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quinta-feira, 29 de julho de 2010

JURID - Condenação. Tráfico de drogas [29/07/10] - Jurisprudência


Sogra e nora condenadas por tráfico de drogas.
MBA Direito Comercial - Centro Hermes FGV


COMARCA DE RESTINGA SECA
VARA JUDICIAL


Processo nº: 147/2.09.0000432-6
Natureza: Produção e Tráfico Ilícito de Drogas
Autor: Justiça Pública
Réu: Carmen Roselaine Rios Coelho
Franciele Ferreira Carvalho e Luiz Carlos de Lara
Juiz Prolator: Juiz de Direito - Dr. Eduardo Giovelli
Data: 12/07/2010



VISTOS ETC.

O Ministério Público ofereceu denúncia contra CARMEN ROSELAINE RIOS COELHO, FRANCIELE FERREIRA CARVALHO E LUIZ CARLOS DE LARA como incursos nas sanções do art. 33, "caput", e art. 35, ambos da Lei nº 11.343/06, majorados pelo artigo 40, inciso VI, do mesmo diploma legal, em concurso material de infrações, porque:

"1º Fato:

Por volta do dia 25 de maio de 2009 até, aproximadamente, o dia 24 de agosto de 2009, às 08 horas, na Rua Emílio Nagel, nº 11, Restinga Seca, as denunciadas Carmem Roselaine Rios Coelho, Franciele Ferreira Carvalho e Luiz Carlos de Lara, em comunhão de vontades e conjunção de esforços com os inimputáveis Luiz Carlos de Lara Junior e Douglas Coelho de Lara, remeteram, prepararam, adquiriram, tinham em depósito, transportaram, ofereceram, guardaram e venderam drogas, sem autorização e em desacordo com a determinação legal, quais sejam, "maconha" e "crack", conforme Auto de Apreensão de Substância Entorpecentes das fls. 17 e 73/74, Laudo Pericial das fls. 20 e 60 e Levantamento Fotográfico da fl. 21 a 24 e 75 a 76.

No período, o grupo criminoso vinha sendo acompanhado e investigado pela Delegacia de Polícia de Restinga Seca, a qual recebeu uma ligação telefônica anônima, informando que as denunciadas, na noite anterior, teria recebido drogas para comercialização, mas como não haviam conseguido vender, "quebrar" e embalar toda a droga (crack), esconderam-na na casa.

Posteriormente, em diligências no local, foram apreendidas 48 (quarenta e oito) pedras de crack, embaladas e prontas para consumo, e 01 (uma) pedra com aproximadamente 10g ainda inteira, sendo que a droga estava escondida na parte externa da parede, atrás de umas tábuas.

Para tanto, na noite anterior o adolescente Douglas Coelho de Lara, vulgo "Zoreia" teria ido buscar a droga a um fornecedor.

Conforme apurado, o grupo criminoso atuava da seguinte forma: após a prisão dos indivíduos Ademar Ferreira da Cunha, vulgo "Alemão" e Magnun Coelho de Lara, e da internação do adolescente Luiz Ricardo Reginaldo de Lara, o comércio de drogas no local, denominado "Beco do Ferrão", passou a ser realizado pelo adolescente Luiz Carlos de Lara Júnior, como apoio de seu genitores (Luiz Carlos de Lara e Carmem Roselaine Rios Coelho).

O grupo criminoso ainda contava com o apoio do adolescente Douglas Coelho de Lara e da denunciada Franciele Ferreira Carvalho, irmão e namorada de Luiz Carlos, respectivamente, sendo que com a internação deste na FASE/Santa Maria, ocorrida em 08 de julho de 2009, o negócio passou a ser tocado por Carmem, Franciele e Douglas.

Embora internado, Luiz Carlos de Lara Junior continuou a comandar e a supervisionar a venda de drogas de entre da FASE, através do contato com familiares e envio de cartas para seus comparsas e subordinados, fls. 80 a 82, Desta feita, a busca da droga junto a fornecedores, bem como o auxílio no seu preparo (divisão em porções e embalagem para a mercancia) ficava a cargo do inimputável Douglas Coelho de Lara, sendo que a venda era realizada atraés de Carmen e Franciele.

Quanto a Luiz Carlos de Lara, a este cabia, juntamente com Franciele, ceder sua conta bancária para o depósito do dinheiro auferido na venda das drogas, além de prestar apoio moral a seus familiares na empreitada criminosa.

O dinheiro obtido na venda da droga era depositado nas contas bancárias da denunciada Franciele e de Luiz Carlos de Lara, fls. 31 a 35, sendo utilizado, dentre outras coisas, no sustento e manutenção de Luiz Carlos na FASE e dos demais indivíduos junto ao Sistema Penitenciário.

2º Fato:

Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar acima descritas, os denunciados Carmem Roselaine Rios Coelho, Franciele Carvalho e Luiz Carlos de Lara, juntamente com os inimputáveis Luiz Carlos de Lara e Douglas Coelho de Lara, associaram-se para o fim de praticar, reiteradamente, a remessa, preparo , aquisição, venda, exposição à venda, oferta, manutenção em depósito, transporte, guarda, entrega a consumo e fornecimento de drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Na oportunidade, conforme revelaram a investigações policiais, a supracitada associação criminosa atuava da seguinte forma: Luiz Carlos de Lara Junior comandava e supervisionava a venda de drogas de dentro da FASE/Santa Maria, mandando cartas para seus comparsas. A busca da droga junto a fornecedores ficava a cargo de Douglas Coelho de Lara, sendo que a venda era realizada através de Carmen e Franciele. Quanto a Luiz Carlos de Lara, a este cabia, juntamente com Franciele, ceder sua conta bancária para o depósito do dinheiro auferido na venda de drogas, fls. 31 a 33 e 35, além de prestar apoio moral e material a seus familiares na empreitada criminosa."


As denunciadas Carmen e Franciele foram presas em flagrante quando do cumprimento de mandado de busca e apreensão, cujo flagrante restou instruído com Laudo de Constatação da Natureza da Substância (fls. 50 e 89) e foi homologado judicialmente.

O pedido de liberdade provisória foi indeferido, bem como indeferida a postulada apreensão dos valores constantes das contas bancárias de titularidade de Franciele e Luiz Carlos, mesma oportunidade que houve indeferimento do pedido de internação do adolescente Douglas.

Aportou aos autos o Laudo Toxicológico Definitivos, fls. 129, confirmando que as substâncias apreendidas se tratam de Cocaína, substância psicoativa presente em drogas conhecidas como crack, merla e "cocaína".

O procurador das denunciadas habilitou-se (fls. 180 e 181).

Os réus foram notificados, pessoalmente, para responderem à acusação, fls. 195V e 228.

As defesas se manifestaram, fls. 189, 190 e 192-194, aduzindo a inocência dos réus, postulando a produção de prova testemunhal e arrolando testemunhas.

A denúncia foi recebida em 20 de outubro de 2009, sendo determinada a citação dos réus e designada audiência de instrução e julgamento.

Informado impetração de Habeas Corpus e prestadas informações, fls. 212, aportou decisão superior denegando a ordem (fls. 250-254).

Aportou aos autos ofício do Banco Central fornecendo relatórios em atenção a determinação de quebra de sigilo bancário dos réus Franciele e Luiz Carlos (fls. 233-236)

Durante a instrução, a qual, com concordância da acusação e defesa, se deu em conjunto com o processo que os inimputáveis Douglas e Luiz Carlos Junior respondem pelos mesmos fatos, foram inquiridas 14 testemunhas. A pedido da defesa e com concordância do Ministério Público, o interrogatório dos réus foi postergado para o final da instrução, como último ato desta.

Com vista do ofício do Banco Central o Ministério Público especificou as instituições bancárias requerendo que fosse oficiado, o que foi deferido.

Sobreveio aos autos pedido de liberdade provisória às rés, o qual, após parecer contrário do Ministério Público, foi indeferido.

Carreadas aos autos respostas aos ofícios expedidos às instituições bancárias (fls. 305-306).O Ministério Público manifestou-se sobre os ofícios das instituições bancárias carreando aos autos extratos e CD fornecido pelo Banco do Brasil (fls. 326-340), dos quais foram dado vista à defesa.

Aportou ofício informando a interposição de novo Habeas Corpus em favor das rés Carmen e Franciele, com decisão superior denegando a ordem (fls. 346-352).

Acostado aos autos resposta ao ofício expedido ao Bradesco, da qual foi dado ao MP, cujo representante manifestou-se nos autos, informando o envio do feito à Divisão de Assessoramento Técnico do Ministério Público (DAT), para fins de perícia técnica nas provas carreadas pelas instituições bancárias.

Novo pedido de informações para instruir Habeas Corpus, tendo como pacientes as denunciadas, prestadas (fls. 360-361).

Aportou aos autos parecer da Unidade de Assessoramento Contábil do Ministério Público do Rio Grande do Sul do qual foi dado vista à defesa.

Os réus foram interrogados, negando os fatos, sustentando nunca terem comercializados substâncias entorpecentes, tendo a defesa reiterado o pedido de liberdade provisória, o qual foi indeferido.

Atualizados os antecedentes (fls. 396-402).

Em Memoriais, o Ministério Público, após longa e exaustiva análise da prova e dos elementos carreados aos autos, requereu a condenação das rés Carmen e Franciele, nos termos da denúncia, entendendo provadas a autoria e materialidade dos fatos narrados na peça vestibular, e a absolvição do corréu Luiz Carlos de Lara, diante da insuficiência probatória.

Já a defesa dos réus, em preliminar, postulou a nulidade por afronta ao artigo 212 do CPP e afronta ao princípio do sistema acusatório e da legalidade, no mérito, a absolvição com assento na fragilidade das provas quanto aos delitos imputados ou, alternativamente, aplicação da minorante do §4º do art. 33 da Lei 11.343/06.

Vieram-me os autos conclusos.

É O RELATO. PASSO A DECIDIR.

Primeiramente, no tocante a alegação de nulidade do feito por afronta ao artigo 212 do CPP e ao princípio do sistema acusatório e da legalidade, não prospera.

No meu entender, não houve qualquer afronta ao sistema adotado pelo CPP ou, mais especificamente, ao teor do art. 212 desse Diploma. Certo e não se olvida que este sofreu nova redação com a alteração estampada pela lei 11689 de 2008. Contudo, ao meu juízo, a novel redação em momento algum teve a intenção ou tem o condão de retirar o poder instrutório do Juiz quando da inquirição das testemunhas. Se entender o contrário, respeitada vênia, é o mesmo que dizer que o Magistrado, na audiência para inquirição de testemunhas, passou a ser mero expectador do ato. E isto, na atual senda evolutiva do processo penal, não se pode aceitar, ao meu ver.

