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quinta-feira, 1 de julho de 2010

JURID - Responsabilidade civil. Servidor público. Relotação. [01/07/10] - Jurisprudência


Responsabilidade civil. Servidor público. Relotação. Danos morais.
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Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC

Apelação Cível n. 2009.067765-7, de Armazém

Relatora: Desembargadora Substituta Sônia Maria Schmitz

RESPONSABILIDADE CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO. RELOTAÇÃO. DANOS MORAIS.

Os sentimentos de angústia, frustração e ressentimento originados de assédio moral praticado por superiores hierárquicos que, após determinação judicial de relotação, efetuaram a reintegração de servidor em local inadequado, devem ser compensados a título de danos morais.

Na ausência de critérios objetivos para mensuração do valor econômico da compensação pelos danos morais, deve o julgador valer-se das regras de experiência comum e bom senso, fixando-a de tal forma que não seja irrisória, a ponto de menosprezar a dor sofrida pela vítima, ou exagerada, tornando-se fonte de enriquecimento ilícito.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2009.067765-7, da comarca de Armazém (Vara Única), em que é apelante Márcio Laurentino Mendonça, e apelado Município de Gravatal:

ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Público, por votação unânime, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Custas na forma da lei.

RELATÓRIO

Márcio Laurentino Mendonça ajuizou ação de reparação por danos morais em face do Município de Gravatal, de Rudinei Carlos do Amaral Fernades, de Mário Inácio Serafin e de Tarciso Marcon Corrêa, noticiando, em síntese, que desde 14.02.02 exerce a função de motorista no Município de Gravatal, com lotação na Secretaria de Saúde, todavia, a partir de 2006 passou a sofrer assédio moral de seus supervisores hierárquicos, tanto que foi submetido a processo administrativo para apuração de falta grave, bem como transferido para Secretaria de Infraestrutura, fatos que lhe acarretaram significativo abalo moral. Informou, ainda, a impetração de Mandado de Segurança para obstar os atos de sindicância e suspensão, cuja decisão de 1º grau lhe restou favorável. Discorrendo acerca do direito que o ampara, concluiu, clamando pelo acolhimento da súplica (fls. 02-16).

Citados, os réus contestaram. Os três últimos aventaram, em prefacial, ilegitimidade passiva. No mérito, defenderam inexistência de lotação específica, situação justificadora dos atos de remoção, mesmo porque decorrentes da discricionariedade do Poder Executivo. Rebateram os demais argumentos do autor, apregoaram legalidade do procedimento, instando, a final, pela improcedência do pleito (fls. 93-105, 109-121 e 189-198).

Após a réplica (fls. 455-463), afastada a preliminar, designou-se audiência inaugural (fl. 206) e, inexitosa a conciliação (fl. 213), o Magistrado deferiu a produção de prova testemunhal (fl. 213). Na data aprazada realizou-se a solenidade (fl. 239), ocasião em que foram inquiridas as testemunhas (fls. 240-247).

Apresentadas alegações finais remissivas (fls. 250-261), sobreveio a r. sentença que julgou improcedente o pedido (fls. 262-268).

Inconformado, o vencido apelou e, reeditando seus argumentos, pugnou pela reforma do decisum (fls.272-276).

Com as contrarrazões (fls. 293-299), os autos ascenderam a esta Corte.

É o relatório

VOTO

Márcio Laurentino Mendonça é funcionário do Município de Gravatal, no cargo de motorista, com lotação na Secretaria da Saúde.

No dia 14.08.06, Ronei Carlos do Amaral Fernandes, Chefe do Executivo Municipal, por meio da Portaria n. 371/06 instaurou procedimento administrativo sumário (sindicância), objetivando apurar cometimento de falta grave, qual seja, uso de veículo público (ambulância) para fins alheios à função e deslocamento em benefício próprio. Ao servidor, facultou-se-lhe defesa no prazo de 03 dias (fls. 27-28), apresentada em 23.08.06 (fls. 29-31). Da certidão de intimação, efetuada em 14.08.06, constou a aplicação, de imediato, da pena de suspensão (03 dias), consoante art. 117 do pertinente Estatuto dos Servidores (fl. 26). Em 17.08.06, por meio da Portaria n. 373/06, transferiu-se o impetrante para a Secretaria de Infraestrutura e, em 23.10.06, a Comissão acolheu parecer da Procuradoria, determinando arquivamento do processo, ao fundamento de legitimidade e cumprimento da penalização já aplicada (fls. 47-48).

