Processual civil. Administrativo. Poder de polícia. Medidas de defesa sanitária animal. Abate de animais.
Superior Tribunal de Justiça - STJ
RECURSO ESPECIAL Nº 1.184.775 - PR (2010/0042869-2)
RELATOR: MINISTRO LUIZ FUX
RECORRENTE: EMERSON DOS SANTOS
ADVOGADO: GEONIR EDVARD FONSECA VINCENSI E OUTRO(S)
RECORRIDO: UNIÃO
RECORRIDO: ESTADO DO PARANÁ
PROCURADOR: CESAR AUGUSTO BINDER E OUTRO(S)
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. PODER DE POLÍCIA. MEDIDAS DE DEFESA SANITÁRIA ANIMAL. ABATE DE ANIMAIS. INDENIZAÇÃO. PRESCRIÇÃO. LEI ESPECÍFICA. LEI Nº 569/1948, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI N.º 11.515/2007. LEX SPECIALIS DERROGAT LEX GENERALIS.
1. O Princípio da Especialidade (lex specialis derrogat lex generalis) afasta a aplicação do art. 1º do Decreto 20.910/32, regra geral que disciplina a prescrição no Direito Administrativo (cobrança das dívidas Passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal), prevalecendo, in casu, a regra encartada no art. 7º da Lei nº 569/1948, com a redação dada pela Lei n.º 11.515/2007.
2. O art. 1º da Lei nº 569/1948, com a redação dada pela Lei nº 11.515/2007, estabelece a indenizabilidade do prejuízo decorrente do sacrifício de animais doentes, verbis:
"Art. 1º Sempre que, para salvaguardar a saúde pública ou por interesse da defesa sanitária animal, venha a ser determinado o sacrifício de animais doentes, destruição de coisas ou construções rurais, caberá ao respectivo proprietário indenização em dinheiro, mediante prévia avaliação.
3. O art. 7º, da Lei nº 569/1948, com a redação dada pela Lei n.º 11.515/2007, ao dispor sobre o prazo para o ajuizamento da ação indenizatória, determina:
Art. 7o O direito de pleitear a indenização prescreverá em 180 (cento e oitenta) dias, contados da data em que for sacrificado o animal ou destruída a coisa. (Redação dada pela Lei 11.515, de 2007)
4. A abalizada doutrina assenta que: "(...) a disposição especial afeta a geral, apenas com restringir o campo da sua aplicabilidade; porque introduz uma exceção ao alcance do preceito amplo, exclui da ingerência deste algumas hipótese. Portanto o derroga só nos pontos em que lhe é contrária (1). Na verdade, a regra especial posterior só inutiliza em parte a geral anterior, e isto mesmo quando se refere ao seu assunto, implícita ou explicitamente, para alterá-la. Derroga a outra naquele caso particular e naquela matéria especial a que provê ela própria" (Carlos Maximiliano, in Hermenêutica e Aplicação do Direito, Forense, 1991, 11ª edição, pág. 360/361).
5. Sobre a aplicação do princípio da especialidade, em sede de prazo prescricional, manifestou-se esta Corte: "A norma geral que disciplina a prescrição em favor da Fazenda Pública, prevista no artigo 1º do Decreto nº 20.910/1932, deve ser afastada no caso, fazendo incidir a regra especial invocada pelos impetrantes (artigo 40 da Lei Estadual nº 11.817/2000), que traduz expressa vontade do legislador em possibilitar a anulação da pena disciplinar "a qualquer tempo", desde que atendidos os requisitos exigidos pela legislação de regência. (...)" (RMS 21.066/PE, Rel. Ministro PAULO GALLOTTI, SEXTA TURMA, julgado em 02/09/2008, DJe 29/09/2008)
6. Consectariamente, a propositura de ação de indenização, em razão do sacrifício de animais doentes ou destruição de coisas ou construções rurais, para salvaguardar a saúde pública ou por interesse da defesa sanitária animal, se subsume ao prazo prescricional de 180 (cento e oitenta) dias, contados da data em que for sacrificado o animal ou destruída a coisa, a teor do que dispõe o art. 7º da Lei nº 569/1948, com a redação dada pela Lei n.º 11.515/2007.
