Recurso em sentido estrito. Pronúncia. Homicídio qualificado (Art. 121, § 2º, I e IV do CP). Pretendida impronúncia.
Tribunal de Justiça do Mato Grosso - TJMT
PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 35126/2009 - CLASSE CNJ - 426 - COMARCA
CAPITAL
RECORRENTE: WANDERLEI DE JESUS DUTRA
RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO
Número do Protocolo: 35126/2009
Data de Julgamento: 27-4-2010
EMENTA
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - PRONÚNCIA - HOMICÍDIO QUALIFICADO (ART. 121, § 2º, I E IV DO CP) - PRETENDIDA IMPRONÚNCIA - ALEGADA FRAGILIDADE DAS PROVAS - IMPOSSIBILIDADE - MATERIALIDADE COMPROVADA E INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA - COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL POPULAR DO JÚRI PARA APRECIAR OS CRIMES DOLOSOS CONTRA A VIDA - PRETENSÃO NÃO ATENDIDA - RECURSO IMPROVIDO.
Havendo prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria, impõe-se a Pronúncia, atribuindo-se à Corte de Jurados Leigos a incumbência de dirimir quaisquer dúvidas quanto à autoria, impositivo constitucional.
RELATÓRIO
EXMO. SR. DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA
Egrégia Câmara:
WANDERLEI DE JESUS DUTRA foi denunciado e pronunciado pelo MM. Juízo da 12ª Vara Criminal da Comarca da Capital, pelo crime de homicídio qualificado (art. 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal), perpetrado contra a vítima JOÃO BATISTA DA SILVA BRITO JÚNIOR, fato este, ocorrido no dia 06-01-07, às 04h00min, na Rua 216, bairro Tijucal, nesta Capital.
Ressai que o Recorrente contratou a pessoa de alcunha "Neguinho" ou "Bugrinho", com o fito de tirar a vida da vítima, o qual efetuou disparo de arma de fogo que culminou na morte da mesma. Na data do fato o Recorrente e o executor se reuniram para a execução do crime, sendo que este ficou nas proximidades da residência da vítima enquanto aquele permaneceu em uma esquina próxima com uma motocicleta. Aproximando-se a vítima "Bugrinho" efetuou o disparo de arma de fogo, posteriormente, fugindo com o Recorrente que estava a sua espera.
Irresignado com o teor do decisum que o submeteu a julgamento perante o colendo Tribunal do Júri, interpôs o Recorrente o presente Recurso em Sentido Estrito objetivando a impronúncia, sustentando a inexistência de indícios suficientes de autoria uma vez que, os testemunhos colhidos na instrução processual não dão certeza da veracidade dos fatos (fls. 316/319).
Sobrevindas as contrarrazões recursais, o Órgão Ministerial requer, às fls. 327/335, o improvimento do Recurso, para que seja mantida a r. decisão de pronúncia.
Em juízo de retratação, o douto Juiz de instância singela manteve a decisão recorrida (fls. 348/349).
Ascenderam os autos a este Grau de Jurisdição, tendo a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do culto Procurador Dr. LEONIR COLOMBO, opinado pelo improvimento do Recurso e consequente manutenção da decisão de pronúncia, uma vez que, há prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria (fls. 427/434).
É o relatório.
PARECER (ORAL)
O SR. DR. JOÃO BATISTA DE ALMEIDA
Ratifico o parecer escrito.
VOTO
EXMO. SR. DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (RELATOR)
Egrégia Câmara:
Consoante extraído dos autos, cuida-se de Recurso em Sentido Estrito manejado por WANDERLEI DE JESUS DUTRA, irresignado com a r. sentença proferida pelo MM. Juízo da 12ª Vara Criminal da Comarca da Capital, por intermédio da qual o mesmo fora pronunciado como incurso do artigo 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal, determinandose que o mesmo fosse submetido a julgamento pelo e. Tribunal Popular do Júri desta Comarca.
Pretende-se nas Razões do Recurso a impronúncia do Recorrente com supedâneo no artigo 414, caput, do Código de Processo Penal. Analisando a pretensão recursal, conclui-se que não assiste razão o Recorrente. Vejamos.
Para a impronúncia, que consiste na decisão terminativa que julga improcedente a pretensão punitiva estatal, reza o artigo 414 do Código de Processo Penal que se dará quando o Juiz não convencer-se da existência do crime ou quando os indícios forem insuficientes a revelar a autoria em desfavor do denunciado ou querelado, conforme o caso.
