Crimes contra a honra (calúnia, difamação e injúria). Elementos subjetivos (não ocorrência).
Superior Tribunal de Justiça - STJ.
AgRg na SINDICÂNCIA Nº 180 - RJ (2008?0240498-3)
RELATOR: MINISTRO LUIZ FUX
R.P?ACÓRDÃO: MINISTRO NILSON NAVES
AGRAVANTE: SALETE MARIA POLITA MACCALOZ
ADVOGADO: CONSTANTINO ALVES DE OLIVEIRA
AGRAVADO: C S R
INTERES.: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
EMENTA
Crimes contra a honra (calúnia, difamação e injúria). Elementos subjetivos (não ocorrência). Ministério Público (requerimento). Sindicância (arquivamento). Ação penal privada subsidiária (pretensão de ajuizamento). Exercício (impossibilidade).
1. Inexistindo, como no caso dos autos, os elementos subjetivos relativamente aos crimes contra a honra - calúnia, difamação e injúria - e havendo formalizado o Ministério Público, por esse motivo, pedido de arquivamento, é de se deferir tal requerimento, evidentemente.
2. Não é de hoje, pois vem de longe, o interesse na questão relativa à possibilidade de ser a ação penal iniciada por queixa do ofendido, quando, nos crimes de ação penal pública, os autos são arquivados a requerimento do Ministério Público. A propósito, as conclusões da sempre lembrada Conferência dos Desembargadores, dos idos de 1944.
3. Ultimamente, não tem o Superior Tribunal admitido se exercite a ação privada uma vez arquivados, a requerimento do Ministério Público, autos de investigação criminal. Precedentes.
4. À vista de tal entendimento, é de se recordar, também, quanto à possibilidade do exercício da ação privada após o arquivamento dos autos a requerimento do Ministério Público, a lição de Vicente Azevedo, segundo o qual "o promotor público, que havia requerido o arquivamento do inquérito, e obtido o deferimento, ver-se-ia na contingência de promover a ação penal contra sua vontade e opinião, porque a parte, depois de oferecê-la, e vê-la recebida, dela se desinteressou, negligenciou quanto ao seu andamento."
5. Agravo regimental improvido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da CORTE ESPECIAL do Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo no julgamento após o voto-vista do Sr. Ministro Nilson Naves, que negou provimento ao agravo regimental, e os votos dos Srs. Ministros Fernando Gonçalves, Felix Fischer, Aldir Passarinho, Gilson Dipp, Eliana Calmon e Laurita Vaz, no mesmo sentido, por maioria, negar provimento ao agravo regimental. Vencidos os Srs. Ministros Relator e João Otávio de Noronha.
Lavrará o acórdão o Sr. Ministro Nilson Naves. Votaram com o Sr. Ministro Nilson Naves os Srs. Ministros Fernando Gonçalves, Felix Fischer, Aldir Passarinho, Gilson Dipp, Eliana Calmon e Laurita Vaz.
Não participaram do julgamento os Srs. Ministros Hamilton Carvalhido, Nancy Andrighi e Teori Zavascki.
Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Cesar Rocha.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Ari Pargendler.
Brasília, 04 de novembro de 2009 (data do julgamento).
Ministro Cesar Asfor Rocha
Presidente
Ministro Nilson Naves
Relator
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX (Relator): Trata-se de agravo regimental interposto por SALETE MARIA POLITA MACCALOZ, em face de decisão de minha lavra, cuja ementa restou assim vazada (fls. 223?224):
"PROCESSUAL PENAL. REPRESENTAÇÃO. PEDIDO DE ARQUIVAMENTO MANIFESTADO PELO DOUTO SUBPROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA, NO EXERCÍCIO DE FUNÇÃO DELEGADA PELO PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA. CONDUTAS QUE SUPOSTAMENTE ADEQUAR-SE-IAM AOS CRIMES DE CALÚNIA, INJÚRIA, DIFAMAÇÃO E VIOLAÇÃO DE SIGILO FUNCIONAL. ARQUIVAMENTO DEFERIDO.
1. Representação oferecida por Juíza Federal de Seção Judiciária do Rio de Janeiro, para apuração de suposta prática de crimes de calunia, injúria, difamação e violação de sigilo funcional, supostamente cometido por Procuradora Regional da República da Procuradoria Regional da 2ª Região.
2. Assentando o Ministério Público Federal - dominus litis - a inexistência de suporte probatório mínimo (ausência de justa causa) para o acolhimento da representação e formalizando o pedido de arquivamento, a proposição deve ser deferida.
3. Precedentes: NC 65?PB, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, DJ de 13.11.2000; AgRg na NC 86?SP, Rel. Min. CESAR ASFOR ROCHA, DJ de 11.6.2001; NC 206?CE, Rel. Min. MILTON LUIZ PEREIRA, DJ de 25.3.2002; RP 213?AM, Rel. Min. MILTON LUIZ PEREIRA, DJ de 20.11.2002, NC 198?PB, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, DJ de 05.03.2003; RP 215?MT, Rel Min. FRANCIULLI NETTO, DJ de 09.12.2003.
4. Deveras, a jurisprudência do Egrégio STF é uníssona no sentido de que 'o monopólio da ação penal pública, incondicionada ou condicionada, pertence ao Ministério Público. Trata-se de função institucional que lhe foi deferida, com exclusividade, pela Constituição Federal de 1988. É incontrastável o poder jurídico-processual do Chefe do Ministério Publico que requer, na condição de 'dominus litis', o arquivamento judicial de qualquer inquérito ou peça de informação. Inexistindo, a critério do Procurador-Geral elementos que justifiquem o oferecimento de denuncia, não pode o Tribunal, ante a declarada ausência de formação da 'opinio delicti', contrariar o pedido de arquivamento deduzido pelo Chefe do Ministério Público. Precedentes do Supremo Tribunal Federal' (Inq. nº 510?DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO. DJU 19.04.91).
5. Pedido de arquivamento deferido."
Sustenta a agravante, em suas razões (fls. 231?238) que o arquivamento liminar da Sindicância, que visa a apurar a investigação dos fatos narrados nos autos atingiria o direito da representante de intentar ação penal privada. Argumenta que o pedido de arquivamento do Subprocurador-Geral da República não vincularia a decisão do STJ sobre o tema. Aponta, ainda, ser incongruente que o próprio MPF instaure ação de persecução contra membro de seus quadros, por isso que jamais iria concordar com o processamento da presente representação. Ressalta a incidência do art. 28, in fine do CPP, cumprindo ao Procurador-Geral da República a palavra final sobre a continuidade do processo. Destaca que, mesmo diante de um pedido de arquivamento do próprio Procurador-Geral, os julgados do Poder Judiciário devem se orientar pelo art. 93, IX da CF?1988 e não consoante a orientação do Ministério Público.
