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terça-feira, 21 de outubro de 2008

Informativo STF 185 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF

Brasília, 10 a 21 de abril de 2000- Nº185.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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ÍNDICE DE ASSUNTOS



ADIn e Conhecimento
ADIn: Desistência de Pedido de Liminar
Agravo Incompleto e Devido Processo Legal
Art. 58 do ADCT e Auxílio-Doença
Contribuição Previdenciária do Estado do RJ
Correção Monetária do FGTS - 1
Correção Monetária do FGTS - 2
Correção Monetária do FGTS - 3
Extinção de Processo e Ofensa Reflexa
Habeas Corpus: Ameaça Indireta
HC e Inabilitação para Cargo Público
Imposto de Renda e Dedução de Prejuízos
PressupostosTípicos de Admissibilidade do REsp
Prisão Preventiva: Fundamentação
Publicação de Nota e Desvio de Finalidade
Qualificadoras e Agravantes Genéricas
RE e Contestação de Investidura de Juiz Classista
Vinculação ao Salário Mínimo
CPI e Sigilo Bancário (Transcrições)
PLENÁRIO


Correção Monetária do FGTS - 1

Em recurso extraordinário em que se discute se há direito adquirido à aplicação dos índices de correção monetária em face dos planos de estabilização econômica nas contas vinculadas ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS, o Tribunal, por maioria, considerando que a decisão do acórdão recorrido se fundou exclusivamente no art. 5º, XXXVI, da CF, rejeitou a preliminar suscitada pelo Min. Marco Aurélio no sentido de que o recurso estaria prejudicado porque o acórdão recorrido teria duplo fundamento, constitucional e legal, este último não atacado, incidindo o verbete de Súmula 283 - o recorrente, apesar de haver interposto simultaneamente recurso especial e extraordinário, não apresentou agravo de instrumento contra a decisão do Presidente do Tribunal a quo que negou o processamento do recurso especial (Súmula 283: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles"). Também declaravam a prejudicialidade do recurso os Ministros Néri da Silveira, Celso de Mello e Carlos Velloso.
RE 226.855-RS, rel. Min. Moreira Alves, 12.4.2000.

Correção Monetária do FGTS - 2

Prosseguindo no julgamento do recurso extraordinário acima mencionado, o Min. Moreira Alves, relator, considerando que o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço não tem natureza contratual, mas sim institucional, aplicando-se, portanto, a jurisprudência do STF no sentido de que não há direito adquirido a regime jurídico, proferiu voto quanto à correção monetária mensal do FGTS (e não trimestral) no seguinte sentido: a) com relação ao Plano Bresser, a atualização dos saldos em 1º.7.97 para o mês de junho é de ser feita pelo índice LBC de 18,02% e não pelo IPC (26,06%) como entendera o acórdão recorrido; b) quanto ao Plano Verão, houve uma lacuna da lei relativamente à correção monetária de 1º.2.89 para o mês de janeiro e a circunstância de o acórdão recorrido ter preenchido essa lacuna com índice de 42,72%, referente ao valor do IPC, configura questão de natureza infraconstitucional (e não de direito intertemporal) que não dá margem a recurso extraordinário; c) no tocante ao Plano Collor I, a atualização dos saldos das contas do FGTS feita em 1º.5.90 para o mês de abril (44,80%) também foi baseada na legislação infraconstitucional e não em face do direito adquirido, implicando, assim, violação indireta ou reflexa à CF, e a atualização feita em 1º.6.90 para o mês de maio deve ser utilizado o BTN (5,38%) uma vez que a MP 189 entrou em vigor ainda durante o mês de maio de 90; e d) no que se refere ao Plano Collor II, a atualização feita em 1º.3.91 para o mês de fevereiro deve ser feita pela TR (7%) em face da MP 294, publicada no dia 1º de fevereiro, de aplicação imediata.
RE 226.855-RS, rel. Min. Moreira Alves, 13.4.2000.

Correção Monetária do FGTS - 3

Em síntese, o Min. Moreira Alves votou no sentido de conhecer em parte do recurso extraordinário da Caixa Econômica Federal - CEF e nela lhe dar provimento para excluir da condenação as atualizações dos saldos do FGTS no tocante aos Planos Bresser, Collor I (apenas quanto à atualização no mês de maio de 90) e Collor II, no que foi acompanhado pelo Min. Nelson Jobim. De sua parte, o Min. Ilmar Galvão, considerando que a correção dos saldos das contas vinculadas do FGTS só pode ser feita por índices oficiais e que há direito adquirido em face de novo índice fixado em plano econômico no decorrer do período aquisitivo mensal do crédito de rendimentos, acompanhou em parte a conclusão do voto do Min. Moreira Alves, relator, para, em maior extensão, excluir da condenação os acréscimos da atualização dos saldos das contas do FGTS feita em 1º.5.90 para o mês de abril (Plano Collor I) relativamente aos saldos superiores a cinqüenta mil cruzados novos. Após, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Min. Maurício Corrêa.
RE 226.855-RS, rel. Min. Moreira Alves, 13.4.2000.