Os depoimentos seguem sendo presididos pelo Juiz, mesmo após a reforma processual de 2008, somente inovando o referido artigo ao facultar às partes indagarem diretamente das testemunhas em vez de fazê-lo através do juiz. Esta é a leitura que faço da novel redação do dispositivo. Mas nem de longe, ao meu ver, retirou (ou melhor, excluiu pois esta seria a consequência ao se acolher a tese da defesa) o poder/dever do Magistrado em questionar às testemunhas e vítimas sobre o acontecido, reservando-lhe apenas faculdade de complementar ao questionado pelas partes. Pensar em contrário, repito, geraria situações de ordem prática surreais e geradoras de ridículo. Nesta mesma linha argumentativa, Recurso Crime Nº 71002368470, Turma Recursal Criminal, Turmas Recursais, Relator: Laís Ethel Corrêa Pias, Julgado em 14/12/2009.

Sobre o tema, leciona Guilherme de Souza Nucci sobre este tema [1]:

"[...] Tal inovação, entretanto, não altera o sistema inicial de inquirição, vale dizer, quem começa a ouvir a testemunha é o juiz, como de praxe e agindo como presidente dos trabalhos e da colheita da prova. Nada se alterou nesse sentido. A nova redação dada pelo art. 212 manteve o básico. Se, antes, dizia-se que 'as perguntas das partes serão requeridas ao juiz que as formulará à testemunha, agora se diz 'as perguntas serão formuladas pelas partes diretamente às testemunhas (...)'. Nota-se, pois, que absolutamente nenhuma modificação foi introduzida no tradicional método de inquirição, iniciado sempre pelo magistrado. Porém, quanto às perguntas das partes (denominada reperguntas na prática forense), em lugar de passarem pela intermediação do juiz, serão dirigidas diretamente às testemunhas. Depois que o magistrado esgota suas indagações, passa a palavra àquele que arrolou a pessoa depoente."

"[...] embora desnecessário o conteúdo do parágrafo único, por ser óbvio, pode o magistrado continuar a perguntar à testemunha, mesmo quando as partes finalizem suas questões, caso não esteja satisfeito com as respostas dadas, em especial no tocante aos pontos não esclarecidos pela pessoa depoente."


Nesse sentido o amparo jurisprudencial de recentes precedentes:

EMBARGOS INFRINGENTES. CODIGO DE PROCESSO PENAL. CPP. ARTIGO 212. A nova redação do art. 212 do CPP, dada pela Lei n. 11.690/2.008, não retirou do Juiz a primazia na instrução, com a inquirição do ofendido, das testemunhas, peritos, acusados(s). A alteração limitou-se a dispensar a intervenção do Juiz por ocasião das perguntas das partes, sem que isto signifique estar ele alheio ao que acontece, pois continua a monitorar ¿ controlar ¿ a forma como são feitas as perguntas, bem como a utilidade. Leitura sistemática do Código leva a esta conclusão, pois não há razão lógica para que, no interrogatório e no Tribunal do Júri, o Juiz pergunte antes, e seja diferente no momento de ouvir as testemunhas. EMBARGOS INFRINGENTES DESACOLHIDOS. (Embargos Infringentes e de Nulidade Nº 70032882730, Segundo Grupo de Câmaras Criminais, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado em 13/11/2009)

APELAÇÃO. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO ¿ SUSPENSÃO DA ATIPICIDADE ¿ PRELIMINARES ¿ SISTEMA ACUSATÓRIO ¿ ARTIGO 212 CPP. 1. A nova redação do artigo 212 do CPP, embora tenha introduzido elementos do sistema acusatório, não excluiu o juiz das perguntas às testemunhas, nem reservou-lhe função meramente complementar, eis que no artigo 203 do mesmo diploma, 222 (precatórias), 201 (ofendido) e 188 (interrogatório) e 473, mantêm o sistema presidido pelo juiz. De qualquer forma, não há nulidade alguma se as perguntas sobre o fato iniciarem-se pelo juiz, eis que nenhum prejuízo a qualquer das partes. 2. Incabível a aplicação da disposição transitória que suspendeu temporariamente a tipicidade adequada as situações do art. 12 da Lei n. 10.826/03 ao porte de arma de fogo em via pública. 3. Pena de multa é sanção penal cumulativa, não comportando isenção sob alegação de pobreza, cabe ao juiz da execução tratando-se de dívida de valor encaminhar à Fazenda Pública para eventual execução. 4. As custas, são de apreciação do Juiz da execução. 5. Readequada a prestação pecuniária. PARCIAL PROVIMENTO. (Apelação Crime Nº 70033232174, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Elba Aparecida Nicolli Bastos, Julgado em 14/01/2010)


No voto do primeiro acórdão consta argumentação com a qual concordo de forma integral, nos seguintes termos:

Significa dizer que o essencial foi mantido, na busca da solução para o processo, que deverá ser dada pelo Juiz, deverá ser ele, o dito destinatário da prova, a recolher aquilo que considerar necessário para o seu convencimento.

Afinal de contas, é no juízo cível que vigora o sistema dispositivo, onde se discutem direitos individuais, e onde cada um dos interessados deve tratar de produzir a prova que seja conveniente aos seus interesses.

Mas no juízo criminal os interesses não são individuais, não são particulares, não são meramente patrimoniais.

Está presente o interesse do Estado, da sociedade, em aplicar o direito, verificando o fato com toda a sua configuração, para então fazer incidir a norma sobre o suporte fático, o caso concreto.

Cuida-se de trazer para o processo a verdade dos fatos, não devendo ser feita a presunção, preconceituosa, de que o Juiz, ao perguntar à testemunha, ou mesmo no interrogatório, estará buscando prejudicar o acusado, atuando como assistente da acusação, mas tão somente buscando esclarecimentos que permitam a ele, Juiz, decidir a causa de acordo com o seu entendimento, a partir da análise serena da prova, aplicando o direito ao fato que foi trazido a julgamento. E, se não atua com assistente da acusação, também não atuará como defensor subsidiário, ou de reserva.

Vale dizer, o Juiz não estará fazendo papel de acusador nem de defensor, mas estará dirigindo perguntas à testemunha para que fique esclarecido o fato em julgamento, venham as declarações em favor da acusação, venham a favor da defesa.

Afinal de contas, a mesma reforma processual penal igualmente se encarregou de fazer voltar o princípio da identidade física do Juiz, da imediatidade, da concentração de atos em audiência, tudo para que, na medida do possível, o mesmo Juiz que se encarregou da instrução seja o Julgador.

E, neste contexto, fazer com que ele se torne mero espectador, mero assistente, quase uma figura decorativa, sem que possa resolver as suas próprias dúvidas, solucionar as angústias da lide e do julgamento, é pretender impedir que a verdade aflore, venha à tona, para que apenas seja esclarecido aquilo que interessa a um e outro lado, que pode nem sempre corresponder à verdade real.

A imparcialidade há de ser preservada. A busca de elementos para o julgamento há de ser assegurada.

Não se queira que o Juiz seja um mero assistente, passivo, que em um primeiro momento apenas ouve o que for do interesse das partes, para indagar supletivamente, apenas para esclarecer algum ponto.


Do corpo do último acórdão citado acima, no voto da Relatora Elba Aparecida Nicolli Bastos, consta passagem elucidativa sobre a questio, após tecer comparações com a forma de inquirição previstas no rito do Júri, art. 473, e quando do interrogatório do réu, art. 187, e à inquirição do ofendido, art. 201 e 203, todos do CPP, escreve:

Não é crível que o Código de Processo Penal tenha alterado o sistema processual para acusatório, apenas quando da inquirição da testemunha, isto ressaltando-se que mantidas as perguntas do 203 quando a testemunha é ouvida pelo juiz que preside a instrução. Veja-se que se inquirida por precatória, a lei processual, continua a dispor no artigo 222 da seguinte forma:

222- A testemunha que morar fora da jurisdição do juiz será inquirida pelo juiz do lugar de sua residência, expedindo-se para este fim carta precatória com prazo razoável, intimadas as partes.


Que mudança para o sistema acusatório é este introduzido pela nova lei se manteve a primazia do Juiz, quando ouve o ofendido, artigo 201, também as testemunhas, nos termos do artigo 203, por precatória, artigo 222 e também no Júri?

Entendo que a única resposta possível é que não houve alteração para o sistema acusatório pura e simplesmente, na redação do artigo 212, quando da inquirição de testemunhas. O juiz não está alijado de sua função de presidir o processo, perguntar sobre o fato e o que sabe sobre ele, logo após a qualificação, como consta da redação do artigo 203 do mesmo Código.


Certamente, isto não significa que o juiz esteja substituindo a acusação ou a defesa. O artigo 212 consolida a lógica e a racionalidade ao dispor que as perguntas serão feitas diretamente. Evidente que cada parte vai perquirir para provar suas teses, mas o que a testemunha sabe sobre o fato e as razões de sua ciência e circunstâncias cabem ao juiz, que por óbvio, como terá que proferir sentença, no caso de delitos comuns deve formar sua convicção de maneira lógica com a reconstituição dos fatos e conduta do acusado, ofendido etc, não ficando exclusivamente com as respostas oferecidas às partes.

Seria uma perda de tempo e, até prejudicaria as perguntas deixar exclusivamente às partes, parciais para depois, ao final o juiz complementar. Claro que mesmo ao final, sempre poderá complementar, se a partir das perguntas permanecem lacunas que precisam ser explicadas, evitando que tenha que determinar, antes de proferir sentença a produção de outras provas e diligências para esclarecer pontos relevantes. Artigo 156, I e II do CPP.

De qualquer forma, mesmo que pudesse ser considerada nulidade por omissão de formalidade legal (564, inciso IV) imprescindível que seja indicado o prejuízo concreto, que à toda evidência inexiste, eis que observado o contraditório e o devido processo legal.

In casu, quando do ato não houve qualquer protesto pela defesa quanto à forma em que realizada a inquirição, somente agora, em sede de memoriais, o Bacharel (o mesmo que estava presente à audiência e naquele momento silenciou) alega esta ocorrência. Todavia, ao estar presente a toda audiência silenciando, concordando (ainda que tacitamente) com a realização da inquirição naquela forma, e ausente qualquer prejuízo ao réu com tal, resta prejudicada neste momento de alegação esta preliminar.

Em outro viés, as testemunhas do presente processo foram ouvidas de forma a preservar as garantias constitucionais do réu e sem ofensa à imparcialidade do julgador.

Transcrevo parte do voto vitorioso do ilustre Des. Mario Rocha Lopes Filho, proferido na apelação criminal Nº 70028904530, em que este manifesta entendimento contrário à tese da nulidade processual por afronta ao artigo 212 do CPP, com redação dada pela Lei nº 11.690/2008:

"Examinando-se a instrução processual, percebe-se que o magistrado, após formular seus questionamentos às testemunhas e à vítima, concedeu a palavra ao agente ministerial que, por sua vez, inquiriu diretamente as testemunhas e a informante, silenciando a defesa quando lhe foi oportunizada a indagação (fls. 107/110).