Ocorre que por ato do Secretário de Administração Municipal (20.10.06 - fls. 65-67), houve nova suspensão (15 dias), com desconto da remuneração, sob o seguinte fundamento: "por conta própria e sem autorização do superior hierárquico, ausentou-se do serviço, no horário de expediente, para fins não sabidos bem como local e ainda, o servidor foi com o veículo do município (Carga 4.000KG - Ford) no Município de Armazém e ainda, compareu na Secretaria de Saúde, e ali estando ameaçou servidores colegas (fato presenciado pelo Secretário de Saúde)." Infringiu, segundo a autoridade, o art. 104 do Estatuto pertinente.

Inconformado com os atos praticados, o autor impetrou Mandado de Segurança (Autos n. 159.06.001642-3), objetivando ser reintegrado na Secretaria de Saúde, com sucesso (fls. 46-54), todavia, por ato verbal do Prefeito, restou efetivada a transferência para Posto de Saúde em Pouso Alto, distante 12 km de Gravatal e do Gabinete Desembargadora Substituta Sônia Maria Schmitz (cr) anterior local laborado.

A hipótese, como se vê, configura ofensa aos princípios da legalidade, do contraditório e da ampla defesa, porque, em que pese o poder de dever averiguar faltas cometidas, em tese, por servidores, imprescindível obediência aos trâmites regulares, sob pena de comprometer a lisura do procedimento.

E mais. Anuladas as respectivas Portarias (fls. 46-54), competia à Administração resguardar, eficientemente, a relotação do servidor em setor apropriado, que notoriamente existia. Sim, ingênuo crer que o remanejamento para lugar distante, em repartição que não exige realização de atividades expressivas, tratou-se de mera coincidência ou de adequação às necessidades administrativas, mormente quando se tem patente que o autor nas funções das quais fora afastado era o que tinha maior experiência e destaque.

Logo, forte as evidências de prejuízo ao servidor, resta comprovada a conduta ilícita, bem como o dano moral e o nexo causal, essenciais para consubstanciar a responsabilidade da entidade pública e gerar o dever de indenizar.

Nesses contornos, o debate direciona-se ao comando do art. 7°, XXVIII da CRFB/88 e 186 do CC, que contemplam a responsabilidade subjetiva do empregador por danos causados aos seus empregados no decurso do exercício laboral. Desse modo, para fins de indenização, sendo a vítima servidor público, torna-se imprescindível a prova não só do dano, mas também do nexo causal e da culpa ou dolo que, no caso, restaram configurados.

A respeito Sérgio Cavalieri Filho elucida:

A segunda conclusão a ser destacada está relacionada com o vocábulo terceiros, constante do texto em exame. 'Terceiro' indica alguém estranho à Administração Pública, alguém com o qual o Estado não tem vínculo jurídico preexistente. Logo, o § 6º do art. 37 da Constituição só se aplica à responsabilidade extracontratual do Estado. Não incide nos casos de responsabilidade contratual, porque aquele que contrata com o Estado não é terceiro; [...]. (Programa de Responsabilidade Civil. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 247).

Mudando o que deve ser mudado, registre-se que Caracteriza-se dano moral quando o empregador reintegra o empregado mas não lhe possibilita a volta ao trabalho, obrigando-o a permanecer em sala fechada, sem nenhuma tarefa ou função isolado do contato com os demais colegas. O objetivo da reintegração, que é o de restabelecer o contrato de trabalho conforme as condições anteriores, deixa de ser atingido, ensejando a indenização pelo dano moral que tem origem na frustração e nas humilhações a que se vê exposto o empregado. (TRT 9ª R - RO 18577-2001-009-09-00-5 - Ap. 18840/2004 - Rel. Ana Carolina Zalina - j. 10.08.2004). (Rui Stoco. Tratado de Responsabilidade Civil. 7. Ed.

São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. P. 1695).

