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sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

JURID - Ação indenizatória. Agravo retido. Prova testemunhal. [11/12/09] - Jurisprudência


Ação indenizatória. Agravo retido. Prova testemunhal. Desnecessidade. Matéria eminentemente de direito.
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Tribunal Regional Federal - TRF 1ª Região.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2000.34.00.037273-8/DF

Processo na Origem: 200034000372738

RELATOR(A): DESEMBARGADORA FEDERAL SELENE MARIA DE ALMEIDA

APELANTE: LIDER TAXI AEREO S/A

ADVOGADO: LUIZ EDUARDO SA RORIZ E OUTROS(AS)

APELADO: UNIAO FEDERAL

PROCURADOR: MANUEL DE MEDEIROS DANTAS

EMENTA

AÇÃO INDENIZATÓRIA. AGRAVO RETIDO. PROVA TESTEMUNHAL. DESNECESSIDADE. MATÉRIA EMINENTEMENTE DE DIREITO. CONTRATO DE FORNECIMENTO DE HELICÓPTEROS PARA O DEPARTAMENTO DE POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL. POLÍTICA ECONÔMICA. MUDANÇA DO SISTEMA DE BANDAS PARA O DE LIVRE FLUTUAÇÃO DA TAXA DE CÂMBIO. MAXIDESVALORIZAÇÃO DA MOEDA NACIONAL FACE AO DÓLAR AMERICANO. DESEMBOLSO DE VALORES AO FORNECEDOR ESTRANGEIRO EM PATAMAR SUPERIOR AO PROJETADO. MANUTENÇÃO DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DO CONTRATO. LEI Nº 8.666/93, ART. 65, II, "D". TEORIA DA IMPREVISÃO. FATO DO PRÍNCIPE. AUSÊNCIA DO REQUISITO DA IMPREVISIBILIDADE. RISCO ORDINÁRIO DAS OPERAÇÕES CAMBIAIS.

1. Agravo Retido. Tratando-se de controvérsia sobre matéria eminentemente de direito, desnecessária a oitiva de testemunhas. O magistrado é o destinatário da prova, cabendo a ele, "de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias." (art. 130, do CPC).

2. As provas documentais colacionadas aos autos comprovam que o desembolso dos valores pela empresa recorrente para aquisição dos helicópteros junto ao fornecedor estrangeiro deu-se após a alteração da política cambial pelo Banco Central, em janeiro de 1999, ao contrário do entendimento adotado pelo juízo monocrático.

3. Equilíbrio econômico-financeiro (ou equação econômico-financeira) é, segundo Celso Antônio Bandeira de Mello, "a relação de igualdade formada, de um lado, pelas obrigações assumidas pelo contratante no momento do ajuste e, de outro lado, pela compensação econômica que lhe corresponderá. A equação econômico-financeira é intangível. (...) A idéia de que as obrigações contratuais devem ser entendidas em função das circunstâncias ao lume das quais se travou o ajuste longe está de ser construção moderna. Pelo contrário, sua origem remonta às lições do Direito Romano."

4. Entendidas as obrigações contratuais relacionadas ao estado fático existente ao tempo da contratação, as alterações importantes deste estado de coisas não podem ser desconsideradas. "O advento da primeira Guerra Mundial fez renascer o velho e salutar preceito contido na cláusula rebus sic standibus. Reapareceu com roupagem nova, sob as vestes de 'teoria da imprevisão'. Esforça-se em que a ocorrência de fatos imprevisíveis, anormais, alheios à ação dos contraentes, e que tornaram o contrato ruinoso para uma das partes, acarreta situação que não pode ser suportada unicamente pelo prejudicado. A instabilidade, a mutação profunda das condições econômicas, em antítese com o momento histórico precedente, não mais se compatibilizaram com o rigor formalístico prestigiado na concepção napoleônica". (Celso Antônio Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrativo, 19ª ed., Malheiros Editores, 2005, p. 602-615).

5. O princípio que recomenda a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato em caso de alteração imprevista do contexto fático que serviu de base ao assentamento do conteúdo da avença não implica na supressão do histórico pacta sunt servanda, fundamento sobre o qual se construiu toda a teoria dos contratos. A obrigatoriedade de cumprimento das convenções, antes princípio rígido, flexibiliza-se com a percepção de que seu seguimento incondicional pode, em certas situações, representar séria injustiça a uma das partes contraentes.