Segundo o escólio de Julio Fabbrini Mirabete:
"(...) A impronúncia é um julgamento de inadmissibilidade de encaminhamento da imputação para o julgamento perante o Tribunal do Júri (...)
Embora para a pronúncia baste a suspeita jurídica derivada de um concurso de indícios, devem estes ser idôneos, convincentes e não vagos, duvidosos, de modo que a impronúncia se impõe quando de modo algum possibilitariam o acolhimento da acusação pelo Júri (...)" (Código de Processo Penal interpretado - 11ª. Ed. - São Paulo: Atlas, 2003, p. 1114).
In casu, a materialidade, no crime de homicídio é comprovada pelo Boletim de Ocorrência (fls. 10) e Laudo de Exame de Necropsia (fls. 26/31), não pairando dúvidas de que a causa da morte da vítima se deu em decorrência de choque hipovolêmico produzido por instrumento perfuro contundente no pulmão esquerdo e fígado.
Em que pese os elementos de informações obtidas na fase extrajudicial e judicial restarem divergentes, a autoria, como se apercebe, não reclama discussão nesta fase processual, que cuida da pronúncia, emergindo do conjunto probatório indícios bastante de que o Pronunciado seja o autor da infração penal, para que o caso seja apreciado pelo Júri Popular.
Ressai da inicial acusatória que o Recorrente tinha convicção de que a vítima havia feito comentários sobre sua esposa, por tal motivo planejou por fim a vida da mesma contratando terceira pessoa, de modo que, no dia dos fatos o executor desferiu um disparo contra a vítima e posteriormente fugiu com o Recorrente/Pronunciado.
Embora tenha mudado sua versão em juízo a testemunha PEDRO COSTA MACEDO (fls. 57/58), asseverou ter certeza sobre a autoria do crime, atribuindo-a ao Recorrente e "Bugrinho" o executor dos disparos, que tal crime se deu em virtude de o Pronunciado ter ouvido comentários feitos pela vítima sobre sua esposa.
A genitora da vítima, Sr. VALDILÉIA MACEDO BRITO, ratificou em juízo seu depoimento prestado na fase policial (fls. 72/73), declarando que o Pronunciado e a vítima eram amigos. Narrou que a vítima sabia do caso que a mulher do Recorrente tinha com terceira pessoa. A pessoa de VALDEMAR DOS SANTOS, ainda, no dia dos fatos, lhe relatou ter sido o Recorrente e "Bugrinho" quem teria cometido o crime, pontificando, ainda, a declarante, que ambos, no dia anterior aos fatos, teriam passado o dia todo juntos.
VALDEMAR DOS SANTOS, por sua vez, declarou na fase policial (fls. 74/75), que o Pronunciado esteve no local onde ocorreram os fatos, inclusive conversado com o mesmo, e, quando o executor efetuou os disparos contra a vítima, correu em direção ao Pronunciado que o esperava com sua motocicleta. Embora tenha mudado sua versão em juízo, seu depoimento prestado na fase policial corrobora a declaração ofertada por VALDILÉIA MACEDO BRITO.
O Recorrente, tanto na fase inquisitiva como em juízo, nega a autoria do delito.
Diante dos fatos supra, denota-se a existência de indícios suficientes de participação do Recorrente na prática do crime de homicídio. Os depoimentos prestados na fase inquisitorial são firmes e congruentes ao apontar o Recorrente como o autor do crime, ainda que em fase judicial seja contraditório. Não obstante, as versões dadas em juízo pelas testemunhas VALDEMAR e PEDRO, serem retratadas, não comportam a pretensão do Recorrente, visto que, estas divergem de suas próprias versões dada na fase polícia, principalmente porque, há informações nos autos de que parentes do Pronunciado vêm ameaçando as testemunhas, conforme se extrai da declaração de VALDEMAR (fls. 75), VALDINEIA (fls. 73) e PEDRO (fls. 57).
Neste esteio, as versões colhidas durante todo o arcabouço probatório devem ser analisadas pelo Conselho de Sentença, já que a decisão de pronúncia é juízo fundado de suspeita, de admissibilidade da acusação, não competindo ao Juiz Singular a análise aprofundada das provas, contentando-se com razoável apoio nos elementos probatórios, sem avaliações subjetivas, motivando o seu convencimento de forma comedida, de modo a não influenciar o ânimo dos Jurados.