ADIn e Conhecimento

Não se conhece de ação direta de inconstitucionalidade que impugna, em determinado sistema normativo, apenas alguns dos preceitos que o integram - deixando de questionar a validade de outros dispositivos com eles relacionados - porque essa declaração de inconstitucionalidade, tal como pretendida, alteraria o sistema da Lei. Com esse entendimento, o Tribunal não conheceu de ação direta ajuizada pelo Partido Democrático Trabalhista - PDT, contra a Lei 9.932/99, do Estado do Rio de Janeiro, que dispõe sobre a transferência de atribuições do "IRB - Brasil Resseguros S.A. - IRB-BRASIL Re" para a Superintendência de Seguros Privados - SUSEP, e dá outras providências. Vencidos os Ministros Ilmar Galvão, Marco Aurélio, Sepúlveda Pertence e Néri da Silveira, que conheciam da ação por entenderem que a fundamentação apresentada na inicial seria suficiente para viabilizar o exame da argüição de inconstitucionalidade. Precedentes citados: ADIn 1.187-DF (DJU de 30.5.97) e ADIn 2.133-RJ (julgado em 9.3.2.000, acórdão pendente de publicação).
ADIn 2.174-DF, rel. Min. Maurício Corrêa, 14.4.2000.

ADIn: Desistência de Pedido de Liminar

É inadmissível, em ação direta de inconstitucionalidade, a desistência total ou parcial de pedido de medida cautelar, tendo em vista a indisponibilidade do seu objeto. Com esse entendimento, o Tribunal, por maioria, resolvendo questão de ordem, em ação direta ajuizada pelo Partido Social Liberal - PSL, contra a Lei 3.189/99, do Estado do Rio de Janeiro, que instituiu o Fundo Único de Previdência Social do Estado do Rio de Janeiro - Rioprevidência, rejeitou pedido formulado pelo partido-requerente de desistência parcial de medida cautelar. Vencido o Min. Marco Aurélio, que entendia possível a desistência conforme pretendida, uma vez que ela não diz respeito ao objeto da ação direta, e, sim, à liminar.
ADInMC 2.049-RJ, rel. Min. Néri da Silveira, 14.4.2000.

Contribuição Previdenciária do Estado do RJ

Prosseguindo no julgamento, o Tribunal, considerando que a CF/88 não autoriza a cobrança de contribuição previdenciária sobre servidores aposentados e pensionistas, deferiu, em parte, medida liminar em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Procurador-Geral da República e pelo Partido Social Liberal - PSL, contra a Lei acima mencionada, para suspender, até decisão final, dispositivos da Lei 3.189/99, do Estado do Rio de Janeiro, que instituem como fonte de receita do Fundo Único de Previdência Social do Estado do Rio de Janeiro as contribuições previdenciárias dos seus servidores estatutários inativos, pensionistas e beneficiários.
ADInMC 2.049-RJ e ADInMC 2.188-RJ, rel. Min. Néri da Silveira, 14.4.2000.

PRIMEIRA TURMA


Habeas Corpus: Ameaça Indireta

É possível discutir a tempestividade de recurso mediante habeas corpus porque, de forma indireta, poderá ser atingida a liberdade de ir e vir do paciente. Trata-se, na espécie, de habeas corpus contra decisão de Ministro do STJ que não conhecera de habeas corpus em que se sustentava a tempestividade de recurso especial cujo seguimento fora negado na origem. Com esse entendimento, a Turma deferiu o writ para considerar cabível o habeas corpus impetrado perante o STJ e para que este o examine como de direito.
HC 79.356-RJ, rel. Min. Sydney Sanches, 4.4.2000.

RE e Contestação de Investidura de Juiz Classista

A contestação da investidura de juiz classista de Junta de Conciliação e Julgamento (CLT, art. 662, § 3º) consubstancia procedimento administrativo que não se caracteriza como "causa" de natureza jurisdicional para efeito de cabimento de recurso extraordinário. Precedente citado: Pet 1.256-SP (julgada em 4.11.98, acórdão pendente de publicação, v. Informativo 130).
RE 265.264-PR, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 4.4.2000.

Qualificadoras e Agravantes Genéricas

Tendo a sentença de pronúncia afastado as qualificadoras da denúncia, não pode o libelo acusatório referir-se às mesmas circunstâncias como agravantes genéricas. Com esse entendimento, a Turma deu provimento em parte a recurso ordinário em habeas corpus para excluir da condenação do paciente, pronunciado por homicídio simples, o acréscimo da pena resultante do reconhecimento da agravante de emboscada (CP, art. 61, II, c), uma vez que a sentença de pronúncia, confirmada em grau de recurso e transitada em julgado, afastara a qualificadora prevista no art. 121, § 2º, IV, 2ª figura ("§ 2º. Se o homicídio é cometido: ... IV - à traição, de emboscada, ...").
RHC 79.538-MG, rel. Min. Sydney Sanches, 4.4.2000.

Vinculação ao Salário Mínimo

Considerando que o disposto no inciso IV do art. 7º da CF veda a utilização do salário-mínimo como fator de correção ("salário-mínimo, fixado em lei ...., sendo vedada sua vinculação para qualquer fim;"), a Turma deu provimento a recurso interposto contra acórdão que confirmou sentença que fixara em número de salários-mínimos indenização por dano moral, para determinar que se considere que a condenação em número de salários-mínimos é aquela relativa ao valor em dinheiro deles no momento da prolação do acórdão recorrido, devendo esse valor, a partir do acórdão recorrido, ser corrigido monetariamente por índice oficial. Precedentes citados: RE 217.700-GO (DJU de 17.12.99) e 237.965-SP (DJU de 30.3.2000).
RE 225.488 -PR, rel. Min. Moreira Alves, 11.4.2000.