Requer, assim, a reconsideração do julgado agravado ou a submissão do feito ao crivo do órgão Colegiado competente.
É o relatório.
VOTO VENCIDO
PROCESSUAL PENAL. SINDICÂNCIA. AGRAVO REGIMENTAL. DELITOS CONTRA A HONRA. REPRESENTAÇÃO DO OFENDIDO. ANIMI CALUMNIANDI, INIURIANDI E DIFAMANDI. VERIFICADO. PEDIDO DE ARQUIVAMENTO. REJEIÇÃO.
1. A recusa do Ministério Público ao oferecimento da denúncia, legitima a representante, uma vez configurada a lesão à sua honra, a faculdade de ajuizar a ação penal privada subsidiária , nos termos do art. 5º, LIX da Constituição Federal c?c art. 29 do Código de Processo Penal. Deveras, tratando-se de delito penal de imputação contundente de fatos que constituem crimes grave, com fundamento em indícios e, ainda, a divulgação indiscriminada dos supostos ilícitos, deve esta Corte verificar a causa e sopesar se efetivamente, ainda que por indícios, exsurgiu a intenção de ofender a honra alheia, porquanto nesses casos a manifestação do Parquet pelo arquivamento da representação não vincula o Tribunal (Precedentes: Rp 30?CE, 29.10.1992 e Rp 22?PR, 16.12.1991).
2. A recusa do Parquet, quando reside na sua convicção de que o fato, embora verificado, não constitui crime e, por isso, deixa de oferecer a ação penal, impõe ao Juiz decidir a respeito, ao invés de acolher o pedido ministerial de arquivamento, com força de coisa julgada, impedindo denúncia posterior.
3. O Excelso Pretório vaticinou, em caso análogo, citado no voto capitaneado pelo e. Min. ARI PARGENDLER na APn 489?SP, que:
"INQUÉRITO POLICIAL: ARQUIVAMENTO REQUERIDO PELO CHEFE DO MINISTÉRIO PÚBLICO POR FALTA DE BASE EMPÍRICA PARA A DENÚNCIA: IRRECUSABILIDADE.
I. No processo penal brasileiro, o motivo do pedido de arquivamento do inquérito policial condiciona o poder decisório do juiz, a quem couber determiná-lo, e a eficácia do provimento que exarar.
II. Se o pedido do Ministério Público se funda na extinção da punibilidade, há de o juiz proferir decisão a respeito, para declará-la ou para denegá-la, caso em que o julgado vinculará a acusação: há, então, julgamento definitivo.
III. Do mesmo modo, se o pedido de arquivamento - conforme a arguta distinção de Bento de Faria, acolhida por Frederico Marques -, traduz, na verdade, recusa de promover a ação penal, por entender que o fato, embora apurado, não constitui crime, há de o Juiz decidir a respeito e, se acolhe o fundamento do pedido, a decisão tem a mesma eficácia de coisa julgada da rejeição da denúncia por motivo idêntico (CPP, art. 43, I), impedindo denúncia posterior com base na imputação que se reputou não criminosa.
IV. Diversamente ocorre se o arquivamento é requerido por falta de base empírica, no estado do inquérito, para o oferecimento da denúncia, de cuja suficiência é o Ministério Público o árbitro exclusivo.
V. Nessa hipótese, se o arquivamento é requerido por outro órgão do Ministério Público, o juiz, conforme o art. 28 CPP., pode submeter o caso ao chefe da instituição, o Procurador-Geral, que, no entanto, se insistir nele, fará o arquivamento irrecusável.
VI. Por isso, se é o Procurador-Geral mesmo que requer o arquivamento - como é atribuição sua nas hipóteses de competência originária do Supremo Tribunal - a esse não restará alternativa que não o seu deferimento, por decisão de efeitos rebus sic stantibus, que apenas impede, sem provas novas, o oferecimento da denúncia (CPP, art. 18; Súmula 524).
VII. O mesmo é de concluir, se - qual sucede no caso -, o Procurador-Geral, subscrevendo-o, aprova de antemão o pedido de arquivamento apresentado por outro órgão do Ministério Público." (QO no Inq 1.604?AL, Tribunal Pleno, Rel. Min. SEPULVEDA PERTENCE, DJU 13.12.02).
O Egrégio STJ, em hipótese semelhante, concluiu que, diante das peculiaridades do caso concreto, resta inviável a remessa dos autos ao Procurador Geral da República, por isso que, observado o art. 5º, LIX da Constituição Federal, cabe conceder à representante ofendida prazo para que possa exercer a ação penal privada. Nesse sentido concluiu o e. Min. BUENO DE SOUZA correspondente entendimento no voto proferido nos autos da Rp 30?CE, verbis:
"(...) Pensando deste modo, quando se trata de crime de ação pública, não posso deixar de assim pensar, por mais forte razão, quando se trata (como agora) de ação penal privada, eis que existe iniciativa da vítima quanto a crime contra a honra. Se a vítima, desde o início, mostra-se inconformada com o que qualifica como 'injusta agressão', sujeita a sanção penal, à sua honra de Magistrado, resulta evidente que está pronta a exercer a ação penal privada. E se a Constituição admite a ação penal privada por crime de ação pública, subsidiária de ação pública (por ter o Ministério Público deixado de propô-la) não parece razoável o envio dos autos ao Ministério Público, caso o Tribunal rejeite as conclusões do parecer. (...)
Eis porque, com todas as vênias do eminente Ministro Relator, acompanho o d. voto do eminente Ministro BARROS MONTEIRO; faço-o, porém, com esta ressalva, de que, ao invés da remessa dos autos ao Procurador-Geral, refluindo para a doutrina dos Ministros DANTAS e WILLIAM PATTERSON ao reconhecerem o Subprocurador-Geral como a presença última do Ministério Público nesta Corte, para que, sem qualquer comprometimento com o mérito, o Tribunal possa apreciar a conduta tida por delituosa. Acrescento que não percebo se possa vislumbrar coação aos membros do Ministério Público, uma das razões do d. voto do eminente Relator: não seria curial admitir subscrevessem eles aquela peça, por constrangimento insuportável do Procurador-Chefe. (...)"