O magistrado, assim agindo, inverteu o ritual preconizado pela recente reforma imposta ao processo penal brasileiro, reforma esta inconseqüente quando autoriza, no procedimento capital, a sistemática agora impugnada pelo relator. Faltou coerência e lógica, colocando em xeque os objetivos pretendidos; aliás, quais os objetivos pretendidos pelo legislador?

De outro lado, qual o prejuízo?

É consabido que o reconhecimento de qualquer nulidade não prescinde da demonstração cabal do prejuízo derivado de ato oportuno tempore impugnado; no caso, sequer houve impugnação, protesto formal por parte da defesa, não me parecendo razoável o reconhecimento de ofício com presunção de prejuízo.

Registro, ainda, que o magistrado, apesar das reformas, não está impedido, incapacitado ou proibido de perguntar ao réu, à vítima ou às testemunhas. A inversão imposta pelo artigo 212, não lhe impede de, se achar necessário, indagar das testemunhas, questioná-las. Não há limitação. Apenas entendeu o legislador de protrair o momento do questionamento judicial, facultando-lhe a inquirição "sobre pontos não esclarecidos".

É certo que a mini-reforma processual subtraiu, neste procedimento, a figura do juiz-ator (adjetivo utilizado muitas vezes de forma pejorativa) colocando-o em posição eqüidistante e de fiscalização da prova testemunhal, aproximando-o, em tese, do adversarial system. Na prática, como afirmado, apenas alterou a posição do juiz em relação à colheita da prova, facultando-lhe todo e qualquer questionamento no sentido do esclarecimento do fato quando as partes não tiverem discernimento ou competência para fazê-lo.

Assim, o fato de tê-lo feito antes, a ausência de requisição da defesa, que concorreu, decisivamente, para o equívoco, inviabiliza o reconhecimento da nulidade." [2]

Nesta senda, entendo que não houve violação à lei e à imparcialidade nas inquirições em comento, haja vista que em momento algum foi a intenção do legislador reformista do processo penal ou desta própria reforma retirar a capacidade/poder de instrução probatória e de colheita de depoimentos pelo Magistrado, passando este a ser mero expectador das partes e sem qualquer poder instrutório, em sentido totalmente oposto ao que se tem afirmado pelas teorias modernas do processo, pelo que afasto a prefacial.

Da mesma forma outro precedente:

APELAÇÃO CRIME. DELITO DE AMEAÇA. ART. 147, CAPUT, DO CÓDIGO PENAL. ORDEM DE INQUIRIÇÃO DAS TESTEMUNHAS. A ordem de quem inicia às perguntas à vítima e/ou testemunhas, juiz ou partes, não produz qualquer nulidade, pois se não questionar a testemunha ao início, está o juiz expressamente autorizado a questioná-la ao final, com o que o resultado prático da ordem de inquirição não produzirá qualquer nulidade. Destinatário da prova é o magistrado, que deve ser esclarecido sobre os fatos, o que se afigura indispensável para o julgamento da lide penal, estando o mesmo autorizado a buscar a verdade real para a formação de sua convicção. Diante da prova judicializada resta demonstrada a existência do fato e a autoria do delito de ameaça, bem como o temor da vítima, impondo-se a confirmação da sentença condenatória. Substituição da pena readequada de ofício. APELAÇÃO IMPROVIDA. (Recurso Crime Nº 71001889096, Turma Recursal Criminal, Turmas Recursais, Relator: Angela Maria Silveira, Julgado em 24/11/2008)

Cito, ainda, quanto a tal que a redação do art. 201 do CPP, da mesma Lei 11690/08, corroborado pelo art. 203, confere plena e total liberdade ao Magistrado para realizar as perguntas à vítima, inexistindo neste dispositivo qualquer vedação à imediata e inicial inquirição pelo Magistrado, com posterior transferência da palavra e da oportunidade de questionar a vítima aos demais atores do processo.

No mérito, analiso conjuntamente os fatos diante da inter-relação e conexão probatória.

A denúncia prospera em parte.

A materialidade vai demonstrada à saciedade pelos relatórios constantes do auto de prisão em flagrante das rés de fls. 25-55, ocorrência policial de fls. 82. Especialmente, auto de apreensão de fls. 86 no qual foram apreendidas em poder da rés Carmen e Franciele, na sua residência, 48 (quarenta e oito) pedras de crack embaladas e prontas para o consumo e 01 (uma) pedra de crack, embalada, pesando, aproximadamente, 10g, fotografias de fls. 90-93 e 144-145, e auto de apreensão oriundo de cumprimento de Mandado de Busca e Apreensão na residência da denunciada Carmen, ocasião em que foram encontrados um pedra pequena de crack, três tesouras, um pedaço de plástico pequeno cortado de forma redonda, vários pedaços ou retalhos de plásticos (sacolas), uma chip de aparelho celular e três bilhetes/cartas, bem como as cartas de fls. 149-152. Também atestada pela prova testemunhal e Laudo de movimentação bancária da conta de titularidade a corré Franciele de fls. 364-280.

Em especial, o laudo provisório de constatação da natureza da substância (fls. 50 e 89) encontradas na residência das rés, que comprova que o produto apreendido era efetivamente "crack". E o laudo definitivo de fls. 129 oriundo do IGP corrobora ao atestar que tal substância se trata de cocaína, substância psicoativa presente em drogas conhecidas como crack, com princípios ativos causadores de dependência, tudo corroborado pelo auto de apreensão de fls. 86.

Materialidade, portanto, robustamente demonstrada nos autos pela farta prova carreada.

A autoria, entretanto, apenas é certa na pessoa das rés Carmen e Franciele. Quanto ao réu Luiz Carlos de Lara, contrariamente, não há provas da sua participação no ilícito, sendo o caso da absolvição deste último.

Os réus quando inquiridos negam a autoria dos fatos que lhe são imputados.

Carmen Coelho, às fls. 393, afirma não traficar substâncias entorpecentes nem ter conhecimento da droga existente na parede de sua residência, referindo:

"Nega os fatos. Que a depoente nunca comercializou droga. Somente soube que seu filho Luiz Carlos Junior estava envolvido com droga depois desde ter sido internado na Fase, que a depoente foi visitá-lo na Fase e o mesmo lhe contou a verdade. Que a depoente nunca participou do ilícito. Do mandado de busca diz que franquiou a casa aos policiais e que estes revistaram dentro da casa e nada localizaram, a depoente ficou dentro da casa com a inspetora Denise e os outros policiais foram olhar do lado de fora e depois voltaram com um jornal onde estaria a droga. Que a droga fora localizada do lado da casa, na parede externa da casa, que a casa tem parede dupla e é cheia de buracos e a droga estaria em um buraco na parede. Que a depoente não sabia da existência da droga. A corré Franciele estava posando na casa da depoente naquele noite pois é namorada de Luiz Carlos Junior. Cerca de uma semana antes da apreensão a policia esteve na casa da depoente e da casa ao lado de seu companheiro Ferrão fazendo buscas com um cachorro, diz que toda a casa foi revirada e nesta ocasião nada foi encontrado. Não tem ideia quem escondeu a droga. Diz que havia um movimento no beco pois havia um ponto de drogas em uma casa que seu marido alugou no beco, que esta casa era na frente da casa da depoente. Diz que o movimento no beco era por causa deste ponto de venda de droga. Na verdade eram dois pontos de venda de drogas no beco, um desta casa na frente e outro da casa ao lado, este último seria da pessoa de Ademar ferreira.... Quando Luiz Junior estava na Fase a depoente os visitava nos finais de semana e levava coisas para ele. Que as passagens eram dadas pela Prefeitura. Franciele não morava com a depoente, apenas as vezes posava na casa da depoente por namorar Junior. O corréu Luiz Carlos é esposo da depoente, mas não residem juntos, cada um mora na sua casa mas Luiz Carlos ajuda financeiramente a depoente."

Franciele Ferreira Carvalho, a seu turno, fls. 394, da mesma forma nega traficar substância entorpecente e informa que era a sogra Carmen, ora corré, que movimentava a conta de sua titularidade. Eis sua palavras:

"(...) Nega os fatos. Nunca comercializou ou transportou drogas. Era e continua sendo namorada de Luiz Carlos Junior. Somente após este ter sido encaminhado à Fase é que a depoente soube se seu envolvimento com drogas. Que a depoente nunca teve qualquer relação com a mercancia de entorpecentes. No dia da apreensão da droga na casa de Carmen a depoente estava posando no local, a depoente não residia com Carmen, apenas pernoitava de fez em quando. Não tinha emprego fixo na época, as vezes ia para fora para trabalhar como doméstica. Ganhava por dia. Pouco antes de ser presa trabalhava em uma casa em Santa Maria e ganhava noventa reais por semana. A depoente possuía conta bancária mas quem movimentava era Carmen, que Carmen estava com e na posse do cartão do banco pois ninguém na casa possuía conta bancária e ela pediu e a depoente emprestou. Na verdade era Carmen quem mexia na conta. Cascuda é o apelido que Luiz Carlos Junior chamava a depoente. Que Junior mandava cartas para a depoente quando estava na Fase. Não sabe sobre os saques da conta que eram realizados em Santa Maria. Na verdade a depoente apenas emprestou o nome para a conta bancária mas era Carmen quem cuidava e movimentava. "

Luiz Carlos de Lara, fls. 395, na mesma trilha da rés, nega as acusações:

"Nega os fatos que nunca traficou ou vendeu drogas. Franciele era namorada do guri. Franciele não morava no local. Faz dois anos que esta separado de Carmen, cada um mora na sua casa mas o depoente da alimentos para os filhos que tem com Carmen. Não é verdade que Carmen vende drogas. Que havia uma boca de venda de ponto de drogas na frente da casa do depoente, que hoje ainda funciona um ponto de venda ali na frente... Diz que a droga foi encontrada na parte externa da casa de Carmen. O depoente tem duas contas bancárias, uma e para pagamento do INSS e a outra o depoente coloca o dinheiro para ninguém mexer."

Entretanto, a negativa das rés é rechaçada pelo restante da prova trazida à baila, estando tal negativa totalmente divorciada do conjunto probatório carreado, a qual não encontra ressonância nos autos. Ao contrário do que afirmam as rés, a prova carreada é uníssona e robusta a indicar que ambas, Carmen e Franciele, efetivamente estavam associadas entre si e com os adolescentes Luiz Carlos Junior e Douglas, e juntos praticavam o tráfico ilícito de entorpecentes na cidade.

Quanto aos adolescentes, já o foram condenados no processo de ato infracional por ambos os delitos de tráfico de entorpecentes e associação para tal, já estando a cumprir as respectivas medidas socio-educativas aplicadas.

