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segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

JURID - Responsabilidade civil. Empregada atacada por animal. [14/12/09] - Jurisprudência


Recurso ordinário do reclamado. Responsabilidade civil. Empregada doméstica atacada por animal de propriedade do empregador.


Tribunal Regional do Trabalho - TRT 4ª Região.

Processo nº 01163-2007-030-04-00-4 RO

EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMADO. RESPONSABILIDADE CIVIL. Empregada doméstica atacada por animal de propriedade do empregador. Configura negligência a manutenção de um rottweiler solto em pátio onde circulam pessoas, como os empregados da propriedade. A responsabilidade pelos danos causados pelo animal é do seu dono, a teor do art. 936 do Código Civil. Recurso desprovido.

VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM. Juiz da 30ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, sendo recorrente ELBIO GOROSTIDES GALARZA e recorrido ANTONIA NOEMI DOS SANTOS FLORES.

Irresignado com a sentença de fls. 100/106, complementada pela de embargos declaratórios (fls.110/111), ambas da lavra da Exma. Juíza Carmen Izabel Centena Gonzalez, que julgou parcialmente procedente a ação, interpõe o reclamado recurso ordinário às fls. 181/195, após o provimento, pela 9ª Turma deste Tribunal, de agravo de petição interposto contra sentença de embargos à execução, tendo sido acolhida a tese de nulidade da notificação da decisão de conhecimento, porque dirigida a procurador diferente daquele a quem a secretaria da Vara do Trabalho se comprometera a intimar (fls. 172/173).

Busca o reclamado, por meio do recurso ordinário, ser absolvido da condenação em indenização por danos morais e materiais. Mantida a condenação ou apenas reduzida esta, busca a exclusão dos honorários assistenciais deferidos. Com contra-razões da reclamante às fls. 202/209, sobem os autos a este Tribunal e são distribuídos na forma regimental.

É o relatório.

ISTO POSTO:

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS

O reclamado se insurge contra a sentença que o condenou em indenização por danos morais (R$ 15.000,00) e materiais (R$ 6.000,00), em decorrência do ataque de cão de sua propriedade, da raça rottweiler, à reclamante, que então era sua empregada doméstica.
Argumenta ser inaplicável a responsabilidade civil objetiva aos danos decorrentes de acidente de trabalho, porque tal encontraria óbice no art. 7º, XXVIII, da Constituição da República. Sustenta que, "ao contrário do que consta na sentença, não está demonstrada a culpa do empregador, uma vez que a prova dos autos demonstra que nunca houve incidente similar no local no qual permanecia o cachorro do recorrente". Tece considerações sobre a prova oral. Quanto aos danos materiais, sustenta a exclusão destes da condenação, porque "a recorrida não apresenta qualquer seqüela relativa à incapacidade laborativa em relação ao acidente sofrido" No que diz com os danos morais, além de postular a absolvição, formula pedido de redução, ao argumento, entre outros, de que sua fixação em quinze mil reais "desconsidera que o recorrente é empregador doméstico e não empresa que explorou a mão de obra da recorrida para atividade econômica visando lucro".

À análise.

É fato incontroverso que a reclamante foi atacada por cão da raça rottweiler, pertencente ao reclamado, em fazenda de propriedade deste na cidade de Dom Pedrito - RS, no dia 18.09.2004.

A indenização dos danos correspondentes é regida por norma específica, a do art. 936 do Código Civil, segundo o qual "o dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior".

Apenas a culpa exclusiva da vítima ou caso de força maior é que excluem, portanto, a responsabilidade do proprietário do animal pelo ressarcimento de dano por este causado a terceiros. Na hipótese dos autos, não há comprovação de tais excludentes. O recurso ordinário não veicula a tese de culpa da vítima ou de força maior, limitando-se às alegações de que o reclamado não foi responsável pelo ocorrido, tudo não passando de fatalidade.

Mesmo que assim não fosse, comunga-se do entendimento da Juíza de origem, de que houve postura evidentemente negligente do proprietário do animal.

A raça rottweiler é agressiva, o que é público e notório, oferecendo risco sério à integridade física de quem estiver a seu alcance, sendo responsabilidade do proprietário exercer guarda sobre o cão de forma a impedi-lo de atacar terceiros, o que não ocorreu no caso.

As testemunhas do reclamado disseram "que o cachorro do reclamado (rottweiler) costumava ficar solto na fazenda". Na data do infortúnio não foi diferente: "o cachorro estava no pátio, solto, perto da cozinha, como era comum". Este é o teor do depoimento de Zilei Reis de Souza (fl. 94). As informações são confirmadas por Dirceu de Araújo Soares (fl. 95).