Desse modo, restringe ao Juízo togado se convencer, acerca da existência do crime e de indícios suficientes da autoria ou da participação para pronunciar o réu, dando prosseguimento à acusação, conforme preceitua o artigo 413 do Código de Processo Penal, pois, inexistindo prova induvidosa para afastar a autoria, pertinente a apreciação da causa pelo competente Conselho de Sentença do Tribunal do Júri. É o que ressalta o artigo 5º, inciso XXXVIII, da Constituição Federal.
Nesta vereda, vem a jurisprudência:
STF: "A impronúncia só deve ser admitida no caso de não ficar provada a existência da infração penal, a sua materialidade ou de não haver uma indicação suficiente de autoria." (HC 56.7229-1-SP - rel. Cordeiro Guerra).
STJ: "PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO DOLOSO. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. I - Na fase de pronúncia, reconhecida a materialidade do delito, qualquer questionamento ou ambigüidade faz incidir a regra do brocardo in dubio pro societate. II - As justificativas só podem ser admitidas, no iudicium accusationis, quando evidentes e inquestionáveis.
Reconhecidos aspectos essenciais polêmicos, no próprio voto do acórdão atacado (adotado por maioria), a absolvição combatida se apresenta inadequada ao disposto nos arts. 408 e 411 do CPP. (Precedentes). Recurso provido." (RESP 485775/DF. Ministro FELIX FISCHER. 5ª Turma. Julgado em 09-9-03 e publicado no DJ em 20-10-03)
TJDF: "... RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HOMICÍDIO QUALIFICADO. MATERIALIDADE IRREFUTÁVEL E FORTES INDÍCIOS DE AUTORIA. IMPRONÚNCIA. IMPOSSIBILIDADE. 1. Cuidando-se de crime sujeito à competência do Tribunal do Júri (homicídio qualificado), provada a materialidade do delito, o julgamento pelo Conselho Popular somente será afastado se ausentes indícios suficientes de autoria, haja vista vigorar, nesse ambiente processual, o princípio in dubio pro societate ...". (SER 20070710246755, Acórdão nº 321503, Relator SILVANIO BARBOSA DOS SANTOS, 2ª Turma Criminal, julgado em 11-9-2008, DJ 01-10-2008) TJDF: "... A sentença de pronúncia deve comportar, basicamente, o juízo de admissibilidade da acusação, adstrito à existência de prova da materialidade do ilícito e suficientes indícios de autoria. II. As dúvidas existentes acerca do crime devem ser resolvidas a favor da sociedade, para que não seja violado o comando constitucional de submissão do julgamento dos crimes dolosos contra a vida pelo Tribunal do Júri ...". (RSE 20060510063492, Acórdão nº 319737, Relatora SANDRA DE SANTIS, 1ª Turma Criminal, julgado em 28-8-2008, DJ 15-10-2008).
Destarte, tenho como satisfeitos os requisitos que legitimam a pronúncia do Recorrente WANDERLEI DE JESUS DUTRA, por configurar a pronúncia mero juízo de admissibilidade, sendo que nesta fase processual, em que prevalece o princípio in dubio pro societate, com a submissão do Recorrente a julgamento perante o Egrégio Tribunal do Júri, juiz natural da causa, é medida que se impõe.
Pelo o exposto, a manutenção da r. decisão de pronúncia deve ser mantida, razão pela qual, em consonância com o parecer da douta Procuradoria-Geral de Justiça, NEGO PROVIMENTO ao Recurso.
É como voto.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do DES. RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Câmara Julgadora, composta pelo DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (Relator), DES. RUI RAMOS RIBEIRO (1º Vogal) e DR. CARLOS ROBERTO C. PINHEIRO (2º Vogal convocado), proferiu a seguinte decisão:
RECURSO IMPROVIDO. UNÂNIME. O PARECER É PELO DESPROVIMENTO DO
RECURSO.
Cuiabá, 27 de abril de 2010.
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DESEMBARGADOR RUI RAMOS RIBEIRO - PRESIDENTE DA PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL
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DESEMBARGADOR JUVENAL PEREIRA DA SILVA - RELATOR
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PROCURADOR DE JUSTIÇA
JURID - Recurso em sentido estrito. Pronúncia. Homicídio qualificado [19/07/10] - Jurisprudência
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