6. A Lei nº 8.666/93 consagrou, em seu art. 65, II, "d", a possibilidade de alteração dos contratos administrativos nos casos de desequilíbrio da equação econômico-financeira inicial "na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de conseqüências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual".

7. Reconhecem-se como requisitos de aplicação da teoria da imprevisão: a) imprevisibilidade do evento; b) inimputabilidade do evento às partes contratantes; c) modificação substancial das condições do contrato; d) ausência de impedimento absoluto.

8. O regime de livre flutuação da taxa de câmbio, motivado pelo clima de insegurança do mercado gerado pela negativa conjuntura econômica e política presente no início de 1999, teve início no dia 15 de janeiro daquele ano, quando o Banco Central emitiu o Comunicado nº 6.563 informando que naquele momento passaria a se abster de operar no mercado de câmbio, o que implicava a suspensão temporária do regime de bandas. No dia 18 daquele mês, o BACEN emitiu o Comunicado nº 6.565 informando que deixaria o próprio mercado definir a taxa de câmbio, nos seguimentos Livre e Flutuante, e que apenas interviria eventualmente para conter movimentos desordenados do câmbio.

9. É correta a afirmativa de que a mudança do sistema de bandas para o de livre flutuação da taxa de câmbio adotado pelo Banco Central não poderia ser prevista pelos contratantes no momento em que firmaram o instrumento de fornecimento de aeronaves. Todavia, não se pode alegar desconhecimento acerca da possibilidade de oscilação da taxa de cambio, vez que esta realidade sempre existiu, mesmo antes da política cambial adotada pelas autoridades monetárias em janeiro de 1999. Se a contratante dependia do ingresso do produto a partir de fornecedor externo, com pagamento em moeda estrangeira, é evidente que existia o risco de se deparar com taxa de câmbio diferente da esperada, seja para mais ou para menos.

10. O requisito da imprevisibilidade, desta feita, não se afigura no caso ora examinado, na medida em que a possibilidade de alteração da taxa de câmbio era realidade presente e conhecida pela empresa recorrente ao tempo da apresentação de sua proposta, bem como no momento da assinatura do contrato de fornecimento de helicópteros ao Departamento de Polícia Rodoviária Federal. A possibilidade de oscilação da moeda estrangeira consubstancia risco ordinário das operações cambiais, o que afasta a possibilidade de reparação com base na teoria da imprevisão.

11. "Ao contratar em moeda estrangeira, o empresário sabe e espera que sua obrigação seja quantificada segundo a variação cambial. O mercado de câmbio, por natureza, é variável. Tanto é assim que para livrar-se dos efeitos de uma valorização inesperada do dólar, existe a opção de contratação de operações de hedge. Ainda que se pudesse considerar imprevisível a súbita liberação do mercado cambial, pelo BACEN, em 18/01/99, através do Comunicado 6565, e a correspondente maxidesvalorização do real, não é possível transferir ao Estado os prejuízos decorrentes da álea de negócio vinculado à variação futura do dólar norte-americano". (Resp 549873/SC, rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, publ. DJ 25/10/2004 p. 224)

12. A apelante exerceu sua liberdade de contratar com o Poder Público e, assim agindo, sujeitou-se às circunstâncias do negócio jurídico, dentre as quais se incluiu a necessidade de se valer de fornecedor internacional para fazer frente à obrigação contratual assumida com a parte adversa. Poderia se abster de participar da concorrência se não queria assumir os riscos naturais do negócio.

13. A recorrente, não obstante a dificuldade financeira causada pela variação na cotação da moeda americana, adquiriu os helicópteros conforme a previsão contratual. Se a avença tornou-se de difícil ou incerto adimplemento, deveria ter renunciado ao cumprimento do contrato e arcado com as sanções nele previstas, e não pretender obter, indiretamente, a majoração do contrato por meio administrativo ou judicial sob a forma de indenização, com fundamento na desvalorização cambial.

