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quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

JURID - Habeas corpus. Dispensa ou inexigibilidade de licitação. [10/12/09] - Jurisprudência


Habeas corpus. Dispensa ou inexigibilidade de licitação fora das hipóteses previstas em lei.


Superior Tribunal de Justiça - STJ.

HABEAS CORPUS Nº 85.356 - SP (2007/0143604-7)

RELATOR: MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA

IMPETRANTE: FERNANDO AQUINO SCALIANTE

IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE: MILTON ARVECIR LOJUDICE

EMENTA

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. DISPENSA OU INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO FORA DAS HIPÓTESES PREVISTAS EM LEI. CONDENAÇÃO: PENA DE 3 ANOS DE DETENÇÃO. APELAÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA, ATIPICIDADE DA CONDUTA, NULIDADES. MATÉRIAS NÃO ANALISADAS PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. NÃO-CONHECIMENTO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. NÃO-OCORRÊNCIA. DENÚNCIA QUE NARRA O FATO E SUAS CIRCUNSTÂNCIAS. FALTA DE JUSTA CAUSA. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE NO ÂMBITO ESTREITO DO WRIT. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO-EVIDENCIADO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. NÃO-OCORRÊNCIA. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESSA EXTENSÃO, DENEGADA.

1. Não havendo manifestação do Tribunal de origem sobre o tema, não pode o Superior Tribunal de Justiça analisá-lo, sob pena de indevida supressão de instância. Precedentes do STJ.

2. O trancamento de ação penal em sede de habeas corpus reveste-se sempre de excepcionalidade, somente admitido nos casos de absoluta evidência de que, nem mesmo em tese, o fato imputado constitui crime.

3. Havendo estrita observância dos requisitos legais previstos no art. 41 do Código Processo Penal, quais sejam, a exposição do fato criminoso, narrando todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado e a tipificação dos delitos por ele cometidos, não há falar em inépcia da denúncia, nem em falta de justa causa para a ação penal.

4. Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o réu defende-se dos fatos narrados na denúncia, e não da capitulação nela contida.

5. Não há falar em prescrição da pretensão punitiva se não decorreu o prazo entre os marcos interruptivos.

6. Ordem parcialmente conhecida e, nessa extensão, denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer parcialmente do pedido e, nessa parte, denegar a ordem. Os Srs. Ministros Jorge Mussi e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Felix Fischer e Napoleão Nunes Maia Filho.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Jorge Mussi.

Brasília (DF), 17 de novembro de 2009(Data do Julgamento).

MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA
Relator

RELATÓRIO

MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA:

Trata-se de habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, com pedido de liminar, impetrado em favor de MILTON ARVECIR LOJUDICE, prefeito do Município de Floreal/SP, que, por denúncia recebida em 16/8/01, nos autos da Ação Penal 383.01.2000.003066-9, foi incurso nas penas do art. 89 da Lei 8.666/93, por 8 vezes, e do art. 1º, V (por 5 vezes) e XIII, do Decreto 201/67 c.c. os arts. 69 e 71, ambos do Código Penal.

Infere-se dos autos que, em 19/9/02, foi proferida sentença que declarou extinta a punibilidade do réu com relação às infrações do art. 1º, incisos V e XIII, do Decreto-Lei 201/67, com fundamento no art. 107, IV, do Código Penal, e o condenou, por infringência ao art. 89 da Lei 8.666/93 c.c. art. 71 do Código Penal, às penas de 3 anos e 6 meses de detenção, em regime inicial aberto, além do pagamento de 11 dias-multa, tendo sido a pena privativa de liberdade substituída por 2 restritivas de direito, consistentes em prestação de serviços à comunidade e limitação de fim de semana. Foi-lhe concedido o benefício de apelar em liberdade.

Insurge-se o impetrante contra acórdão proferido pela 6ª Criminal do 3º Grupo da Seção Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que, por unanimidade, rejeitou as preliminares e negou provimento à Apelação Criminal 420.853.3/6, que objetivava o reconhecimento de inépcia da denúncia e a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva. No mérito, a defesa alegou inocência do acusado.

Reitera, em síntese, as alegações de inépcia da denúncia e ocorrência da prescrição da pretensão punitiva.