4. Sob esse enfoque, concluiu a Corte mediante voto do E. Min. BUENO DE SOUZA nos autos da Representação n.º 30?CE, verbis:
"(...) Pensando deste modo, quando se trata de crime de ação pública, não posso deixar de assim pensar, por mais forte razão, quando se trata (como agora) de ação penal privada, eis que existe iniciativa da vítima quanto a crime contra a honra. Se a vítima, desde o início, mostra-se inconformada com o que qualifica como 'injusta agressão', sujeita a sanção penal, à sua honra de Magistrado, resulta evidente que está pronta a exercer a ação penal privada. E se a Constituição admite a ação penal privada por crime de ação pública, subsidiária de ação pública (por ter o Ministério Público deixado de propô-la) não parece razoável o envio dos autos ao Ministério Público, caso o Tribunal rejeite as conclusões do parecer. (...)
Eis porque, com todas as vênias do eminente Ministro Relator, acompanho o d. voto do eminente Ministro BARROS MONTEIRO; faço-o, porém, com esta ressalva, de que, ao invés da remessa dos autos ao Procurador-Geral, refluindo para a doutrina dos Ministros DANTAS e WILLIAM PATTERSON ao reconhecerem o Subprocurador-Geral como a presença última do Ministério Público nesta Corte, para que, sem qualquer comprometimento com o mérito, o Tribunal possa apreciar a conduta tida por delituosa. Acrescento que não percebo se possa vislumbrar coação aos membros do Ministério Público, uma das razões do d. voto do eminente Relator: não seria curial admitir subscrevessem eles aquela peça, por constrangimento insuportável do Procurador-Chefe. (...)"
5. Representação oferecida por Juíza Federal de Seção Judiciária do Rio de Janeiro, para apuração de suposta prática de crimes de calunia, injúria, difamação e violação de sigilo funcional, supostamente cometido por Procuradora Regional da República da Procuradoria Regional da 2ª Região.
6. In casu, noticia-se na representação que a representada teria feito publicar, em vários veículos de comunicação eletrônica, a notícia da representação oferecida ao Conselho Nacional de Justiça - CNJ, que requereu a anulação do ato do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, que aprovou a indicação da representante da carreira, por antiguidade, para o cago de Desembargadora Federal daquele Tribunal.
Deveras, o conteúdo da peça enviada ao CNJ, divulgado eletronicamente, assentou:
" (...) A representada afirma que a representante 'em conluio com uma servidora e três advogados, liberava liminares para saques de vultuosas quantias do FGTS, em razão da mudança do regime dos funcionários públicos, então celetistas, para o estatutário. As liminares determinavam o saque dos saldos em bloco, em mandados de busca e apreensão de quantia milionárias, não se limitando a autorizar a movimentação destes por seus titulares'.
Na seqüência, aduz que a representante 'desrespeitando a lei, ordenou várias atividade ilegais durante uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal e Ministério Público do Estado contra a União, Estado do Rio de Janeiro e Município de Itaguaí em uma ação de danos ambientais resultantes de rejeitos químicos industriais. Isso quando ordenou desde o bloqueio de verba da União, passando pela compra de material sem licitação e até mesmo a venda de rejeitos químicos para arrecadar verba a ser gerenciada pelo Juízo da 7ª Vara Federal'.
(...) Alega que a representante 'de forma alguma preenche os requisitos constitucionais e legais necessários ao cargo de membro de Tribunal', e sentencia que a sua nomeação para o aludido cargo 'atenta contra o princípio da moralidade e demais normas da Lei Orgânica da Magistratura Nacional".
Cumpre ressaltar, conforme consta da representação, que:
"(...) As informações estrepitosamente vazadas para a imprensa estão protegidas pelo segredo de justiça, que a representada não pode ignorar, visto ser ela a signatária do pedido de inquérito nº 2006.02.01.008623-5, ainda sequer objeto de denúncia formal."
7. Destarte, apesar de os fatos terem sido divulgados e debatidos em audiência pública, na qual a Representante foi indicada para o cargo de Desembargador Federal do TRF da 2ª Região, a exegese legal propende para a ocorrência do animi clumniandi, iniuriando e difamandi, no ato da Procuradora da República pelo qual divulgou, para vários veículos de comunicação, como se verificou no site de notícias do MPF (fls. 04?05), no site do Jornal Gazeta Mercartil (Gazeta on line - fls. 06?08), no site do Jornal Tribuna do Norte (fls. 09), no Jornal A Resenha Diária (fls. 10?17), a notícia de ter oferecido perante o CNJ, representação contra a mencionada indicação da Representante, assim como o conteúdo da peça.
8. Destarte, os fatos penais apontados são assim especificados:
Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
§ 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga.
§ 2º - É punível a calúnia contra os mortos.
§ 3º - Admite-se a prova da verdade, salvo:
I - se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível;
II - se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no nº I do art. 141;
III - se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível.
Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.
Parágrafo único - A exceção da verdade somente se admite se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções.
Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
§ 1º - O juiz pode deixar de aplicar a pena:
I - quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria;
II - no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.
§ 2º - Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência.
§ 3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:
Pena - reclusão de um a três anos e multa.
Art. 141 - As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido:
I - contra o Presidente da República, ou contra chefe de governo estrangeiro;
II - contra funcionário público, em razão de suas funções;
III - na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria.
IV - contra pessoa maior de 60 (sessenta) anos ou portadora de deficiência, exceto no caso de injúria.
Parágrafo único - Se o crime é cometido mediante paga ou promessa de recompensa, aplica-se a pena em dobro.
O Procurador-Geral da República é o legitimado ao ajuizamento da Ação Penal originária e, inexistindo acima deste outro membro do Ministério Público, uma vez que a suprema chefia do referido órgão lhe cabe, o pedido de arquivamento requerido, em regra, deve ser acolhido.
9. Agravo regimental provido para abrir vista à representante para o oferecimento da ação penal privada subsidiária, consoante o precedente estabelecido na Rp 30?CE.
O EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX (Relator): Cuida-se de representação oferecida por Juíza Federal de Seção Judiciária do Rio de Janeiro, para apuração de suposta prática de crimes de calunia, injúria, difamação e violação de sigilo funcional, supostamente cometido por Procuradora Regional da República da Procuradoria Regional da 2ª Região.