Imposto de Renda e Dedução de Prejuízos

Iniciado o julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão que considerou legítima a aplicação, para o período-base de 1994, dos arts. 42 e 58 da MP 812, publicada no Diário Oficial da União de 31.12.94 (convertida na Lei 8.981/95), que limitaram em 30% a parcela dos prejuízos verificados em exercícios anteriores, para efeito da determinação do lucro real para pagamento de imposto de renda, e para determinação da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro. O Min. Ilmar Galvão, relator, afastando a alegação de ofensa aos princípios do direito adquirido, da capacidade contributiva e da proibição de confisco, votou no sentido de conhecer em parte, e, nessa parte, dar provimento para declarar inaplicável, no que se refere ao exercício de 1994, o art. 58 da MP 812/94, ao entendimento de que o referido dispositivo majorou a contribuição social incidente sobre o lucro das empresas, sem observar o princípio da anterioridade nonagesimal. Após, pediu vista o Min. Sepúlveda Pertence.
RE 244.293-SC, rel. Min. Ilmar Galvão, 11.4.2000.

Art. 58 do ADCT e Auxílio-Doença

Considerando que o art. 58 do ADCT, que prevê a aplicação da equivalência salarial para os benefícios em manutenção quando da promulgação da CF, não autoriza a revisão do valor de aposentadoria para adequá-la às bases de cálculo de outro benefício já ultrapassado, a Turma deu provimento a recurso para reformar acórdão que determinou a aplicação do critério de revisão do benefício previdenciário previsto no art. 58 do ADCT a partir da concessão do auxílio-doença, embora convertido em aposentadoria por invalidez antes do advento da CF/88.
RE 259.956-SP, rel. Min. Octavio Gallotti, 11.4.2000.

Publicação de Nota e Desvio de Finalidade

A Turma, por maioria, manteve acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que, acolhendo pedido em ação popular, anulara ato administrativo praticado pela então Prefeita do Município de São Paulo por desvio de finalidade e impusera-lhe o ressarcimento ao erário do prejuízo sofrido. Trata-se, na espécie, de publicação repetida em diversos jornais, sob o título "A greve geral e a Prefeitura", na qual a Prefeita explicara a posição de apoio assumida em face de greve geral ocorrida em dias anteriores, em que se sustentava a legitimidade do ato impugnado porquanto de cunho informativo e de interesse público. A Turma, por maioria, considerando não caracterizado o cunho educativo, de orientação social ou informativo da referida publicação, até porque posterior ao encerramento da greve geral, entendeu inexistir a alegada ofensa ao art. 37, §1º, da CF ("A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social,..."). Vencido o Min. Sepúlveda Pertence, que conhecia e dava provimento ao recurso extraordinário, por entender que a publicidade prevista no §1º, do art. 37, da CF, abrange as hipóteses de explicação de conduta governamental à população.
RE 208.114-SP, rel. Min. Octavio Gallotti, 18.4.2000.

Extinção de Processo e Ofensa Reflexa

Não se conhece de recurso extraordinário contra decisão que julgou extinto processo, sem julgamento do mérito, por ofensa aos princípios do livre acesso ao poder Judiciário, da ampla defesa e do contraditório (CF, art. 5º, XXXV e LV), uma vez que tal alegação configura ofensa indireta. Com base nesse entendimento, a Turma manteve sentença da 12ª Vara Federal do Estado do Rio de Janeiro que julgara extinta execução fiscal por falta de interesse de agir do autor - Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Estado - CREA/RJ -, dado que o valor da execução seria inferior ao parâmetro estabelecido no art. 1º do Decreto-lei 1.793/80, que autoriza o não ajuizamento de ações pela União, autarquias e empresas públicas, cujo valor seja inferior a 20 ORTN's.
RREE 239.597-RJ e 239.598-RJ, rel. Min. Moreira Alves, 18.4.2000.

Pressupostos Típicos de Admissibilidade do REsp

Por ofensa ao art. 105, III, a, da CF ("Compete ao Superior Tribunal de Justiça: III - julgar, em recurso especial, as causas decididas, em última ou única instância, [...] quando a decisão recorrida: a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;"), a Turma deu provimento a recurso extraordinário interposto pelo Estado de São Paulo contra acórdão do STJ que, ao julgar pedido de exclusão de índice de 70,28% na correção monetária de crédito fiscal de janeiro/89 - em que o contribuinte sustentara que a Lei 6.374/89, do mencionado Estado, ofendera o princípio da irretroatividade -, estabelecera a aplicação de índice diverso para a correção monetária do referido débito, no valor de 42,72%. A Turma entendeu que o Tribunal a quo não poderia decidir qual o índice seria aplicável ao caso, dado que tal questão não fora prequestionada.
RE 208.775-SP, rel. Min. Moreira Alves, 18.4.2000.

Prisão Preventiva: Fundamentação

A recusa em colaborar com a instrução criminal não é causa suficiente para a decretação de prisão preventiva, sendo assegurado ao indiciado, inclusive, o direito ao silêncio (CF, art. 5º, LXIII). Com base nesse entendimento, a Turma deferiu habeas corpus para cassar a ordem de prisão preventiva do paciente, tendo em vista a insubsistência dos motivos que a fundamentaram, quais sejam, a falta de interesse em colaborar com a justiça, evidenciada pelo fato de que o paciente respondera as perguntas formuladas de forma evasiva, e a sua alegada fuga quando da decretação da prisão, embora tenha se apresentado em seguida. Precedentes citados: HC 75.257-RJ (DJU de 20.8.97) e HC 68.929-SP (RTJ 141/512).
HC 79.781-SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 18.4.2000.

