Dono de propriedade invadida por cão será indenizado pelo vizinho.
Circunscrição: BRASÍLIA
Processo: 2008.01.1.090095-8
Vara: DÉCIMA PRIMEIRA VARA CÍVEL
SENTENÇA
Trata-se de ação de indenização ajuizada por RAMIRO LATERÇA DE ALMEIDA em desfavor de RONALDO LAO, em que o autor alega ter sofrido danos morais, materiais e lucros cessantes decorrentes da destruição de sua criação de galináceos por cachorro de propriedade do réu.
O autor, produtor rural, aduz que, em dezembro de 2007, o cachorro do réu, da raça boxer, invadiu a sua propriedade e matou mais de 200 aves da sua criação de galináceos.
Alega ter diligenciado várias vezes, desde o início dos ataques, no sentido de buscar uma solução para fazer cessar as investidas do cachorro, mas não obteve êxito diante da suposta omissão do réu.
Por fim, requer a reparação dos danos materiais, no valor de R$ 5.400,00 (cinco mil e quatrocentos reais), referentes às 200 (duzentas) aves, num preço médio de R$ 30,00 (trinta reais) cada (descontada a participação de 10% do caseiro na comercialização das aves), acrescidos de R$ 22.000,00 (vinte e dois mil reais), referentes às despesas com produtos e serviços destinados à criação, reprodução e comercialização.
Requer a indenização dos lucros cessantes, no valor de R$ 13.500,00, alegando para tanto que deixou de empregar atividade econômica com a perda das aves (venda de aves vivas e abatidas, ovos, filhotes, etc).
Por fim, a condenação pelos danos morais, no importe de R$ 30.000,00, ante a frustração de perder o empreendimento que empregava há mais de três anos e desídia do réu frente aos fatos.
O réu, embora tenha constituído patrono às fls. 67, e ainda, citado por oficial de justiça (fls. 80), deixou de apresentar peça contestatória.
É o sucinto relatório. O feito comporta julgamento antecipado, nos termos do art. 330, II, do Diploma Processual Civil. Passo à análise do mérito.
Pois bem, inicialmente, constato que, embora devidamente citado (fls. 80), e ainda, após constituir advogado (fls. 67), o réu deixou de contestar, razão pela qual DECRETO sua revelia, nos termos do artigo 319 do CPC, fazendo incidir os efeitos materiais e processuais do instituto, principalmente quanto à consideração de veracidade dos fatos narrados.
Assim, considero como verdadeiro o fato de que o réu deu causa aos prejuízos narrados pelo autor, olvidando-se dos cuidados necessários a guarda de seu animal (cão da raça boxer), que acabou por destruir a criação de galináceos do autor, da forma narrada na inicial.
No que tange à responsabilidade do réu pelos danos causados por seu animal, já preceitua o art. 936 do Código Civil, in vebis:
Art. 936. O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior.
A responsabilidade tratada no dispositivo supra é indireta e goza de presunção iuris tantum, admitindo-se prova em contrário; mas o que se verifica nos autos é confissão fática do réu revel.
O entendimento dos nossos tribunais é no mesmo sentido, confira-se:
RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO PROVOCADO POR ANIMAL. CULPA PRESUMIDA. O dano causado por animal presume-se decorrente de culpa in vigilando do seu guardião, salvo quando comprova a ocorrência de alguma das excludentes legais de responsabilidade. (TJDFT, 20010110218990ACJ, Relator FERNANDO HABIBE, PRIMEIRA TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E CRIMINAIS DO DF, julgado em 26/02/2002, DJ 29/04/2002 p. 115)
Forte nessas razões, vejo presentes os elementos que configuram o dever de indenizar diante da responsabilidade do réu pelos atos praticados pelo seu animal. Passo, então, a analisar o dano.
O autor alega na inicial, emendada às fls. 48, ter sofrido danos materiais de R$ 5.400,00 (cinco mil e quatrocentos reais), referentes a 200 (duzentas) aves, num preço médio de R$ 30,00 (trinta reais) cada (descontada a participação de 10% do caseiro na comercialização das aves), acrescidos de R$ 22.000,00 (vinte e dois mil reais), referentes às despesas com produtos e serviços destinados à criação, reprodução e comercialização das aves.
Embora não tenha juntado nenhum documento que comprove o valor comercial das aves, a quantia de R$ 30,00 (trinta reais) per capta - em se tratando galinhas caipiras e poedeiras, conforme narrado na petição inicial - é razoável, sendo notório que seu valor comercial é mais elevado do que aquelas criadas nos granjeiros.