7. In casu, a pretensão deduzida na inicial resultou atingida pelo decurso do prazo prescricional de 180 (cento e oitenta) dias, previsto no art. 7º da Lei 569/1948 com a redação dada pela Lei 11.515/2007, uma vez que o abate dos animais ocorreu em 04.11.2005 e a ação indenizatória foi ajuizada em 17.01.2008, portanto, após o decurso do prazo prescricional estabelecido na legislação especial in foco.
8. Recurso Especial desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da PRIMEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Benedito Gonçalves (Presidente) e Hamilton Carvalhido votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 04 de maio de 2010(Data do Julgamento)
MINISTRO LUIZ FUX
Relator
RELATÓRIO
EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX(Relator): Trata-se de Recurso Especial interposto por EMERSON DOS SANTOS (fls. 140/153), com fulcro no artigo 105, III, alíneas "a" e "c", do permissivo constitucional , contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim ementado:
"ADMINISTRATIVO. PRAZO PRESCRICIONAL. LEI Nº 569/48.
O Decreto nº 90.910/32, que regula prazo prescricional perante a Fazenda Pública, excepciona a aplicação de prazo prescricional inferior sempre que houver previsão legal.
Portanto, aplica-se o prazo previsto na Lei nº 569/48, uma vez que o prazo prescricional é o menor." (fl. 131)
Versam os autos, originariamente, Ação de Indenização ajuizada por EMERSON DOS SANTOS em face do ESTADO DO PARANÁ, objetivando o ressarcimento de danos materiais e morais decorrentes do abate de animais, de propriedade do autor, contaminados por tuberculose/brucelose, a qual foi extinta com supedâneo no art. 269, VI, do CPC (fls. 101/103).
Irresignado com o teor da sentença, o autor interpôs recurso de apelação, perante o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o qual foi desprovido, nos moldes delineados na ementa acima transcrita (fls. 129/132).
O Recorrente, em sede de recurso especial, aduz que o entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo viola o disposto no art. 1º do Decreto 20.910/32, bem como diverge de julgados de outros tribunais pátrios em hipóteses análogas.
A UNIÃO e o ESTADO DO PARANÁ, em contra razões (fls. 155/158 e 160/163), pugnam pelo desprovimento do recurso especial.
O Recurso Especial foi admitido no Tribunal a quo à fl. 166.
É o Relatório.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.184.775 - PR (2010/0042869-2)
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. PODER DE POLÍCIA. MEDIDAS DE DEFESA SANITÁRIA ANIMAL. ABATE DE ANIMAIS. INDENIZAÇÃO. PRESCRIÇÃO. LEI ESPECÍFICA. LEI Nº 569/1948, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI N.º 11.515/2007. LEX SPECIALIS DERROGAT LEX GENERALIS.
1. O Princípio da Especialidade (lex specialis derrogat lex generalis) afasta a aplicação do art. 1º do Decreto 20.910/32, regra geral que disciplina a prescrição no Direito Administrativo (cobrança das dívidas Passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal), prevalecendo, in casu, a regra encartada no art. 7º da Lei nº 569/1948, com a redação dada pela Lei n.º 11.515/2007.
2. O art. 1º da Lei nº 569/1948, com a redação dada pela Lei nº 11.515/2007, estabelece a indenizabilidade do prejuízo decorrente do sacrifício de animais doentes, verbis:
"Art. 1º Sempre que, para salvaguardar a saúde pública ou por interesse da defesa sanitária animal, venha a ser determinado o sacrifício de animais doentes, destruição de coisas ou construções rurais, caberá ao respectivo proprietário indenização em dinheiro, mediante prévia avaliação.