14. Agravo retido da autora improvido.

15. Apelação da autora improvida.

ACÓRDÃO

Decide a Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 1a. Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido, bem como à apelação, nos termos do voto da Exma. Sra. Desembargadora Federal Selene Maria de Almeida.

Brasília, 11 de novembro de 2009.

SELENE MARIA DE ALMEIDA
Desembargadora Federal - Relatora

RELATÓRIO

A Exma. Sra. Desembargadora Federal SELENE MARIA DE ALMEIDA (Relatora):

Em exame apelação de Líder Taxi Aéreo interposta em face de sentença que julgou improcedente pedido de indenização dirigido contra a União fundado em alegação de rompimento do desequilíbrio econômico-financeiro de contrato de fornecimento de helicópteros destinados a serviço de remoção de vítimas de acidentes, resgates e operações especiais do Departamento de Polícia Rodoviária Federal.

Em preliminar, requer a apelante o julgamento do agravo retido de fls. 341/343 pelo qual postula a oitiva de depoimentos do ex-coordenador administrativo, do ex-coordenador de operações e do presidente da comissão de licitação do DPRF, com objetivo de comprovar que a Administração estava ciente de que o prazo limite para a entrega das aeronaves era insuficiente e que não teve culpa no atraso, além do fato de que a emissão das notas fiscais de faturamento datadas de 28.12.98 deveu-se a exigência da própria Administração.

Reportando-se aos fatos, diz a recorrente que após licitação pública assinou, em 15.12.1998, contrato prevendo o fornecimento de 5 helicópteros ao Departamento de Polícia Rodoviária Federal, incluindo acessórios e equipamentos sofisticados, necessários ao trabalho de transporte e remoção de vítimas de acidentes, resgates e operações especiais.

Ficou acertado o preço de cada unidade em R$ 2.173.737,64 (dois milhões, cento e setenta e três mil, setecentos e trinta e sete reais e sessenta e quatro centavos) e o valor global em R$ 10.868.688,22 (dez milhões, oitocentos e sessenta e oito mil, seiscentos e oitenta e oito reais e vinte e dois centavos). O preço unitário de cada aeronave, em dólares americanos, era US$ 1.496.387,00 (um milhão, quatrocentos e noventa e seis mil, trezentos e oitenta e sete dólares).

Segundo afirma a apelante, em 16 de dezembro de 1998 foi assinado um aditivo contratual visando o fornecimento de mais uma aeronave, correspondente a 20% do contrato original, com prazo de entrega em 31.12.1998.

Esclarece a recorrente que embora o contrato tenha sido assinado com valores em moeda nacional, o fornecimento das aeronaves e seus acessórios dependia de importação. Diz que dois dias após a assinatura do contrato o processo de licitação foi suspendido por decisão exarada pelo juízo da 3ª Vara Federal, em 17.12.1998, nos autos do Mandado de Segurança nº 98.30678-4, impetrado pela empresa Helibrás. Assim, foi obrigada a suspender o processo de importação junto a fornecedores estrangeiros.

Ressalta que em janeiro de 1999 o Governo Federal mudou de forma inesperada a política cambial brasileira, causando uma maxidesvalorização do Real frente ao dólar. Em conseqüência, a empresa informou ao DRPRF a impossibilidade de total cumprimento do contrato por motivos alheios à sua vontade e postulou a prorrogação do prazo para entrega dos helicópteros. O pedido foi atendido pela Administração, que prorrogou o prazo em 12.03.1999 para 30.04.1999.

Afirma a apelante que mesmo suportando enorme prejuízo cumpriu o contrato conforme seus termos e condições, no novo prazo acordado.

Aduz que em três ocasiões solicitou, sem êxito, o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato com fulcro no art. 65, § 5º, II, "d", da Lei nº 8.666/93, em face da oscilação cambial e da maxidesvalorização do Real frente ao Dólar. Diante da negativa da Administração, ajuizou a presente ação de rito ordinário, pretendendo indenização pelos prejuízos que alega ter sofrido.

Assevera a autora que a taxa de câmbio no momento de apresentação da proposta era de R$ 1,1929, mas as importações se deram com taxas de R$ 2,1070; 1,8465 e 1,7630, o que representa alterações de 77%, 55% e 48%, as quais resultaram em prejuízo da ordem de R$ 6.611.231,08 (seis milhões, seiscentos e onze mil, duzentos e trinta e um reais e oito centavos).

