Apelação cível. Ação de indenização por danos morais. Promoção de editora. Passagens aéreas.
Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC
Apelação Cível n. 2006.005280-1, de Blumenau
Relator: Des. Subst. Stanley da Silva Braga
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PROMOÇÃO DE EDITORA OFERECENDO AOS ASSINANTES PASSAGENS AÉREAS. OBRIGAÇÃO INADIMPLIDA EM RAZÃO DA QUEBRA DA EMPRESA QUE REALIZARIA O TRANSPORTE AÉREO. RELAÇÃO CONTRATUAL ABSOLUTAMENTE DISTINTA. SUBSISTÊNCIA DA OBRIGAÇÃO PROMOCIONAL. CONDENAÇÃO EM VERBA INDENIZATÓRIA QUE SE IMPÕE DESDE QUE COMPATÍVEL AO DISSABOR E AO FORNECIMENTO DAS PASSAGENS. PRECEDENTES. RECURSO DESPROVIDO
"No momento em que o fornecedor oferece brinde pela aquisição de seu produto, ainda que outorgue a terceiros o seu cumprimento, responderá solidariamente pelo adimplemento da obrigação ou pelas perdas e danos decorrentes de seu não cumprimento" (Apelação Cível n. 2005.040563-8, de Turvo - Relator: Des. Victor Ferreira).
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2006.005280-1, da comarca de Blumenau (4ª Vara Cível), em que é apelante Editora Globo S/A, e apelado Osnildo Moreira:
ACORDAM, em Primeira Câmara de Direito Civil, por votação unânime, conhecer e negar provimento ao recurso, vencido o relator que votou pela redução o valor da indenização por danos morais para a quantia de R$ 5.000,00. Custas legais.
RELATÓRIO
Nos termos da decisão de Primeiro Grau (fls. 93-97):
"Trata-se de ação de indenização por danos morais ajuizada por Osnildo Moreira em face de Editora Globo S/A, já qualificados.
Alegou o autor, em síntese, que, em 30.03.2001, realizou contrato com a editora ré para assinatura pelo período de um ano das revistas Época e Quem; que, conforme pactuado, 30 (trinta) dias após a quitação da assinatura, receberia um voucher para retirar passagem de ida e volta na classe econômica para qualquer lugar do país em que a empresa Transbrasil realizasse vôos; apesar de ter pago a vista e receber o vale, não conseguiu retirar a passagem porque a empresa aérea mencionada deixou de prestar o serviço; comunicada do ocorrido a ré ofertou outros brindes em troca, o que não foi aceito; que a promoção foi determinante para que assinasse os periódicos; publicidade enganosa; abalo moral; dever de indenizar.
Também em resumo, alegou a ré, preliminarmente, litisconsórcio passivo necessário da Transbrasil; no mérito, que sua responsabilidade estava adstrita ao fornecimento das revistas e à emissão do voucher; que não teve culpa pelo fato da empresa aérea não ter emitido a passagem, caracterizando a culpa exclusiva de terceiro; que na busca de minorar os danos dos seus clientes, conseguiu prorrogação do prazo de emissão das passagens; afronta ao princípio da força obrigatória dos contratos; inexistência de danos; que a verba indenizatória pleiteada configura enriquecimento ilícito".
Restando o litígio assim decidido na Instância a quo:
"Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado por Osnildo Moreira em face de Editora Globo S/A para condenar a ré ao pagamento, a título de danos morais, da quantia de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), corrigida monetariamente pelo INPC-IBGE e acrescida de juros de mora de 6% (seis por cento) ao ano a partir desta sentença até o efetivo pagamento (TJSC, Ap. Cív. 2002.005478-5, de São Joaquim, Rel. Des. Alcides Aguiar, j. 18.11.2004).
Condeno, ainda, a ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, conforme art. 20, 3, do CPC."
Foi aforado Recurso de Apelação Cível (fls. 104-124) por Editora Globo S/A que prequestionou a matéria, teceu argumentação e concluiu requerendo o acolhimento da preliminar de ilegitimidade passiva, extinguindo-se o feito, sem julgamento de mérito. Requereu a reforma da sentença para julgar improcedente o pedido, invertendo-se os ônus sucumbenciais.
Caso fosse mantida a condenação, requereu a redução dos valores fixados sob o dístico dos danos morais, como forma de adequá-los aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Contrarrazões às fls. 133-136.