Ab initio, cumpre observar a origem da representação. Consoante narrado no arquivamento da Sindicância 180?RJ, verbis:
"Trata-se de representação da Juíza Federal da 7ª Vara da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, Salete Maria Polita Maccaloz, a fim de apurar a prática dos crimes de calúnia, injúria, difamação e violação de sigilo funcional, atribuída à Procuradora Regional da República da 2ª Região, Cristina Schwansee Romanó. Noticia-se na representação que a representada teria feito publicar, em vários veículo de comunicação eletrônica, a notícia da representação oferecida ao Conselho Nacional de Justiça - CNJ, que requereu a anulação do ato do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, que aprovou a indicação da representante da carreira, por antiguidade, para o cago de Desembargadora Federal daquele Tribunal. Ressalta-se na representação (fl. 8?10):
'2. Para justificar a iniciativa, a representada afirma que a representante 'em conluio com uma servidora e três advogados, liberava liminares para saques de vultuosas quantias do FGTS, em razão da mudança do regime dos funcionários públicos, então celetistas, para o estatutário. As liminares determinavam o saque dos saldos em bloco, em mandados de busca e apreensão de quantia milionárias, não se limitando a autorizar a movimentação destes por seus titulares'
3. Na seqüência, aduz que a representante 'desrespeitando a lei, ordenou várias atividade ilegais durante uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal e Ministério Público do Estado contra a União, Estado do Rio de Janeiro e Município de Itaguaí em uma ação de danos ambientais resultantes de rejeitos químicos industriais. Isso quando ordenou desde o bloqueio de verba da União, passando pela compra de material sem licitação e até mesmo a 'venda' de rejeitos químicos para 'arrecadar verba' a ser gerenciada pelo Juízo da 7ª Vara Federal.'
4. Por fim, alega que a representante 'de forma alguma preenche os requisitos constitucionais e legais necessários ao cargo de membro de Tribunal', e sentencia que a sua nomeação para o aludido cargo 'atenta contra o princípio da moralidade e demais normas da Lei Orgânica da Magistratura Nacional.
5. (...) As informações estrepitosamente vazadas para a imprensa estão protegidas pelo segredo de justiça, que a representada não pode ignorar, visto ser ela a signatária do pedido de inquérito nº 2006.02.01.008623-5, ainda sequer objeto de denúncia formal.
(...)
7. Assim, assumindo, com vontade livre e consciente, condutas subjetiva e objetivamente típicas, a representada está incursa nas sanções previstas nos artigos 138, 139, 140, c?c artigo 141, todos do Código Penal, além de sujeita ao rigor do artigo 325, § 2º do mesmo diploma, ante a reprovável violação do sigilo funcional.'
Após autuado o processo administrativo sob o nº 1.00.000.010466?2008-23, concedeu-se prazo para a representada se manifestar por escrito (fls. 28)."
O Ministério Público ao pleitear o arquivamento, sustentou:
"Atuados os presentes autos nessa Corte Superior, foi concedida vista ao Ministério Público Federal que, no Parecer nº 2.950?2008?EA?SA?PGR, oferecido pela insigne Subprocurador-Geral da República, Dr. EUGÊNIO JOSÉ GUILHERME DE ARAGÃO, propõe o arquivamento dos autos em excerto da promoção que transcrevo a seguir (fls. 3?4):
'Compulsando os autos, verifica-se que não há justa causa para a instauração da ação penal contra a Procuradora Regional da República da 2ª Região, Cristina Schwansee Romanó, ante à evidente atipicidade dos fatos narrados na representação. É que, conforme se depreende da transcrição tida por ofensiva, a Procuradora se limitou a informar ao Conselho Nacional de Justiça - CNJ, no exercício de sua função de Chefe da PRR - 2ª Região, os argumentos expostos pelo Corregedor-Geral da Justiça Federal da Segunda Região, e alguns desembargadores, em seus votos proferidos na sessão plenária do procedimento de promoção da representante. É que esses votos - que restaram vencidos - deram conta de que a magistrada não preenchia os pressupostos para a indicação à promoção a Desembargadora, em vista de seu envolvimento em inquéritos criminais, bem como do acúmulo de processos conclusos em seu gabinete sem decisão. Aliado a esses fatores, a representada não poderia deixar de informá-los, também, do teor do inquérito criminal que investiga o deferimento de uma seqüência de liminares para saques de saldo de FGTS, de vultuosas quantias, atribuído à magistrada. Portanto, não se depreende daí nenhum fato ofensivo à honra da magistrada.
A representada não imputou fato definido como crime à magistrada, nem fato ofensivo a sua reputação, muito menos a insultou ou aviltou a sua honra de forma a atingir seus atributos morais, intelectuais ou morais. Apenas narrou os fatos objeto de investigação criminal, como um argumento plausível para a anulação do ato que indicaria a magistrada ao quadro de desembargadores.
Ademais, ainda que percebida, como ofensiva, não há como vislumbrar ilícito penal na afirmação feita a procuradora, acima transcrita, porque dela não deflui o elemento subjetivo do tipo penal de calúnia, difamação ou injúria, a saber o animus calumniandi, difamandi e injuriandi, cuja falta, uma vez mais, exclui a tipicidade da conduta.
Não restou demonstrado, em momento algum, a intenção da representada ofender a honra da representante, mas, apenas, a intenção de oferecer respaldo ao seu requerimento feito junto ao CNJ. Portanto, ahiu no estrito cumprimento do seu dever legal, na qualidade de Chefe da Procuradoria Regional da República da 2ª Região (cf. peitção encaminhada ao CNJ - fls. 31?59). Assim, excluída está, também, a ilicitude das afirmações, nos termos do art. 23, III do CP.
Tal entendimento encontra respaldo na jurisprudência do e. Superior Tribunal de Justiça.
Verifica-se, também, que não há ilícito penal da afirmação da representada, pela excludente dos crimes de injúria e difamação, prevista no art. 142, III do CP, quando a suposta ofensa não passa de 'conceito desfavorável emitido por funcionário público em apreciação ou informação que preste no cumprimento de dever de ofício', o que ocorre nesse caso.