3. O art. 7º, da Lei nº 569/1948, com a redação dada pela Lei n.º 11.515/2007, ao dispor sobre o prazo para o ajuizamento da ação indenizatória, determina:
Art. 7o O direito de pleitear a indenização prescreverá em 180 (cento e oitenta) dias, contados da data em que for sacrificado o animal ou destruída a coisa. (Redação dada pela Lei 11.515, de 2007)
4. A abalizada doutrina assenta que: "(...) a disposição especial afeta a geral, apenas com restringir o campo da sua aplicabilidade; porque introduz uma exceção ao alcance do preceito amplo, exclui da ingerência deste algumas hipótese. Portanto o derroga só nos pontos em que lhe é contrária (1). Na verdade, a regra especial posterior só inutiliza em parte a geral anterior, e isto mesmo quando se refere ao seu assunto, implícita ou explicitamente, para alterá-la. Derroga a outra naquele caso particular e naquela matéria especial a que provê ela própria" (Carlos Maximiliano, in Hermenêutica e Aplicação do Direito, Forense, 1991, 11ª edição, pág. 360/361).
5. Sobre a aplicação do princípio da especialidade, em sede de prazo prescricional, manifestou-se esta Corte: "A norma geral que disciplina a prescrição em favor da Fazenda Pública, prevista no artigo 1º do Decreto nº 20.910/1932, deve ser afastada no caso, fazendo incidir a regra especial invocada pelos impetrantes (artigo 40 da Lei Estadual nº 11.817/2000), que traduz expressa vontade do legislador em possibilitar a anulação da pena disciplinar "a qualquer tempo", desde que atendidos os requisitos exigidos pela legislação de regência. (...)" (RMS 21.066/PE, Rel. Ministro PAULO GALLOTTI, SEXTA TURMA, julgado em 02/09/2008, DJe 29/09/2008)
6. Consectariamente, a propositura de ação de indenização, em razão do sacrifício de animais doentes ou destruição de coisas ou construções rurais, para salvaguardar a saúde pública ou por interesse da defesa sanitária animal, se subsume ao prazo prescricional de 180 (cento e oitenta) dias, contados da data em que for sacrificado o animal ou destruída a coisa, a teor do que dispõe o art. 7º da Lei nº 569/1948, com a redação dada pela Lei n.º 11.515/2007.
7. In casu, a pretensão deduzida na inicial resultou atingida pelo decurso do prazo prescricional de 180 (cento e oitenta) dias, previsto no art. 7º da Lei 569/1948 com a redação dada pela Lei 11.515/2007, uma vez que o abate dos animais ocorreu em 04.11.2005 e a ação indenizatória foi ajuizada em 17.01.2008, portanto, após o decurso do prazo prescricional estabelecido na legislação especial in foco.
8. Recurso Especial desprovido.
VOTO
EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX(Relator): Preliminarmente, conheço do recurso pela alínea "a", do permissivo constitucional, uma vez que os dispositivos legais foram efetivamente prequestionados.
A questio iuris reside em saber se as ações de indenização, em razão do sacrifício de animais, se submete ao prazo prescricional quinquenal do Decreto 20.910/32 ou ao prazo de 180 dias, previsto na Lei Lei nº 569/1948, com a redação dada pela Lei n.º 11.515/2007, que estabelece medidas de defesa sanitária animal.
O art. 1º da Lei nº 569/1948, com a redação dada pela Lei n.º 11.515/2007, estabelece a indenizabilidade do prejuízo decorrente do sacrifício de animais doentes, verbis:
"Art. 1º Sempre que, para salvaguardar a saúde pública ou por interesse da defesa sanitária animal, venha a ser determinado o sacrifício de animais doentes, destruição de coisas ou construções rurais, caberá ao respectivo proprietário indenização em dinheiro, mediante prévia avaliação.
O art. 7º, da Lei nº 569/1948, com a redação dada pela Lei n.º 11.515/2007, ao dispor sobre o prazo para o ajuizamento da ação indenizatória, determina:
Art. 7o O direito de pleitear a indenização prescreverá em 180 (cento e oitenta) dias, contados da data em que for sacrificado o animal ou destruída a coisa. (Redação dada pela Lei 11.515, de 2007)
Com efeito, o Princípio da Especialidade (lex specialis derrogat lex generalis) afasta a aplicação do art. 1º do Decreto 20.910/32, regra geral que disciplina a prescrição no Direito Administrativo (cobrança das dívidas Passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal), prevalecendo, in casu, a regra encartada no art. 7º da Lei nº 569/1948, com a redação dada pela Lei n.º 11.515/2007.