Alega, ainda, cerceamento de defesa, atipicidade da conduta por ausência de dolo, fraude e dano ao erário, bem como nulidade do acórdão impugnado em face da não-aplicação do Decreto 210/67 e do princípio da intervenção mínima.

O pedido de liminar foi por mim indeferido (fl. 349), ocasião em que solicitei novas informações à apontada autoridade coatora, as quais foram prestadas às fls. 356/358, e vieram acompanhadas dos documentos de fls. 359/560.

O Ministério Público Federal, em parecer exarado pelo Subprocurador-Geral da República DURVAL TADEU GUIMARÃES, opinou pela denegação da ordem (fls. 562/564).

É o relatório.

VOTO

MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA (Relator):

Conforme relatado, pretende o impetrante a anulação da denúncia, por inépcia, e o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva. Alega, ainda, cerceamento de defesa; atipicidade da conduta por ausência de dolo, fraude e dano ao erário e nulidade do acórdão impugnado em face da não-aplicação do Decreto 210/67 e do princípio da intervenção mínima. Sem razão, entretanto.

Inicialmente, como bem acentuou o douto representante ministerial em seu parecer (fls. 562/564), apenas devem ser analisadas no presente writ as questões relativas à inépcia da denúncia e à ocorrência da prescrição, porquanto as demais matérias aqui arguidas não foram objeto de debate pelo Tribunal de origem. Assim, a análise dos temas pelo Superior Tribunal de Justiça caracterizaria indevida supressão de instância.

Nesse sentido:

HABEAS CORPUS. CRIMES CONTRA O MEIO AMBIENTE. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. PRESCRIÇÃO. QUESTÕES NÃO ANALISADAS PELO TRIBUNAL A QUO, DIANTE DA PENDÊNCIA DE JULGAMENTO DO APELO DEFENSIVO. DESCABIMENTO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO PARA QUE A CORTE ESTADUAL ANALISE O MÉRITO DA IMPETRAÇÃO.

1. O pedido de trancamento da ação penal não foi apreciado pelo Tribunal a quo, que entendeu ser inviável a análise da matéria, em sede de habeas corpus, sob o argumento de existir recurso de apelação da Defesa pendente de julgamento sobre a mesma matéria.

2. Como a questão não foi debatida na instância originária, não há como ser conhecida a impetração, diante da manifesta incompetência desta Corte para apreciar originariamente a matéria, sob pena de supressão de instância.

3. Apesar de ser a apelação o recurso próprio cabível contra sentença condenatória, não há óbice ao manejo do habeas corpus quando a análise da legalidade do ato coator prescindir do exame aprofundado de provas, como no caso, onde as alegações de prescrição e falta de justa causa não demandam o análise do material cognitivo constante nos autos.

4. Habeas corpus não conhecido. Concedida a ordem, de ofício, para determinar que o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Distrito Federal e Territórios aprecie o mérito da impetração. (HC 95.875/DF, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ 24/3/08)

HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO CRIME DE ROUBO. INTERNAÇÃO. EMPREGO DE ARMA DE FOGO, GRAVE AMEAÇA E VIOLÊNCIA CONTRA À PESSOA. CIRCUNSTÂNCIAS PESSOAIS DO ADOLESCENTE. ORDEM ORIGINÁRIA NÃO CONHECIDA PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA.

1. A legalidade da medida sócio-educativa de internação imposta ao Paciente não foi apreciada pelo Tribunal a quo, que entendeu ser inviável a análise da matéria, em sede de habeas corpus, porque a análise sobre a adequação da medida sócio-educativa mais gravosa demandaria o exame dos requisitos subjetivos do menor e das circunstâncias da infração, notoriamente inviáveis de aferição na via estreita do writ.

2. Em sendo assim, como a matéria não foi debatida na instância originária, não há como ser conhecida a impetração, diante da manifesta incompetência desta Corte Superior Tribunal de Justiça para apreciar originariamente a matéria, sob pena de supressão de instância.

