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sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

JURID - Rescisão indireta do contrato de trabalho. Agressão física. [11/12/09] - Jurisprudência


Rescisão indireta do contrato de trabalho. Agressão física do empregador contra o empregado


Tribunal Regional do Trabalho - TRT 3ª Região.

Processo: 00422-2009-109-03-00-0 RO

Data de Publicação: 23/11/2009

Órgão Julgador: Sexta Turma

Juiz Relator: Des. Emerson Jose Alves Lage

Juiz Revisor: Des. Anemar Pereira Amaral

RECORRENTE: ANA PAULA BARBOSA DA SILVA

RECORRIDA: VEREDA LANCHES LTDA

RELATOR: DESEMBARGADOR EMERSON JOSÉ ALVES LAGE

EMENTA: RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. AGRESSÃO FÍSICA DO EMPREGADOR CONTRA O EMPREGADO. Agressão física contra empregado, suficientemente comprovada nos autos, inviabiliza a manutenção do contrato de trabalho e representa falta suficientemente grave do empregador, tipificada na alínea "f" do art. 483 da CLT, autorizadora da rescisão indireta, com o acolhimento do pedido de verbas decorrentes da rescisão contratual, motivada por falta patronal.

Vistos os autos, relatado e discutido o presente recurso ordinário, decide-se:

1 - RELATÓRIO

A MM. Juíza do Trabalho Júnia Márcia Marra Turra, em exercício na 30ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, pela r. sentença de f. 49/53, cujo relatório adoto e a este incorporo, julgou procedentes, em parte, os pedidos formulados na reclamação trabalhista ajuizada por ANA PAULA BARBOSA DA SILVA contra VEREDA LANCHES LTDA, condenando esta a pagar àquela 06/12 de férias proporcionais acrescidas de 1/3; 02/12 de 13º salário proporcional; saldo de salário de 14 dias; FGTS sobre 13º salário proporcional e sobre estimativa de gorjeta, para depósito em conta vinculada.

Inconformada, a reclamante interpôs recurso ordinário às f. 55/59, pretendendo a reforma da r. sentença quanto à rescisão indireta; indenização por danos morais; horas extras.

Contrarrazões às f. 62/65, requerendo a aplicação da multa por litigância de má-fé à reclamante.

Não houve manifestação do Ministério Público do Trabalho, já que neste processo não se vislumbra interesse público a proteger, nem quaisquer das hipóteses previstas no art. 82 do Regimento Interno deste Eg. Tribunal Regional do Trabalho.

É o relatório.

2 - ADMISSIBILIDADE

Próprio e tempestivo, conhece-se do recurso interposto.

3 - FUNDAMENTOS

3.1 - RESCISÃO INDIRETA/INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS

A reclamante alega que, ao contrário do que entendeu a d. julgadora de origem, a prova testemunhal comprovou a agressão física noticiada na inicial, perpetrada contra ela pelo sócio proprietário da reclamada, ressaltando que a segunda testemunha ouvida a seu rogo relatou detalhadamente o fato, além de ter reconhecido o agressor em audiência (Sr. José Mário), circunstâncias que revelam que o depoente não estava alcoolizado, ressaltando, ainda, que a sua terceira testemunha, apesar de não ter visto a agressão propriamente, presenciou os fatos que lhe sucederam (queda do cinzeiro e a autora limpando a sua roupa no local onde foi atingida). Alega, ainda, que o fato de os contratos de trabalho das testemunhas ouvidas a rogo da reclamada ainda estarem em vigor fragiliza seus depoimentos, que tendem a ser parciais. E tendo sido comprovada, suficientemente, a agressão física do Sr. José Mário contra a recorrente, pretende o reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho, com deferimento das verbas rescisórias correlatas e da indenização por danos morais decorrentes da agressão sofrida, tal como postulado na inicial.

Com razão, data venia do posicionamento adotado na origem.

Na inicial a reclamante alegou que no dia 05/03/09, no local de trabalho, foi atingida no rosto por um objeto atirado contra si pelo proprietário da reclamada, propositadamente. Diz que a conduta do seu ex-patrão lhe causou imenso constrangimento e que não teve mais condições de voltar ao trabalho a partir dessa agressão que lhe foi perpetrada, postulando a rescisão indireta do contrato de trabalho, com fulcro nas alíneas "b" e "f" do art. 483 da CLT, e a condenação da reclamada ao pagamento de uma indenização pelos danos morais decorrentes do ato ilícito do seu ex-patrão (f. 04).