Alega a empresa que "o direito à manutenção da equação econômico-financeira de um contrato administrativo, ou à exata indenização que corresponda aos efetivos prejuízos suportados por um dos contratantes, quando rompida tal equação por fato do príncipe, é de índole constitucional, consubstanciada no art. 37, inciso XXI da CF e, também, de índole infraconstitucional, consubstanciada no art. 65, inciso II, alínea "d" e art. 58, §§ 1º e 2º da Lei 8666/93".

Referindo-se ao conteúdo da sentença, explica a apelante que as notas fiscais mencionadas pelo juízo monocrático, com data anterior à maxidesvalorização do Real (28.12.1998) são de simples faturamento, sem destaque de ICMS, com ressalvas expressas dessa condição, e foram emitidas para que a União pudesse empenhar as despesas e prorrogar a sua liquidação. Assevera que o que comprova a compra e pagamento dos helicópteros em data posterior à mudança da política cambial são os contratos de fechamento de câmbio, as faturas de venda das aeronaves da fornecedora estrangeira, as guias de recolhimento do ICMS, as guias de importação e desembaraço aduaneiro e as notas fiscais de entrada, documentos que não foram apreciados pelo juízo a quo.

Ao final, requer a apelante a reforma da sentença com a procedência do pedido, condenando-se a União a indenizá-la dos prejuízos efetivamente sofridos em decorrência do rompimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato de fornecimento de helicópteros, contemplando-se a variação cambial ocorrida entre a data da apresentação da proposta e a data do efetivo pagamento de cada helicóptero por parte da autora, aplicada tal variação ao preço ofertado na licitação, para cada aeronave, tudo acrescido de juros e correção monetária, além da fixação do pagamento de custas e honorários advocatícios em 20% do valor atribuído à causa.

A União apresentou contra-razões às fls. 406/431.

É o relatório.

VOTO

A Exma. Sra. Desembargadora Federal SELENE MARIA DE ALMEIDA (Relatora):

AGRAVO RETIDO

Por meio de agravo retido nos autos (fls. 341/343) a empresa Líder Taxi Aéreo insurge-se contra decisão que indeferiu pedido de produção de prova testemunhal, mediante oitiva dos depoimentos pessoais dos ex-dirigentes da Polícia Rodoviária Federal. Conforme se colhe da peça da autora (fl. 337), o pedido tem por objetivo "esclarecer alguns pontos suscitados na contestação da Ré, a fim de demonstrar principalmente: que a Administração estava ciente de que o prazo limite para a entrega das aeronaves era insuficiente e que seria, portanto, prorrogado; a sua ausência de culpa no atraso da entrega dos objetos contratados; e que a emissão das notas fiscais de simples faturamento, datadas de 28.12.99, deveu-se à exigência da própria Administração para possibilitar o empenho dos recursos ao exercício financeiro seguinte".

Ocorre que o caso tratado nos autos envolve matéria eminentemente de direito, como aliás reconhece a própria agravante no pedido de fl. 337, sendo, portanto, desnecessária a oitiva das pessoas arroladas pela autora.

Desta forma, não restam dúvidas que o magistrado a quo agiu com acerto, uma vez que os pontos controvertidos a serem solucionados resumem-se a questões de direito, as quais dispensam a produção de prova testemunhal.

Por outro lado, o magistrado é o destinatário da prova, cabendo a ele, "de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias." (art. 130, do CPC).

Neste sentido anda a jurisprudência desta Corte Regional e do Superior Tribunal de Justiça, conforme julgados a seguir transcritos:

"TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. PEDIDO DE PARCELAMENTO. CONFISSÃO IRRETRATÁVEL E IRREVOGÁVEL DO DÉBITO. DENÚNCIA ESPÔNTANEA. SELIC.

1. Se a questão judicial foi resolvida pelo exame de matéria eminentemente de direito, cuja análise, tornou prejudicada a apreciação da questão fática submetida à comprovação pericial, não caracteriza cerceamento de defesa o seu indeferimento.

(...)