3. Não resta evidenciado, de plano, a existência de constrangimento ilegal porque estando a decisão judicial devidamente fundamentada, a aplicação de medida sócio-educativa de internação encontra amparo legal quando o ato infracional é cometido mediante violência e grave ameaça à pessoa, inclusive com o emprego de arma de fogo, a teor do disposto no art. 122, inciso I, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

5. Habeas corpus não conhecido. (HC 88.151/SP, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ 17/3/08)

No que tange à alegação de inépcia da denúncia, a peça acusatória assim narrou a conduta do paciente (fls. 359/361):

1 - Consta do incluso inquérito policial que, durante o ano de 1996, enquanto ainda Prefeito Municipal, o indiciado inexigiu licitação fora das hipóteses previstas em lei, nos seguintes casos:

a) contrato firmado com a empresa B. W. Informática, com termo inicial em 1994, e renovado pelo imputado, tendo como objeto a locação de Softwares e Hardwares, no valor de R$ 200,00 mensais, além das despesas com combustíveis, a razão de R$ 0,15 o Km rodado, durante todo o exercício de 1996 (fls. 21);

b) compra de R$ 54.233,10 de medicamentos, de um único fornecedor (fls. 21);

c) compra de R$ 2.584,85 de materiais odontológicos (fls. 22);

d) compra de R$ 5.642,82 de carne para a merenda escolar (fls. 22/23);

e) compra de R$ 5.331,00 de pães, de dois fornecedores (fls. 23);

f) compra de R$ 3.003,00 de frutas e verduras, também para a merenda escolar (fls. 23/24);

g) compra de R$ 69.997,16 de combustíveis, de dois fornecedores (fls. 24);

h) compra de R$ 5.000,00 de bens de caráter permanente, da loja "Sinhorini - Móveis e Eletrodomésticos Ltda (fls. 24);

2 - Consta, ainda, que MILTON, também em 1996, ordenou despesas em desacordo com as normas financeiras pertinentes, ou seja:

a) ordenou o abastecimento e reparo de veículos sem sua identificação - anotação do número do patrimônio, da chapa, chassi, etc -;

b) ordenou despesas sem prévio empenho - o processamento das notas de empenho ocorriam quando do recebimento das notas fiscais na Prefeitura;

c) ordenou despesas sem o conhecimento (identificação) do destinatário. Assim infringiu o disposto nos artigos 58, 60, 62 e 63, par. 1º, da Lei Federal nº 4.320/64 (fls. 28/29);

3 - Consta, ainda, que o indiciado ordenou despesas não autorizadas por lei, consistente em:

a) ligações telefônicas impróprias - 0900, no valor de R$ 86,45, tais como, "tele sorte, tele orelhão, turminha legal, tele orelhão, Walter e seus videntes" (fls. 30) -;

b) despesas com refeições sem comprovação adequada, no valor de R$ 1.158,80, tais como: "136 comerciais, 20 espetos, 40 refrigerantes, 04 churrascos, etc. (fls. 31);

4 - Consta, ainda, que o denunciado admitiu servidor, contra expressa disposição de lei, consistente na contratação, sem concurso público, do médico Ronaldo Gaspar Bottino Quicoli (fls. 35). Inclusive não há nos autos notícia de registro em carteira, contrato, etc.

Todas as irregularidades acima foram constatadas pelo Tribunal de Contas do Estado, no processo TC - nº 001475/026/97, conforme relatório de fls. 11/58, cujas contas da Prefeitura Municipal foram rejeitadas (fls. 110).

As licitações acostadas às fls. 145 e s. (pães) e fls. 182 e s. (medicamentos) foram realizadas após as compras impugnadas pelo Tribunal de Contas às fls. 21/22. Portanto, estas não foram solicitadas.

Isto posto DENUNCIO a Vossa Excelência MILTON ARVECIR LOJUDICE como incurso nas penas cominadas pelo artigo 89, das Lei 8.666/93 (8 vezes) e artigo 1º, inciso V (5 vezes) e XIII, do Decreto-lei n. 201/67, c.c. os artigos 69 e 71 do Código Penal, e requeiro que, observado o disposto no artigo 2, inciso I, do Dec. Lei 201/67, seja ele citado para o processo, ouvindo-se as testemunhas do rol abaixo, com final sentença condenatória.