A prova colhida é uníssona em indicar a autoria dos fatos narrados na exordial nas pessoas das rés Carmen e Franciele, pouco ou nada informando sobre o envolvimento de Luiz Carlos com o tráfico de entorpecentes.

O Delegado Jun Sukekava, em seu depoimento, fls. 256, relata as investigações e o envolvimento, especialmente das rés Carmen e Franciele, bem como dos adolescentes Luiz Carlos Júnior e Douglas, com o tráfico de drogas na cidade. Eis suas palavras:

"Que houve uma apreensão de drogas na casa da ré Carmen, ao que recorda foi apreendido um pacote contendo várias pequenas pedras de crack já embaladas para venda, foi apreendido esta droga na parede da casa pelo lado de fora. A casa onde houve a apreensão é da ré Carmem mas o réu Luiz Carlos de Lara não reside nesta e sim na casa ao lado. Carmem morava com os filhos na residência. Nenhum dos filhos que respondem ao processo de ato infracional pelos mesmos fatos se encontrava na casa quando do cumprimento do mandado. Que o depoente na noite anterior a apreensão recebeu uma denúncia de que o adolescente Zoreia teria ido buscar droga na cidade e estaria com a droga na casa, na manhã seguinte recebeu nova denúncia de que não teriam conseguido quebrar todas as pedras, então os policiais foram até a residência e efetuaram a apreensão. Que as duas informações retro são oriundas da mesma pessoa. Pelo MP: Que Zoreia é filho da ré Carmen. Já haviam cumprido mandado na residência anteriormente. Em um dos anteriores mandados cumprido no local o depoente apreendeu três cartas na residência da ré Carmen, cartas estas oriundas do menor Luiz Carlos Junior que estava na FASE, uma dessa endereçada a Carmen e outra para a sua namorada e uma terceira para um rapaz vizinho que seria usuário de drogas, o depoente refere que em uma das cartas Junior dizia para pegar a droga e vazar fora. Nesta ocasião também achou na casa um saco plástico tudo picotado como se fosse utilizado para embalar droga. Entre a prisão do menor Luiz Ricardo e a apreensão de drogas ora objeto do feito o depoente já tinha cumprido um ou dois mandados de busca nesta residência, que em uma dessa oportunidade estava com cães farejador. Que na ocasião o cão farejador percorreu toda a casa. Diz que os informes era de que após a prisão de Ademar e Magnun e Luiz Carlos Junior foi Zoreia e a mãe Carmen e a namorada de Junior que seguiram vendendo entorpecente no local.(...) Quando da inquirição do menor Luiz Carlos Junior na FASE e do menor Luiz Ricardo o depoente estava junto e também havia um advogado da FASE. Diz que Luiz Carlos falou quando do depoimento que foi colhido lá na FASE. No início Luiz Carlos, ficou em silêncio, mas depois foram perguntando e ele respondendo. Que o advogado estava junto. Luiz Carlos não foi agredido."

Marlon Basso da Silva, policial civil, fls. 257, que participou das investigações, inclusive do cumprimento do mandado de busca e apreensão, refere, corroborando o constante da denúncia:

"Cumpriu mandado de busca na residência da ré Carmen e localizaram cerca de 48 pequenas pedras de crack, já enroladas em um plástico, e ainda uma pedra maior ainda não quebrada pesando em torno de 10 gramas. Que a droga estava na parede da casa em um buraco com acesso pelo lado de fora da residência. Douglas não estava no local quando do mandado mas morava com sua mãe. Diz que Franciele também morava nesta residência. Pelo MP: Após a internação de Luiz Ricardo já haviam estado na residência cumprido mandado de busca mas naquela ocasião nada foi encontrado, diz que recebeu denuncias do local. Que os viciados informavam que mesmo após a detenção dos menores Luiz Carlos Junior e Luiz Ricardo seguia a venda no local. Na residência da ré Carmen apreenderam cartas de Luiz Carlos Junior que mandava da FASE, falava nas cartas no seu linguajar em tetões e para não deixar outro de fora assumir o local. Na carta também falava no sentido de não dar bandeira na venda. No anterior mandado na casa da ré Carmen apreenderam retalhos de saco plástico. Pela Defesa: Tinha autorização judicial para filmagens mas antes de operacionalizar esta receberam a denuncia e então efetuaram a apreensão."

Ledonis Cezar, policial civil, fls. 258, ratifica as palavras da testemunha acima citada, relatando:

"Estava junto com o policial Marlon quando cumpriram mandado de busca na casa da ré Carmen. Localizaram em um buraco na parede da casa pelo lado de fora, que seria para o lado do quarto da ré Carmen, enrolado em um saco plástico com um jornal 48 pedras de crack já embaladas e prontas para venda e uma outra pedra maior, de cerca de 10 gramas, foram presas em flagrante a rés Carmen e Franciele. O representado Douglas não estava na casa naquele momento. Que as rés disseram na hora que não tinham conhecimento... O depoente reside próximo e diz que haviam denuncias de traficância no local e o depoente por ser vizinho via bastante movimento no beco. Nunca viu as rés Carmen ou Franciele entregando drogas. "

Partilho do entendimento de autores que, como Fernando Capez, sobre o depoimento de policiais, assim se manifestam: "Não é possível a afirmação de suspeita, pela mera condição funcional; ademais, por serem agentes públicos, também gozam da presunção de legitimidade, atributo dos atos praticados pela administração pública" (in Curso de Processo Penal, 3ªed., Ed. Saraiva, p. 274 ).

Márcio Mostardeiro, fls. 259, usuário de entorpecentes, informou que adquiria drogas no local, tendo pego baseado de maconha com Carmen, e referindo que Franciele estava por volta quando comprova a droga e o via negociando entorpecente, negando, todavia, que o réu Luiz Carlos atuasse no ilícito. Nas suas palavras, "O depoente pegou baseados de maconha no local, diz que pegava com quem estava lá. Diz que pegava com quem aparecia. Que as vezes nem precisava bater na casa para comprar, já viam chegando na rua e ali mesmo comprava. Nunca pegou droga com o réu Luiz Carlos de Lara. Confirma que pegou baseado de maconha com a ré Carmen... Acha que o único que não vendia era o réu Ferrão. A ré Franciele estava na casa por volta, que ela via o depoente negociar mas com o depoente nunca pegou entorpecente. Franciele estava na casa e nunca tratou sobre droga com ela. Pagava quatro ou cinco reais pelo baseado. Que chegou a pegar droga com Ademar e Magnun antes destes serem presos".

Desta testemunha emerge a participação direta na atividade ilícita das rés Carmem e Franciele, aquela inclusive como vendedor e entregador da droga e esta última sempre por perto, participando e presenciando tudo, ainda que de Franciele não tenha ele recebido droga diretamente.

A testemunha Alan, fls. 260, também ex-usuário de drogas, nega que tivesse adquirido drogas dos réus. Refere: "(...)Que após a prisão de Ademar e Luiz Ricardo diz que continuava a ter algum movimento no local. Não sabe se o movimento era da boca de fumo."

Rafael, fls. 261, nada elucidou sobre os fatos, apenas informa que frequentava o local, pois tinha amizade com o adolescente, mas nunca comprou ou pegou substância entorpecentes com nenhum dos réus, nem viu eles vendendo.

No mesmo sentido é o depoimento de Luana, ex-usuária, fls. 262, da mesma forma que Alan, afirma nunca ter adquirido substância entorpecente dos representados e dos coautores imputáveis, mas refere: "Chegou a usar droga junto com Junior, maconha. Pelo MP: Que como era difícil conseguir maconha a depoente dizia para Junior que quando este tivesse avisasse que a depoente ia fumar junto, fumavam em uma pecinhas que existem ao lado da casa. As vezes tinha outras pessoas por volta. Frente havia uma galera no local."

A testemunha Maurício, fls. 267, refere nunca ter adquirido drogas no local e era amigos dos adolescentes, bem como ouviu falar sobre a venda de substância entorpecente no Beco.

Na mesma linha é o depoimento de Mateus, fls. 268, dizendo que nunca comprou drogas dos adolescentes Luiz Carlos Junior e Luiz Ricardo.

Peterson, fls. 169, nada elucida dos fatos, visto que apenas afirma que nunca usou e nem nunca comprou droga no beco do Ferrão.

O adolescente Luiz Carlos, a seu turno, fls. 263, além de negar as imputações, nega que tenha se manifestado quando inquirido na FASE, dizendo que fez uso de seu direito de permanecer em silêncio. Além disso, apesar de confirmar ter escrito as cartas carreadas aos autos, tenta justificar os termos utilizados a fim de afastar as acusações contra si. Eis suas palavras:
"(...) Esta internado na FASE desde o dia 07 de julho de 2009. Que não é verdade a acusação, que o depoente estava preso na FASE e não traficava entorpecentes. Quando a mãe do depoente foi presa já estava internado na FASE. Mandou cartas quando da FASE. Que é do depoente a letra de fls. 96/98. Franciele era namorada do depoente e as vezes parava na casa do depoente. Está recolhido na Fase e este sendo processado. Indica o Bel. Sérgio Lima para a sua defesa. Pelo MP: Que o depoente optou na CASE quando ouvido pelo delegado em ficar calado. Que o advogado da FASE estava junto. Que não disse ao delegado ao que consta às fls. 62, que optou por ficar em silêncio. Tetões que consta na carta é o irmão do depoente pequeno de nome Eliton. Que Peterson não tem apelido Tetões. Beck que o depoente fala na carta era a maconha que o Rafael Turba fumava . Que Beck é a gíria de maconha. Para crack a gíria é pedra ou brita. Cascuda é o pelido da Franciele. Não confirma o que consta a fl. 62. O brique que consta na carta é relativa a uma moto velha que o depoente possuía. O que falou na carta sobre sua mãe se cuidar é que se a policia achasse a droga de Luiz Ricardo ela seria presa. Luzi ricardo havia dito que tinha drogas escondida em uma parede da casa. Que o delegado conversou mais com os inspetores e mandava escrever no papel o que ali consta mas o depoente não disse isto. Pela Defesa: Não leram para o depoente o interrogatório na FASE antes de assinar, que apenas chamaram o advogado Ronald quando estava pronto, que este passava tomando chimarrão e saia e voltava para a sala e não ficou todo o tempo acompanhando o depoente. O brique referido era de uma moto que o depoente vendeu uma agrele preta cujo o dinheiro ficou com seu pai. Quatrocentos reais aproximadamente foram depositados na conta de Franciele, o depoente vendeu a moto para seu irmão Carlos Roberto, que este pagou parcelado. O preço total foi em torno de mil e oitocentos reais. Conversa com Luiz Ricardo na FASE. Que antes do depoente ser preso visitou Luiz Ricardo na FASE e este disse que tinha deixado droga na casa, que o total da droga do que fora apreendido e do que estava na casa fechava mil reais. Confirma que havia movimentação de pessoas no beco, diz que era porque havia uma boca de fumo de Camile, Lurdes mãe dela é que cuidava e Luiz Ricardo ganhava comissão pelo transporte."