5. Apelação não provida.

6. Peças liberadas pelo Relator, em 18/11/2008, para publicação do acórdão.

(AC 2000.01.00.083072-0/MT, Rel. Juiz Federal Rafael Paulo Soares Pinto (conv), Sétima Turma,e-DJF1 p.148 de 28/11/2008)

DIREITO CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. LOCAÇÃO. CITAÇÃO. RECEBIMENTO POR DIRETOR DA EMPRESA RÉ. TEORIA DA APARÊNCIA. APLICABILIDADE. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA. AFERIÇÃO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO DE ALUGUÉIS E ACESSÓRIOS. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. DESNECESSIDADE. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E IMPROVIDO.

1. É firme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça do sentido de ser válida a citação realizada na pessoa que se identifica como representante legal da empresa, sem ressalvas, em face da aplicação da Teoria da Aparência.

2. O julgamento antecipado da lide não importa em cerceamento de defesa quando o magistrado entende que o processo versa exclusivamente sobre matéria de direito, sendo desnecessária a produção de prova.

3. Hipótese em que, tendo a Corte de origem firmado a compreensão no sentido de que existiriam nos autos provas suficientes para o deslinde da controvérsia, rever tal posicionamento demandaria o reexame do conjunto probatório dos autos. Incidência da Súmula 7/STJ.

4. Para o ajuizamento de ação de despejo por falta de pagamento de aluguéis e acessórios, é despicienda a prévia notificação do locatário.

5. Recurso especial conhecido e improvido.

(REsp 834.482/RN, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, julgado em 06/09/2007, DJ 22/10/2007 p. 356)

PROCESSUAL CIVIL. PROVA PERICIAL. ARTS. 130, 330 E 535 DO CPC. SÚMULA 7/STJ.

(...)

2. A decisão pela necessidade ou não da produção de prova é uma faculdade do magistrado, a quem caberá decidir se há nos autos elementos e provas suficientes para formar sua convicção.

(...)

4. Recurso especial improvido.

(REsp 874735/RJ, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 27/03/2007, DJ 10/04/2007 p. 206)

Ante o exposto, nego provimento ao agravo retido.

APELAÇÃO

Em apertada síntese, pretende a empresa Líder Taxi Aéreo S.A. obter indenização da União sob o fundamento de que a alteração da política cambial promovida pelo Governo Federal em janeiro de 1999 causou desequilíbrio econômico-financeiro em contrato preexistente de fornecimento de helicópteros, em face da maxidesvalorização do Real perante o Dólar americano.

Explica a autora que assinou contrato em dezembro de 1998 prevendo o fornecimento de 5 helicópteros ao Departamento de Polícia Rodoviária Federal pelo preço total de R$ 10.868.688,22 (dez milhões, oitocentos e sessenta e oito mil, seiscentos e oitenta e oito reais e vinte e dois centavos).

Afirma que a maxidesvalorização do Real causou-lhe enorme prejuízo, da ordem de R$ 6.611.231,08 (seis milhões, seiscentos e onze mil, duzentos e trinta e um reais e oito centavos), uma vez que os helicópteros foram adquiridos no exterior com preço cotado em Dólar. Em outras palavras, para adquirir as aeronaves viu-se obrigada a um desembolso bem superior ao previsto no momento de celebração do contrato, pois o pagamento em Dólares ao fornecedor estrangeiro se deu após a substancial alteração das taxas de câmbio em seu desfavor.

O pedido foi julgado improcedente pelo juízo monocrático, que entendeu que as notas fiscais existentes nos autos demonstram que a aquisição das aeronaves se deu em 28.12.1998, portanto antes da maxidesvalorização do Real, não havendo, assim, que se falar em prejuízo.

Em seu apelo a empresa autora sustenta que as notas fiscais referidas na sentença não demonstram o momento da compra dos helicópteros pois foram emitidas para simples faturamento, para que a União pudesse empenhar as despesas e prorrogar sua liquidação. Indica outras notas fiscais e documentos que efetivamente comprovam que a compra das aeronaves ocorreu em data posterior à alteração cambial de janeiro de 1999.

Pugna a recorrente por indenização com fundamento na quebra do equilíbrio econômico-financeiro do contrato firmado com o Departamento de Polícia Rodoviária Federal.