Como se observa, ao contrário do alegado, a denúncia não padece de nenhum vício, pois individualiza com clareza a conduta do paciente, permitindo o amplo exercício do direito de defesa assegurado pelo ordenamento constitucional.

Com efeito, narra a inicial acusatória que o paciente, na qualidade de prefeito de Floreal/SP, no ano de 1996, deixou de exigir licitação ou despendeu importâncias superiores às que tinham sido objeto de licitação, em diversas oportunidades, tais como na execução de contrato com empresa de informática para locação de softwares e hardwares e nas compras de medicamentos, materiais odontológicos, carne para merenda escolar, pães, frutas e verduras, combustíveis, dentre outros bens. Assim, houve a narrativa de fatos penalmente típicos, descrevendo o nexo causal entre as supostas condutas do paciente e os eventos danosos que lhe foram atribuídos.

Corroborando tal entendimento, destaco os seguintes julgados desta Corte:

CRIMINAL. AÇÃO PENAL. DENÚNCIA. ADMISSIBILIDADE. POSSÍVEL FRAUDE À LICITAÇÃO. DISPENSA DE PROCEDIMENTO LICITATÓRIO NECESSÁRIO À CONTRATAÇÃO DE SERVIÇO DE PUBLICIDADE. MATERIALIDADE COMPROVADA. ASPECTOS DE FUNDO, LEVANTADOS NAS RESPOSTAS, QUE NÃO PODEM SER EXAMINADOS. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROCESSUAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA NÃO VERIFICADA. CLASSIFICAÇÃO QUE NÃO TEM ESPECIAL RELEVO. IMPROCEDÊNCIA DA ACUSAÇÃO, NA FORMA DE JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE, INOCORRENTE. EVENTUAL DÚVIDA QUE BENEFICIA A ACUSAÇÃO, NESTA FASE PROCESSUAL. TEMAS A SEREM ESCLARECIDOS QUE NÃO ENSEJAM A PRONTA DECLARAÇÃO DE IMPROCEDÊNCIA. "VISTO". IMPROPRIEDADE DE UM JUÍZO PRÉVIO SOBRE SEU CONTEÚDO E VALIDADE. MOMENTO IMPRÓPRIO PARA O EXAME DA CULPABILIDADE OU EXCLUSÃO DE CRIMINALIDADE. SUFICIENTES INDÍCIOS DE AUTORIA EVIDENCIADOS. AÇÃO PENAL PROPOSTA DEVIDO AO FORO ESPECIAL DE MEMBRO DE TRIBUNAL DE CONTAS ESTADUAL E EX-GOVERNADOR. DENÚNCIA RECEBIDA.

I. Feito instaurado para a apuração de possíveis irregularidades na contratação de empresa de publicidade, pelo Governo de Rondônia, a fim de promover campanha de aumento de arrecadação, através do controle da expedição de notas fiscais.

II. Evidencia-se a devida comprovação da materialidade, se sobressai, em princípio, a prática de possível dispensa irregular de procedimento licitatório, assim como a inobservância, em tese, às formalidades legais a ele pertinentes, com base em documentos convergentes e em harmonia com o contexto dos fatos noticiados.

III. Não se pode proceder à análise dos aspectos de fundo levantados nas respostas escritas, concernentes ao próprio mérito da causa penal, pois os mesmos deverão ser examinados no momento processual adequado, com a realização da indispensável instrução criminal contraditória.

IV. Não há inépcia da denúncia, se as condutas delituosas encontram-se satisfatoriamente descritas na peça acusatória e se esta se mostra formalmente idônea, contendo a exposição do fato criminoso, com suas circunstâncias, a qualificação dos acusados e a classificação do crime.

V. A classificação feita na inicial não tem especial relevo, em função do que dispõe o art. 383 do CPP.

VI. Rejeitando-se as alegações concernentes à regularidade formal da peça pórtica, passa-se ao exame sobre se seria o caso de eventual conclusão sobre a improcedência da acusação, na forma do julgamento antecipado da lide.

VII. A improcedência só pode ser reconhecida quando evidenciada, estreme de dúvidas, a inviabilidade da instauração do processo, quando for possível afirmar-se, sem necessidade de formação de culpa, que a acusação não procede.