Regularmente preparado, a tempo e modo, ascenderam os autos a esta Instância.
VOTO
Da admissibilidade:
Presentes os pressupostos e requisitos legais, o recurso é conhecido.
Do julgamento:
Das preliminares:
Da ilegitimidade passiva.
Aduz a apelante que não está legitimada a integrar o polo passivo da demanda visto que não pode assumir as responsabilidades decorrentes da situação financeira de seus fornecedores.
Razão não lhe assiste.
O tema já foi enfrentado pela Corte e, por medida de celeridade e economia processual adota-se como fundamentação e razão de decidir a manifestação a seguir:
A ilegitimidade passiva suscitada não merece acolhida, pois a propaganda veiculada foi bastante clara ao oferecer passagem de ida e volta para qualquer lugar do Brasil, sem sorteio, para aqueles que assinassem por um ano as revistas "Época" e "Quem" (fl. 16). Logo, independentemente da empresa aérea contratada, inafastável a responsabilidade da fornecedora das assinaturas pelo cumprimento da oferta, conforme preceitua o art. 30 da Lei n. 8.078/90:
Art. 30. Toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser celebrado.
No momento em que o fornecedor oferece brinde pela aquisição de seu produto, ainda que outorgue a terceiros o seu cumprimento, responderá solidariamente pelo inadimplemento da obrigação. Isso porque toda "oferta relativa a produtos e serviços vincula o fornecedor ofertante, obrigando-o ao cumprimento do que oferecer" (NUNES, Rizzatto. Curso de direito do consumidor. 2. ed. rev., mod. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 389).
Na verdade, a prefacial se confunde com o mérito, cabendo desde já afastar a alegação de que não é devido o ressarcimento das passagens aéreas. Ora, se a responsabilidade do ofertante é, além de objetiva, solidária, a não viabilização da viagem, ainda que por culpa exclusiva da TransBrasil, permite aos Autores pleitear diretamente à Ré o valor correspondente ao brinde prometido quando da assinatura das revistas.
Nesse sentido:
CIVIL. CONTRATO ASSINATURA DE REVISTAS. BRINDE. PASSAGEM AÉREA INTERNACIONAL. NÃO REALIZAÇÃO DA PROMESSA. RESPONSABILIDADE CIVIL EXIGÍVEL.
1. A editora de revista que propaga a oferta de brinde a quem fizer assinatura se obriga a adimplir a promessa, mesmo que haja transferido a outrem a incumbência de concretizar a avença.
2. Não preferindo mais o beneficiário concretizar a viagem prometida, ostenta o direito de receber o valor equivalente ao brinde.
3. Recurso parcialmente conhecido e improvido (TJDF, Recurso n. 2007.01.1.066001-9, Segunda Turma Recursal dos Juizados Cíveis e Criminais, rel. Juiz Sandoval Oliveira, DJDFTE 19-1-09).
E:
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ASSINATURA DE REVISTAS. PROMOÇÃO NACIONAL DANDO DIREITO A PASSAGEM AÉREA PARA QUALQUER LUGAR DO PAÍS. CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES. DIREITO A VIAGENS ADQUIRIDO NA CONTRATAÇÃO DO SERVIÇO. EMISSÃO DE "VOUCHER" PERMITINDO A RETIRADA DE PASSAGENS JUNTO A EMPRESA AÉREA. NÃO CUMPRIMENTO DO PACTUADO. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM (TJSC, Recurso n. 2007.200566-3, de Blumenau, Segunda Turma de Recursos Cíveis e Criminais, rel. Juiz Álvaro Luiz Pereira, j. 07-10-08).
Mais:
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - ASSINATURA DE REVISTA - PROMOÇÃO DE VIAGEM - ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM - INOCORRÊNCIA - ENTREGA DO PRÊMIO - OBRIGAÇÃO DA EMPRESA QUE PROMOVEU A PROMOÇÃO - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - PROPAGANDA.
1- Não há falar em ilegitimidade passiva ad causam se a ré assumiu, contratualmente, o compromisso com o autor de premiá-lo com uma viagem aérea e se esta não se realizou em decorrência da falência da companhia aérea que faria o transporte.
