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sexta-feira, 16 de julho de 2010

JURID - Horas extraordinárias. Controles. Registros invariáveis. [16/07/10] - Jurisprudência


Horas extraordinárias. Controles contendo registros invariáveis. Ônus subjetivo da prova.

Tribunal Regional do Trabalho - TRT6ªR

PROCESSO N.º TRT-02063-2008-261-06-00-0

ÓRGÃO JULGADOR: PRIMEIRA TURMA.

RELATOR: DESEMBARGADOR NELSON SOARES JÚNIOR.

RECORRENTE: JOSÉ MARCOS DOS SANTOS.

RECORRIDO: JOSÉ ABELARDO CARNEIRO LEÃO (ENGENHO BREJO).

ADVOGADOS: ARINALDA MARIA MORAES ALVES MARTINS E FERNANDA LUCCHESI CARNEIRO LEÃO.

PROCEDÊNCIA: VARA DO TRABALHO DE RIBEIRÃO (PE).

EMENTA: HORAS EXTRAORDINÁRIAS. CONTROLES CONTENDO REGISTROS INVARIÁVEIS. ÔNUS SUBJETIVO DA PROVA. Em sendo constatada a ineficácia jurídica dos controles de horários de trabalho, em razão de conterem registros invariáveis, isto é, que não se harmonizam à falibilidade humana, há inversão do ônus subjetivo da prova, a teor do disposto no item III da Súmula nº 338 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), do qual, na hipótese em causa, o recorrido não se desobrigou. Dessa forma, as horas extraordinárias hão de ser apuradas em consonância com as jornadas descritas na petição inicial, na parte ratificada pela testemunha. Recurso ordinário parcialmente acolhido.

Vistos etc.

Cuida-se de recurso ordinário de José Marcos dos Santos, interposto por intermédio de advogada, por meio do qual ele postula a reforma da sentença do Excelentíssimo Juiz do Trabalho da Vara de Ribeirão (PE), proferida nos autos da reclamação proposta em face de José Abelardo Carneiro Leão (Engenho Brejo), que implicou a extinção do processo, sem julgamento do mérito, em relação ao pedido de pagamento de diferenças de depósitos do fundo de garantia do tempo de serviço (FGTS), e a rejeição dos demais.

O recorrente não se conforma com o indeferimento dos pedidos de pagamento de horas extraordinárias, repercussões, domingos, feriados e de multa moratória (artigo 477 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT). Mediante a transcrição de depoimentos de testemunhas, sustenta a demonstração dos fatos constitutivos dos supracitados direitos, isto é, haver trabalhado nos horários extravagantes descritos na petição inicial, inclusive, nos dias destinados aos descansos semanais. Pede o provimento do recurso pelas razões documentadas às fls. 233/5.

Contrarrazões às fls. 238/41.

Inexistindo obrigatoriedade, não determinei a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho.

É o relatório.

VOTO:

O juízo de primeiro grau julgou improcedentes pedidos de pagamento de horas extraordinárias, repercussões, domingos e feriados sob o fundamento central de que o recorrente não logrou fazer a demonstração da falsidade ideológica dos controles de horários de trabalho, uma vez que as testemunhas teriam sido contraditórias, ou seja, não corroboraram as jornadas extravagantes descritas na inicial.

Com a devida vênia a Sua Excelência, discordo desse douto ponto de vista: em sendo constatada a ineficácia jurídica dos controles de horários de trabalho, em razão de conterem registros invariáveis, isto é, que não se harmonizam à falibilidade humana, há inversão do ônus subjetivo da prova, a teor do disposto no item III da Súmula nº 338 do TST, do qual, na hipótese em causa, o recorrido não se desobrigou.

Com efeito, conforme se verifica dos documentos às fls. 33/195, raros são os controles de horários de trabalho que contêm registros verossímeis, ou seja, que não são uniformes. Daí a declaração da primeira testemunha, Antônio Maurício da Silva Filho, de que os aludidos documentos só eram assinados no momento do recebimento dos salários e que nem sempre os horários consignados eram corretos (fl. 213). Como corolário, são absolutamente nulos, de conformidade com o disposto no artigo 9º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Ante esse quadro, as horas extraordinárias hão de ser apuradas em consonância com as jornadas descritas na petição inicial, na parte ratificada pela testemunha acima mencionada -- única que possuía condições de informar realmente os horários de trabalho do recorrente, uma vez que exercia a função de ajudante.