Entretanto, importante salientar que quando inquirido na fase investigatória, fls. 116, inquirido na própria FASE e na presença do advogado da FASE, o adolescente Luiz Carlos confirmou a comercialização de drogas na residência onde posteriormente se deu a apreensão e prisão em flagrante, entorpecente que era comercializado por sua mãe, a ora ré Carmem. Salientou "com referência ao teor das cartas, principalmente quando se refere a (briques) venda de drogas, foi a pedido de RICARDO, seu sobrinho e que está internado junto com o depoente e que daqui de dentro ele determinava e controlava a venda de drogas no beco. Que RICARDO dizia que dona LURDES, mãe de CAMILA, é quem mandava drogas para ser vendida no beco, a mando de RICARDO e este dizia, 'se aquela velho não me manda mais vou largar ele de mão'."

Oscar da Silva, fls. 150, professor que frequentava a residência da imputável Carmen, relata:

"Frequentava a casa da ré Carmen, se dava com esta. Que o esposo de Carmen Luiz Carlos de Lara morava em outra casa nos fundos. Nunca presenciou Luiz Carlos de Lara ou a ré Carmen vendendo ou negociando droga. Pelo MP: Que havia uma boca de fumo no beco, que era dos meninos. Diz que as vezes o réu Ferrão gritava e chamava a atenção dos meninos para que parassem e terminassem que não levaria a lugar nenhum. É professor. Dava conselho mas não lhe ouviam. Ficou surpreso quando o representado Douglas foi internado. Nunca viu Douglas vendendo drogas, diz que Douglas é inteligente. Que o pai comentava que Douglas saia a noite mas o depoente não sabe o que este fazia. Que Ademar que morava no local e foi preso o depoente o viu vendendo entorpecentes. Nunca viu a ré Franciele traficando. Que se dava com esta. Que Magnun, Luiz Ricardo, Luiz Carlos Junior e Ademar andavam juntos como se fosse uma família, mas não os viu armados. Nunca viu estas pessoas armadas apenas ouviu isto por comentários. Pela Defesa: Nunca viu Carmen ou Franciele traficando entorpecentes, embora houvesse comentários o depoente nunca viu."

Dionara, moradora do Beco, fls. 151, nora do réu Luiz Carlos, dispensada do compromisso, também pelo fato de afirmar não ter bom relacionamento com Carmen, confirma o envolvimento dos adolescente e da ré Carmen com a traficância. Eis suas palavras:

"Mora no beco. Que havia uma boca de fumo no local, que não via Magnun nesta mas via Ademar e os menores Luiz Ricardo e Luiz Carlos Junior vendendo. Diz que o menor Douglas também vendia droga. Havia movimento no beco, carro, a pé e até de bicicleta. Que Ademar e Luiz Ricardo as vezes andavam armados, mais a noite. Que Luiz Carlos Junior dava tiros para cima. Franciele namorava Luiz Carlos Junior e ficava por ali mas nunca viu ela vendendo ou entregando droga. Que compravam e iam embora, não usavam droga no beco. Diz que a ré Carmen vendia e dava força para os guris venderem drogas. Que Douglas vivia a parte dos outros menores e somente entrou depois para vender. Que depois é após a prisão dos outros. Pela Defesa: Que Franciele ficava dentro de casa e também pela frente mas nunca a viu vendendo drogas."

Paulo Sérgio Gonçalves de Lara, filho do réu Luiz Carlos, por isso não compromissado, corrobora a denúncia, informando o envolvimento dos adolescentes e da ré Carmen com o mercância de drogas:

"Mora no beco. Que teve um ponto de venda de droga no beco. Viu Ademar, Luiz Ricardo e Luiz Carlos Junior e também Douglas vendendo drogas. O mais vendido era crack. O movimento era grande no local, a pé, de bicicleta, e até de carro novo "carro fino". Diz que todos andavam armados, revólver e arma de cano serrado. Luiz Carlos Junior dava tiro para cima e para o lado do pátio do depoente. Que depois dos outros serem presos Zoreia ficou na liderança e tinha contato na cidade onde buscava droga. Viu Carmen vendendo e entregando drogas. Acha que Carmen pensava que estava ajudando a família. Franciele namorava Junior e morava no local mas não sabe da participação destas nos fatos e nunca a viu vendendo droga. Luiz Carlos pai do depoente morava na casa da frente e Ricardo na casa dos fundos. Seu pai não atuava no trafico e reclamava da situação."

Os três últimos depoimentos, especialmente, em conjunto com o restante da prova, trazem relevantes elementos e demonstram extreme de dúvidas a prática do delito de tráfico ilícito de entorpecentes e associação para o tráfico pelas rés e os adolescentes indicados, um filho da ré Carmem e namorado/companheiro da ré Franciele, e o outro também filho da ré Carmem, os quais recebiam ou traziam as substâncias entorpecentes de fora do município para revenda nesta cidade, possuindo ponto de venda no citado beco onde todos residiam e paravam, ponto este de comercialização da droga de todos conhecido na cidade segundo a prova oral (em especial, dos usuários) evidencia, todos conhecendo o local como de venda e onde era possível adquirir substância entorpecente.

Esta prova testemunhal, em conjunto com o restante da prova traz relevantes e robustos elementos e demonstram extreme de dúvidas a prática do delito de tráfico ilícito de entorpecentes e associação para o tráfico pelas denunciadas Carmen e Franciele, e ainda os inimputáveis Luiz Carlos Junior e Douglas, que tinham em depósito substâncias entorpecentes para venda nesta cidade, possuindo ponto de venda da droga na residência da ré Carmen, de todos conhecido na cidade segundo prova e com relata uma das testemunhas (as vezes nem precisar bater na casa para comprar, já viam chegando na rua e ali mesmo comprava). Assim, pela prova e elementos, evidentemente caracterizada a habitualidade no agir, caracterizando os elementos típicos, sem razão, destarte, neste ponto a defesa técnica ao impugnar tal.

Outrossim, o parecer da Unidade de Assessoramento Contábil do Ministério Público do Rio Grande do Sul, conclui que:

"A grande movimentação financeira de entradas decorreu crédito de INSS.

A grande movimentação financeira de saídas foi através de saques em dinheiro.

Não temos maiores informações sobre o tipo de "profissão ou ramo comercial ou econômico" dos investigados.

Deixamos de gerar um gráfico de linha de tempo (demonstrando entradas e saídas), tendo em vista que as entradas de valores nas contas correntes analisadas correspondem, em quase a sua totalidade, à créditos oriundos do INSS e obtenção de empréstimos. Os créditos decorrentes de TEDs são pouco representativos no período."


Em relação a ré Franciele, a qual não comprovou o exercício de qualquer atividade lícita, nem sua alegação que era a ré Carmen que realizava a movimentação em sua conta bancária, a planilha de fls. 379 demonstra uma movimentação financeira considerável em período inferior a um mês, onde houveram depósitos, em dinheiro, no valor total de R$ 805,00 (oitocentos e cinquenta reais), seguido de saques, o que causa estranheza visto que mesmo trabalhasse em uma residência na cidade de Santa Maria, seria incoerente que o pagamento se desse mediante depósito bancário em dinheiro para logo após ser sacado, o que demonstra que sua conta era utilizada para a prática dos delitos objetos do presente feito, como relatado na denúncia. Ademais, sua movimentação financeira neste período é incompatível com sua situação financeira e sua suposta renda.

De Franciele, afora a questão da sua conta bancária ser utilizada para movimentação financeira da receita da atividade ilícita, pela prova supra analisada esta sempre estava no local e acompanhava a venda e comercialização da droga, ainda que dela diretamente as testemunhas não refiram ter adquirido o entorpecente. Mas ao estar sempre ali, acompanhar e ver toda as transações e atividade ilícita desempenhada pelo seu companheiro e demais envolvidos da família, resta evidente sua ciência e participação no desiderato criminoso.

Ademais, repito, a prova testemunhal carreada logrou demonstrar a associação para o tráfico indicando que o adolescente Luiz Carlos, mesmo após internado na FASE, continuava comandando a traficância, redigindo cartas com ordens e orientações à genitora Carmem, ao irmão e a namorada Franciele, a fim de que estes continuassem a mercância enquanto ele estivesse na FASE. Deste arcabouço probatório possível extrair a destinação à venda da substância entorpecente e associação das rés entre si e com os inimputáveis para tanto.

Ainda, mister mencionar as cartas enviadas por Luiz Carlos, internado na FASE, especialmente a de fls. 149 e 151, demonstram que o tráfico na residência continuava e era realizado pelo irmão Douglas e por outros familiares imputáveis, sua genitora e namorada, mesmo após a internação daquele na FASE.

Transcrevo alguns trechos, pois, relevantes.

Carta de fls. 96: "ai mãe ta cuidando do pai da cascuda e das crianças como vai os brick te cuida que eu não vo me perdoa se acontece alguma coisa contigo com o zoreia que deus me ajude eu sairei daqui por que o meu lugar é aí com vocês...acha que eu vou ser sempre um maconheiro marginal que não presta mas as pessoas mudam, só que eu ratei só mudei depois de cair aqui..."

Carta de fls. 97: "Aí Alemão te liga só não é pra ti, o peterson, ou alan fica enchertado no beco enquanto eu estiver aqui, eu tenho irmãos e a minha mina em casa por isso que não era vocês 3 fica ai enrroda da baia e também o meu coroa não quer ninguém lá, eu to só te avisando, se eu souber que alguém de vocês 3 treinou terminou os apoio e se quize pega alguma coisa pega e vaza e diz pra que tá dando beck pro tetões que depois de eu sair eu me entendo era isso! Faz essa não por mim valeu..."

Da mesma forma, caracterizado a majorante do inciso VI do art. 40 da citada legislação, na medida em que certo, como se infere dos elementos carreados, quanto à prática ilícita pelas rés ter se dado em concurso com adolescente (in casu, Luiz Carlos Junior e Douglas), tendo, portanto, o desiderato criminoso envolvido e atingido adolescentes (estes, inclusive, já condenados na esfera menorista por tal envolvimento).

Destarte, imperiosa a conclusão de que as rés praticavam o tráfico de drogas, até porque quando das suas prisões foram apreendidas 48 (quarenta e oito reais) pedras de "crack" embaladas e prontas para o consumo, e 01 (uma) pedra com aproximadamente 10g ainda inteira, na parte externa da residência da ré Carmen, na parede atrás de umas tábuas, além de em outra oportunidade ter sido apreendido apetrechos usados para acondicionar as pedras de crack para venda (pedados de plásticos, tesouras...).