VIII. Na decisão final, a dúvida beneficia o réu e, nesta fase de recebimento da exordial, a dúvida beneficia a acusação.

IX. Sobressaindo dois temas a serem esclarecidos: se havia possibilidade de licitação e se houve dolo por parte dos acusados, em relação aos quais há necessidade de abertura da instrução probatória, tem-se que a hipótese não enseja, nesta oportunidade, a declaração de improcedência da acusação, tampouco restando evidenciada qualquer excludente de ilicitude.

X. Na fase de recebimento da denúncia também não cabem maiores averiguações sobre a caracterização/descaracterização do indigitado "visto", pois, em princípio, houve o endosso, o "aprove-se", sendo certo que não se pode proceder a um juízo prévio sobre o conteúdo e a validade de tal assinatura.

XI. O momento também não se presta ao exame da culpabilidade ou de outra forma de exclusão de criminalidade, pois a questão é restrita à verificação de eventual atipicidade do fato, ausência de indícios a fundamentarem a acusação ou, ainda, eventual extinção da punibilidade - do que não se cogita in casu.

XII. Sobressaem suficientes indícios de autoria com relação às condutas imputadas aos denunciados, sendo que as alegações de suas defesas preliminares ficam restritas a meras suposições, em função da inexistência de elementos aptos a alicerçarem, inequivocamente, os seus argumentos.

XIII. A denúncia define quem agiu, de que maneira, em que lugar e em qual oportunidade.

XIV. Tratando-se de ação penal proposta neste Superior Tribunal de Justiça devido à participação de um membro do Tribunal de Contas do Estado de Rondônia e um ex-Governador, que detêm foro especial por prerrogativa de função, atraindo os demais acusados, e levando-se em conta a gravidade dos fatos denunciados, impõe-se a devida apuração das alegações ministeriais.

XV. Denúncia recebida. (Apn 195/RO, Rel. Min. GILSON DIPP, Corte Especial, DJ 15/9/03)

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 89, CAPUT, DA LEI 8.666/93. ALEGADA INÉPCIA DA DENÚNCIA. INOCORRÊNCIA. TRANCAMENTO. AUTORIA. DILAÇÃO PROBATÓRIA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA.

I - A peça acusatória deve conter a exposição do fato delituoso em toda a sua essência e com todas as suas circunstâncias. (HC 73.271/SP, Primeira Turma, Rel. Min. Celso de Mello, DJU de 04/09/1996). Denúncias genéricas que não descrevem os fatos na sua devida conformação, não se coadunam com os postulados básicos do Estado de Direito. (HC 86.000/PE, Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJU de 02/02/2007). A inépcia da denúncia caracteriza situação configuradora de desrespeito estatal ao postulado do devido processo legal.

II - Na hipótese dos autos, todavia, a exordial acusatória descreve de maneira satisfatória fato, ao menos em tese, delituoso que se adequa ao tipo penal previsto no art. 89, caput, da Lei 8.666/93. Com efeito, narra a denúncia, objetivamente, que o paciente, à época funcionário da Fundação Municipal de Saúde de São Gonçalo/RJ, juntamente com outros co-réus, teria dispensado licitação para a aquisição de insumos hospitalares, fora das hipóteses legais, simulando situação de emergência, de modo a justificar a dispensa do devido certame licitatório. Assim, não há como se acolher a alegação de inépcia da proemial.

III - Ainda, é geral, e não genérica, a denúncia que atribui a mesma conduta a todos os denunciados, desde que seja impossível a delimitação dos atos praticados pelos envolvidos, isoladamente, e haja indícios de acordo de vontades para o mesmo fim (STJ: RHC 21284/RJ, 5ª Turma, Relatora Ministra Jane Silva (Desembargadora convocada do TJ/MG), 5ª Turma, DJU de 01/10/2007)