SEGUNDA TURMA


Agravo Incompleto e Devido Processo Legal

A Turma, por maioria, manteve decisão do STJ que negara provimento a agravo regimental em agravo de instrumento, por falta de peça obrigatória (CPC, art. 544, § 1º). Trata-se, na espécie, de recurso extraordinário em que o recorrente sustentava ter providenciado o traslado integral do processo quando da formação do agravo de instrumento - o que fora reafirmado na contra-minuta da parte agravada, pois esta deixara de apresentar outras peças, já que trasladadas "todas as folhas dos autos" - e, por isso, alegava a subtração de peça processual. O Min. Maurício Corrêa não conheceu do recurso por entender que a questão em debate teria natureza infraconstitucional e, por diverso fundamento, qual seja, de que a questão constitucional não fora prequestionada, o Min. Néri da Silveira também não conheceu do recurso. Vencido o Min. Marco Aurélio, relator, que, ressaltando a excepcionalidade do caso, conhecia e dava provimento ao recurso, por ofensa ao princípio do devido processo legal (CF, art. 5º, LIV), ao entendimento de que a agravada confirmara na minuta do agravo a informação de que todas as folhas dos autos já teriam sido trasladadas, o que poderia ensejar dúvidas quanto à correta prática cartorária.
RE 258.051-BA, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Maurício Corrêa, 11.4.2000.

HC e Inabilitação para Cargo Público

Concluído o julgamento de habeas corpus impetrado contra acórdão do STJ em que se pretende a desconstituição de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás que condenou o paciente, ex-prefeito municipal, a dois anos de reclusão e a cinco anos de inabilitação para o exercício de cargo ou função pública, por uso indevido de verba pública (DL 201/67, art. 1º, II) - v. Informativo 178. O Tribunal, por maioria, não conheceu do pedido na parte em que se pretendia afastar a execução da pena acessória de inabilitação, por entender que a referida pena não põe em risco a liberdade de locomoção do paciente. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Nelson Jobim, que, entendendo cabível a impetração de habeas corpus contra condenação em pena restritiva de direito, conheciam do pedido e o deferiam, por entenderem inexistir justa causa a justificar a ação penal, tendo em vista a ausência do dolo essencial para configuração do delito.
HC 79.791-GO, rel. Min. Néri da Silveira, 18.4.2000.

Sessões

Ordinárias

Extraordinárias

Julgamentos

Pleno

12.4.2000

13 e 14.4.2000

9

1a. Turma

11 e 18.4.2000

-----

192

2a. Turma

11 e 18.4.2000

-----

318



C L I P P I N G D O D J

14 de abril de 2000

ADIn N. 273-2 - medida liminar
RELATOR: MIN. ALDIR PASSARINHO
EMENTA: - LIMINARES: PROIBIÇÃO DE SUA CONCESSÃO EM MANDADOS DE SEGURANÇA E EM AÇÕES ORDINÁRIAS E CAUTELARES, DECORRENTES DE MEDIDAS PROVISÓRIAS. (M.P. 181 e 182).
INDEFERIMENTO DE PEDIDO DE LIMINAR PARA SUSPENDER AQUELA PROIBIÇÃO.
Tendo-se que o pedido de concessão de liminar para que os efeitos das Medidas Provisórias n.º 181 e 182 - que proibiam cautelares em determinadas ações - não satisfaz aos requisitos necessários ao seu deferimento, cabe indeferí-lo. Ademais, devendo ser decidido, pelo Congresso Nacional, em breves dias, a conversão ou não de tais Medidas ou lei, desaconselha-se o deferimento da liminar.
De relembrar que a própria inicial da O.A.B ressalta que podem os Juízes por via incidental, no exame dos casos concretos, deixar de atender à vedação, se a considerarem inconstitucional, contida nas Medidas Provisórias.

ADIn N. 546-4
RELATOR: MIN. MOREIRA ALVES
EMENTA: Ação direta de inconstitucionalidade. Arts. 4º e 5º da Lei nº 9.265, de 13 de junho de 1991, do Estado do Rio Grande do Sul.
- Tratando-se de projeto de lei de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, não pode o Poder Legislativo assinar-lhe prazo para o exercício dessa prerrogativa sua.
- Não havendo aumento de despesa, o Poder Legislativo pode emendar projeto de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, mas esse poder não é ilimitado, não se estendendo ele a emendas que não guardem estreita pertinência com o objeto do projeto encaminhado ao Legislativo pelo Executivo e que digam respeito a matéria que também é da iniciativa privativa daquela autoridade.
Ação julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 4º e 5º da Lei nº 9.265, de 13 de junho de 1991, do Estado do Rio Grande do Sul.

HABEAS CORPUS N. 73.352-2
RELATOR: MIN. NÉRI DA SILVEIRA
EMENTA: Habeas corpus. 2. Crime doloso contra a vida. Art. 121, § 2º, IV, do Código Penal. 3. Absolvição sumária. Não interposição de recurso, pelo Ministério Público. 4. Art. 411, do Código de Processo Penal. Recurso de ofício. Pronúncia, pelo Tribunal, na conformidade dos termos da denúncia. 5. Vigência do art. 411, do Código de Processo Penal, no regime da Constituição de 1988. Precedentes. 6. Habeas corpus indeferido.
* noticiado no Informativo 25