É inafastável a conclusão da sentença, de que "o demandado não pode e não deve ter um cachorro da raça Rottweiler solto no pátio da sua fazenda, durante o dia, com pessoas transitando pelo local, ainda que nunca antes ou depois do acidente tenha havido - felizmente - outro infortúnio como esse" (grifo no original).

A alegação de que o acidente foi uma "fatalidade" não pode excluir a responsabilidade do reclamado. Dizer que "a reação do animal que mantinha solto não era presumível diante da sua postura habitual" é totalmente inócuo, porque contrário ao bom senso e à prudência exigidos de proprietários de animais perigosos.

Vale a citação, a respeito da matéria de responsabilidade do proprietário pelos danos causados pelo animal, do seguinte precedente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:

EMENTA: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL. Cabe indenização por danos morais quando o autor sofre lesões físicas provocadas pelo ataque de cães e a dona dos animais não comprova qualquer das excludentes de responsabilidade. Indenização não deve ser em valor ínfimo, nem tão elevada que torne desinteressante a própria inexistência do fato. Atenção às particularidades das circunstâncias fáticas e ao controle tarifário estabelecido pela Câmara. Indenização reduzida. Os danos materiais são indenizáveis quando sobejamente demonstrados nos autos por meio de roupas rasgadas e necessidade de assistência familiar. Apelação provida, em parte. Decisão unânime. (Apelação Cível Nº 70014657670, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana, Julgado em 03/08/2006 - grifado)

Quando da análise de caso estritamente análogo ao dos autos, a Relatora do Acórdão nº 00770-2002-008-04-00-1 RO (julgado em 28.06.2007 por esta 8ª Turma), Desa. Maria Cristina Schaan Ferreira, fez constar o seguinte trecho do Programa de Responsabilidade Civil, obra de autoria de Sérgio Cavalieri Filho (Editora Atlas, 7ª Edição, 2007), que merece transcrição:

"À luz do art. 1.527 do Código de 1916 parece-nos que não havia como fugir da presunção de culpa in vigilando ou in custodiando. E assim era porque aquele dispositivo permitia ao dono ou detentor do animal elidir sua responsabilidade provando que o guardava com cuidado preciso. Havia, portanto, a inversão do ônus da prova quanto à culpa, que deixava de incumbir à vitima e passava ao guarda.

Mas o Código de 2002 mudou de posição. O art. 936 não mais admite ao dono ou detentor do animal afastar sua responsabilidade provando que o guardava e vigiava com cuidado preciso, ou seja, provando que não teve culpa. Agora, a responsabilidade só poderá ser afastada se o dono ou detentor do animal provar fato exclusivo da vítima ou força maior. Temos, destarte, uma responsabilidade objetiva tão forte que ultrapassa os limites da teoria do risco criado ou do risco-proveito. Tanto é assim que nem todas as causas de exclusão do nexo causal, como o caso fortuito e o fato de terceiro, afastarão a responsabilidade do dono ou detentor de animal. A vítima só terá de provar o dano, e que este foi causado por determinado animal. A defesa do réu estará restrita às causas especificadas na lei, e o ônus da prova será seu." (sem grifos no original)

Estabelecida a responsabilidade do reclamado, perquire-se dos danos decorrentes do fato.

Não se pode dizer que os danos físicos foram de pequena monta. Ambas as testemunhas do reclamado confirmam que houve sangramento decorrente do ataque do cão, que mordeu o pescoço da reclamante, embora refiram que o sangramento tenha sido pequeno. A reclamante também necessitou de atendimento médico. Veja-se, a propósito, que já quatro dias após os fatos, tendo retornado a Porto Alegre (onde ambos os litigantes residem), permanecia necessária a realização de curativos no local ("região da carótida" - fl. 19). Mais: já no mês de novembro permanecia sob prescrição de medicamentos em decorrência dos mesmos fatos, relatando dores no local atingido, tendo havido indicação de procedimento cirúrgico para o dia 30.11.2004 (fl. 23). Além disso, a recorrida ficou marcada por cicatriz na região do pescoço, área do corpo sempre visível, o que caracteriza dano estético, conforme se observa pela fotografia juntada à fl. 16.

É evidente que de tal quadro decorre considerável abalo psíquico, que não pode deixar de ser indenizado. Acrescenta-se o fato de que a reclamante foi despedida em 13.11.2004, época em que estava, como visto, em tratamento médico. Embora não se discuta a licitude da rescisão, foi privada de sua remuneração em momento delicado, em que estava com problemas de saúde e necessitava de tratamento. Condenável, portanto, a postura do reclamado, sabedor que era do estado de sua funcionária e das razões disso.