Realmente, as declarações da segunda testemunha servem apenas à corroboração do horário inicial das jornadas descritas pela primeira testemunha, e da permanência do recorrente no serviço após os horários registrados nos controles, porquanto o presenciou no trabalho às 5h30, às 17h30 e às 18 horas (fl. 214).

Saliento a inexistência de contradições nos depoimentos das testemunhas, porque a segunda não narrou os horários de trabalho do recorrente: testemunhou apenas a presença dele no serviço nos supracitados horários. No entanto, caso existissem declarações antagônicas, nem assim haveria razão para rejeição integral dos depoimentos porque, como Giorgio Tesoro observou, "(...) não se deve esquecer que a testemunha não é uma máquina que reproduza exatamente aquilo que viu e ouviu, mas, um ser pensante que julga e elabora todas as suas sensações e, por isto, mais ou menos conscientemente, deforma o que viu e ouviu" (Cf. La psicologia della testimonianza, p. 2 -- apud: I. Borges da Rosa, "Questões Essenciais de Direito e Nulidades Processuais". 2. ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1959, vol. 1, p. 147).

Aliás, como I. Borges da Rosa advertiu com apoio em BINET, STERN, VARENDONK, GORPHE, BANCELS e outros, "(...) as divergências e contradições entre os depoimentos de duas ou mais testemunhas são (...) naturais; o que não é natural é a conformidade dos mesmos que faz supor a identidade de inspiração, o concerto prévio, o eumdem premeditatum sermonem, de que fala FRAMARINO MALATESTA, na sua Lógica das Provas" (cf. op. cit., p. 151).

Portanto, impõe-se a condenação do recorrido ao pagamento das horas extraordinárias, repercussões, domingos e feriados, a serem apurados de conformidade com os horários de trabalho descritos na inicial, na parte que foram ratificados pela testemunha.

Entretanto, o inconformismo do recorrente é infundado no pertinente ao pedido de pagamento de multa moratória, uma vez que confessou, expressamente, ser responsável pelo atraso no pagamento das verbas rescisórias (fls. 3 e 26, verso), não sendo essa sanção pecuniária devidas em razão de diferenças reconhecidas apenas em juízo.

No ponto, recordo que os textos normativos de natureza punitiva são interpretados de forma estrita, ou seja, suas sanções são aplicadas apenas às situações jurídicas nelas expressamente descritas. Nesse sentido é a lição de Carlos Maximiliano, quando, após a advertência de que o preceito penal só compreende os casos especificados, e que não se permite a extensão, por analogia ou paridade, para qualificar faltas reprimíveis, ou lhes aplicar penas, conclui: "(...) parecem intuitivas as razões pelas quais se reclama exegese rigorosa, estrita, de disposições cominadoras de penas" (grifei) (1) - Chamada de notas .

Com essas considerações, dou parcial provimento ao recurso, para, julgando em parte procedentes os pedidos, condenar o recorrido ao pagamento do valor correspondente às horas extraordinárias, repercussões, domingos e feriados (a serem apurados conforme a fundamentação), com juros e correção monetária, além das custas processuais, no valor de R$400,00 (quatrocentos reais), calculadas sobre R$20.000,00 (vinte mil reais) -- quantia arbitrada à condenação para todos os efeitos legais --, autorizando, desde logo, a retenção das contribuições para custeio da seguridade social (as quais incidirão sobre todas as prestações pecuniárias, à exceção das diferenças de FGTS) e do imposto de renda na fonte: é como voto.

ACORDAM os Desembargadores da Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, para, julgando em parte procedentes os pedidos, condenar o recorrido ao pagamento do valor correspondente às horas extraordinárias, repercussões, domingos e feriados (a serem apurados conforme a fundamentação), com juros e correção monetária, além das custas processuais, no valor de R$400,00 (quatrocentos reais), calculadas sobre R$20.000,00 (vinte mil reais) -- quantia arbitrada à condenação para todos os efeitos legais --, autorizando, desde logo, a retenção das contribuições para custeio da seguridade social (as quais incidirão sobre todas as prestações pecuniárias, à exceção das diferenças de FGTS) e do imposto de renda na fonte.

Recife, 10 de junho de 2010.

Nelson Soares Júnior - Desembargador relator.

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Notas:


1 - MAXIMILIANO. Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. 9. ed. 3ª tiragem. Rio de Janeiro: Forense, 1984, pp. 321 e 323. [Voltar]




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