HABEAS CORPUS N. 77.613-7
RED. P/ O ACÓRDÃO: MIN. MOREIRA ALVES
EMENTA: "Habeas corpus".
- Esta Corte tem entendido que, quando há, no texto da sentença, elementos outros que não apenas o fundamento expresso da gravidade do crime para justificar a imposição de regime inicial de cumprimento da pena mais severo, está ele justificado com base naqueles elementos, como sucede no caso. Ademais, se o Juiz, por benevolência, impuser pena mais branda do que a que deveria ter aplicado, não está ele obrigado a ser, também, benévolo na imposição do regime inicial de cumprimento dela, por não estar impedido de cumprir a lei com referência a esse regime.
- No caso, portanto, não se está diante, como em outras hipóteses, de uma sentença em que, depois de o Juiz dizer que o réu é primário e tem bons antecedentes, estabelece ele, com base exclusivamente na gravidade do crime cometido, o regime fechado para o cumprimento inicial da pena.
- Por isso, não se há que anular a sentença nesse ponto. Se, porém, o acórdão, depois de manter a pena imposta, manteve também, com base exclusivamente na gravidade do delito praticado, o regime inicial de cumprimento dela como sendo o fechado, deverá este ser anulado nessa parte, para que justifique licitamente essa manutenção.
"Habeas corpus" deferido em parte, para que, mantida a condenação, seja anulado o acórdão na parte da fixação do regime inicial do cumprimento da pena, a fim de que ele fundamente o regime a ser imposto, observando o disposto no § 3º do art. 33 c/c com o art. 59 do Código Penal.
* noticiado no Informativo 128

PET (QO) N. 1.863-0
RELATOR: MIN. MOREIRA ALVES
EMENTA: Petição. Medida cautelar inominada. Questão de ordem.
- Esta Corte tem entendido que não cabe medida cautelar inominada para a obtenção de efeito suspensivo a recurso extraordinário que ainda não foi admitido no Tribunal de origem, não só porque a concessão dessa medida pressupõe necessariamente a existência de juízo positivo de admissibilidade do recurso extraordinário, mas também porque, em se tratando de recurso extraordinário, que demanda esse juízo de admissibilidade da competência da Presidência do Tribunal que prolatou o acórdão recorrido, não se aplica o disposto no parágrafo único do artigo 800 do C.P.C. pela singela razão de que, se fosse concedida a liminar para dar efeito suspensivo, pela relevância de sua fundamentação jurídica, a recurso dessa natureza ainda não admitido, a referida Presidência, em virtude da hierarquia jurisdicional, não poderia desconstituí-la com a não-admissão desse recurso, ficando, assim, adstrita - o que é incompatível com a sua competência para o juízo de admissibilidade - a ter de admiti-lo.
- A impossibilidade de esta Corte deferir pedido de liminar para dar efeito suspensivo a recurso extraordinário ainda não admitido permite que, entre a interposição desse recurso e a prolação desse juízo de admissibilidade, não haja autoridade ou órgão judiciários que, por força de dispositivo legal, tenha competência para o exame de liminar dessa natureza. Para suprir essa lacuna que pode acarretar danos irreparáveis ou de difícil reparação em casos em que é relevante a fundamentação jurídica do recurso extraordinário, seria de atribuir-se ao Presidente do Tribunal "a quo", que é competente para examinar sua admissibilidade, competência para conceder, ou não, tal liminar, e, se a concedesse, essa concessão vigoraria, se o recurso extraordinário viesse a ser admitido, até que essa Corte a ratificasse, ou não. Essa solução não encontra óbice em que, assim, haveria invasão na competência deste Supremo Tribunal, certo que, antes da admissão do recurso extraordinário e por causa do sistema do juízo dessa admissibilidade, não é possível a ele decidir esse pedido de liminar.
Questão de ordem que se resolve no sentido de indeferir o pedido de medida cautelar.
* noticiado no Informativo 174

RE N. 143.807-0
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. Concurso público: exigência incontornável para que o servidor seja investido em cargo de carreira diversa.
À vista da Constituição de 1988, consolidou-se definitivamente no STF que - ressalvado exclusivamente o provimento derivado mediante promoção - que pressupõe a integração de ambos os cargos na mesma carreira -, são inadmissíveis quaisquer outras formas de provimento do servidor público, independentemente de concurso público, em cargo diverso daquele do qual já seja titular a qualquer título, precedido ou não a nova investidura de processo interno de seleção ou habilitação: precedentes.
II. Direito constitucional intertemporal: caso de direito adquirido inexistente.
O provimento de cargo público, quando antecedido de qualquer modalidade de seleção ou habilitação dos candidatos, é um procedimento, que só com o ato final de nomeação ou equivalente gera direito à posse; antes - ainda que findo o processo seletivo - o provimento e a investidura são objeto, como é curial, de mera expectativa de direito: por isso, frustra-as de imediato a superveniência de norma constitucional que subordine a validade do provimento do cargo a processo seletivo diverso, qual o concurso público.
Não sendo o provimento esperado um efeito jurídico, ainda que futuro, da seleção finda sob o regime anterior, sequer será necessário cogitar de aplicabilidade imediata ou retroatividade mínima da Constituição vigente: esta simplesmente regerá os pressupostos de validade do ato de provimento a ser praticado na sua vigência: tempus regit actum.