IV - O trancamento da ação penal por meio do habeas corpus se situa no campo da excepcionalidade (HC 901.320/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, DJU de 25/05/2007), sendo medida que somente deve ser adotada quando houver comprovação, de plano, da atipicidade da conduta, da incidência de causa de extinção da punibilidade ou da ausência de indícios de autoria ou de prova sobre a materialidade do delito (HC 87.324/SP, Primeira Turma, Relª. Minª. Cármen Lúcia, DJU de 18/05/2007). Ainda, a liquidez dos fatos constitui requisito inafastável na apreciação da justa causa (HC 91.634/GO, Segunda Turma, Rel. Min. Celso de Mello, DJU de 05/10/2007), pois o exame de provas é inadmissível no espectro processual do habeas corpus, ação constitucional que pressupõe para seu manejo uma ilegalidade ou abuso de poder tão flagrante que pode ser demonstrada de plano (RHC 88.139/MG, Primeira Turma, Rel. Min. Carlos Britto, DJU de 17/11/2006).

V - In casu, a alegação de que o paciente não tinha qualquer poder decisório, em razão das atribuições do cargo que exercia, tendo atuado no procedimento somente após a entrega das mercadorias, é matéria afeta ao próprio mérito da ação penal, incompatível com a via estreita e sumária do habeas corpus.

Writ denegado. (HC 103.812/RJ, Rel. FELIX FISCHER, Quinta Turma, DJ 16/2/09)

Ademais, diante do entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o réu defende-se dos fatos narrados na denúncia, e não da capitulação nela contida. Confiram-se os precedentes:

PROCESSUAL PENAL - HABEAS CORPUS. ART. 16, PARÁGRAFO ÚNICO, INC. IV, DA LEI N.º 10.826/03. PORTE DE ARMA. DESCLASSIFICAÇÃO. PRISÃO PREVENTIVA. CAPITULAÇÃO. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. EXCESSO DE PRAZO NA FORMAÇÃO DA CULPA. SÚMULA 52/STJ.

I - Não se presta o remédio heróico a apreciar questões que envolvam exame aprofundado de matéria fático-probatória, como, no caso, na pretensão à desclassificação do crime de porte de arma de uso restrito para o de uso permitido (Precedentes).

II - O trancamento de ação por falta de justa causa, na via estreita do writ, somente é viável desde que se comprove, de plano, a atipicidade da conduta, a incidência de causa de extinção da punibilidade ou a ausência de indícios de autoria ou de prova sobre a materialidade do delito, hipóteses não ocorrentes na espécie (Precedentes).

III - A capitulação da conduta descrita na exordial acusatória, ainda que incorreta, poderá, oportunamente, ser corrigida, não constituindo prejuízo à defesa do acusado, que se defenderá dos fatos narrados (Precedentes).

IV - "Encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de constrangimento ilegal por excesso de prazo" (Enunciado nº 52, da Súmula do Superior Tribunal de Justiça).

Writ denegado. (HC 34.544/PE, Rel. Min. FELIX FISCHER, Quinta Turma, DJ 6/9/04)

HABEAS CORPUS. PECULATO E FALSIDADE IDEOLÓGICA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. MINISTÉRIO PÚBLICO. TITULAR DA AÇÃO PENAL PÚBLICA. PODER INVESTIGATIVO. AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA. DIVISIBILIDADE. QUEBRA DE SIGILO FISCAL. FALTA DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. CONSTRANGIMENTO NÃO DEMONSTRADO. FALTA DE JUSTA CAUSA. ATIPICIDADE PRIMUS ICTUS OCULI. CAPITULAÇÃO LEGAL. DEFESA DOS FATOS NARRADOS NA DENÚNCIA. EXAME APROFUNDADO DE PROVAS. VEDAÇÃO NA VIA ELEITA. ORDEM DENEGADA.

1. O Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal já firmaram compreensão no sentido de que, a teor do disposto no art. 129, VI e VIII, da Constituição Federal, e no art. 8º, II e IV, da Lei Complementar nº 75/93, o Ministério Público, como titular da ação penal púbica, pode proceder a investigações, inclusive colher depoimentos, lhe sendo vedado tão-somente dirigir o inquérito policial.

2. Esta Corte já decidiu que, em se tratando de ação penal pública incondicionada, não está o Ministério Público obrigado a denunciar todos os indiciados. Pode propor ação penal com relação àqueles contra quem haja indícios suficientes e determinar, quanto aos demais, o arquivamento ou o prosseguimento das investigações, sendo possível, posteriormente, o oferecimento de nova denúncia ou o aditamento da primeira.