No que concerne à apreciação das provas documentais colacionadas aos autos, constato que as mesmas comprovam que o desembolso dos valores pela empresa recorrente para aquisição dos helicópteros junto ao fornecedor estrangeiro deu-se após a alteração da política cambial pelo Banco Central, em janeiro de 1999, ao contrário do entendimento adotado pelo juízo monocrático.

Passo, desta feita, ao exame da questão jurídica que envolve a lide.

Sobre o assunto, trago de início lição de Celso Antônio Bandeira de Mello[1]:

"Equilíbrio econômico-financeiro (ou equação econômico-financeira) é a relação de igualdade formada, de um lado, pelas obrigações assumidas pelo contratante no momento do ajuste e, de outro lado, pela compensação econômica que lhe corresponderá.

A equação econômico-financeira é intangível. (...)

Como é de todos sabido, a idéia de que as obrigações contratuais devem ser entendidas em função das circunstâncias ao lume das quais se travou o ajuste longe está de ser construção moderna. Pelo contrário, sua origem remonta às lições do Direito Romano."

Citando Lúcio Bittencourt, acrescenta que "em Sêneca e Cícero, nas Decretais de Graciano, nas obras de Juan de Andréa e Bartolomeu de Brescia, já se encontravam a enunciação do princípio. Este ganhou com os bartolistas enunciação definitiva nos seguintes termos: 'contractus qui habent tractum sucessivum et dependentiam de futura rebus sic stantibus intelliguntur´.

Entendidas as obrigações contratuais relacionadas ao estado fático existente ao tempo da contratação, as alterações importantes deste estado de coisas não podem ser desconsideradas. Neste sentido, esclarece o professor Celso Antônio Bandeira de Mello:

"O advento da primeira Guerra Mundial fez renascer o velho e salutar preceito contido na cláusula rebus sic standibus. Reapareceu com roupagem nova, sob as vestes de 'teoria da imprevisão'. Esforça-se em que a ocorrência de fatos imprevisíveis, anormais, alheios à ação dos contraentes, e que tornaram o contrato ruinoso para uma das partes, acarreta situação que não pode ser suportada unicamente pelo prejudicado.

A instabilidade, a mutação profunda das condições econômicas, em antítese com o momento histórico precedente, não mais se compatibilizaram com o rigor formalístico prestigiado na concepção napoleônica. Com efeito, a idéia de imutabilidade do pactuado só é convivente com períodos de grande estabilidade. Fora daí, longe de servir à disciplina de relações sociais - como pretende o Direito -, só pode gerar empeço ao eficiente desenvolvimento delas.

Não é de surpreender, então, que, na própria França, em famoso aresto do Conselho de Estado (Gaz de Bordeaux, 1916), fosse proclamada a impossibilidade de um concessionário arcar com a totalidade dos prejuízos decorrentes de imprevisível alta de preços que tornara as tarifas insuficientes. Aliás, conforme advertência de Waline, as premissas da 'teoria da imprevisão' e suas conseqüências já haviam sido aplicadas em arestos precedentes e a própria voz 'imprevisão' fora dantes invocada, em 1905, no aresto 'Ville de Paris'. O aresto 'Labeye', de 1911, segundo o mesmo autor, concede indenização 'nada obstante todas as cláusulas em contrário'.

A teoria da imprevisão ganhou tomo e obteve larga aceitação assim na jurisprudência que na doutrina, tanto alhures como no Brasil.

Supunha-se, quando de sua aplicação inicial na França, tratar-se de remédio heróico, terapia provisória a ser aplicada sobre situação efêmera, marcada pela transitoriedade. Daí, certamente, a fisionomia altanto restritiva com que se apresentou naquele país, pois partilhava entre os contraentes os prejuízos advindos das altas imprevistas, na pressuposição de que se estava a enfrentar algo como uma crise, um fenômeno circunstancial, a ser logo superado. Ledo engano. A estabilidade dos tempos transactos foi superada em todo o mundo, como se acabou por reconhecer urbi et orbi (...)

Para a aplicação da teoria, entendia-se necessária a ocorrência de três requisitos, a saber:

a) que o prejuízo resultasse de evento alheio ao comportamento das partes, ou, no caso da Administração, estranho à sua posição jurídica de contratante;

b) que o evento determinante do prejuízo fosse não apenas imprevisto, mas também imprevisível;

c) que o prejuízo resultante para o onerado fosse significativo, isto é, gravemente convulsionador da economia do contrato.