RE N. 226.640-1
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: Recurso: legitimidade do defensor para interpô-lo, não prejudicada pela renúncia do réu.
1. No processo penal, o papel do defensor, constituído ou dativo, não se reduz ao de simples representante ad judicia do acusado, investido mediante mandato, ou não, incumbindo-lhe velar pelos interesses da defesa: por isso, a renúncia do réu à apelação não inibe o defensor de interpô-la.
2. A pretendida eficácia preclusiva da declaração de renúncia ao recurso pelo acusado reduziria a exigência legal de subseqüente intimação do defensor técnico - com a qual jamais se transigiu - a despropositada superfetação processual.
* noticiado no Informativo 182

RE N. 247.243-3
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. Recurso extraordinário: devolução.
Prejudicial de inconstitucionalidade suscitada pelo autor e repelida pelo acórdão recorrido, que, no entanto, por fundamento diverso, acolheu a demanda; RE da parte adversa, impugnando fundamento acolhido pelo Tribunal a quo; controvérsia possível, à luz da Súmula 456, sobre ficar ou não preclusa a questão prejudicial, à falta de recurso adesivo do autor: irrelevância no caso, em que o ponto foi decidido conforme a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal.
II. Medida provisória: força de lei: idoneidade para instituir tributo, inclusive contribuição social (PIS).
III. Contribuição social: instituição ou aumento por medida provisória: prazo de anterioridade (CF., art. 195, § 6º).
O termo a quo do prazo de anterioridade da contribuição social criada ou aumentada por medida provisória é a data de sua primitiva edição, e não daquela que - após sucessivas reedições - tenha sido convertida em lei.

Acórdãos publicados: 263


T R A N S C R I Ç Õ E S

Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
_______________________________________

CPI e Sigilo Bancário

MS N. 23.669-DF (Medida Liminar)*

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO


EMENTA: COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO. GARANTIA CONSTITUCIONAL DA INTIMIDADE. SIGILO BANCÁRIO. POSSIBILIDADE DE SUA QUEBRA. CARÁTER RELATIVO DESSE DIREITO INDIVIDUAL. OBSERVÂNCIA NECESSÁRIA DO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. MEDIDA LIMINAR DEFERIDA.

A GARANTIA CONSTITUCIONAL DA INTIMIDADE, EMBORA NÃO TENHA CARÁTER ABSOLUTO, NÃO PODE SER ARBITRARIAMENTE DESCONSIDERADA PELO PODER PÚBLICO.

- O direito à intimidade - que representa importante manifestação dos direitos da personalidade - qualifica-se como expressiva prerrogativa de ordem jurídica que consiste em reconhecer, em favor da pessoa, a existência de um espaço indevassável destinado a protegê-la contra indevidas interferências de terceiros na esfera de sua vida privada.

A transposição arbitrária, para o domínio público, de questões meramente pessoais, sem qualquer reflexo no plano dos interesses sociais, tem o significado de grave transgressão ao postulado constitucional que protege o direito à intimidade, pois este, na abrangência de seu alcance, representa o "direito de excluir, do conhecimento de terceiros, aquilo que diz respeito ao modo de ser da vida privada" (HANNA ARENDT).

O DIREITO AO SIGILO BANCÁRIO - QUE TAMBÉM NÃO TEM CARÁTER ABSOLUTO - CONSTITUI EXPRESSÃO DA GARANTIA DA INTIMIDADE.

- O sigilo bancário reflete expressiva projeção da garantia fundamental da intimidade das pessoas, não se expondo, em conseqüência, enquanto valor constitucional que é, a intervenções de terceiros ou a intrusões do Poder Público desvestidas de causa provável ou destituídas de base jurídica idônea.

O sigilo bancário não tem caráter absoluto, deixando de prevalecer, por isso mesmo, em casos excepcionais, diante da exigência imposta pelo interesse público. Precedentes. Doutrina.

O PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE CONDICIONA A EFICÁCIA DAS DELIBERAÇÕES DE QUALQUER COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO, ESPECIALMENTE EM TEMA DE QUEBRA DO SIGILO BANCÁRIO.

- O princípio da colegialidade traduz diretriz de fundamental importância na regência das deliberações tomadas por qualquer Comissão Parlamentar de Inquérito, notadamente quando esta, no desempenho de sua competência investigatória, ordena a adoção de medidas restritivas de direitos, como aquela que importa na revelação das operações financeiras ativas e passivas de qualquer pessoa.

O necessário respeito ao postulado da colegialidade qualifica-se como pressuposto de validade e de legitimidade das deliberações parlamentares, especialmente quando estas - adotadas no âmbito de Comissão Parlamentar de Inquérito - implicam ruptura, sempre excepcional, da esfera de intimidade das pessoas.

A quebra do sigilo bancário, que compreende a ruptura da esfera de intimidade financeira da pessoa, quando determinada por ato de qualquer Comissão Parlamentar de Inquérito, depende, para revestir-se de validade jurídica, da aprovação da maioria absoluta dos membros que compõem o órgão de investigação legislativa (Lei nº 4.595/64, art. 38, § 4º).

DECISÃO: Trata-se de mandado de segurança, com pedido de medida liminar, impetrado contra a CPI/Narcotráfico, sob a alegação de que esta, ao quebrar o sigilo bancário do ora impetrante, não submeteu, à apreciação dos parlamentares que a compõem, o pedido que motivou o ato ora impugnado.

Com efeito, sustenta-se, nesta sede mandamental, que a CPI/Narcotráfico teria transgredido o princípio da colegialidade, ordenando, de maneira abusiva, sem a prévia e necessária deliberação dos membros que a integram (Lei nº 4.595/64, art. 38, § 4º), a quebra do sigilo pertinente aos registros bancários do ora impetrante, desrespeitando-se, assim, a garantia constitucional que tutela a privacidade e a intimidade das pessoas (fls. 7 e 13):