3. Não se reconhece a ocorrência de constrangimento decorrente da quebra de sigilo fiscal sem prévia autorização se a impetração não impugna o fundamento do acórdão - de não ter sido comprovada a ilegalidade -, tampouco junta documentos hábeis a demonstrá-lo.

4. É pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça de que somente se reconhece a falta de justa causa apta a trancar a ação penal quando um exame não detalhado dos elementos de convicção trazidos aos autos em confronto com a descrição da denúncia leve à conclusão de ser atípica a conduta nela narrada.

5. Não sendo as condutas descritas na denúncia daquelas que, à toda evidência, levam à conclusão da inexistência da prática de delitos, revela-se prematuro o trancamento da ação penal na via eleita, notadamente porque o réu se defende dos fatos descritos na peça acusatória, não da capitulação legal a eles emprestada.

6. A alegação de que não há provas da participação do paciente relativamente ao crime de falsidade ideológica não pode ser aqui acatada, pois demandaria o exame aprofundado dos elementos de convicção, vedado na via estreita do habeas corpus, além do que a denúncia deixa certa a existência de indícios de autoria do delito.

7. Habeas corpus denegado, cassada a liminar. (HC 50.973/RN, Rel. Min. PAULO GALLOTTI, Sexta Turma, DJ 11/12/07)

Dessa forma, havendo observância dos requisitos legais previstos no art. 41 do Código Processo Penal, quais sejam, a exposição do fato criminoso, narrando todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado e a tipificação do delito por ele cometido, não há falar em inépcia da peça acusatória.

No tocante à falta de justa causa, o pleito também não merece prosperar.

Com efeito, o trancamento de ação penal em sede de habeas corpus reveste-se sempre de excepcionalidade, somente admitido nos casos de absoluta evidência de que, nem mesmo em tese, o fato imputado constitui crime. Isso porque a estreita via eleita não se presta como instrumento processual para exame da procedência ou improcedência da acusação, com incursões em aspectos que demandam dilação probatória e valoração do conjunto de provas produzidas, o que só poderá ser feito após o encerramento da instrução criminal, sob pena de violação ao princípio do devido processo legal.

Com esse entendimento:

HABEAS CORPUS. APURAÇÃO DE CRIMES DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO, ESTELIONATO E FORMAÇÃO DE QUADRILHA. PRETENDIDO TRANCAMENTO DE INQUÉRITO POLICIAL. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE EXAME PROBATÓRIO. ORDEM DENEGADA.

1. Em sede de habeas corpus, conforme pacífico magistério jurisprudencial, somente se admite o trancamento de inquérito policial ou da ação penal, por falta de justa causa, quando desponta, induvidosamente, sem a necessidade de avaliação aprofundada de fatos, indícios e provas, a inocência do indiciado, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade, circunstâncias não demonstradas na hipótese em exame.

2. Uma vez não demonstrada, de plano, a ausência de justa causa para o inquérito policial, é descabido o seu trancamento.

3. Ordem denegada. (HC 59.750/PR, de minha relatoria, Quinta Turma, DJ 4/12/06)

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CRIMES DE LAVAGEM DE DINHEIRO E FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. FALTA DE JUSTA CAUSA. TRANCAMENTO. ALEGAÇÃO DE ATIPICIDADE DA CONDUTA E DE INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. NECESSIDADE DE ANÁLISE DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. VIA ELEITA INADEQUADA. PRECEDENTES DO STJ.

1. O trancamento da ação penal pela via de habeas corpus é medida de exceção, que somente é admissível quando emerge dos autos, de forma inequívoca, a inocência do acusado, a atipicidade da conduta ou a extinção da punibilidade. Precedentes desta Corte.

2. O acolhimento das alegações constantes na presente impetração, de atipicidade da conduta e ausência de elemento material indiciário, referentes, respectivamente, aos crimes de lavagem de dinheiro e falsificação de documento público, requer um exame acurado do conjunto fático e, também, de ampla produção de provas. Tal possibilidade afigura-se incabível na via estreita do habeas corpus, ainda mais em se considerando que já houve a superveniência da condenação pelos referidos crimes, na instância originária, onde se faz possível a detida análise fático-probatória contida nos autos.

