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segunda-feira, 12 de julho de 2010

JURID - Despedida por justa causa. Roupeiro. [12/07/10] - Jurisprudência


Despedida por justa causa. Roupeiro. Fornecimento de camisetas do clube de futebol reclamado.

Tribunal Regional do Trabalho - TRT4ªR

ACÓRDÃO

0119600-32.2008.5.04.0023 RO Fl.1

EMENTA: DESPEDIDA POR JUSTA CAUSA. ROUPEIRO. FORNECIMENTO DE CAMISETAS DO CLUBE DE FUTEBOL RECLAMADO. A distribuição e troca de camisetas entre jogadores, roupeiros e torcedores, caracteriza-se como prática comum nos clubes de futebol e está relacionada à paixão nacional pelo esporte. Nesse contexto, a imputação do crime de furto qualificado e a demissão por justa causa do reclamante, por ter ele, na condição de roupeiro, fornecido duas ou três camisetas usadas a um atleta profissional do próprio clube, que tinha como destinatário um torcedor, se mostra excessiva e desproporcional, até mesmo porque não há regramento editado pelo empregador definindo quem pode, ou não, ter acesso aos artigos esportivos usados. Além disso, não houve aplicação de advertência prévia, tampouco suspensão. Recurso do autor provido, no particular.

VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM. Juiz da 23ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, sendo recorrentes ISMAEL GOMES DE ÁVILA e SPORT CLUB INTERNACIONAL e recorridos OS MESMOS.

Inconformados com a sentença das fls. 493/501, complementada na fl. 521, reclamante e reclamado interpõem recurso ordinário respectivamente às fls. 505/518 e 524/528.

Insurge-se o autor contra a decisão que manteve a demissão por justa causa e indeferiu o pleito de indenização por dano moral.

O reclamado recorre contra a condenação ao pagamento de horas extras e honorários advocatícios.

É o relatório.

ISTO POSTO.

CONHECIMENTO.

Tempestivo o recurso do reclamante (folhas 492 e 505), e regular a representação (folhas 17).

Tempestivo o recurso do reclamado (folhas 523/524), regular a representação (folha 86), e efetuado o preparo (folhas 529/530), encontram-se preenchidos os pressupostos extrínsecos de admissibilidade do recurso.

Contra-razões igualmente tempestivas (folhas 534, 536 e 533, 550), e com representação regular.

MÉRITO.

I - RECURSO DO RECLAMANTE.

DESPEDIDA POR JUSTA CAUSA. ROUPEIRO. CAMISETAS DE CLUBE DE FUTEBOL.

Não se conforma o reclamante com a sentença que manteve a despedida por justa causa. Alega que sua principal função era cuidar dos uniformes e repassá-los aos jogadores. Disserta que nunca furtou, ou roubou camisetas do clube. Argumenta que as camisetas que alcançou para o jogador Henrique, eram usadas e já se encontravam em desuso. Defende que o próprio preposto do clube, não sabe o que é feito com camisetas que não estão mais em condições de uso. Refere que é prática comum do clube dar as camisetas que sobram, ou que não estão mais em uso. Menciona que não há qualquer norma interna que impeça dar camisetas e que já havia doado camisetas na presença de dirigentes. Esclarece, ainda, que é permitido ao final do jogo trocar o fardamento com o time adversário, o que demonstra total liberdade com os uniformes.

O reclamado defende que fez uso do direito que lhe assiste como empregador, aduzindo que os atos praticados pelo reclamante foram de natureza gravíssima, incompatíveis com a manutenção da relação de emprego. Refere que, se em alguma oportunidade o reclamante doou camiseta na frente de dirigentes, foi com autorização destes.

Com razão o autor.

O reclamante, na condição de roupeiro do time "B" do S. C. Internacional (fls. 301, 303. 308, 351 e 352), alcançou três camisetas usadas a um dos atletas profissionais do clube, Sr. Henrique (fl. 416). As camisetas se destinavam a uma terceira pessoal, qual seja o dono do Bar Gato do Alemão (fl. 417), estabelecimento instalado dentro das dependências do Beira-Rio, sendo que o comerciante se declara torcedor e colecionador de camisetas e artigos esportivos do Clube, tendo referido que tem camisetas de quase todos os jogadores que estão e que passaram pelo S. C Internacional (fl. 417).

Por ser o brasileiro apaixonado por futebol, a camiseta mais valiosa para o torcedor não é a que está à venda no manequim da loja, mas sim, aquela utilizada pelos jogadores nas partidas disputadas pelo clube do coração. Não por outro motivo, a distribuição e troca de camisetas entre jogadores e torcedores, caracteriza-se como prática comum nos clubes e está relacionada à paixão pelo esporte como um todo.

No domingo passado, inclusive, em tempos de copa do mundo, foi transmitido pela televisão a cena de um goleiro de seleção indo embora escondendo, por debaixo de sua camiseta, nada menos do que a bola do jogo, a jabulani. Seria ele merecedor de imputação de crime de furto qualificado de uma bola? É claro que não, pois há um valor muito maior envolvido, que é a paixão pelo esporte e por sua nação, e isso deve ser considerado.