Também não há falar em violação de sigilo funcional, uma vez que não houve quebra de sigilo. As informações contidas na nota divulgada na imprensa eletrônica já eram de conhecimento público, eis que exposta e discutidas na sessão plenária, aberta ao público, onde vários jornalistas estavam presentes. Inclusive a existência de inquéritos criminais e procedimentos administrativos em, que se investigam condutas potencialmente criminosas praticadas pela magistrada no exercício de sua função. Portanto, não havia qualquer dado sigiloso naquelas informações.
Assim, ante à ausência de justa causa para a instauração da ação penal, já que os fatos narrados evidentemente não constituem crime, deve ser arquivado o presente procedimento administrativo'."
Assenta a representante que, apesar de os fatos terem sido divulgados e debatidos em audiência pública, na qual a Representante foi indicada para o cargo de Desembargador Federal do TRF da 2ª Região, a exegese legal propende para a ocorrência do animi calumniandi, iniuriando e difamandi, no ato da Procuradora da República pelo qual divulgou, para vários veículos de comunicação, a notícia de ter oferecido perante o CNJ, representação contra a mencionada indicação da Representante, assim como o conteúdo da peça.
Os fatos penais apontados na representação são assim especificados:
Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.
§ 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga.
§ 2º - É punível a calúnia contra os mortos.
§ 3º - Admite-se a prova da verdade, salvo:
I - se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido não foi condenado por sentença irrecorrível;
II - se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no nº I do art. 141;
III - se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível.
Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.
Parágrafo único - A exceção da verdade somente se admite se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções.
Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:
Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.
§ 1º - O juiz pode deixar de aplicar a pena:
I - quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria;
II - no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.
§ 2º - Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou pelo meio empregado, se considerem aviltantes:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa, além da pena correspondente à violência.
§ 3o Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:
Pena - reclusão de um a três anos e multa.
Art. 141 - As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido:
I - contra o Presidente da República, ou contra chefe de governo estrangeiro;
II - contra funcionário público, em razão de suas funções;
III - na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria.
IV - contra pessoa maior de 60 (sessenta) anos ou portadora de deficiência, exceto no caso de injúria.
Parágrafo único - Se o crime é cometido mediante paga ou promessa de recompensa, aplica-se a pena em dobro.
NELSON HUNGRIA assim define o dolo específico nos crimes contra a honra:
Pode-se, então, definir o dolo específico do crime contra a honra como sendo a consciência e a vontade de ofender a honra alheia (reputação, dignidade ou decoro), mediante a linguagem falada, mímica ou escrita. Ê indispensável a vontade de injuriar ou difamar, a vontade referida ao eventus sceleris, que é no caso, a ofensa à honra. (Comentários ao Código Penal, 5ª ed.: Rio de Janeiro, Forense, 1982, p. 53, volume VI,).
Deveras, é cediço que a Lei nº 8.038, de 28 de maio de 1990 dispõe, em seu art. 3º, que na hipótese do Ministério Público requerer o arquivamento do Inquérito ou de peças informativas, compete ao Relator determiná-lo ou submeter o pedido à apreciação da Corte. O arquivamento fundou-se no entendimento de que o Ministério Público Federal, Dominus Litis, investido no monopólio da ação penal e assentando a inexistência de suporte probatório mínimo (ausência de justa causa) para o acolhimento da representação, formalizou o pedido, cuja proposição deveria ser deferida
Legitimando-se à Ação Penal originária o Procurador-Geral da República, e não havendo acima deste outro membro do Ministério Público, uma vez que a suprema chefia do referido órgão lhe cabe, o pedido de arquivamento requerido não depende, em regra, deve ser acolhido.
Contudo, a recusa do Ministério Público ao oferecimento da denúncia, legitima a representante, uma vez configurada a lesão à sua honra, a faculdade de ajuizar a ação penal privada subsidiária , nos termos do art. 5º, LIX da Constituição Federal c?c art. 29 do Código de Processo Penal.
Além disso, quando se tratar de imputação contundente de tipos penais, fatos que constituem crimes grave, com fundamento em indícios e, ainda, a divulgação em veículos de grande circulação da notícia, deve esta Corte verificar o caso concreto e sopesar se a representada intentou ofender a honra alheia.
Insurge-se a agravante sustentando a não vinculação do Poder Judiciário à opinio delicti exarada em última instância de representação do Ministério Público.
Efetivamente, a jurisprudência da Corte Especial vem assentando que:
"DELITO CONTRA A HONRA. CONFIGURAÇÃO EM TESE. REPRESENTAÇÃO DO OFENDIDO. PEDIDO DE ARQUIVAMENTO REJEITADO.
1. O pedido de arquivamento de inquérito, feito pelo representante do Ministério Público, não vincula o Tribunal (Representação nº 22?PR).
2. A imputação contundente a alguém da pratica de fatos da maior gravidade, com base em meras suspeitas e em excesso no exercício das próprias funções, revela, ao menos em tese, a consciência e a vontade de ofender a honra alheia.
3. Omitindo-se o Ministério Público em seu "poder-dever" de oferecer a denúncia, abre-se a vítima a possibilidade de aforar a ação penal privada subsidiaria (art. 5º, inciso LIX da CF).
Pedido de arquivamento da representação rejeitado, ressalvando-se a iniciativa da parte ofendida quanto a propositura da ação penal privada subsidiaria." (Rp 30?CE, Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, Relator para o acórdão Min. BARROS MONTEIRO, DJU 29.10.92).
PROCESSUAL PENAL. INQUÉRITO. PEDIDO DE ARQUIVAMENTO. VINCULAÇÃO, OU NÃO, TRIBUNAL. CPC, ART. 28. INTERPRETAÇÃO. PENAL. CRIME DE IMPRENSA. INJURIA. SUJEITO PASSIVO. ÓRGÃO EQUIPARADO A PESSOA JURÍDICA. POSSIBILIDADE.
I - O pedido de arquivamento de inquérito, feito pelo representante do Ministério Público, não vincula o Tribunal.
II - Possibilidade, no caso, de caracterizar-se em tese, crime de injuria, no qual figura como sujeito passivo órgão equiparado a pessoa jurídica, razão por que o pedido de arquivamento e indeferido.
III - Rejeitado o pedido de arquivamento devem os autos ser remetidos ao Procurador Geral da Republica, nos termos do art. 28 do Código de Processo Penal." (Rp 22?PR, Rel. Min. ANTONIO DE PÁDUA RIBEIRO, DJU 16.12.91).