O dano moral sofrido pelo empregado vítima de danos físicos decorrentes de acidente do trabalho não pode ser quantificado objetivamente, sendo ilusória, ainda, a pretensão de reparação, em face da impossibilidade de reconstituição do estado anterior à lesão.

Imperioso considerar, dessa forma, a natureza da indenização, que busca, a um só tempo, compensar o dano sofrido, punir o ato ilícito praticado e prevenir a ocorrência de situação similar no futuro, devendo ser sopesadas, na fixação do valor devido, a extensão do dano causado e a capacidade financeira do reclamado. É de se ressaltar, também, o caráter punitivo da indenização, que não se presta a dar causa a enriquecimento ilícito.

Entende-se razoável o valor de R$ 15.000,00 que a sentença fixa. Não se trata de quantum excessivo, mesmo em se tratando o reclamado de empregador doméstico, porque compatível com sua capacidade econômica e incapaz de ensejar enriquecimento ilícito para a reclamante, por menor que seja sua remuneração.

Quanto aos danos materiais, ao arbitrá-los a sentença leva em conta que a reclamante foi despedida em período no qual necessitava de tratamento, como se expôs. Vieram aos autos prescrições de medicamentos, da época imediatamente posterior aos fatos, como se vê às fls. 22 e 25.

Não se está diante de indenização decorrente da redução de capacidade para o trabalho (art. 950 do Código Civil), já que não houve instrução probatória a este respeito, mas sim de danos patrimoniais que a sentença considera presumíveis em razão da natureza dos fatos ocorridos. O reclamado sustenta não haver qualquer indício de que a reclamante tenha suportado danos de ordem patrimonial.

Os danos patrimoniais podem decorrer de motivos outros que não a perda da capacidade para o trabalho, hipótese específica de dano material regrada pelo art. 950 do CC, que estabelece a obrigação do responsável em pensionar mensalmente o lesado. Como já se disse, a autora necessitou de tratamento médico, bem como fazer uso de medicamentos, tendo sido despedida em 13.11.2004 (sendo que nos três dias anteriores estava inapta ao trabalho, a julgar pelos atestados médico de fls. 98/99).

Efetivamente, é presumível que a reclamante tenha necessitado arcar com custos decorrentes de sua patologia, devendo ser mantida a condenação.

Nega-se provimento.

Consideram-se prequestionados todos os dispositivos suscitados nas razões recursais, nenhum deles violados pela presente decisão.

HONORÁRIOS

A sentença recorrida condena o reclamado em honorários assistenciais, à razão de 15% sobre o valor bruto da condenação.

Recorre o reclamado, sustentando que, para o deferimento de honorários, devem estar preenchidos os requisitos da Lei nº 5.584/70. Invoca as Súmulas 11, 219 e 329, todas do TST.

Sem razão.

Revendo-se posicionamento sobre a matéria, entende-se aplicáveis, na Justiça do Trabalho, além das normas previstas na Lei nº 5.584/70, as disposições contidas na Lei nº 1.060/50, especialmente após o cancelamento da Súmula nº 20 deste Tribunal e tendo em vista a ampliação da competência da Justiça do Trabalho trazida pela EC nº 45/04, não se podendo reconhecer apenas aos sindicatos a assistência judiciária constitucionalmente estabelecida.

No caso, está ausente a credencial sindical (art. 14 da Lei nº 5.584/70). Por outro lado, colacionada à fl. 20 declaração de insuficiência econômica (art. 4º da Lei nº 1.060/50), fica afastada a incidência das Súmulas nos 219 e 329 do TST.

Quanto à base de cálculo, adota-se entendimento constante na Súmula nº 37 deste TRT: "HONORÁRIOS DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. BASE DE CÁLCULO. Os honorários de assistência judiciária são calculados sobre o valor bruto da condenação", não havendo o que alterar na sentença.

Nega-se provimento.

CRITÉRIOS DE JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA

A sentença posterga para a fase de liquidação a definição dos juros de mora aplicáveis, sendo harmônica com a jurisprudência desta Turma.

Quanto à atualização monetária, que a recorrente defende ser aplicável "a partir da prolação da decisão que reconheceu as indenizações", não há o que prover no apelo, pois a decisão foi justamente esta, conforme se verifica à fl. 105, sendo, inclusive, compatível com a Súmula 50 deste Tribunal.

Nega-se provimento.

Ante o exposto,

ACORDAM os Magistrados integrantes da 8ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região: por unanimidade, negar provimento ao recurso ordinário.

Intimem-se.

Porto Alegre, 29 de outubro de 2009 (quinta-feira).

DES. DENIS MARCELO DE LIMA MOLARINHO
Relator

Publicado em 03/12/09




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