O caso dos autos deve ser analisado levando-se em consideração as peculiaridades do mundo do futebol. Na hipótese, um torcedor/colecionador pediu camiseta a um jogador profissional de seu clube do coração, o qual repassou o pedido ao seu roupeiro. Foi nesse contexto que o reclamante, na condição de roupeiro do S. C. Internacional, foi acusado de furto qualificado e demitido por justa causa. Tudo isso em razão do fornecimento de três camisetas usadas, com valor de mercado de R$ 40,00 a R$ 70,00 cada uma, a um atleta profissional, que defendia as cores do clube e que também foi demitido.

A demissão por justa causa caracteriza-se como a pena máxima passível de ser imposta ao trabalhador, sendo que as hipóteses estão definidas no art. 482 da CLT. No caso dos autos, ela ainda veio acompanhada de imputação do crime de furto.

Todavia, as peculiaridades do mundo do futebol já referidas, acompanhadas da ausência de regulamentação pelo empregador, que não possui norma editada com o fim de definir os limites para distribuição de camisetas entre jogadores e torcedores, devem abrandar o rigor formal, de maneira que a demissão por justa causa, antes da aplicação de alguma advertência ou suspensão, se mostra excessiva.

Observa-se que a testemunha do reclamado, Sr. Renan Kruger (fls. 491/492), que é advogado do S. C. Internacional, referiu que o chefe de segurança procurou a assessoria jurídica em razão de que não sabia qual a atitude que deveria tomar no caso. Mencionou a testemunha, que o departamento jurídico teve que consultar os empregados responsáveis para saber sobre a possibilidade dos roupeiros darem ou retirarem camisetas do clube. Aduziu que acreditava que as camisetas vendidas já estivessem lavadas e que não sabia o tipo de controle utilizado na rouparia. Referiu, ainda, que em consulta aos diretores, foi constatado que o reclamante não tinha autorização para pegar camisetas. Por fim, mencionou que não sabia se a prerrogativa de, somente os diretores pegarem camisetas, estava regulamentada.

Constata-se do depoimento que, em relação a roupeiros, distribuição de uniformes e jogadores, não existe regulamentação editada pelo empregador, já que o advogado do clube desconhece a existência de tal norma. Do conteúdo do depoimento, observa-se que foram necessárias várias diligências e questionamentos, até se chegar à conclusão de que os roupeiros não estão autorizados a dar uniformes usados ou em desuso.

Isso é suficiente para se concluir que a matéria suscita dúvida dentro do próprio clube e que, em razão disso, o caso foi tratado com rigor excessivo e desproporcional. O próprio clube, quando realiza partidas no Beira-Rio, distribui, nos intervalos, em torno de dez camisetas para torcedores. Também é normal a troca de camisetas entre os jogares, que às vezes fazem duas trocas no mesmo jogo, uma no intervalo e outra ao final da partida. O reclamante também referiu que já distribuiu camisetas na presença de dirigentes, quando em jogos pelo interior do Estado (fl. 45), o que não é negado em contra-razões.

Diante desse contexto, não se pode exigir que os roupeiros e atletas saibam exatamente qual é o limite no que se refere à concessão de camisetas usadas (a testemunha do reclamado referiu que as camisetas já haviam sido lavadas), já que não há normatização editada pelo reclamado no sentido de ordenar de forma precisa a concessão das camisetas usadas, ou em desuso.

Nesse contexto, a demissão por justa causa não merece ser mantida, até porque sequer houve advertência, ou suspensão prévia. O reclamado também poderia, ao invés de demitir o empregado, reivindicar o ressarcimento dos valores correspondentes, com a competente pena de advertência ou suspensão. Outros fatores que devem ser sopesados, referem-se ao poder econômico do clube em relação ao valor de duas, ou três camisetas usadas, e o fato de que o destinatário dos artigos esportivos era um torcedor/colecionador.
O poder de direção do empregador é subdividido nos poderes de organização, controle e disciplinar. No caso dos autos, o reclamado exerceu seu poder disciplinar de forma máxima, aplicando a demissão por justa causa de forma preliminar, antes mesmo de suscitar qualquer advertência. Entretanto, foi omisso no que se refere ao seu poder/dever de organização, o que evidencia que a conduta do réu foi excessiva e desproporcional, pois cabia a ele, em meio a todas essas peculiaridades que envolvem o mundo do futebol, no qual estão inseridos os roupeiros, jogadores e torcedores, regulamentar o fornecimento e distribuição de camisetas em desuso pelo clube.

Assim, considerando que se tratavam de camisetas usadas, e que não há regulamentação expressa editada pelo S. C. Internacional, no sentido de definir o destino ou doação das camisetas em tais condições, impõe-se o reconhecimento da demissão sem justo motivo. Consoante já referido, seria admissível no caso a advertência, suspensão e até mesmo o requerimento de ressarcimento das despesas (art. 462, § 1º, da CLT), mas nunca despedida por justa causa, em face das peculiares inerentes ao contexto do futebol e da ausência de regramento.