A prova testemunhal confirma o fato relatado na inicial, tendo, duas das testemunhas ouvidas a rogo da autora, presenciado o ocorrido e relatado o seguinte:

"só uma vez presenciou a reclamante ser agredida parece que pelo proprietário ele estava sentado em uma mesa na entrada e viu ser arremessado um cinzeiro contra a reclamante, não sabe dizer o nome da pessoa que fez isso, ouviu dizer que era o dono do imóvel; logo em seguida a esse fato a reclamante saiu e foi embora; isso aconteceu há quase 2 meses; indicado a ele o Sr. José Mário identificou como sendo a pessoa que arremessou o cinzeiro na reclamante" (testemunha Adelton Valadares da Cruz, ata, f. 37);

"na oportunidade que esteve na reclamada foi a noite e tem uns 2 meses; nesse dia presenciou um incidente viu um cinzeiro batendo no chão e a reclamante limpando a sua roupa na frente; (...)" (testemunha Rosimeire Emereciano, ata, f. 37).

Nota-se que os depoentes presenciaram os fatos narrados pela reclamante, ao contrário das testemunhas ouvidas a rogo da reclamada que não se encontravam no local no momento da agressão sofrida pela autora.

E o fato de a segunda testemunha da autora admitir que havia ingerido três cervejas não retira a credibilidade de suas declarações, que apresentam um relato coerente e detalhado das circunstâncias presenciadas naquele dia, além de terem sido prestadas mediante compromisso com a verdade, lembrando que a testemunha não foi sequer contraditada pela ré.

Ademais, a terceira testemunha ouvida a rogo da autora também relatou acontecimentos que coadunam com a agressão alegada na inicial, tal como ter ouvido a queda do objeto atirado na reclamante e ter visto a trabalhadora limpar sua roupa, depois da agressão sofrida, o que reforça a convicção de que o testemunho de Adelton Valadares da Cruz descreve a realidade dos fatos ocorridos naquele dia.

O cenário fático-probatório acima delineado torna inequívoca a agressão física do proprietário da reclamada contra a reclamante, fato que dá ensejo ao reconhecimento da rescisão indireta postulada na inicial, por se enquadrar na hipótese descrita na alínea "f" do art. 483 da CLT, in verbis:

"O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando: (...)

f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem".

Importante registrar que não há qualquer prova nos autos de que a conduta agressiva do empregador tenha sido motivada pela ressalva estampada na parte final da alínea "f" do artigo supramencionado.

Esclarece-se que agressão física contra empregado, suficientemente comprovada nos autos, inviabiliza a manutenção do contrato de trabalho e representa falta suficientemente grave do empregador, tipificada na alínea "f" do art. 483 da CLT, autorizando o reconhecimento da rescisão indireta, o deferimento das verbas rescisórias correlatas, bem como de indenização pelo dano moral decorrente da agressão, como se verá.

De outro ponto, tem-se que o pedido de indenização por danos morais e materiais, no ordenamento jurídico pátrio, encontra respaldo principalmente no inciso X do art. 5º da CR/88, que preceitua que "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação", bem como no art. 186 do Código Civil brasileiro, segundo o qual aquele que causa dano a outrem fica obrigado a repará-lo.

A partir da Constituição Brasileira de 1988, albergou-se como princípio fundamental, a valoração da dignidade da pessoa humana (foco ou centro para o qual deve convergir toda nossa atenção). É certo, no entanto, que esses valores se mostram acolchoados por um manto de subjetividade e/ou abstratividade valorativa (se é que deveriam sofrer essa espécie de quantificação) flagrantemente díspar em relação a cada um de nós. Contudo, essa sensação de sofreguidão pode ser por todos percebida e tateada, notadamente se nos abstrairmos do materialismo do mundo moderno, voltando-nos, nessa inflexão, à centralidade do homem (ser humano) como razão de ser de toda nossa existência. E esse é, certamente, o avanço de maior relevo da Carta Constitucional Brasileira de 1988.
Desse modo, condutas reprováveis e que nos tenham ou assemelhem como verdadeiros objetos (coisa), renegando-nos a nós mesmos enquanto seres humanos serão passíveis de recomposição. E essa recomposição, embora jamais pudesse ser vista como reparação ou indenização, como por sinal alude a própria Constituição, assim se reverterá, dada a impossibilidade de se restabelecer as pessoas envolvidas ao seu status quo ante, o que seria o ideal para esse tipo de ofensa, mas, contudo, impossível de ser alcançada, pelo menos através dos instrumentos e elementos culturais que o direito nos disponibiliza nos dias atuais.