No Direito brasileiro a teoria ganhou plena aceitação. Alcino Salazar faz ampla documentação disto em comentário sobre 'A cláusula rebus sic standibus, sua aplicação no Direito brasileiro'.

A teoria da imprevisão, que fora instaurada na França sob feição circunscrita, pois estabelecia partilha de prejuízos, assumiu novo caráter, inclusive porque se tornou evidente que os casos a serem por ela atendidos não correspondiam a fenômenos esporádicos, relacionados com situação efêmera. Deveras: em se verificando que a instabilidade adquirira foros de normalidade, por consectária de novo período histórico, razão alguma haveria para manipulá-la em guisa de paliativo limitado ao socorro de emergências, mero recurso ocasional balanceador de prejuízos incidentais.

Daí o haver-se afigurado com intuito idôneo para ajustar a normalidade dos contratos aos 'novos padrões de normalidade dos acontecimentos', se assim nos podemos expressar. Destarte, converteu-se em fórmula eficiente para garantir integralmente o equilíbrio econômico-financeiro avençado ao tempo da constituição do vínculo, vale dizer: instrumento de recomposição do equilíbrio estabelecido, o que, no fundo, nada mais representa senão prestigiar o significado real do consensus expressado no contrato, pela restauração dos termos da equivalência inicial, ou seja, de sua normalidade substancial."

Ressalte-se que o princípio que recomenda a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato em caso de alteração imprevista do contexto fático que serviu de base ao assentamento do conteúdo da avença não implica na supressão do histórico pacta sunt servanda, fundamento sobre o qual se construiu toda a teoria dos contratos. A obrigatoriedade de cumprimento das convenções, antes princípio rígido, flexibiliza-se com a percepção de que seu seguimento incondicional pode, em certas situações, representar séria injustiça a uma das partes contraentes.

Vale dizer: "o homem que adotou o pacta sunt servanda como norma obrigatória dos contratos tinha a postura de quem estava certo da estabilidade dos negócios e da moeda, onde o não cumprimento literal das avenças era questão de forte imoralidade, punível com sanções previstas no próprio acordo, além daquela mais grave e eficiente, a perda do crédito na praça. Por outro lado, o defensor da teoria da imprevisão enxerga além, desejoso que está em que não haja injustiça na relação credor-devedor pela simples satisfação de uma tradição, nos dias de hoje, injustificável. (...) O império da palavra empenhada deve ser mantido como princípio norteador das obrigações. Contudo devemos interpretá-lo de forma inteligente, pois acima dele está o império da Equidade e da Justiça."[2]

Em termos legislativos, a Lei nº 8.666/93 consagrou, em seu art. 65, II, "d", a possibilidade de alteração dos contratos administrativos nos casos de desequilíbrio da equação econômico-financeira inicial, nestes termos:

"Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:

(...)

II - por acordo das partes:

(...)

d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da Administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de conseqüências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual"

Comentando o dispositivo legal, Marçal Justen Filho destaca que "em nosso sistema jurídico não se aplicam alguns princípios peculiares ao Direito francês. Assim, não há diversidade de tratamento jurídico em vista da distinção entre fato do príncipe, teoria de imprevisão, fato da Administração ou caso fortuito. Todas essas hipóteses são agrupadas pelo art. 65, inc. II, 'd', para tratamento uniforme. Logo, não há utilidade em diferenciar as diversas hipóteses - ao menos, isso não acarreta tratamento jurídico distinto."[3]

A doutrina relaciona os seguintes requisitos - que devem ocorrer simultaneamente - para fins de aplicação da teoria da imprevisão:

a) imprevisibilidade do evento;

b) inimputabilidade do evento às partes contratantes;

c) modificação substancial das condições do contrato;

d) ausência de impedimento absoluto.