2- O Código de Defesa do Consumidor deu à propaganda a natureza jurídica de um contrato. Se, antes, havia apenas uma oferta via propaganda, no momento em que o consumidor dela toma conhecimento, dá-se o efeito vinculativo, e, a partir do instante em que este consumidor manifesta sua aceitação pelo produto, a oferta torna-se parte integrante do contrato, assumindo o fornecedor, por óbvio, a obrigação de cumpri-lo integralmente (TJMG, Apelação Cível n. 2.0000.00.487579-0, de Belo Horizonte, rel. Des. Maurício Barros, j. 10-8-05).h (Apelação Cível n. 2005.040563-8, de Turvo - Relator: Des. Victor Ferreira)
Do mérito:
Com a solução acima fornecida para a preliminar, resolve-se, simultaneamente, o mérito quanto à responsabilidade civil e quanto ao dever de indenizar.
Nada mais há que ser fundamentado relativamente ao dano e ao nexo da causalidade.
Relativamente ao valor da indenização a Câmara, por seus integrantes adota como razão de decidir a fundamentação da sentença objurgada, mantendo o 'quantum' fixado para a condenação.
Contudo, este relator entende, data vênia compreensão diversa, que a indenização a ser fixada, assim como não pode se resumir somente ao valor da passagem aérea não recebida, deve, também, recompor, de forma razoável, a frustração do consumidor que, diga-se de passagem, em nada contribuiu para ver suprimida a sua expectativa de realizar uma viagem quando da aquisição da assinatura.
O dano moral, consoante noção difundida tanto na doutrina quanto na jurisprudência, é o prejuízo de natureza não patrimonial que afeta o estado anímico da vítima, seja relacionado à honra, à paz interior, à liberdade, à imagem, à intimidade, à vida ou à incolumidade física e psíquica.
A propósito, ensina a doutrina:
O dano moral somente ingressará no mundo jurídico, com a subseqüente obrigação de indenizar, em havendo alguma grandeza no ato considerado ofensivo a direito personalíssimo. Se o ato tido como gerador do dano extrapatrimonial não possui virtualidade para lesionar sentimentos ou causar dor e padecimento íntimo, não existiu o dano moral passível de ressarcimento. Para evitar a abundância de ações que tratam de danos morais presentes no foro, havendo uma autêntica confusão do que seja lesão que atinge a pessoa e do que é mero desconforto, convém repetir que não é qualquer sensação de desagrado, de molestamento ou de contrariedade que merecerá indenização. O reconhecimento do dano moral exige determinada envergadura. Necessário, também, que o dano se prolongue durante algum tempo e que seja a justa medida do ultraje às afeições sentimentais (SANTOS, Antônio Jeová. Dano moral indenizável. 3ª ed. São Paulo: Método, 2001, p. 122).
Tal indenização, contudo, deve ser estabelecida levando-se em conta os princípios da prudência e do bom senso pois, quem se habilita a ganhar uma passagem de ida e volta a qualquer ponto do território nacional, não pode ser agraciado, em virtude da inadimplência do fornecedor, com uma indenização que lhe possibilite, ainda que nos dias de hoje e em valores absolutos, passar, no mínimo, uma semana em território europeu, incluindo-se a alimentação e hospedagem.
Este é o caso dos autos.
Se mantido o valor da condenação de Primeira Instância (R$ 30.000,0 em 7-10-2005) e a ele forem somados os juros e a correção monetária, o apelado estará sendo indenizado por quantia que em muito supera a perda por ele experimentada.
Outrossim, não se diga que a indenização fixada na sentença é justa se considerado que, no polo passivo da demanda, encontra-se empresa integrante de um conglomerado jornalístico bem sucedido.
Assim se afirma pois a fixação do valor da indenização não pode se pautar, exclusivamente, por princípios de justiça 'hobinwoodiana' passando o Poder Judiciário, a quem cabe, primordialmente, a jurisdição (dizer o direito no caso concreto e fazer valer as suas decisões), a exercer funções de distribuição de renda que são inerentes à função de outros entes estatais.
Em situação idêntica é o entendimento da Sétima Turma de Recursos do Estado de Santa Catarina:
APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAL E MORAL. PROMOÇÃO DE ASSINATURAS DE REVISTAS COM A CONTEMPLAÇÃO DE PASSAGEM AÉREA. IMPOSSIBILIDADE DA VIAGEM EM RAZÃO DA FALÊNCIA DA EMPRESA DE AVIAÇÃO. RESPONSABILIDADE DA EDITORA EM RESSARCIR OS DANOS CAUSADOS AO CONSUMIDOR/ASSINANTE (Sétima Turma de Recursos deste Estado, Apelação cível n. 693/04, da comarca de Itajaí, Rel. Juiz José Agenor de Aragão).