"Em face da informação recebida do Banco Rural S.A., o impetrante empenhou-se em esclarecer o assunto e verificou, mediante acesso às atas das reuniões da CPI, que nelas não se registra qualquer deliberação que afete a sua privacidade e intimidade, quer quanto ao sigilo bancário, quer quanto aos sigilos fiscal e telefônico.
Com efeito, ao que consta, a CPI do Narcotráfico só teria deliberado quanto à ruptura de sigilos bancário, fiscal e telefônico em suas reuniões de 10.11.99, 23.11.99 e 15.12.99, que são, respectivamente, as 62ª, 67ª e 73ª Reuniões. Compulsando-se, porém, as atas respectivas (docs. 07, 07-A e 07-B), vê-se que nelas não há qualquer medida ou providência adotada contra o impetrante.
Daí o ensejo ao presente writ constitucional objetivando coibir a ilegalidade e o abuso de poder perpetrados pelo órgão de investigação parlamentar, com manifesta repercussão sobre direitos e garantias constitucionais do impetrante, sujeitos ao controle jurisdicional originário da Suprema Corte.
.......................................................
O caso da presente impetração é de ausência de deliberação sobre a quebra do sigilo bancário do impetrante, vício extremo, ainda mais grave do que a falta de fundamentação, que já seria suficiente para produzir a irrefragável nulidade da medida excepcional." (grifei)

Passo a analisar o pedido de medida liminar.

O exame sumário dos elementos constantes da presente impetração parece evidenciar que a CPI/Narcotráfico teria deixado de deliberar colegialmente, abstendo-se, em conseqüência - segundo alega o impetrante - de determinar, pelo voto necessário da maioria absoluta de seus membros (Lei nº 4.595/64, art. 38, § 4º), a quebra do sigilo bancário do autor do presente writ constitucional.

Essa alegação - a de que o princípio da colegialidade teria sido transgredido pela CPI/Narcotráfico - assume relevo jurídico inquestionável, pois, especialmente em tema de quebra de sigilo bancário, reveste-se de nulidade qualquer deliberação de Comissão Parlamentar de Inquérito que deixe de observar o postulado em causa.

É preciso ter presente que o princípio da colegialidade traduz diretriz de fundamental importância na regência das deliberações tomadas por qualquer Comissão Parlamentar de Inquérito, notadamente quando esta, no desempenho de sua competência investigatória, ordena a adoção de medidas restritivas de direitos, como aquela que importa na revelação das operações financeiras ativas e passivas de qualquer pessoa.

A controvérsia instaurada na presente causa suscita algumas reflexões em torno do tema pertinente ao alcance da norma inscrita no art. 5º, X, da Constituição, que, ao consagrar a tutela jurídica da intimidade, dispõe que "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas..." (grifei).

Como se sabe, o direito à intimidade - que representa importante manifestação dos direitos da personalidade - qualifica-se como expressiva prerrogativa de ordem jurídica que consiste em reconhecer, em favor da pessoa, a existência de um espaço indevassável destinado a protegê-la contra indevidas interferências de terceiros na esfera de sua vida privada.

Daí a correta advertência feita por CARLOS ALBERTO DI FRANCO, para quem "Um dos grandes desafios da sociedade moderna é a preservação do direito à intimidade. Nenhum homem pode ser considerado verdadeiramente livre, se não dispuser de garantia de inviolabilidade da esfera de privacidade que o cerca".

Por isso mesmo, a transposição arbitrária, para o domínio público, de questões meramente pessoais, sem qualquer reflexo no plano dos interesses sociais, tem o significado de grave transgressão ao postulado constitucional que protege o direito à intimidade, pois este, na abrangência de seu alcance, representa o "direito de excluir, do conhecimento de terceiros, aquilo que diz respeito ao modo de ser da vida privada" (HANNA ARENDT).

É certo que a garantia constitucional da intimidade não tem caráter absoluto. Na realidade, como já decidiu esta Suprema Corte, "Não há, no sistema constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de caráter absoluto, mesmo porque razões de relevante interesse público ou exigências derivadas do princípio de convivência das liberdades legitimam, ainda que excepcionalmente, a adoção, por parte dos órgãos estatais, de medidas restritivas das prerrogativas individuais ou coletivas, desde que respeitados os termos estabelecidos pela própria Constituição" (MS 23.452-RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO). Isso não significa, contudo, que o estatuto constitucional das liberdades públicas - nele compreendida a garantia fundamental da intimidade - possa ser arbitrariamente desrespeitado por qualquer órgão do Poder Público.

Nesse contexto, põe-se em evidência a questão pertinente ao sigilo bancário, que, ao dar expressão concreta a uma das dimensões em que se projeta, especificamente, a garantia constitucional da privacidade, protege a esfera de intimidade financeira das pessoas.

Embora o sigilo bancário, também ele, não tenha caráter absoluto (RTJ 148/366, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - MS 23.452-RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), deixando de prevalecer, por isso mesmo, em casos excepcionais, diante de exigências impostas pelo interesse público (SERGIO CARLOS COVELLO, "O Sigilo Bancário como Proteção à Intimidade", in Revista dos Tribunais, vol. 648/27), não se pode desconsiderar, no exame dessa questão, que o sigilo bancário reflete uma expressiva projeção da garantia fundamental da intimidade - da intimidade financeira das pessoas, em particular -, não se expondo, em conseqüência, enquanto valor constitucional que é (VÂNIA SICILIANO AIETA, "A Garantia da Intimidade como Direito Fundamental", p. 143-147, 1999, Lumen Juris), a intervenções estatais ou a intrusões do Poder Público desvestidas de causa provável ou destituídas de base jurídica idônea.

Daí o inquestionável relevo que assume o princípio da colegialidade, no plano das deliberações tomadas por qualquer Comissão Parlamentar de Inquérito, especialmente - como acima enfatizado - nas hipóteses excepcionais de ruptura da esfera de intimidade das pessoas.

