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terça-feira, 20 de julho de 2010

JURID - Desvio de função. Diferenças salariais. [20/07/10] - Jurisprudência


Desvio de função. Diferenças salariais.

Tribunal Regional do Trabalho - TRT6ªR

Proc. nº TRT - 0167900-16.2008.5.06.0008

Órgão Julgador: 1ª Turma

Relator: Desembargador Federal do Trabalho Ivan de Souza Valença Alves

Recorrente: Washington Neves de Souza

Recorrido: Companhia Pernambucana de Saneamento - COMPESA

Advogados: André Correia de Paiva e Paulo Américo Passos de Brito

Procedência: 8ª Vara do Trabalho do Recife-PE

EMENTA: DESVIO DE FUNÇÃO - DIFERENÇAS SALARIAIS - Restou evidente a anuência da empregadora quanto ao desvio de função, pouco importando a necessária qualificação e os impedimentos legais existentes. Conquanto não possa o empregado público ser enquadrado em cargo diverso daquele para o qual foi contratado, sem lograr aprovação em concurso, não se afigura razoável ignorar a realidade, qual seja: a de o trabalhador ter laborado em desvio de função. Assim, deve, enquanto perdurar a irregularidade, receber o salário correspondente ao cargo que efetivamente exerce. Recurso parcialmente provido para determinar o pagamento das diferenças salariais oriundas do desvio entre as funções de assistente técnico II, classe 10, estágio "C", e a de assistente técnico I, classe 8, estágio "C", com a incidência sobre os quinquênios gratificações natalinas, férias acrescidas do terço legal, FGTS e demais gratificações pagas no curso do seu pacto laboral, enquanto perdurar o desvio.

Vistos etc.

Recurso Ordinário interposto por WASHINGTON NEVES DE SOUZA, em virtude de sentença proferida pelo MM. Juízo da 8ª Vara do Trabalho de Recife (PE), que julgou improcedente a presente reclamação trabalhista, movida pelo autor em face da COMPANHIA PERNABUCANA DE SANEAMENTO - COMPESA.

Em razões recursais, às fls. 60/66, o autor/recorrente pretende a reforma da sentença, ao argumento que a mesma fere a majoritária doutrina e jurisprudência dominantes. Reafirma os termos da exordial, aduzindo que, através do desvio de função, trabalha como assistente técnico II, classe 10, estágio "C", mas consta na sua CTPS a função de assistente técnico I, classe 8, estágio "C". Na sequência, pede o pagamento das diferenças salariais enquanto permanecer o desvio funcional apontado, assim como, a incidência sobre os quinquênios gratificações natalinas, férias acrescidas do terço legal, FGTS e demais gratificações pagas no curso do seu pacto laboral. Afirma também que não busca o reenquadramento, reclassificação ou equiparação salarial. Aponta o autor inexistir óbice à sua pretensão, momento em que transcreve decisões desta Corte que lhe são favoráveis. Ao final pede a reforma da r. sentença de 1º grau para condenar a reclamada no pedido principal, consectário e honorários advocatícios em face da sucumbência.

Apesar de devidamente intimada a reclamada não apresentou suas contrarrazões, consoante a certidão de fl.68.

É O RELATÓRIO.

VOTO:

DA DIFERENÇA SALARIAL. DESVIO DE FUNÇÃO.

Postula o autor o pagamento de diferenças salariais, fundamentando atuar com desvio de função, uma vez que desempenha as atividades de assistente técnico II, classe 10, estágio "C", mas na sua CTPS consta a função de assistente técnico I, classe 8, estágio "C".

A insurgência empresarial, em sede de defesa, situa impedimento constitucional, a partir do artigo 37, inciso II da Constituição Federal e, assevera que, se ultrapassada a questão, o autor não atuava com desvio.

Com efeito, apreciando de primeiro o impedimento apontado, não há dúvida de que o trabalhador não pode ser enquadrado ou reclassificado - em cargo isolado ou de carreira diverso daquele que o levou a ingressar, por concurso, nos quadros da Administração Pública, sem que ferimento seja operado ao inciso II, do artigo 37 da Carta Magna, de inegável importância à preservação dos princípios, hoje constitucionalizados, da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, todos elencados no caput do mesmo artigo, voltado à prevalência do interesse público em detrimento do interesse privado, como não poderia deixar de ser. Afinal, no âmbito da Administração Pública, somente é possível fazer aquilo que a lei autoriza, afastando dela a incidência da vontade subjetiva do administrador, diferentemente do que se dá no plano privado, no qual é possível realizar tudo o que a lei não proíbe. Tais princípios, associados à ética não podem ser afastados, dentro de avaliação razoável, proporcional e justa.