Dá-se provimento no tópico, para reconhecer a despedida sem justa causa, e condenar o reclamado ao pagamento de aviso prévio, 13º salário, férias com 1/3, FGTS com indenização compensatória de 40% e indenização relativa ao benefício do seguro-desemprego. Observe-se a projeção do período do aviso prévio indenizado. No cálculo das parcelas, deverá ser observada a média de horas extras e a percepção de adicional de insalubridade.

2. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL.

Requer o reclamante seja reformada a sentença que indeferiu o pedido de indenização por dano moral, em razão da acusação de furto qualificado e rescisão contratual por justa causa. Alega ter havido divulgação do fato por outros empregados do clube. Refere também que, devido aos fatos imputados, não tem conseguido encontrar novo emprego. Invoca o disposto no art. 5º, V e X, da Constituição Federal.

Na hipótese, ressalvado o entendimento dessa Relatora, no sentido de que a despedida por justa causa e a imputação do crime de furto qualificado, se caracterizam como condutas excessivas adotadas pelo réu, que não cumpriu seu poder/dever de regulamentação da distribuição de camisetas usadas do clube; considerando, ainda, que tal conduta por parte do empregador casou prejuízos significativos na vida profissional do trabalhador, o que ensejaria, repita-se, no entendimento dessa Relatora, a condenação ao pagamento de indenização por dano moral, a Turma Julgadora, entretanto, em sua maioria, entende não caracterizada hipótese de dano moral, razão porque mantém-se a sentença, no particular.

Nega-se provimento ao recurso.

II - RECURSO DO RECLAMADO.

Investe o reclamando contra a condenação ao pagamento de horas extras excedentes a 8ª hora diária e 44ª hora semanal. Alega que o reclamante estava submetido a regime de jornada compensatória, razão pela qual são devidas as horas excedentes a 44ª hora semanal. Invoca o disposto nos artigos 7º, XIII, da Constituição Federal e artigos 58 e 59 da CLT.

Sem razão.

Verifica-se da fl. 246, por exemplo, que o reclamante laborou todos os sábados do mês. Nessa hipótese, fica configurada a nulidade do regime compensatório semanal invocado, pois o propósito desse regime é exatamente dispensar o trabalhador do labor aos sábados, o que não foi observado. Assim, não há o que ser retificado na decisão que condenou o reclamado ao pagamento de horas extras excedentes a 8ª hora diária e 44ª hora semanal.

Tem-se por prequestionados todos os dispositivos legais invocados pelo reclamado (inteligência da Súmula 297, 1, do C. TST) .

Nega-se provimento.

2. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

Insurge-se o demandado contra a condenação ao pagamento de honorários advocatícios. Invoca a previsão das Súmulas nº 219 e 329 do TST.

Sem razão.

À luz do disposto no § 3º, do art. 790 da CLT, tem direito a litigar ao abrigo da Justiça Gratuita aqueles que ...percebam salário igual ou inferior ao dobro do mínimo, ou declarem, sob as penas da lei, que não estão em condições de pagar as custas do processo sem prejuízo do seu próprio sustento. (grifou-se). O reclamante declarou sua pobreza na fl. 13, o que é suficiente para fazer prova de sua condição de miserabilidade econômica, a teor do disposto no § 1º, da Lei nº 7.115/83, que atribui presunção de veracidade à declaração feita. Assim, a assistência judiciária pode ser concedida com base na Lei 1.060/50 e art. 790, § 3º, da CLT, garantindo o acesso ao judiciário de forma integral e gratuita, como prevê o inciso LXXIV, do art. 5º, da Constituição Federal. Deve ser observado ainda o art. 133, da Constituição, segundo o qual o advogado é indispensável à administração da Justiça. Esta Relatora entende que não há monopólio dos sindicatos para a prestação da assistência judiciária, não adotando o entendimento das Súmulas nº 219 e 329 do TST. Incide no caso a Previsão da Súmula nº 450 do STF, segundo a qual São devidos honorários de advogado sempre que vencedor o beneficiário de Justiça Gratuita.

Nega-se provimento.

Ante o exposto,

ACORDAM os Magistrados integrantes da 6ª TURMA do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade de votos, dar provimento ao recurso ordinário do reclamante, para reconhecida a despedida sem justa causa do reclamante, condenar o reclamado ao pagamento de aviso prévio, 13º salário, férias com 1/3, FGTS com indenização compensatória de 40% e indenização relativa ao benefício do seguro-desemprego, observada a projeção do período do aviso prévio indenizado. Por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso ordinário do reclamado. Valor da condenação arbitrado em R$ 1.000,00, que é majorado para R$ 3.000,00 para efeitos legais.

Intimem-se.

Porto Alegre, 7 de julho de 2010 (quarta-feira).

JUÍZA CONVOCADA MARIA MADALENA TELESCA
Relatora




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