3. Habeas corpus não conhecido. (HC 46.222/RN, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ 13/8/07)

Vale registrar, ainda, os seguintes precedentes do Supremo Tribunal Federal:

PENAL. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME MILITAR. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. DENÚNCIA. FATOS SUFICIENTEMENTE DESCRITOS. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA ASSEGURADOS. MANIFESTA ILEGALIDADE. INOCORRÊNCIA. ORDEM DENEGADA.

I - Não se pode substituir o processo de conhecimento pela via estreita do habeas corpus sem que se demonstre a manifesta ilegalidade ou abuso de poder que impeçam ou venham a impedir o exercício do direito de ir e vir.

II - Via eleita que não admite discussão aprofundada de fatos e provas.

III - Ordem denegada. (HC 89.344/MS, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, DJ 23/3/07)

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CRIME ELEITORAL. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. ALEGAÇÃO DE INÉPCIA DA INICIAL ACUSATÓRIA, AFRONTA AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DA INOCÊNCIA, AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO E FALTA DE JUSTA CAUSA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. HABEAS CORPUS DENEGADO NO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. DECISÃO EM PERFEITA CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTE SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECURSO DESPROVIDO.

1. Não é inepta a denúncia que bem individualiza as condutas, expondo de forma pormenorizada o fato criminoso, preenchendo, assim, os requisitos do art. 41 do CPP.

2. Não se admite, na via acanhada do habeas corpus, a análise aprofundada de fatos e provas, a fim de se verificar a inocência dos Pacientes.

3. O trancamento da ação penal, em habeas corpus, apresenta-se como medida excepcional, que só deve ser aplicada quando evidente a ausência de justa causa, o que não ocorre quando a denúncia descreve conduta que configura crime em tese.

4. Devidamente fundamentada, nos termos legalmente previstos e em consonância com o entendimento deste Supremo Tribunal sobre a matéria, a decisão que recebeu a denúncia, deve a ação penal ter seu curso normal.

5. Recurso desprovido. (RHC 89.721/RO, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, DJ 16/2/07)

Destarte, deve subsistir o entendimento firmado nas instâncias ordinárias, em face da ausência de constrangimento ilegal, uma vez que o estreito rito do habeas corpus não admite dilação probatória, exigindo prova pré-constituída das alegações, que demandaria aprofundada incursão na seara fático-probatória.

Por fim, salienta-se que não se implementou a prescrição da pretensão punitiva. Com efeito, o paciente foi condenado à pena de 3 anos de detenção. Assim, nos termos dos arts. 109, IV, 117, I e IV, e 119 do Código Penal, o prazo prescricional é de 8 anos. Tendo em vista que os fatos se consumaram no ano de 1996, que a denúncia foi recebida em 16/8/01 e que a sentença recorrível foi publicada em 19/9/02, verifica-se que a prescrição não se consumou.

Ante o exposto, conheço parcialmente da ordem e, nessa extensão, a denego.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

QUINTA TURMA

Número Registro: 2007/0143604-7 HC 85356 / SP

MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 14370451 402000 4208533

EM MESA JULGADO: 17/11/2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro JORGE MUSSI

Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. LINDÔRA MARIA ARAÚJO

Secretário
Bel. LAURO ROCHA REIS

AUTUAÇÃO

IMPETRANTE: FERNANDO AQUINO SCALIANTE

IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE: MILTON ARVECIR LOJUDICE

ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes Previstos na Legislação Extravagante - Crimes da Lei de licitações

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Turma, por unanimidade, conheceu parcialmente do pedido e, nessa parte, denegou a ordem."

Os Srs. Ministros Jorge Mussi e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Felix Fischer e Napoleão Nunes Maia Filho.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Jorge Mussi.

Brasília, 17 de novembro de 2009

LAURO ROCHA REIS
Secretário

Documento: 929759

Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 07/12/2009




JURID - Habeas corpus. Dispensa ou inexigibilidade de licitação. [10/12/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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