Neste sentido, colaciono algumas decisões:

APELAÇÃO DEFENSIVA. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES E RECEPTAÇÃO. SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. CONDENAÇÃO MANTIDA. A materialidade restou consubstanciada pelos autos de apreensão, constatação de natureza da substância, laudos periciais, e pela prova oral colhida. A autoria, por outro lado, também é inconteste e embora negada pelo acusado, restou comprovada nas demais provas colhidas. Os testemunhos policiais, associados aos demais elementos de prova, atestam a prática do tráfico de drogas e da receptação. Assim, deve ser mantida a condenação do réu por esses dois crimes. PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO DO TRÁFICO PARA O CRIME DO ART. 28 DA LEI 11.343/06. Inviável a desclassificação do fato para o crime uso de drogas, porquanto a grande quantidade, a maneira de acondicionamento e os demais artefatos apreendidos atestam a atividade de tráfico e não o consumo.[...] . Em razão de se tratar de condenado primário, de bons antecedentes, não havendo qualquer informação de que integre organização criminosa, é reconhecida a redutora do § 4º do art. 33 da lei 11.343/06, reduzindo sua pena em 1/3, diante das peculiaridades do caso. APELAÇÃO MINISTERIAL. IMPROVIMENTO. A absolvição da co-denunciada por todos os fatos delituosos deve ser mantida, por força do princípio do in dubio pro reo, haja vista que não há nos autos provas suficientes a ensejarem sua condenação. No tocante ao acusado, a absolvição da ré acabou por fundamentar a sua absolvição no tocante ao delito de associação para o tráfico. No que diz respeito aos delitos de receptação praticados pelo condenado, não houve demonstração inequívoca de que as práticas se deram em dias diversos, razões pelas quais deve ser mantida a condenação única. Apelo ministerial improvido e defensivo parcialmente provido. (Apelação Crime Nº 70023097314, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Antônio Ribeiro de Oliveira, Julgado em 23/04/2008)

TRÁFICO. LEI 6.368/76. TÓXICOS. ART. 12. Prova consistente apontando a responsabilidade do réu para prática do tráfico de drogas. QUALIDADE DA PROVA. DEPOIMENTOS DE POLICIAIS. Quanto aos depoimentos policiais, nada a desacreditá-los, pois coerentes e idôneos, mantendo harmonia com as demais provas. Além disso, é da própria natureza da atividade policial a atuação em situação de flagrância, de modo que não seria coerente atribuir aos agentes da autoridade o desempenho de tal atividade e depois não aceitar as suas declarações. PORTE PARA USO PRÓPRIO ¿ Para que seja viável a desclassificação do crime de tráfico para o de porte para uso próprio é indispensável a demonstração do elemento subjetivo do tipo, que não restou evidente. Réu que apesar de viciado era imputável. INCIDÊNCIA DA LEI BENIGNA. Condições pessoais do agente que não autorizam a incidência da redutora prevista no artigo 33, § 4°, da Lei nova. POSSE ILEGAL DE ARMA - 16, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 10.826/03. Extinção da punibilidade. Lei nova benéfica, que retroage. LAVAGEM DE DINHEIRO.¿ ART. 1º, INC. I, 4º, LEI N. 9.613/98. Prova convincente da tipificação do delito denominado ¿lavagem de dinheiro¿, consistente no depósito regular de quantias em conta bancária adquiridas com a venda de substância entorpecente. PENA APLICADA COM MODERAÇÃO. REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA. INICIAL FECHADO. PRELIMINAR REJEITADA. APELOS IMPROVIDOS. UNÂNIME. (Apelação Crime Nº 70019755594, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado em 13/02/2008)

Por fim, de registrar que nesta espécie criminosa o objeto jurídico protegido é justamente à saúde pública, a qual, com qualquer quantidade da substância entorpecente, já está lesionada.

De resto, não afloram causas que excluam a ilicitude da conduta ou então isentem os representados da aplicação de medida sócio educativa, razão porque, comprovadas a materialidade e autoria do evento ilícito.

Derradeiramente, conforme a prova colhida, especialmente a testemunhal, não há elementos a imputar de forma segura a prática dos delitos em tela em relação ao réu Luiz Carlos, visto que nenhuma das testemunhas mencionou a traficância por parte deste nem mesmo refere que ele participasse, ou apoiasse de qualquer forma, a atividade ilícita desenvolvida pela família. Ao contrário, houve declarações a indicar que ele seria o único que não atuava na atividade ilícita nem comercializava drogas na casa. Acrescento que a despeito dele ser companheiro da ré Carmem, residiam em casas distintas, como se infere da prova testemunhal.

Desta forma, provadas, pois, autoria na pessoa das rés Carmen e Franciele e materialidade, a parcial procedência da denúncia é imperativa.

Trago à baila jurisprudência pertinente:

APELAÇÃO DEFENSIVA. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES E RECEPTAÇÃO. SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. CONDENAÇÃO MANTIDA. A materialidade restou consubstanciada pelos autos de apreensão, constatação de natureza da substância, laudos periciais, e pela prova oral colhida. A autoria, por outro lado, também é inconteste e embora negada pelo acusado, restou comprovada nas demais provas colhidas. Os testemunhos policiais, associados aos demais elementos de prova, atestam a prática do tráfico de drogas e da receptação. Assim, deve ser mantida a condenação do réu por esses dois crimes. PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO DO TRÁFICO PARA O CRIME DO ART. 28 DA LEI 11.343/06. Inviável a desclassificação do fato para o crime uso de drogas, porquanto a grande quantidade, a maneira de acondicionamento e os demais artefatos apreendidos atestam a atividade de tráfico e não o consumo.[...] . Em razão de se tratar de condenado primário, de bons antecedentes, não havendo qualquer informação de que integre organização criminosa, é reconhecida a redutora do § 4º do art. 33 da lei 11.343/06, reduzindo sua pena em 1/3, diante das peculiaridades do caso. APELAÇÃO MINISTERIAL. IMPROVIMENTO. A absolvição da co-denunciada por todos os fatos delituosos deve ser mantida, por força do princípio do in dubio pro reo, haja vista que não há nos autos provas suficientes a ensejarem sua condenação. No tocante ao acusado, a absolvição da ré acabou por fundamentar a sua absolvição no tocante ao delito de associação para o tráfico. No que diz respeito aos delitos de receptação praticados pelo condenado, não houve demonstração inequívoca de que as práticas se deram em dias diversos, razões pelas quais deve ser mantida a condenação única. Apelo ministerial improvido e defensivo parcialmente provido. (Apelação Crime Nº 70023097314, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Antônio Ribeiro de Oliveira, Julgado em 23/04/2008)

TRÁFICO. LEI 6.368/76. TÓXICOS. ART. 12. Prova consistente apontando a responsabilidade do réu para prática do tráfico de drogas. QUALIDADE DA PROVA. DEPOIMENTOS DE POLICIAIS. Quanto aos depoimentos policiais, nada a desacreditá-los, pois coerentes e idôneos, mantendo harmonia com as demais provas. Além disso, é da própria natureza da atividade policial a atuação em situação de flagrância, de modo que não seria coerente atribuir aos agentes da autoridade o desempenho de tal atividade e depois não aceitar as suas declarações. PORTE PARA USO PRÓPRIO. Para que seja viável a desclassificação do crime de tráfico para o de porte para uso próprio é indispensável a demonstração do elemento subjetivo do tipo, que não restou evidente. Réu que apesar de viciado era imputável. INCIDÊNCIA DA LEI BENIGNA. Condições pessoais do agente que não autorizam a incidência da redutora prevista no artigo 33, § 4°, da Lei nova. POSSE ILEGAL DE ARMA - 16, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 10.826/03. Extinção da punibilidade. Lei nova benéfica, que retroage. LAVAGEM DE DINHEIRO.¿ ART. 1º, INC. I, 4º, LEI N. 9.613/98. Prova convincente da tipificação do delito denominado ¿lavagem de dinheiro¿, consistente no depósito regular de quantias em conta bancária adquiridas com a venda de substância entorpecente. PENA APLICADA COM MODERAÇÃO. REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA. INICIAL FECHADO. PRELIMINAR REJEITADA. APELOS IMPROVIDOS. UNÂNIME. (Apelação Crime Nº 70019755594, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado em 13/02/2008)

De resto, não afloram causas que excluam a ilicitude da conduta ou então isentem os réus da reprimenda penal, razão porque, comprovadas a materialidade e autoria do evento ilícito.

No mais, nos termos da argumentação do Parquet, considero não preenchidos os requisitos legais, não havendo de se falar em aplicação da minorante do parágrafo 4º do art. 33, como bem salientou o Agente Ministerial, a benesse em tela é defesa nos casos de traficantes reiterados de cocaína e "crack", bem como integrantes de organização criminosa, o que obsta sua incidência. In casu, diante da farta prova quanto a ocorrência da associação ao tráfico e da habitualidade da atuação, obstado está em se falar na incidência desta minorante, conforme parte final do dispositivo legal supra.

Outrossim, afora a presença da associação para obstar a incidência desta minorante, ainda há que se considerar se tratar este dispositivo ao meu ver flagrantemente inconstitucional, pois mesmo que se entendesse que tal diminuição fosse adequada ao princípio da proporcionalidade na visão da proibição de proteção deficiente, ainda assim sua aplicação ao caso estaria adstrita à análise e discricionariedade do julgador.

Tenho que ao prever a regra do artigo 33, parágrafo 4º do Código de Processo Penal, o legislador criou situação de proibição deficiente, infringindo o preceito fundamental da proporcionalidade. Cediço que a Constituição Federal elencou o tráfico ilícito de entorpecentes como crime hediondo (art. 5º, XLIII), exigindo do legislador uma reprimenda mais severa. Contrariamente ao disposto na Carta Constitucional, o dispositivo do artigo 33, parágrafo 4º permite a imposição de pena de até um ano e oito meses (se aplicada a redução de dois terços) para um traficante de drogas, o que revela evidente afronta ao princípio da proporcionalidade.