A abalizada doutrina assenta que: "(...) a disposição especial afeta a geral, apenas com restringir o campo da sua aplicabilidade; porque introduz uma exceção ao alcance do preceito amplo, exclui da ingerência deste algumas hipótese. Portanto o derroga só nos pontos em que lhe é contrária (1). Na verdade, a regra especial posterior só inutiliza em parte a geral anterior, e isto mesmo quando se refere ao seu assunto, implícita ou explicitamente, para alterá-la. Derroga a outra naquele caso particular e naquela matéria especial a que provê ela própria" (Carlos Maximiliano, in Hermenêutica e Aplicação do Direito, Forense, 1991, 11ª edição, pág. 360/361).
Sobre a aplicação do princípio da especialidade, em sede de prazo prescricional, manifestou-se esta Corte: "A norma geral que disciplina a prescrição em favor da Fazenda Pública, prevista no artigo 1º do Decreto nº 20.910/1932, deve ser afastada no caso, fazendo incidir a regra especial invocada pelos impetrantes (artigo 40 da Lei Estadual nº 11.817/2000), que traduz expressa vontade do legislador em possibilitar a anulação da pena disciplinar "a qualquer tempo", desde que atendidos os requisitos exigidos pela legislação de regência. (...)" (RMS 21.066/PE, Rel. Ministro PAULO GALLOTTI, SEXTA TURMA, julgado em 02/09/2008, DJe 29/09/2008).
Consectariamente, a propositura de ação de indenização, em razão do sacrifício de animais doentes ou destruição de coisas ou construções rurais, para salvaguardar a saúde pública ou por interesse da defesa sanitária animal, se subsume ao prazo prescricional de 180 (cento e oitenta) dias, contados da data em que for sacrificado o animal ou destruída a coisa, a teor do que dispõe o art. 7º da Lei nº 569/1948, com a redação dada pela Lei n.º 11.515/2007.
In casu, a pretensão deduzida na inicial resultou atingida pelo decurso do prazo prescricional de 180 (cento e oitenta) dias, previsto no art. 7º da Lei 569/1948 com a redação dada pela Lei 11.515/2007, uma vez que o abate dos animais ocorreu em 04.11.2005 e a ação indenizatória foi ajuizada em 17.01.2008, portanto, após o decurso do prazo prescricional estabelecido na legislação especial in foco
Ex positis, NEGO PROVIMENTO ao Recurso Especial.
É como voto.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
PRIMEIRA TURMA
Número Registro: 2010/0042869-2
REsp 1184775 / PR
Número Origem: 200870070000750
PAUTA: 04/05/2010
JULGADO: 04/05/2010
Relator
Exmo. Sr. Ministro LUIZ FUX
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro BENEDITO GONÇALVES
Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. RAQUEL ELIAS FERREIRA DODGE
Secretária
Bela. BÁRBARA AMORIM SOUSA CAMUÑA
AUTUAÇÃO
RECORRENTE: EMERSON DOS SANTOS
ADVOGADO: GEONIR EDVARD FONSECA VINCENSI E OUTRO(S)
RECORRIDO: UNIÃO
RECORRIDO: ESTADO DO PARANÁ
PROCURADOR: CESAR AUGUSTO BINDER E OUTRO(S)
ASSUNTO: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO - Responsabilidade da Administração - Indenização por Dano Material
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia PRIMEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Benedito Gonçalves (Presidente) e Hamilton Carvalhido votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 04 de maio de 2010
BÁRBARA AMORIM SOUSA CAMUÑA
Secretária
Documento: 967785
Inteiro Teor do Acórdão
DJ: 18/05/2010
JURID - Processual civil. Poder de polícia. Defesa sanitária animal. [15/07/10] - Jurisprudência
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