque das Colinas, nesta Capital, efetuando a demolição dos barracos e qualquer tipo de construção irregular ali existente, para que o citado logradouro ficasse totalmente livre e desimpedido para sua destinação legal, se necessário com o uso da força pública (fls. 267/277), porém a decisão foi suspensa logo depois e revogada pelo Tribunal de Justiça, dando provimento ao agravo de instrumento nº 2007.002995-3, interposto pelo Município, que posteriormente contestou o pleito autoral, oportunidade em que requerer a improcedência dos pedidos formulados pelo Parquet (fls. 308/331).

Realizei audiência de conciliação e instrução e as partes ofereceram suas alegações finais (fls. 378/381).

Objetivando solucionar definitivamente o impasse o Ministério Público e o Município de Natal realizaram acordo extrajudicial, o que resultou na retirada dos invasores da "favela via sul" e no assentamento das 45 (quarenta e cinco) famílias no Conjunto Habitacional Planalto I, no bairro Planalto, nesta Capital, construído pelo Município, fato ocorrido aos 13.10.2009, mantendo o espaço livre e desocupado, além do compromisso de apresentar projeto de urbanização do local, oportunidade em que pediram a homologação do pacto e a consequente extinção do feito com resolução de mérito (fls. 383/389).

Por fim, por meio das petições protocoladas aos 19 de maio e 09 de junho passados, a Procuradoria Geral do Município informou ao Juízo que alguns dos antigos ocupantes da extinta "favela via sul" estavam retornando ao local desocupado e edificando nova "favela", mesmo tendo recebido casas no conjunto habitacional Planalto I, e por este motivo solicita medida judicial no sentido de coibir imediatamente tal ilegalidade, inclusive com a requisição da força policial para evitar o agravamento de nova invasão do espaço público, com evidente degradação do meio ambiente.


FUNDAMENTAÇÃO

Conforme os elementos probatórios encontrados nos autos, está clarividente que houve a ocupação do espaço público mencionado na petição inicial, descrito no relatório, onde pessoas ali se fixaram, ergueram suas moradias da forma mais precária possível, motivando a indignação dos habitantes regulares da localidade que se sentiram prejudicados, além dos transtornos causados ao meio ambiente, à satisfação coletiva, à segurança e outros aspectos da convivência social, sem esquecer a situação de vileza e ausência de pundonor a que se submetiam os membros das famílias invasoras (especialmente as crianças), que assim agem, em geral, por não terem onde morar e viver dignamente, não obstante se tratar de prática de ato ilegal e reprovável pelo sistema jurídico vigente.

Em situações como a ora narrada, é dever do poder público municipal coibir a ocupação irregular do bem público, adotar política de desenvolvimento urbano e oferecer o meio ambiente ecologicamente equilibrado em prol da coletividade presente e futura, conforme preceitos contidos na Constituição Federal (arts. 182 e 255) e na Lei federal nº 10.257/2001 (Estatuto da Cidade).

Os autos demonstram comprovam que efetivamente ocorreu a ocupação irregular do terreno público praticada por invasores, mesmo se tratando de pessoas carentes e desassistidas pelo poder estatal, que aos poucos ali se fixaram e criaram uma favela chamada "via sul", onde catadores juntavam lixo recolhido pela cidade, transformando àquele espaço em local insalubre e agressivo ao meio ambiente, como bem enfatizou a Promotoria de Justiça na petição inicial, especialmente porque a região é considerada Zona de Proteção Ambiental (ZPA), protegida pela Lei municipal nº 4.664/1995, tornando ônus para a Administração municipal apurar a infração ambiental e aplicar as sanções previstas na Lei federal nº 9.605/1998.

Ao apoderar-se do imóvel público (leito de ruas), bem de uso comum do povo, os invasores praticam o crime de esbulho possessório, previsto no artigo 161, inciso II, do Código Penal, e continuando no local onde constroem moradias (mesmo barracos) e prosseguem utilizando irregularmente o terreno, o delito é permanente enquanto durar a conduta ilícita; tratando-se de bem público a ação penal é pública incondicionada, devendo a autoridade policial apurar o fato mediante inquérito, encaminhando e seguida ao Ministério Público para a medida legal cabível.

Em outro campo, com nitidez o Código Civil dispõe que as ruas, praças e estradas, igualmente os mares e rios, são bens públicos de uso comum do povo (art. 99, I), que são inalienáveis, enquanto conservarem essa qualificação, como também não se encaixilham no processo de usucapião (arts. 100 e 102, combinado com o art. 191, parágrafo único, da Constituição Federal). Significa que esse tipo de bem público, em regra, não pode ser objeto de quaisquer negócios privados (ex: compra e venda, permuta, doação, empréstimo, comodato, transação, etc.), assim como a titularidade do seu domínio não será adquirida pelo particular em virtude da posse prolongada.

Antes, porém, de uma decisão judicial imperativa, o Ministério Público e o Município demandado firmaram avença solucionando o impasse, tendo como corolário a edificação do conjunto habitacional Planalto I, no bairro Planalto, onde foram instaladas as 45 (quarenta e cinco) famílias que viviam na "favela via sul" no bairro Parque das Colinas, fato ocorrido no mês de outubro de 2009, entretanto, no mês de maio passado alguns beneficiados com os imóveis residenciais doados pela Administração municipal, em decorrência do ajuste em questão, inexplicavelmente retornaram ao lugar inóspito vivido anteriormente, provocando o pedido de providência do próprio Município ao Juízo, para obstar o ressurgimento do problema até então resolvido, não havendo necessidade de maiores delongas para concluir a prestação jurisdicional, da maneira que o faço adiante.


DISPOSITIVO

Ante o exposto, homologo por sentença, para que produzam os efeitos legais correspondentes, o acordo firmado entre o MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL e o MUNICÍPIO DO NATAL que resultou na desocupação do espaço público onde existia a "favela via sul", com o assentamento das 45 famílias no Conjunto Habitacional Planalto I, nesta Capital, assim como a viabilização de projeto de urbanização do local onde antes funcionava a mencionada favela, conforme consta às fls. 383/389 dos autos, extinguindo o feito com resolução de mérito, a teor do art. 269, III, do Código de Processo Civil.

Na oportunidade, defiro o requerimento formulado pelo Município do Natal às fls. 390/391 e 440/442, e em consequência determino a retirada dos novos invasores do terreno público, no prazo de 15 (quinze) dias, por mandado a ser cumprido pelo Oficial de Justiça, com o auxílio da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (SEMURB) e o apoio operacional da Polícia Militar do Estado, que ora requisito ao Senhor Comandante Geral da Corporação, nos termos do art. 461, § 5º, do Código de Processo Civil, com a redação da Lei nº 10.444/2002.

Sem custas processuais nem honorários advocatícios.

Cumpra-se. Publique-se, registre-se e intimem-se.



JURID - ACP. Desocupação de área [15/07/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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