Nos autos do RE 418376, em voto vista, o Ministro Gilmar Mendes deu as balizas ao citado princípio, como segue:

Quanto à proibição de proteção deficiente, a doutrina vem apontando para uma espécie de garantismo positivo, ao contrário do garantismo negativo (que se consubstancia na proteção contra os excessos do Estado) já consagrado pelo princípio da proporcionalidade. A proibição de proteção deficiente adquire importância na aplicação dos direitos fundamentais de proteção, ou seja, na perspectiva do dever de proteção, que se consubstancia naqueles casos em que o Estado não pode abrir mão da proteção do direito penal para garantir a proteção de um direito fundamental. Nesse sentido, ensina o Professor Lênio Streck:

"Trata-se de entender, assim, que a proporcionalidade possui uma dupla face: de proteção positiva e de proteção de omissões estatais. Ou seja, a inconstitucionalidade pode ser decorrente de excesso do Estado, caso em que determinado ato é desarrazoado, resultando desproporcional o resultado do sopesamento (Abwägung) entre fins e meios; de outro, a inconstitucionalidade pode advir de proteção insuficiente de um direito fundamental-social, como ocorre quando o Estado abre mão do uso de determinadas sanções penais ou administrativas para proteger determinados bens jurídicos. Este duplo viés do princípio da proporcionalidade decorre da necessária vinculação de todos os atos estatais à materialidade da Constituição, e que tem como consequência a sensível diminuição da discricionariedade (liberdade de conformação) do legislador."(Streck, Lênio Luiz. A dupla face do princípio da proporcionalidade: da proibição de excesso (Übermassverbot) à proibição de proteção deficiente (Untermassverbot) ou de como não há blindagem contra normas penais inconstitucionais. Revista da Ajuris, Ano XXXII, nº 97, marco/2005, p.180)

No mesmo sentido, o Professor Ingo Sarlet:

"A noção de proporcionalidade não se esgota na categoria da proibição de excesso, já que abrange, (...), um dever de proteção por parte do Estado, inclusive quanto a agressões contra direitos fundamentais provenientes de terceiros, de tal sorte que se está diante de dimensões que reclamam maior densificação, notadamente no que diz com os desdobramentos da assim chamada proibição de insuficiência no campo jurídico-penal e, por conseguinte, na esfera da política criminal, onde encontramos um elenco significativo de exemplos a serem explorados."(Sarlet, Ingo Wolfgang. Constituição e proporcionalidade: o direito penal e os direitos fundamentais entre a proibição de excesso e de insuficiência. Revista da Ajuris, ano XXXII, nº 98, junho/2005, p. 107.)

E continua o Professor Ingo Sarlet:

"A violação da proibição de insuficiência, portanto, encontra-se habitualmente representada por uma omissão (ainda que parcial) do poder público, no que diz com o cumprimento de um imperativo constitucional, no caso, um imperativo de tutela ou dever de proteção, mas não se esgota nesta dimensão (o que bem demonstra o exemplo da descriminalização de condutas já tipificadas pela legislação penal e onde não se trata, propriamente, duma omissão no sentido pelo menos habitual do termo)."(Sarlet, Ingo Wolfgang. Constituição e proporcionalidade: o direito penal e os direitos fundamentais entre a proibição de excesso e de insuficiência. Revista da Ajuris, ano XXXII, nº 98, junho/2005, p. 132.)

Dessa forma, para além da costumeira compreensão do princípio da proporcionalidade como proibição de excesso (já fartamente explorada pela doutrina e jurisprudência pátrias), há uma outra faceta desse princípio, a qual abrange uma série de situações, dentre as quais é possível destacar a dos presentes autos.

Conferir à situação dos presentes autos o status de união estável, equiparável a casamento, para fins de extinção da punibilidade (nos termos do art. 107, VII, do Código Penal) não seria consentâneo com o princípio da proporcionalidade no que toca à proibição de proteção insuficiente.

Isso porque todos os Poderes do Estado, dentre os quais evidentemente está o Poder Judiciário, estão vinculados e obrigados a proteger a dignidade das pessoas, sendo este mais um motivo para acompanhar a divergência inaugurada pelo Min. Joaquim Barbosa.


Nesta senda, segundo Sarlet, a noção de proporcionalidade não se esgota na categoria de proibição de excesso, já que abrange "um dever de proteção por parte do Estado, inclusive quanto a agressões de direitos fundamentais provenientes de terceiros" (2005, p. 107). Em tal contexto, ainda, parece inequívoca a assertiva de Sarlet no sentido de que tanto a proibição de excesso, como a proibição de insuficiência vinculam os órgãos estatais, guardando ampla relação com a liberdade de conformação do legislador penal (2005, p. 133).

Não se pode afastar, destarte, a necessidade da tutela penal em relação a bens jurídicos que se revelem como consectários dos direitos fundamentais, como a vida, liberdade, propriedade e, ainda, aqueles de ordem transindividual, a exemplo do meio ambiente e da ordem econômica.

Por outro lado, além de ser vedado ao legislador proceder na ampliação dos espaços de proibição a níveis que se revelem írritos, na perspectiva de assegurar direitos fundamentais, lhe é também proibido dedicar proteção insuficiente, ou mesmo nenhuma, a esses mesmos direitos. Como diz Streck, "não se ignora que a proteção de bens jurídicos não se realiza somente através do direito penal. O direito penal não deve intervir quando há outros meios para proteger os bens em questão. Contudo, não deve ser esquecido e nem subestimado o valor simbólico que representa o direito penal, enquanto interdito, enquanto limite que separa a civilização da barbárie".(2004, p. 10)

E ainda que os critérios estabelecidos para diminuição de pena fossem proporcionais, a análise da aplicação ou não da minorante pela redação do citado dispositivo estaria adstrita ao julgador, diante das particularidades do caso, a fim de evitar a imposição de uma reprimenda inadequada e incapaz de atender os objetivos do sancionamento, mas nem de longe se poderia ter como obrigatória.

No caso em apreço as circunstâncias em que se deu a apreensão, a riqueza de elementos que informaram o envolvimento das rés com o tráfico e, especialmente, pela forma de agir e tempo de atuação com elevada habitualidade e envolvimento da unidade familiar denotam a impossibilidade da afirmação no sentido de que os réus não se dedicassem ao tráfico.

O objetivo do legislador ao introduzir a causa de diminuição de pena no ordenamento jurídico foi o de conferir uma pena mais amena àqueles que atuam apenas como simples agente do tráfico, não participando da cadeia da traficância nem com ingerência sobre esta, exigindo que não se dedicassem à atividade criminosa, não integrassem organização criminosa e não fossem reincidentes ou portadores de maus antecedentes. Não é o caso dos autos.

Outrossim, a aplicação desta redutora se sujeitaria à análise do julgador, a este cabendo verificar a viabilidade ou não da redução no caso concreto. Veja-se que ao redigir o parágrafo 4º do artigo 33 da Lei n. 11.343/06 foi utilizado o verbo "poder" e não "dever", de forma clara que compete ao intérprete decidir pela aplicação ou não da benesse considerando o caso concreto e suas nuances. Assim, pretendeu evitar a concessão de indevida redução de pena, evitando que a pena imposta se tornasse insuficiente à prevenção e repressão do delito.

Em artigo publicado em seu sítio jurídico, o Procurador de Justiça Lenio Streck manifestou seu posicionamento acerca da diminuição de pena prevista no artigo 33, parágrafo 4º, da Lei n. 11.343/06, defendendo que o dispositivo possui eiva de inconstitucionalidade por ofensa ao princípio da proibição de proteção deficiente. Transcrevo trechos do texto, pela pertinência:

"O que deve ser aqui considerado diz respeito à determinação legislativa que veio a aplacar/mitigar a repressão penal do crime de tráfico ilícito de entorpecentes. Não é desarrazoado afirmar que a punição insuficiente para um crime de extrema gravidade e reprovabilidade equivale à impunidade. Ou, em outras palavras, equivale a não aplicação do comando constitucional de criminalizar. Na verdade, o legislador banaliza a punição do tráfico, nesse particular, ao tempo em que a Constituição aponta explicitamente para o outro lado, isto é, para uma atuação eficaz do Estado na repressão do tráfico de entorpecentes.

Dito de outro modo, a Constituição Federal da República do Brasil estabelece diretrizes de política criminal a serem, necessariamente, seguidas quando da edição de leis penais no exercício da atividade legiferante. Com base em tal premissa, o legislador não é dotado de absoluta liberdade na eleição das condutas que serão alvo de incriminação e nem, tampouco, na escolha dos bens jurídicos que serão objeto de proteção penal. Em decorrência, também não pode o Poder Legislativo deliberar sobre a descriminalização de normas protetivas de bens jurídicos com manifesta dignidade constitucional.

Por isso, o legislador ordinário, ao conceder o favor legal de "desconto" da pena com o teto de 2/3, extrapolou sua "competência", a ponto de se poder dizer que tal atitude equivale à desproteção do bem jurídico ofendido pela conduta de quem pratica o crime de tráfico ilícito de entorpecentes. A determinação constitucional é expressa, não sendo possível - a partir do que vem consagrado no artigo 5o, XLIII - interpretar o contrário do que está disposto no texto constitucional. Trata-se de uma questão de fácil resolução hermenêutica. A força normativa da Constituição não pode ser esvaziada por qualquer lei ordinária. Por isso, há que se levar a sério o texto constitucional.

Veja-se que não há similitude no Código Penal. Crimes graves como o roubo nem de longe permitem diminuição de pena no teto de 2/3. Na verdade, o teto de 2/3 de desconto da pena transforma o crime de tráfico ilícito de entorpecentes em crime equiparável ao furto qualificado, para citar apenas este. A propósito, cumpre lembrar que o ordenamento jurídico considera como de menor potencial ofensivo crimes cujas penas máximas não ultrapassam 02 anos de reclusão.

(...) Veja-se, assim, a situação teratológica - e me permito utilizar novamente essa adjetivação, porque merecida - que se delineia em terrae brasilis: a Constituição exige tratamento mais rigoroso a determinados crimes e o legislador atenua, sem qualquer autorização/justificação/ ressalva constitucional, a proteção conferida a tais crimes. Ora, isso é ler a Constituição de acordo com a lei ordinária! Pior do que isso, sem qualquer prognose. E não precisamos aqui recordar, por tudo o que já avançamos em termos de teoria constitucional e de controle de constitucionalidade, o caso Marbury v. Madison para saber que uma lei ordinária não pode "alterar" a Constituição!

(...) Pretendendo ser mais claro: a quebra do princípio da integridade provoca também retrocesso social no combate ao crime de tráfico de entorpecente. Ou seja, uma vez eleita pelo próprio legislador constituinte a via da criminalização (sem direito sequer a graça e anistia) do crime de tráfico de drogas e já estando em vigor legislação que atendia ao comando constitucional, parece razoável afirmar que a nova lei desatendeu aos propósitos constituintes. A menos que o mesmo legislador houvesse comprovado que o favor legal, com fortes evidências, proporcionaria uma diminuição da ocorrência do crime tão fortemente combatido pelo legislador constituinte. (grifei) (Disponível em . Acesso em 26 ago. 2008).


DISPOSITIVO

ANTE O EXPOSTO,
julgo parcialmente procedente a denúncia para o fim de absolver o réu LUIZ CARLOS DE LARA, já qualificado, das imputações contidas na denúncia, forte no art. 386, inciso VII, do CPP. Outrossim, condeno as rés CARMEN ROSELAINE RIOS COELHO E FRANCIELE FERREIRA CARVALHO como incursas nas sanções do art. 33, "caput", e art. 35, combinado com o art. 40, inciso VI, todos da Lei nº 11.343/06, na forma do art. 69 do CP.

Passo a fixação da pena.