Por derradeiro, ainda que levantadas pela apelante outras teses, não restou caracterizada a necessidade de análise dos prequestionamentos.
Por esses motivos, dá-se provimento parcial ao recurso para reduzir para a quantia relativa a indenização por danos morais ao valor de R$ 5.000,00 contados os juros de 1% ao mês desde o evento danoso (data da assinatura da revista) e a atualização monetária contada da data da prolação da sentença de Primeiro Grau.
Anote-se que a jurisprudência desta Corte tem entendido, em caso análogos, a inocorrência da indenização por dano moral.
À guisa de exemplo, cita-se:
Meros dissabores e infortúnios em virtude da frustração da viagem, desacompanhados de evidências que demonstrem o abalo psíquico, não têm aptidão para ensejar o dever de indenizar." (Apelação Cível n. 2005.040563-8, de Turvo - Relator: Des. Victor Ferreira)
Ou, ainda:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. VENDA DE REVISTA PROMOCIONAL. DIREITO A PASSAGEM AÉREA MEDIANTE ASSINATURA ANUAL. BRINDE ENTREGUE AOS AUTORES FORA DO PRAZO PARA SUA UTILIZAÇÃO. DEVER DE CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO PELA RÉ. CONDENAÇÃO AO FORNECIMENTO DAS PASSAGENS. ALEGADA OCORRÊNCIA DE DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE PROVAS NESTE SENTIDO. MERO DISSABOR CORRIQUEIRO NA RELAÇÃO CONSUMERISTA. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. PLEITO DE MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ACOLHIMENTO. QUANTUM FIXADO COM BASE NOS CRITÉRIOS LEGAIS. SENTENÇA MANTIDA NO MÉRITO. PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO (Apelação Cível n. 2004.029416-6, de Blumenau. Relator: Des. Sérgio Izidoro Heil).
E, mais:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO COMINATÓRIA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - ASSINATURA DE REVISTA - VANTAGEM PROMOCIONAL - PASSAGEM AÉREA - DESCUMPRIMENTO DA EDITORA RECONHECIDO - DANOS MORAIS - INOCORRÊNCIA - INADIMPLEMENTO CONTRATUAL - MERO DISSABOR - CONDENAÇÃO LIMITADA AO DESCRITO NO REGULAMENTO.
Se determinada editora de revistas compromete-se a, na assinatura de uma de suas publicações, conceder como prêmio o direito ao assinante de viajar a qualquer lugar do país, o inadimplemento contratual correspondente à inviabilidade de realização da viagem, por encerramento das atividades da empresa de transporte aéreo, dois meses antes da data prevista, autoriza o ajuizamento de obrigação de fazer, contudo, por si só não configura a condenação ao pagamento de indenização por danos morais, visto que, para tanto, não basta um simples infortúnio, mas sim, que o dano seja capaz de causar um abalo psíquico profundo à parte contratada. Em situação desse jaez, a condenação da ré deve ficar limitada ao objeto do contrato, com aplicação de cláusula penal, quando houver previsão nesse sentido (Apelação Cível n. 2007.028485-8, da Capital. Relatora: Desa. Salete Silva Sommariva).
Apesar da fundamentação suso explicitada os demais integrantes da Câmara mantém seu posicionamento relativamente à manutenção do quantum arbitrado pelo Julgador 'a quo'.
A fim de que preserve a harmonia dos julgados deste Órgão Fracionário o relator, apesar da ressalva acima fundamentada, resta vencido parcialmente.
DECISÃO
Nos termos do voto do relator, esta Primeira Câmara de Direito Civil, à unanimidade, resolveu conhecer do recurso e negar-lhe provimento.
O julgamento, realizado no dia 22 de junho de 2010, foi presidido pelo Exmo. Sr. Desembargador Carlos Prudêncio, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Desembargador Joel Figueira Júnior.
Florianópolis, 5 de julho de 2010.
Stanley da Silva Braga
relator
JURID - Ação de indenização por danos morais. Promoção de editora . [16/07/10] - Jurisprudência
Nenhum comentário:
Postar um comentário