In casu, em princípio, resta configurado o elemento subjetivo do tipo penal no ato de divulgação deliberada dos fatos que ocorreram na sessão plenária do procedimento de promoção da representante.
É que apesar de os fatos terem sido divulgados e debatidos em audiência pública, na qual a Representante foi indicada para o cargo de Desembargador Federal do TRF da 2ª Região, restou aparentemente caracterizado o animii calumniandi, iniuriando e difamandi, no ato da Procuradora da República pelo qual divulgou, para vários veículos de comunicação, como se verificou no site de notícias do MPF (fls. 04?05), no site do Jornal Gazeta Mercartil (Gazeta on line - fls. 06?08), no site do Jornal Tribuna do Norte (fls. 09), no Jornal A Resenha Diária (fls. 10?17), a notícia de ter oferecido perante o CNJ, representação contra a mencionada indicação da Representante, assim como revelar o conteúdo da peça procedimental.
Impõe-se, assim, que seja rejeitado o pedido de arquivamento, cabendo ao Ministério Público o oferecimento da denúncia, por isso que não exercida a persecução penal da representada, abre à representante, enquanto configurada a lesão à sua honra, a faculdade de ajuizar a ação penal privada subsidiária, nos termos do art. 5º, LIX da Constituição Federal c?c art. 29 do Código de Processo Penal, nos termos da jurisprudência da Corte Especial indicada acima.
A recusa do Parquet, quando reside na sua convicção de que o fato, embora verificado, não constitui crime e, por isso, deixa de oferecer a ação penal, impõe ao Juiz decidir a respeito, ao invés de acolher o pedido ministerial de arquivamento, com força de coisa julgada, impedindo denúncia posterior.
O Excelso Pretório vaticinou, em caso análogo, citado no voto capitaneado pelo e. Min. ARI PARGENDLER na Apn 489?SP, que:
"Inquérito policial: arquivamento requerido pelo chefe do Ministério Público por falta de base empírica para a denúncia: irrecusabilidade.
1. No processo penal brasileiro, o motivo do pedido de arquivamento do inquérito policial condiciona o poder decisório do juiz, a quem couber determiná-lo, e a eficácia do provimento que exarar.
2. Se o pedido do Ministério Público se funda na extinção da punibilidade, há de o juiz proferir decisão a respeito, para declará-la ou para denegá-la, caso em que o julgado vinculará a acusação: há, então, julgamento definitivo.
3. Do mesmo modo, se o pedido de arquivamento - conforme a arguta distinção de Bento de Faria, acolhida por Frederico Marques -, traduz, na verdade, recusa de promover a ação penal, por entender que o fato, embora apurado, não constitui crime, há de o Juiz decidir a respeito e, se acolhe o fundamento do pedido, a decisão tem a mesma eficácia de coisa julgada da rejeição da denúncia por motivo idêntico (CPP, art. 43, I), impedindo denúncia posterior com base na imputação que se reputou não criminosa.
4. Diversamente ocorre se o arquivamento é requerido por falta de base empírica, no estado do inquérito, para o oferecimento da denúncia, de cuja suficiência é o Ministério Público o árbitro exclusivo.
5. Nessa hipótese, se o arquivamento é requerido por outro órgão do Ministério Público, o juiz, conforme o art. 28 CPP., pode submeter o caso ao chefe da instituição, o Procurador-Geral, que, no entanto, se insistir nele, fará o arquivamento irrecusável.
6. Por isso, se é o Procurador-Geral mesmo que requer o arquivamento - como é atribuição sua nas hipóteses de competência originária do Supremo Tribunal - a esse não restará alternativa que não o seu deferimento, por decisão de efeitos rebus sic stantibus, que apenas impede, sem provas novas, o oferecimento da denúncia (CPP, art. 18; Súmula 524).
7. O mesmo é de concluir, se - qual sucede no caso -, o Procurador-Geral, subscrevendo-o, aprova de antemão o pedido de arquivamento apresentado por outro órgão do Ministério Público." (QO no Inq 1.604?AL, Tribunal Pleno, Rel. Min. SEPULVEDA PERTENCE, DJU 13.12.02).
No presente caso, contudo, seria inviável a remessa dos autos ao Procurador Geral da República, se esta Corte rejeita parecer conduzido sob sua delegação pessoal. Deveras, com as devidas vênias que merece o Subprocurador-Geral da República e, observado o art. 5º, LIX da Constituição Federal, cabe conceder à representante prazo para que possa exercer a ação penal privada.
Nesse sentido, se manifestou o e. Ministro BUENO DE SOUZA na Rp 30?CE, in verbis:
"Entretanto, em mais detida reflexão sobre o tema, tenho-me animado a aprofundar minha respeitosa divergência com o entendimento tradicional, de cabal acatamento de parecer por arquivamento. E isto, não simplesmente por consideração de ordem doutrinária ou sistemática; mas, precipuamente, em virtude de novo sistema que a Constituição adotou, expresso no art. 5º, LIX, verbis:
'será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal'
(...)
O que a Constituição determina, a meu ver, pe que poderá haver ação pública subsidiária; e que, assim, assegurado fica o contraste da conduta, em tese, delituosa, perante os tribunais, mesmo a despeito da falta de iniciativa do Ministério Público em promovê-la, se o parecer por arquivamento não obtiver a aquiescência da Corte.
(...)
Pensando deste modo, quando se trata de crime de ação pública, não posso deixar de assim pensar, por mais forte razão, quando se trata (como agora) de ação penal privada, eis que existe iniciativa da vítima quanto a crime contra a honra. Se a vítima, desde o início, mostra-se inconformada com o que qualifica como 'injusta agressão', sujeita a sanção penal, à sua honra de Magistrado, resulta evidente que está pronta a exercer a ação penal privada. E se a Constituição admite a ação penal privada por crime de ação pública, subsidiária de ação pública (por ter o Ministério Público deixado de propô-la) não parece razoável o envio dos autos ao Ministério Público, caso o Tribunal rejeite as conclusões do parecer.
(...)