Ré Carmen

Art. 33

A culpabilidade do agir é em grau elevado, presente a reprovabilidade social da conduta e tendo ela plena consciência do caráter ilícito e totais condições de se portar de maneira diversa. Registro que o crime em tela é dos mais graves da atualidade e com funestas consequências na nossa sociedade.

A ré registra considerável rol de antecedente, fls. 396-398, pois afora a condenação geradora da reincidência que será valorada no segundo momento de fixação da pena, a fim de evitar o bis in idem, registra vários processos em tramite em seu desfavor. Sua conduta social não restou esclarecida.

Personalidade desviada, ao meu juízo, pela frequência no envolvimento com ilícitos e trânsito na seara policial e judicial criminal.

As circunstâncias são as inerentes à espécie, ressaltando apenas que a atuação ilícita já ocorria há algum tempo e envolvia situação peculiar, o envolvimento de quase a totalidade da família no ilícito, o que vem em seu desfavor pela forma em que a atuação se dava.

Não há de se perquirir acerca do comportamento da vítima, que é a saúde pública. Os motivos já fazem parte do tipo em comento.

Consequências vem em se desfavor, dada a gravidade do delito e seus reflexos.

Assim, analisados estes vetores do art. 59 do Código Penal, e atento aos critérios de necessidade e suficiência para a reprovação e prevenção do crime, fixo a pena base em 08 anos de reclusão.

Agravo a pena em 06 meses face a agravante da reincidência, conforme certidão de fls. 396-398, restando esta provisoriamente em 08 anos e 06 meses de reclusão, tornando-a provisória neste patamar.

Aumento a pena em face da incidência da majorante do inciso VI do art. 40 da legislação, reconhecida na fundamentação, pela gravidade desta, atingir adolescentes, sabidas que são as nefastas consequências atualmente a estes jovens do uso de entorpecente e posterior dependência gerada, em um quarto, a qual, ausente qualquer outra circunstância modificadora a influir na fixação, torno a pena definitiva da ré Carmem para este delito em 10 anos e 07 meses e 15 dias de reclusão. Condeno a ré, ainda, ao pagamento de pena pecuniária a qual fixo em 500 dias multa, com o dia-multa arbitrado no mínimo legal de um trinta avos, conforme art. 43, com base nas circunstâncias judiciais acima analisados.

Art. 35

A culpabilidade do agir é em grau elevado, presente a reprovabilidade social da conduta e tendo ela plena consciência do caráter ilícito e totais condições de se portar de maneira diversa. Registro que o crime em tela é dos mais graves da atualidade e com funestas consequências na nossa sociedade.

A ré registra considerável rol de antecedente, fls. 396-398, pois afora a condenação geradora da reincidência que será valorada no segundo momento de fixação da pena, a fim de evitar o bis in idem, registra vários processos em tramite em seu desfavor. Sua conduta social não restou esclarecida.

Personalidade desviada, ao meu juízo, pela frequência no envolvimento com ilícitos e trânsito na seara policial e judicial criminal.

As circunstâncias são as inerentes à espécie, ressaltando apenas que a atuação ilícita já ocorria há algum tempo. Especificamente do delito de associação, o envolvimento de quase toda a unidade familiar, incluindo os filhos adolescentes, vem em seu desfavor

Não há de se perquirir acerca do comportamento da vítima, que é a saúde pública. Os motivos já fazem parte do tipo em comento.

Consequências vem em se desfavor, dada a gravidade do delito e seus reflexos.

Assim, analisados estes vetores do art. 59 do Código Penal, e atento aos critérios de necessidade e suficiência para a reprovação e prevenção do crime, fixo a pena base em 04 anos de reclusão.

Agravo a pena em 06 meses face a agravante da reincidência, conforme certidão de fls. 396-398, restando esta provisoriamente em 04 anos e 06 meses de reclusão, tornando-a provisória neste patamar.

Aumento a pena em face da incidência da majorante do inciso VI do art. 40 da legislação, reconhecida na fundamentação, pela gravidade desta, atingir adolescente, sabidas que são as graves consequências a estes, em um quarto, a qual, ausente qualquer circunstância modificadora a influir na fixação, torno-a definitiva, restando a pena definitiva da ré Carmem para este delito fixada em 05 anos e 07 meses e 15 dias de reclusão. Condeno a ré, ainda, ao pagamento de pena pecuniária, a qual fixo no mínimo legal de 700 dias multa, com o dia-multa arbitrado no mínimo legal de um trinta avos, conforme art. 43.

Como os crimes se deram em concurso material, procedo ao somatório das penas, restando a pena definitiva da ré Carmem fixada em 16 anos e 03 meses de reclusão e pena pecuniária de 1200 dias multa, com o dia-multa arbitrado no mínimo legal de um trinta avos.

Ré Franciele


Art. 33

A culpabilidade do agir é em grau elevado, presente a reprovabilidade social da conduta e tendo ela plena consciência do caráter ilícito e totais condições de se portar de maneira diversa. Registro que o crime em tela é dos mais graves da atualidade e com funestas consequências na nossa sociedade.

A ré não registra antecedentes. Sua conduta social e personalidade não restaram esclarecidas.

As circunstâncias são as inerentes à espécie, ressaltando apenas que a atuação ilícita já ocorria há algum tempo, o que vem em seu desfavor, ao que se soma a forma em que a atuação se dava por envolver toda a unidade familiar.

Não há de se perquirir acerca do comportamento da vítima, que é a saúde pública. Os motivos já fazem parte do tipo em comento.

Consequências vem em se desfavor, dada a gravidade do delito e seus reflexos.

Assim, analisados estes vetores do art. 59 do Código Penal, e atento aos critérios de necessidade e suficiência para a reprovação e prevenção do crime, fixo a pena base em 06 anos de reclusão. Ausentes circunstâncias atenuantes ou agravantes, torno-a provisória neste quantum.

Aumento a pena em face da incidência da majorante do inciso VI do art. 40 da legislação, reconhecida na fundamentação, pela gravidade desta, atingir adolescentes, sabidas que são as nefastas consequências a estes, em um quarto, a qual, ausente qualquer outra circunstância modificadora a influir na fixação, torno a pena definitiva da ré Franciele para este delito em 07 anos e 06 meses de reclusão. Condeno a ré, ainda, ao pagamento de pena pecuniária a qual fixo em 500 dias multa, com o dia-multa arbitrado no mínimo legal de um trinta avos, conforme art. 43, com base nas circunstâncias judiciais acima analisados.

Art. 35

A culpabilidade do agir é em grau elevado, presente a reprovabilidade social da conduta e tendo ela plena consciência do caráter ilícito e totais condições de se portar de maneira diversa, delito com funestas consequências na nossa sociedade.

A ré não registra antecedentes. Sua conduta social e personalidade não restaram esclarecidas.

As circunstâncias são as inerentes à espécie, destacando quanto à associação que a atuação ilícita já ocorria há algum tempo, ao que se soma a forma em que a atuação se dava e com envolvimento de quase toda a unidade familiar no ilícito.

Não há de se perquirir acerca do comportamento da vítima, que é a saúde pública. Os motivos já fazem parte do tipo em comento. Consequências em se desfavor, dada a gravidade do delito e seus reflexos.

Assim, analisados estes vetores do art. 59 do Código Penal, e atento aos critérios de necessidade e suficiência para a reprovação e prevenção do crime, fixo a pena base em 03 anos e 08 meses de reclusão. Ausentes atenuantes e agravantes, torno a pena provisória neste quantum.

Aumento a pena em face da incidência da majorante do inciso VI do art. 40 da legislação, reconhecida na fundamentação, pela gravidade desta, atingir adolescente, em um quarto, a qual, ausente qualquer circunstância modificadora a influir na fixação, torno-a definitiva, restando a pena definitiva da ré Franciele para este delito fixada em 04 anos e 07 meses de reclusão. Condeno a ré, ainda, ao pagamento de pena pecuniária, a qual fixo no mínimo legal de 700 dias multa, com o dia-multa arbitrado no mínimo legal de um trinta avos, conforme art. 43.

Como os crimes se deram em concurso material, procedo ao somatório das penas, restando a pena definitiva da ré Franciele fixada em 12 anos e 01 mês de reclusão e pena pecuniária de 1200 dias multa, com o dia-multa arbitrado no mínimo legal de um trinta avos.

DEMAIS PROVIMENTOS


As rés deverão cumprir a pena no regime inicial fechado, eis que se trata de crime equiparado a hediondo, nos exatos termos da Lei 11.464, com a nova redação ao § 1º e 2º do art. 2º da Lei 8.072/90.

Incabível a substituição por pena restritiva de direito, seja pelo quantum de pena fixado que extrapola o limite legal autorizador da concessão desta benesse, seja porque se cuida de crime equiparado a hediondo e com expressa previsão legal obstando a citada substituição. A própria culpabilidade da conduta indica que tal substituição não seja suficiente para a reprovação e prevenção do ilícito.

As rés Carmen e Franciele não poderão apelar em liberdade, eis que a necessidade de sua segregação mostra-se imperiosa como garantia da ordem pública, já que soltas poderão retornar a senda criminosa, praticando novos ilícitos, atento à condenação ora lhes imposta e pena aplicada. De resto, permanecem incólumes os motivos que determinaram sua segregação provisória durante todo o feito e manutenção desta, sendo que se trata de delito equiparado a hediondo não só na sua classificação, mas também pela forma de execução e gravidade, sendo a regra nos crimes hediondos, conforme art. 2º, parágrafo 2º, da Lei 8072/90, em caso de sentença condenatória não apelar em liberdade.

Quanto ao réu Luiz Carlos, absolvido, por lógico poderá apelar em liberdade.

Recomendem-se as rés ao Presídio onde se encontram.

Em caso de recurso expeçam-se os PECs provisórios.

Deixo de fixar indenização na forma do art. 387, inciso IV, do CPP, redação da Lei 11.719, considerando ser a vítima a incolumidade pública e diante de maiores elementos probatórios carreados ao caderno processual que permitam tal fixação.

Custas, na razão de 1/3 para cada réu, sendo a parte do réu Luiz Carlos pelo Estado face sua absolvição.

Após o trânsito em julgado: a) comunique-se ao Tribunal Regional Eleitoral, para fins do disposto na Constituição Federal, art. 15; b) remeta-se o boletim estatístico individual ao Departamento de Informática Policial; c) lance-se o nome das rés no rol dos culpados. Ainda, comunique-se à autoridade policial a autorização para destruição da substância entorpecente apreendida.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Restinga Seca, 12 de julho de 2010.


Eduardo Giovelli,
Juiz de Direito



Notas:


1 - Nucci, Guilherme de Souza, Código de Processo Penal Comentado, 8ª Edição. [Voltar]

2 - Apelação Crime Nº 70028904530, Sexta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nereu José Giacomolli, Julgado em 30/04/2009 [Voltar]



JURID - Condenação. Tráfico de drogas [29/07/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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