Ultrapassada a questão do reenquadramento por vedação constitucional deve, entretanto, serem deferidos ao autor os efeitos financeiros equivalentes, enquanto perdurar a situação extraordinária, desvio de função. A conclusão decorre da combinação das normas dos artigos 37, inciso II e 173, § 1º, inciso II da Constituição Federal. Salientando-se que o trabalho gratuito é constitucionalmente vedado, em casos que tais, a insuficiência do pagamento poderia conduzir à ilação de que estaria sendo permitido.

Na mesma linha a jurisprudência dominante no C. TST, sendo disso expressão a Orientação Jurisprudencial nº 125 da SBDI-1, in verbis:

"Desvio de função. Quadro de carreira.

O simples desvio funcional do empregado não gera direito a novo enquadramento, mas apenas às diferenças salariais respectivas, mesmo que o desvio de função haja iniciado antes da vigência da CF/1988."

A corroborar o entendimento, cito os seguintes arestos:

"DESVIO DE FUNÇÃO - REENQUADRAMENTO - ANOTAÇÃO NA CTPS - Nos termos do artigo 37, inciso II, da Constituição Federal de 1988, revela-se juridicamente inviável o reenquadramento, tampouco anotação na CTPS, em relação a cargo para o qual o empregado de ente público não logrou aprovação em concurso público. Constatado, porém, o desvio de função, são devidas as diferenças salariais. Recurso de revista conhecido e provido. (TST - RR 466158 - 1ª T. - Rel. Min. João Oreste Dalazen - DJU 29.06.2001 - p. 667) JCF. 37 JCF. 37. II"

"RECURSO DE REVISTA - DESVIO DE FUNÇÃO - DIFERENÇAS SALARIAIS - REENQUADRAMENTO - ANOTAÇÃO NA CTPS - Nos termos do artigo 37, inciso II, da Constituição da República, revela-se juridicamente inviável o reenquadramento e anotação na CTPS em relação a cargo para o qual o empregado de ente público não logrou aprovação em concurso público. Constatado, porém, o desvio de função, são devidas as diferenças salariais, conforme entendimento consagrado no Tema 125 da Orientação Jurisprudencial da SBD-1 desta Corte. Recurso de revista conhecido e parcialmente provido. (TST - RR 461407 - 1ª T. - Rel. Min. Conv. Guilherme Bastos - DJU 05.09.2003) JCF. 37 JCF. 37. II"

"I - DESVIO FUNCIONAL - REENQUADRAMENTO - ENTE PÚBLICO MUNICIPAL - QUADRO EM CARREIRA - DIFERENÇAS SALARIAIS - Por consonância ao entendimento consubstanciado na orientação jurisprudencial nº 125 da SDI-1 do C. TST é devida recomposição pecuniária, mas não reenquadramento ao empregado em desvio de função após a Constituição de 1988. Tal construção traduz expressão do princípio do não enriquecimento sem causa, fruto de eqüidade, consagrado na Lei Civil nos artigos 158 e 964 do Código de 1916, porquanto situação diversa importaria um deslocamento patrimonial causado injustamente, pelo qual uma parte enriqueceria com o empobrecimento de outra. II - Lei Municipal - Gratificação por tempo de serviço e reenquadramento por descumprimento do quadro de carreira (promoção) - Lei nova - Direito adquirido - Ultratividade - Diante dos princípios insculpidos no caput do art. 18 e no art. 30 da Constituição de 1988, a possibilidade de alteração legislativa na seara municipal é manifesta desde que observado o princípio da competência legislativa. Para tanto, a nova Lei, ao entrar em vigor, face ao que preceitua o artigo 5º, inciso XXXV, da Carta da República, deve observar os direitos adquiridos. Nada obstante, a teor dos artigos 114 e 118 do Código Civil de 1916 (artigos 121 e 125 do novo Código Civil brasileiro - Lei nº 10.406/2002, desde 11.01.2003) c/c arts. 6º da LICC e 5º, inciso XXXV, da Constituição de 1988, a Lei que condiciona direito a evento futuro e incerto, enquanto não verificada esta condição, gera simples expectativa de direito. Portanto, o advento de nova norma que revoga ou altera a anterior não ofende direito adquirido (art. 2º, da LICC). (TRT 9ª R. - Proc. 03386-2001-662-09-00-7 - (16971-2003) - Relª Juíza Sueli Gil El Rafihi - DJPR 01.08.2003) JCF. 18 JCF. 30 JCF. 5 JCF. 5. XXXV JCCB. 114 JCCB. 118." (Grifo nosso).