Portanto, a "indenização" por dano moral decorrente do contrato de trabalho pressupõe um ato ilícito ou erro de conduta do empregador ou de preposto seu; o dano experimentado pelo ofendido e um nexo de causalidade entre a conduta injurídica e o dano, cumprindo ao Julgador examinar a presença concomitante desses pressupostos fático-jurídicos para, a partir da demonstração inequívoca especialmente do primeiro e segundo desses elementos mencionados, porquanto, relativamente ao dano, esse se caracteriza in re ipsa (através do próprio evento, ou seja, da ofensa perpetrada à dignidade da pessoa humana) imprimir a condenação referente à recomposição dos danos decorrentes à subversão dos valores subjetivos do empregado, causados pelo seu empregador.

No caso, é inquestionável que a agressão física suportada pela reclamante na presença dos demais colegas de trabalho e dos clientes encerra, em si mesma, a ocorrência inequívoca do dano, bem como a conduta injurídica do empregador e o nexo causal entre eles. O evento danoso gerou para a reclamante enorme constrangimento e humilhação, com ofensa à sua honra e dignidade, conduta reprovável e que impõe para o agressor o dever de indenizar (art. 186 do CC/02).

E o dano moral, entendido como o sofrimento físico e mental, a perda da paz interior, o sentimento de dor, desânimo e angústia, conquanto não-mensurável por critérios objetivos, enseja uma reparação que dê à vítima o conforto e a esperança de ver mitigado o seu sentimento de dor, de menos valia, de desconforto.

No caso, considerando a qualificação profissional da reclamante (garçonete), a sua última remuneração (R$465,00, recibo de f. 12)), e o porte médio do empreendimento da reclamada, que atua no ramo de bares e restaurantes, entende-se razoável fixar a indenização pelos danos morais suportados pela autora em três vezes o seu salário, o que vai representar R$1.395,00 (mil e trezentos e noventa e cinco reais), montante que se apresenta coerente com a gravidade da conduta patronal e se presta para reparar suficientemente a lesão sofrida e causar no agressor, em contrapartida, a justa medida da inconveniência do seu ato.

Dá-se provimento ao recurso da reclamante para reconhecer a rescisão indireta do contrato de trabalho e acrescer à condenação o pagamento de aviso prévio indenizado, os 40% rescisórios do FGTS e indenização por danos morais, no valor de R$1.395,00, devendo a reclamada fornecer o TRCT no código 01, sob pena de conversão da obrigação de fazer em obrigação de pagar o valor equivalente.

3.2 - HORAS EXTRAS

A reclamante se insurge contra a jornada fixada na sentença, especificamente quanto aos dias de trabalho, alegando que prestava serviços de segunda a sábado, portanto, em seis dias na semana, folgando um dia, de modo que o trabalho prestado de 16h00min à 1h00min, com uma hora de intervalo intrajornada, vai ensejar sobrejornada de quatro horas semanais, devendo a decisão ser reformada no particular. Alega, a recorrente, que a reclamada não contestou a sua alegação de que o trabalho se dava por seis dias na semana, com um de folga, fato que deve, portanto, ser tido como incontroverso e considerado para fins de apuração das horas extras postuladas.

Com razão, data venia do entendimento adotado na origem.

Com efeito, a reclamante alegou na inicial que trabalhava "de segunda a segunda-feira, (...) com uma folga semanal" (item 2, f. 03; grifos acrescidos), tendo a reclamada, em contrapartida, se limitado a alegar que "a jornada da reclamante jamais excedeu as quarenta e quatro horas semanais, sempre com regulares folgas semanais" (f. 40/41; grifos acrescidos), impugnação genérica quanto ao número de folgas semanais concedidas, autorizando, a princípio, o acolhimento da jornada alegada na inicial.