Eis porque, com todas as vênias do eminente Ministro Relator, acompanho o d. voto do eminente Ministro BARROS MONTEIRO; faço-o, porém, com esta ressalva, de que, ao invés da remessa dos autos ao Procurador-Geral, refluindo para a doutrina dos Ministros DANTAS e WILLIAM PATTERSON ao reconhecerem o Subprocurador-Geral como a presença última do Ministério Público nesta Corte, para que, sem qualquer comprometimento com o mérito, o Tribunal possa apreciar a conduta tida por delituosa. Acrescento que não percebo se possa vislumbrar coação aos membros do Ministério Público, uma das razões do d. voto do eminente Relator: não seria curial admitir subscrevessem eles aquela peça, por constrangimento insuportável do Procurador-Chefe.
Assim, eminente Presidente, acompanho o d. voto do Senhor Ministro BARROS MONTEIRO; porém não remetendo os autos, mas sim, abrindo vistas à vítima."
Ex positis, DOU PROVIMENTO AO AGRAVO REGIMENTAL PARA ABRIR VISTAS À REPRESENTANTE PARA O OFERECIMENTO DA AÇÃO PENAL PRIVADA SUBSIDIÁRIA, CONSOANTE O PRECEDENTE ESTABELECIDO NA RP 30?CE.
É como voto.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
CORTE ESPECIAL
EM MESA JULGADO: 30?06?2009
Relator
Exmo. Sr. Ministro LUIZ FUX
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro CESAR ASFOR ROCHA
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. HAROLDO FERRAZ DA NOBREGA
Secretária
Bela. VANIA MARIA SOARES ROCHA
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia CORTE ESPECIAL, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
Após o voto do Sr. Ministro Luiz Fux dando provimento ao agravo regimental no que foi acompanhado pelo Sr. Ministro João Otávio de Noronha, pediu vista o Sr. Ministro Nilson Naves.
Aguardam os Srs. Ministros Ari Pargendler, Fernando Gonçalves, Felix Fischer, Aldir Passarinho Junior, Gilson Dipp, Eliana Calmon, Paulo Gallotti e Laurita Vaz.
Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Hamilton Carvalhido e Francisco Falcão.
Licenciada a Sra. Ministra Nancy Andrigh.
Brasília, 30 de junho de 2009
VANIA MARIA SOARES ROCHA
Secretária
VOTO-VISTA
O EXMO. SR. MINISTRO NILSON NAVES: Primeiramente ouçamos a doutrina, e lá há lições num e noutro sentido. Estamos aqui falando, reparem, de caso em que, uma vez arquivados os autos de uma representação, o que se pretende é que admitamos o exercício da ação privada. É assim que o ilustre Relator votou, isto é, provendo o agravo "para abrir vistas à representante para o oferecimento da ação penal privada subsidiária, consoante o precedente estabelecido na RP 30?CE".
Ouçamos, pois, a doutrina: entre outros (mais antigos), admitem, em casos que tais, a ação privada Tornaghi, Basileu e Osni Duarte, mas não a admitem Hungria, Roberto Lyra e Vicente de Azevedo (consultem Walter Acosta, "O Processo Penal", 1989, págs. 170?1). Vão aqui duas lições - num e noutro sentido, é óbvio -, a de Tornaghi e a de Azevedo:
- "E é claro que se o Ministério Público pede o arquivamento, durante o prazo da denúncia ou depois dele, pouco importa, não intenta a ação penal no prazo da lei. E é isso mesmo que a lei quer significar; não há dúvida: o Estado que chamou a si o exercício da ação penal, retirando-o ao ofendido, deve restituir-lho quando entende de não a promover."
- "Em face dos termos amplos do art. 29, parece à primeira vista que sim. Mas, bem analisada a hipótese, a conclusão deve ser contrária, tendo-se presente a parte final do artigo; estabelecer-se-ia, facilmente, a seguinte situação: o promotor público, que havia requerido o arquivamento do inquérito, e obtido o deferimento, ver-se-ia na contingência de promover a ação penal contra sua vontade e opinião, porque a parte, depois de oferecê-la, e vê-la recebida, dela se desinteressou, negligenciou quanto ao seu andamento."
Tão interessante é a questão, que uma das conclusões da tão lembrada Conferência dos Desembargadores, dos idos de 1944, teve este enunciado: "Nos crimes de ação pública, arquivados os autos a requerimento do Ministério Público, não pode a ação penal ser iniciada mediante queixa do ofendido."
2.Relativamente à jurisprudência, a do Superior Tribunal, ultimamente, de um lado, é a que foi recordada pelo Ministro Fux, a saber, "assentando o Ministério Público Federal - dominus litis - a existência de suporte probatório mínimo (ausência de justa causa) para o acolhimento da representação e formalizando o pedido de arquivamento, a proposição deve ser deferida"; de outro, é a da ementa escrita pelo Ministro Dipp para os EDcl no AgRg no Inq-528, de 2007: "O pedido de arquivamento não é hábil a configurar inércia do Parquet, afastando, portanto, a possibilidade de levar a efeito a ação penal privada subsidiária."
3.Reparem que, ultimamente, o Superior Tribunal não tem admitido se exercite a ação privada, uma vez arquivados, a requerimento ministerial, autos de investigação policial - sejam, é claro, quais forem os autos.
4.Se dois são os aspectos de uma mesma questão, os dois, em conjunto ou separadamente, já foram por nós aqui da Corte Especial longamente discutidos. Recordaria, por exemplo, e até já foi aqui recordado pelo Ministro Fux, a Rp-30, de 1992. Em meu voto naquela ocasião, a saber, na sessão do dia 29.10.92, disse o seguinte nestes dois tópicos:
"2. Até o momento, votaram, neste caso, pelo deferimento do pedido de arquivamento, os Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo (relator), William Patterson e José Cândido, e pela rejeição do pedido, os Srs. Ministros Barros Monteiro, Hélio Mosimann, Demócrito Reinaldo, José Dantas e Bueno de Souza. O Sr. Ministro William, em seu voto, entendeu que não é lícito ao Tribunal rejeitar pedido de arquivamento, e o Sr. Ministro Barros, rejeitando o pedido, aplicou, em sua conclusão, o princípio do art. 28 do Cód. de Pr. Penal, determinando, em conseqüência, a remessa dos autos ao Procurador-Geral da República, e o Sr. Ministro Bueno, rejeitando também o pedido, divergiu, na conclusão final, do Sr. Ministro Barros, porque findou o seu voto por determinar a abertura de vista dos autos à vítima.
.................................................................................................................