Ademais, o réu deixou de contestar os valores apresentados pelo autor, fazendo-se compreender pela confissão tácita.
Com efeito, na indenização por danos materiais, ainda são devidos ao autor os valores gastos com produtos e serviços direcionados à criação dos galináceos que foram abatidos pelo cão do réu.
Entretanto, tais despesas não foram suficientemente comprovadas pelo autor, sendo que a documentação de fls. 25/30 comprova apenas parte dos gastos (milho e medicamentos veterinários), no importe de R$ 1.219,00 (um mil duzentos e dezenove reais).
Embora instado por diversas vezes a esclarecer, discriminar e comprovar as demais despesas com as aves perdida, o autor não satisfez às determinações, sendo que as despesas comprovadas (R$ 1.219,00) estão muito aquém das despesas alegadas in abstratu (22.000,00).
Assim, fixo a indenização sobre as despesas com produtos e serviços destinados à criação das aves perdidas no valor de R$ 1.219,00 (um mil e duzentos e dezenove reais).
No que tange aos danos materiais por lucros cessantes, pleiteados no valor de R$ 13.500,00 (treze mil e quinhentos reais), estes não foram devidamente comprovados, mesmo quando o autor foi intimado para tanto (fls. 33). Tampouco se pode presumir tamanho lucro do autor com a criação de aves, sequer declarado, diante dos documentos de fls. 41/45, apresentados pelo autor para fins de concessão da assistência judiciária gratuita. (fls. 46).
A documentação trazida aos autos é muito frágil para que se possa auferir, mesmo que por razoabilidade, os danos materiais sofridos a título de lucros cessantes.
É preciso esclarecer que a indenização por lucros cessantes exige um mínimo de comprovação suficiente dos prejuízos, sendo que a mera alegação in abstratu da parte não configura embasamento forte o suficiente a ensejar o dever de indenizar.
Nesse sentido:
PEDIDO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS E MATERIAIS. INOVAÇÃO. TRANSPORTE AÉREO. AUSÊNCIA DE PROVA EFETIVA. ... A pretensão de pagamento de indenização por lucros cessantes há de estar acompanhada de prova efetiva do prejuízo, de nada servindo as meras suposições levantadas para esse fim. ... Recurso improvido.(19990110212065APC, Relator ANTONINHO LOPES, 6ª Turma Cível, julgado em 28/04/2010, DJ 20/05/2010 p. 115 - grifei)
Quanto aos danos morais, entendo que estes restaram presentes, sendo devida a justa reparação.
Com efeito, os constrangimentos injustamente percebidos ultrapassam a barreira do mero dissabor para atingir efetivamente o íntimo do autor, causando-lhe profunda frustração e irritação com os fatos ocorridos.
A frustração que identifico decorre da perda de sua criação de animais, atividade esta a que o autor já se dedicava há três anos. Reconheço ainda como digno de reparação o descaso do réu em sua conduta negligente, quando notificado dos fatos, deixou de tomar as providencias cabíveis.
O valor da indenização por danos morais deve ter o condão não apenas compensatório dos danos sofridos, mas também punitivo e preventivo, a fim de se evitar a reincidência. Tal indenização deve ser fixada levando-se em conta a situação econômica das partes, a gravidade do dano, os incômodos experimentados e o aspecto educativo da sanção, tendo sempre como parâmetros a proporcionalidade e a razoabilidade da condenação.
Levando-se em conta tais parâmetros, entendo como justa, a fim de reparar os danos morais sofridos pelo autor, a quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais).
Ante o exposto, resolvo o mérito da lide, com fulcro no artigo 269, I, do CPC e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para condenar o réu a indenizar ao autor os danos materiais, no importe de R$ 6.619,00 (seis mil e seiscentos e dezenove reais), corrigidos e atualizados, com juros legais de 1% ao mês, desde a data da citação; e os danos morais, fixados em R$ 3.000,00 (três mil reais), a serem acrescidos de juros e correção monetária a contar da publicação da sentença.
O réu arcará com as custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 20, §3º do CPC.
Transitada em julgado, deverá o réu dar cumprimento à condenação, no prazo de 15 (quinze), independente de intimação pessoal, sob pena de multa de 10% (dez por cento) sob o montante do débito, nos termos do art. 475-J do CPC.
Após, recolhidas as custas finais, se houver, arquive-se.
Registre-se, publique-se e intime-se.
Brasília - DF, quinta-feira, 08/07/2010 às 13h09.
JURID - Condenação. Indenização [30/07/10] - Jurisprudência
Nenhum comentário:
Postar um comentário