Traçados os limites da lide, incumbia ao autor o ônus da prova, nos termos do artigo 818, da CLT, c/c art. 333, I do CPC, do qual se desincumbiu, uma vez que a testemunha que o demandante tomou a iniciativa de fazer ouvir, disse em Juízo (fl. 49) que: "Que o cargo que está na carteira da depoente é Auxiliar Administrativo I; que a depoente exerce o cargo de Auxiliar Administrativo III; que trabalha junto com o reclamante; que o local de trabalho é CAS-Ibura; que a função que o reclamante exerce é de assistente técnico 2; que o assistente técnico 2 assessora o engenheiro nas obras, faz relatórios, faz cálculos, gráficos, fiscaliza as obras, coordena as equipes; que as equipes tanto podem ser da empresa como terceirizadas; que o assistente técnico 1 faz relatório de medição, aferição de aparelho de Pitometria (aparelho que mede vazão e pressão da água); que o assistente técnico 1 faz levantamento de dados em campo; que esses dados são entregues ao reclamante; que existe funcionário com registro na carteira de assistente técnico 2; que não existe nenhuma diferença nas funções exercidas por ele e nas executadas pelo reclamante; que o reclamante trabalha no CAS-Ibura há mais ou menos um ano; que antes o reclamante trabalhava no ELO-Jaboatão; que a depoente também trabalha há um ano no CAS-IBura; que antes trabalhava no ELO-Jaboatão; que no ELO-Jaboatão o reclamante também fazia função de assistente técnico 2; que o reclamante é responsável pela programação dos serviços das equipes tanto no ELO-Jaboatão na época, como no CAS-Ibura agora; que a programação consiste em as equipes fazer trabalho de tratamento, implantação de redes, substituição de redes, de pequeno e médio porte; que o reclamante programa internamente e depois fiscaliza as obras."

Constituída a prova oral, vistas as normas organizacionais em vigor na reclamada e os demais elementos constantes dos autos, não há dúvida de que demonstrado o desvio de função denunciado de forma a ensejar o pagamento das diferenças salariais pretendidas.

DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

A demandante-recorrente renova o requerimento dos honorários advocatícios, tendo em vista a declaração de pobreza formulada às fls. 07, e o fato de se encontrar assistida por seu órgão de classe, requisitos estabelecidos nas Leis nº 5.584/70 e 7.115/83 c/c as Súmulas 219 e 329 do C. TST.

Quanto aos honorários advocatícios, entendo que na Justiça do Trabalho somente são devidos quando o empregado está assistido por seu órgão de classe, a teor dos artigos 14 e 16 da Lei no 5584/70.

Ressalto a Súmula 329 do C. TST, que dispõe:

"Honorários advocatícios. Art. 133 da CF/1988

Mesmo após a promulgação da CF/1988, permanece válido o entendimento consubstanciado na Súmula nº 219 do Tribunal Superior do Trabalho."(Res. 21/1993, DJ 21.12.1993).

Ressalto, ainda, a OJ 304 da SDI-I do C. TST, com o seguinte teor:

"Honorários advocatícios. Assistência judiciária. Declaração de pobreza. Comprovação.

DJ 11.08.2003 - Parágrafo único do artigo 168 do Regimento Interno do TST.

Atendidos os requisitos da Lei nº 5.584/1970 (art. 14, § 2º), para a concessão da assistência judiciária, basta a simples afirmação do declarante ou de seu advogado, na petição inicial, para se considerar configurada a sua situação econômica (art. 4º, § 1º, da Lei nº 7510/1986, que deu nova redação à Lei nº 1.060/1950)."

Por fim, transcrevo a OJ 305 da SDI-1, segundo a qual:

"Honorários advocatícios. Requisitos. Justiça do Trabalho. DJ 11.08.2003 - Parágrafo único do artigo 168 do Regimento Interno do TST. Na Justiça do Trabalho, o deferimento de honorários advocatícios sujeita-se à constatação da ocorrência concomitante de dois requisitos: o benefício da justiça gratuita e a assistência por sindicato."

Ora, das disposições jurisprudenciais acima transcritas, julgo devidos os honorários advocatícios a cargo da empresa sucumbente, e no percentual de 15%, inteligência da Súmula 219 do C. TST.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso para determinar o pagamento das diferenças salariais a WASHINGTON NEVES DE SOUZA oriundas do desvio entre as funções de assistente técnico II, classe 10, estágio "C", e a de assistente técnico I, classe 8, estágio "C", com a incidência sobre os quinquênios gratificações natalinas, férias acrescidas do terço legal, FGTS e demais gratificações pagas no curso do seu pacto laboral, enquanto perdurar o desvio e honorários advocatícios na base de 15% sobre a condenação.

ACORDAM os Desembargadores da Primeira Turma do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da Sexta Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso para determinar o pagamento das diferenças salariais a WASHINGTON NEVES DE SOUZA oriundas do desvio entre as funções de assistente técnico II, classe 10, estágio "C", e a de assistente técnico I, classe 8, estágio "C", com a incidência sobre os quinquênios gratificações natalinas, férias acrescidas do terço legal, FGTS e demais gratificações pagas no curso do seu pacto laboral, enquanto perdurar o desvio e honorários advocatícios na base de 15% sobre a condenação.

Recife, 10 de junho de 2010.

Ivan de Souza Valença Alves
Desembargador Federal do Trabalho
Relator




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