E muito embora a reclamada tenha justificado a não-apresentação dos cartões de ponto (petição de f. 44/46), documentos que se comprometeu em exibir (parte final da ata de f. 39), não comprovou que o trabalho da autora não se dava na intensidade noticiada na inicial (de segunda a segunda, com uma folga semanal), inexistindo nos autos prova contrária à jornada ali alegada, que deve, portanto, ser acolhida como verdadeira.

Importante registrar que as testemunhas ouvidas nos autos nada mencionaram a respeito da frequência semanal do trabalho, tendo se limitado a informar os horários de início e término (depoimentos de f. 36/39).

Diante do exposto, dá-se provimento ao recurso da reclamante para acrescer à condenação o pagamento de quatro horas extras semanais, acrescidas do adicional de 70%, no período abrangido pela cláusula quarta da CCT 07/08 (f. 15), e de 50% no período descoberto pela aludida norma coletiva, com reflexos em RSR e, após, em 13º salário, férias + 1/3 e FGTS + 40%, observados o divisor 220, a jornada semanal de seis dias de trabalho com um de folga, a evolução salarial da autora e a Súmula 264 do TST.

4 - CONCLUSÃO

Conhece-se do recurso e, no mérito, nos termos da fundamentação, dá-se-lhe provimento parcial para declarar a rescisão indireta do contrato de trabalho da reclamante e acrescer à condenação impressa na r. sentença recorrida o pagamento de aviso prévio indenizado, multa de 40% do FGTS e indenização por danos morais no valor de R$1.395,00, devendo a reclamada fornecer à autora o TRCT no código 01, no prazo de cinco dias após o trânsito em julgado desta decisão, sob pena de pena de conversão desta obrigação de fazer em obrigação de pagar o valor equivalente, bem como o pagamento de quatro horas extras semanais, acrescidas do adicional de 70%, no período abrangido pela cláusula quarta da CCT 07/08 (f. 15), e de 50% no período descoberto pela aludida norma coletiva, com reflexos em RSR e, após, em 13º salário, férias + 1/3 e FGTS + 40%, observados o divisor 220, a jornada semanal de seis dias de trabalho com um de folga, a evolução salarial da autora e a Súmula 264 do TST.

Para fins do disposto no art. 832, §3º, da CLT, declara-se que as horas extras, parcela acrescida à condenação, possui natureza salarial, assim como seus reflexos nos repousos semanais remunerados, aviso prévio, décimos terceiros salários e férias gozadas.

Eleva-se a condenação para R$2.600,00, com custas de R$52,00, a cargo da reclamada.

Fundamentos pelos quais,

ACORDAM os Desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, pela sua 6ª Turma, preliminarmente, à unanimidade, conhecer do recurso; no mérito, sem divergência, nos termos da fundamentação, dar-lhe provimento parcial para declarar a rescisão indireta do contrato de trabalho da reclamante e acrescer à condenação impressa na r. sentença recorrida o pagamento de aviso prévio indenizado, multa de 40% do FGTS e indenização por danos morais no valor de R$1.395,00, devendo a reclamada fornecer à autora o TRCT no código 01, no prazo de cinco dias após o trânsito em julgado desta decisão, sob pena de pena de conversão desta obrigação de fazer em obrigação de pagar o valor equivalente, bem como o pagamento de quatro horas extras semanais, acrescidas do adicional de 70%, no período abrangido pela cláusula quarta da CCT 07/08 (f. 15), e de 50% no período descoberto pela aludida norma coletiva, com reflexos em RSR e, após, em 13º salário, férias + 1/3 e FGTS + 40%, observados o divisor 220, a jornada semanal de seis dias de trabalho com um de folga, a evolução salarial da autora e a Súmula 264 do TST; para fins do disposto no art. 832, §3º, da CLT, declarar-se que as horas extras, parcela acrescida à condenação, possui natureza salarial, assim como seus reflexos nos repousos semanais remunerados, aviso prévio, décimos terceiros salários e férias gozadas; elevada a condenação para R$2.600,00, com custas de R$52,00, a cargo da reclamada.

Belo Horizonte, 10 de novembro de 2009.

EMERSON JOSÉ ALVES LAGE
DESEMBARGADOR - RELATOR




JURID - Rescisão indireta do contrato de trabalho. Agressão física. [11/12/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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