Em conseqüência desse postulado, cumpre advertir que a legitimidade do ato de quebra do sigilo bancário, além de supor a plena adequação de tal medida ao que prescreve a Constituição, deriva da necessidade de a providência em causa respeitar, quanto à sua adoção e efetivação, o princípio da colegialidade, sob pena de essa deliberação reputar-se nula.

Esse entendimento - que põe em evidência o significado político-jurídico do princípio da colegialidade e que lhe acentua o caráter subordinante da eficácia das deliberações parlamentares - reflete-se no magistério da doutrina (ODACIR KLEIN, "Comissões Parlamentares de Inquérito - A Sociedade e o Cidadão", p. 64-68, item n. 10, 1999, Fabris Editor; JOSÉ NILO DE CASTRO, "A CPI Municipal", p. 91 e 98, itens ns. 7 e 9, 3ª ed., 2000, Del Rey, v.g.), valendo referir, no ponto, ante a sua extrema pertinência, a lição de JOSÉ LUIZ MÔNACO DA SILVA ("Comissões Parlamentares de Inquérito", p. 55, 1999, Ícone Editora):

"É preciso não perder de vista que, antes da determinação de qualquer diligência, caberá à comissão decidir sobre a realização dela. E a decisão será tomada, sempre, por maioria de votos. Trata-se do consagrado princípio da colegialidade, vigorante entre nós, o qual submete as CPIs à regra das decisões majoritárias (...). Assim, todas as decisões de uma CPI serão tomadas pela vontade majoritária de seus membros." (grifei)

Devo reconhecer, finalmente, que a plausibilidade jurídica da pretensão mandamental deduzida pelo ora impetrante evidencia-se, de maneira bastante expressiva, ante o próprio conteúdo das Atas concernentes à reuniões da CPI/Narcotráfico.

Com efeito, as cópias das Atas referentes às 62ª, 67ª e 73ª Sessões da CPI/Narcotráfico, constantes de fls. 26/48, nada registram sobre a possível existência de qualquer deliberação, por parte desse órgão de investigação parlamentar, concernente à decretação da quebra do sigilo bancário do impetrante, ora questionada na presente sede processual.

A ausência desse registro mostra-se extremamente relevante, pois, como se sabe, a Ata constitui registro fiel de todas as atividades e deliberações nela referidas. Tratando-se de documento público, como no caso, dispõe de presunção juris tantum de veracidade. Por tal motivo, e ao menos nesta fase de mera delibação, não vejo como possa reconhecer, no caso, a ocorrência de deliberação colegiada, cuja existência - contestada pelo ora impetrante - sequer foi referida pela CPI/Narcotráfico no texto das Atas de suas próprias sessões.

Assim sendo, considerando a indiscutível plausibilidade jurídica da pretensão mandamental ora deduzida nesta sede processual - e tendo em vista, ainda, que também concorre, na espécie dos autos, o requisito do periculum in mora -, defiro, até final julgamento da presente ação de mandado de segurança, o pedido de medida liminar, nos precisos termos em que foi ele requerido (fls. 13/14 - item n. 4.2., "a"), inclusive no que se refere ao dever de preservação da confidencialidade dos dados já eventualmente transmitidos aos membros da CPI/Narcotráfico, sob as penas da lei (Lei nº 4.595/64, art. 38, §§ 1º e 7º).

Cabe relembrar, neste ponto, por absolutamente necessário, a advertência constante de decisão unânime proferida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento final do MS 23.452-RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO:

"A QUESTÃO DA DIVULGAÇÃO DOS DADOS RESERVADOS E O DEVER DE PRESERVAÇÃO DOS REGISTROS SIGILOSOS.
- A Comissão Parlamentar de Inquérito, embora disponha, ex propria auctoritate, de competência para ter acesso a dados reservados, não pode, agindo arbitrariamente, conferir indevida publicidade a registros sobre os quais incide a cláusula de reserva derivada do sigilo bancário, do sigilo fiscal e do sigilo telefônico.
Com a transmissão das informações pertinentes aos dados reservados, transmite-se à Comissão Parlamentar de Inquérito - enquanto depositária desses elementos informativos -, a nota de confidencialidade relativa aos registros sigilosos.
Constitui conduta altamente censurável - com todas as conseqüências jurídicas (inclusive aquelas de ordem penal) que dela possam resultar - a transgressão, por qualquer membro de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, do dever jurídico de respeitar e de preservar o sigilo concernente aos dados a ela transmitidos.
Havendo justa causa - e achando-se configurada a necessidade de revelar os dados sigilosos, seja no relatório final dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (como razão justificadora da adoção de medidas a serem implementadas pelo Poder Público), seja para efeito das comunicações destinadas ao Ministério Público ou a outros órgãos do Poder Público, para os fins a que se refere o art. 58, § 3º, da Constituição, seja, ainda, por razões imperiosas ditadas pelo interesse social - a divulgação do segredo, precisamente porque legitimada pelos fins que a motivaram, não configurará situação de ilicitude, muito embora traduza providência revestida de absoluto grau de excepcionalidade."

Comunique-se, com urgência, esta decisão, aos Presidentes da CPI/Narcotráfico e do Banco Central do Brasil, encaminhando-se-lhes cópia do presente ato decisório.

2. Requisitem-se informações ao órgão ora apontado como coator (Lei nº 4.348/64, art. 1º, "a").

Publique-se.

Brasília, 12 de abril de 2000.

Ministro CELSO DE MELLO
Relator

* decisão publicada no DJU de 17.4.2000


 
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Informativo STF - 185 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

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