Complementando:

O dano moral é direito, quando lesiona um interesse tendente à satisfação ou gozo de um bem jurídico não patrimonial. Os danos morais são direitos quando a lesão afeta um bem jurídico contido nos direitos de personalidade, como a vida, a integridade corporal, a honra, a própria imagem ou então quando atinge os chamados atributos da pessoa, como o nome, a capacidade, o estado de família. (Rui Stoco. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 459).

Em consonância, este Tribunal referendou:

Não se desconhece que para efeito de aferição de abalo moral, de modo a autorizar a correspondente indenização, basta seja demonstrado o fato passível de acarretar constrangimento ou sofrimento à vítima. No entanto, in casu, o que poderia ensejar o reconhecimento do direito subjetivo à indenização por danos morais seria exatamente a injustiça ou o incabimento da aplicação da pena imposta. (AC n. 2003.007508-9, de Chapecó, rel Des. Luiz Cézar Medeiros).

In casu, o constrangimento experimentado pelo autor em ser afastado de suas funções habituais, certamente caracteriza o dano moral.

Em casso análogo, aliás, essa Corte decidiu:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - PERSEGUIÇÃO POLÍTICA - AFASTAMENTO DE SERVIDOR PÚBLICO ESTÁVEL DE SUAS FUNÇÕES, QUE TERIA MOTIVADO HUMILHAÇÃO PERANTE COLEGAS - COMPROVADA A CONDUTA CULPOSA DO ENTE PÚBLICO E DO PREFEITO - ABALO MORAL DEMONSTRADO - INDENIZAÇÃO FIXADA EM CONSONÂNCIA À REALIDADE DO FATO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSOS DO AUTOR E DOS RÉUS IMPROVIDOS.

[...]

- Comprovada a conduta ilícita da Municipalidade e do Prefeito no caso em tela, bem como o dano moral alegado pelo autor, existente, portanto, o nexo de causalidade essencial para se ter a responsabilidade civil dos réus. (AC n. 2009.020183-6, de Descanso, rel. Des. Sérgio Roberto Baascj Luz).

Em relação ao quantum fixado, tarefa das mais tormentosas para o julgador, pois ao tempo que não pode ser considerado irrisório, a tal ponto de menosprezar o prejuízo sofrido, também não pode dar margem ao enriquecimento ilícito.

Em outros termos, dada a ausência de critérios objetivos que permitam quantificar economicamente a lesão à honra subjetiva do cidadão, deve o magistrado valer-se sobretudo das regras da experiência comum e do bom senso, que, de outro modo, autorizam o julgamento por equidade .

Nas palavras de Antonio Lindbergh C. Montenegro, "Para avaliar o dano moral, haver-se-á de levar em consideração, em primeiro lugar, a posição social e cultural do ofensor e do ofendido. Para isso deve-se ter em vista o homo medius, de sensibilidade ético-social normal." (Ressarcimento de Danos. 8.ed. Lumen Juris, Rio de Janeiro: 2005. p. 132).

Face as minudências do caso, mostra-se adequado fixar o valor em R$ 10.000,00 (dez mil reais).

No mais, os valores deverão ser atualizados monetariamente desde o seu arbitramento, pela Taxa Selic, que compreende tanto os juros como o fator de correção monetária.

Por fim, há se fixar os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, conforme posicionamento desta Corte (AC n. 2002.002158-0, de Blumenau, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros), devendo o Município ser isento do pagamento das custas processuais, consoante dispõe o art. 35, "i", da LC n. 156/97, com redação dada pela LC n. 161/97.

Diante do exposto, vota-se pelo conhecimento e provimento do recurso.

DECISÃO

Nos termos do voto da Relatora, a Terceira Câmara de Direito Público, por unanimidade, decidiu conhecer do recurso e dar-lhe provimento.

O julgamento, realizado no dia 1º de junho de 2010, foi presidido pelo Desembargador Pedro Manoel Abreu, com voto, e dele participou o Desembargador Wilson Augusto do Nascimento.

Florianópolis, 09 de junho de 2010.

Sônia Maria Schmitz
RELATORA
Gabinete Desembargadora Substituta Sônia Maria Schmitz (cr)




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