4. No Inq-2, de 1989, a Corte deferiu o pedido de arquivamento, sem, contudo, discutir sobre se lhe era lícito, ou não, recusar o pedido. Mas, no Inq-12, de 1990, embora o pedido de arquivamento tenha sido deferido por unanimidade, tal questão acabou sendo aflorada, em debate entre os Srs. Ministros José Dantas e Assis Toledo. Foi na Rp-22, de 1991, que esta Corte, por iniciativa do Sr. Ministro Pádua Ribeiro (relator), debateu amplamente a questão, e ficou então decidido o seguinte, de acordo com o 'extrato da minuta': 'Decisão: A Corte Especial, preliminarmente e por maioria, decidiu, em questão de ordem, que o pedido de arquivamento não vincula o Tribunal..."
Observem que, nesse caso, de 1992, o Superior Tribunal, de um lado, compreendeu, uma vez mais, que o pedido de arquivamento não o vincularia; de outro lado, entendeu, talvez pela vez primeira, que a omissão ministerial daria à vítima "a possibilidade de aforar a ação penal privada subsidiária". É que, na Rp-22, a compreensão fora, já que rejeitado o pedido de arquivamento, no sentido da remessa dos autos ao Procurador-Geral da República (Cód. de Pr. Penal, art. 28).
5.No precedente de 1992, até que acompanhei a maioria que lá se formou, tal a conclusão do meu voto: "Ante o exposto, acompanho o voto do Sr. Ministro Barros Monteiro, isto é, defiro o pedido de desmembramento e rejeito, no mais, o pedido de arquivamento, mas, quanto ao procedimento a ser adotado, se rejeitado o pedido de arquivamento, adiro à conclusão do Sr. Bueno de Souza."
6.Dos anos setenta, lição de Frederico Marques provocou reflexões, ei-la resumidamente ("Elementos...", vol. I, págs. 340?1):
"Também não nos parece que o Ministério Público seja o dono da ação penal nos 'processos de competência originária' do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais de Justiça.
................................................................................................................
Sendo assim, indeferido pelo Tribunal o pedido de arquivamento formulado pelo procurador-geral, ou este oferece denúncia, ou atribui essa função a seu substituto legal, ou então será nomeado procurador ad hoc para esse fim. Aplica-se, in casu, por analogia, o que dispõe o art. 419 do Cód. de Proc. Penal, porquanto o indeferir o arquivamento equivale ao Tribunal declarar admissível a acusação e necessária a propositura da ação penal."
7.Ultimamente, no entanto, temos tido orientação adstrita ao requerimento ministerial, exemplificativamente, do ano 2008, Sd-150, Ministro Fernando, e Rp-314, do ano 2009, Ministro Falcão. De igual maneira, quanto à ação privada, não a temos admitido, conforme já visto.
8.Até que me proporia, quanto ao arquivamento em si, exercer um pouco mais de controle das investigações, quem sabe à vista da lição de Frederico Marques. Já quanto à ação penal privada - ação privada subsidiária -, não mais me proporia mexer na atual jurisprudência da Casa, recordando, uma vez mais, a lição de Vicente de Azevedo:
"... o promotor público, que havia requerido o arquivamento do inquérito, e obtido o deferimento, ver-se-ia na contingência de promover a ação penal contra sua vontade e opinião, porque a parte, depois de oferecê-la, e vê-la recebida, dela se desinteressou, negligenciou quanto ao seu andamento."
9. Com essas reminiscências de ontem e de hoje, estou votando, com a devida vênia do Relator, no sentido de negar provimento ao agravo regimental. Posto que esteja, assim, colocando-me, penso eu, ao lado da nossa atual jurisprudência, estou, no entanto, provocando, em torno da matéria, o debate.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES:
Sr. Presidente, estou de acordo com o voto-vista do Sr. Ministro Nilson Naves.
Nego provimento ao agravo regimental.
VOTO
A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ: Sr. Presidente, verifico um precedente da Corte Especial, ou seja, o Inquérito nº 528?MT - não sei se o eminente Relator. citou esse inquérito -, relatado pelo Ministro Gilson Dipp, no mesmo sentido do voto divergente.
Acompanho a divergência inaugurada pelo Sr. Ministro Nilson Naves, negando provimento ao agravo regimental.
MINISTRA LAURITA VAZ
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
CORTE ESPECIAL
AgRg na
Número Registro: 2008?0240498-3 Sd 180 ? RJ
Número Origem: 100000010466200823
EM MESA JULGADO: 04?11?2009
Relator
Exmo. Sr. Ministro LUIZ FUX
Relator para Acórdão
Exmo. Sr. Ministro NILSON NAVES
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro ARI PARGENDLER
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. EDINALDO DE HOLANDA BORGES
Secretária
Bela. VANIA MARIA SOARES ROCHA
AUTUAÇÃO
REQUERENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
REQUERIDO: C S R
ADVOGADO: JOSÉ LEOVEGILDO OLIVEIRA MORAIS E OUTRO(S)
ASSUNTO: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO - Agentes Políticos - Ministério Público - Processo Disciplinar ? Sindicância
AGRAVO REGIMENTAL
AGRAVANTE: SALETE MARIA POLITA MACCALOZ
ADVOGADO: CONSTANTINO ALVES DE OLIVEIRA
AGRAVADO: CSR
INTERES.: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia CORTE ESPECIAL, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Nilson Naves negando provimento ao agravo regimental, e os votos dos Srs. Ministros Fernando Gonçalves, Felix Fischer, Aldir Passarinho Junior, Gilson Dipp, Eliana Calmon e Laurita Vaz, no mesmo sentido, a Corte Especial, por maioria, negou provimento ao agravo regimental. Vencidos os Srs. Ministros Relator e João Otávio de Noronha.
Lavrará o acórdão o Sr. Ministro Nilson Naves.
Votaram com o Sr. Ministro Nilson Naves os Srs. Ministros Fernando Gonçalves, Felix Fischer, Aldir Passarinho Junior, Gilson Dipp, Eliana Calmon e Laurita Vaz.
Não participaram do julgamento os Srs. Ministros Hamilton Carvalhido, Nancy Andrighi e Teori Albino Zavascki.
Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Ari Pargendler.
Brasília, 04 de novembro de 2009
VANIA MARIA SOARES ROCHA
Secretária
Documento: 898264
Inteiro Teor do Acórdão
DJ: 28/06/2010
JURID - Crimes contra a honra (calúnia, difamação e injúria). [30/07/10] - Jurisprudência
Nenhum comentário:
Postar um comentário