No caso tratado nestes autos a União, através do Departamento de Polícia Rodoviária Federal, firmou contrato com a empresa Líder Taxi Aéreo S.A. no dia 15 de dezembro de 1998 para aquisição de 5 (cinco) helicópteros, marca Bell, modelo B407, ano de fabricação 1998, monoturbina, com potência de 813 SHP e capacidade para sete pessoas, incluindo o piloto, conforme condições estabelecidas no Edital de Concorrência Pública nº 002/98 - processo nº 08.650.001.151/98-38.

Pela cláusula quarta do pacto ficou estabelecido o preço de R$ 2.173.737,64 (dois milhões, cento e setenta e três mil, setecentos e trinta e sete reais e sessenta e quatro centavos) por aeronave e R$ 10.868.688,22 (dez milhões, oitocentos e sessenta e oito mil, seiscentos e oitenta e oito reais e vinte e dois centavos) pelo total das cinco unidades (fl. 56).

A cláusula sexta estabeleceu que o pagamento seria efetuado em até 5 (cinco) dias contados a partir do recebimento definitivo do objeto da contratação (fl. 57).

Um aditivo ao contrato fez inclusão de mais um helicóptero ao acordo inicial, pelo mesmo valor previsto para as demais unidades, alterando o quantitativo para 6 (seis) aeronaves (fls. 65/67).

Não possuindo os helicópteros constantes do instrumento contratual, a empresa contratante recorreu à fornecedora Atlantic Corporation, pagando o preço de US$ 1.496.387,00 (um milhão, quatrocentos e noventa e seis mil, trezentos e oitenta e sete dólares americanos) por cada unidade adquirida (fls. 125/126).

Ocorre que entre a data da contratação e a data em que a empresa Líder Taxi Aéreo efetivou os pagamentos das aeronaves à fornecedora estrangeira as autoridades monetárias do Governo Federal implementaram a substituição do sistema de bandas pelo sistema de livre flutuação do dólar.

O regime de livre flutuação da taxa de câmbio, motivado pelo clima de insegurança do mercado gerado pela negativa conjuntura econômica e política presente no início de 1999, teve início no dia 15 de janeiro daquele ano, quando o Banco Central emitiu o Comunicado nº 6.563 informando que naquele momento passaria a se abster de operar no mercado de câmbio, o que implicava a suspensão temporária do regime de bandas. Logo em seguida, precisamente no dia 18 daquele mês, o BACEN emitiu o Comunicado nº 6.565 informando que deixaria o próprio mercado definir a taxa de câmbio, nos seguimentos livre e flutuante, e que apenas interviria eventualmente para conter movimentos desordenados do câmbio.

A alteração da política cambial visou precipuamente estancar um contínuo fluxo de perdas de reservas internacionais líquidas, iniciado no segundo semestre de 1998, bem como evitar um significativo aumento das taxas de juros.

A autora alega que em razão de forte alteração da taxa de câmbio acabou por desembolsar valor substancialmente superior ao previsto na aquisição dos helicópteros junto à fornecedora estrangeira. Junta contrato de operação de câmbio datado de 4 de março de 1999 em que praticada a taxa cambial de 2,1070 e afirma que na formação do preço da proposta comercial apresentada em 3 de novembro de 1998 projetou uma taxa de câmbio de 1,1929.

A recorrente atribui seu prejuízo à alteração da política cambial promovida pelo BACEN em janeiro de 1999, a qual reputa evento imprevisível no momento da contratação, sendo, destarte, cabível a aplicação da teoria do fato do príncipe para fins de recomposição do equilíbrio da equação econômico-financeira do contrato, com arrimo no art. 65, II, "d", da Lei nº 8.666/93.

É correta a afirmativa de que a mudança do sistema de bandas para o de livre flutuação da taxa de câmbio adotado pelo Banco Central não poderia ser prevista pelos contratantes no momento em que firmaram o instrumento de fornecimento de aeronaves.

Todavia, não se pode alegar desconhecimento acerca da possibilidade de oscilação da taxa de cambio, vez que esta realidade sempre existiu, mesmo antes da política cambial adotada pelas autoridades monetárias em janeiro de 1999. Se a contratante dependia do ingresso do produto a partir de fornecedor externo, com pagamento em moeda estrangeira, é evidente que existia o risco de se deparar com taxa de câmbio diferente da esperada, seja para mais ou para menos.

Caso a flutuação no momento da contratação da operação de câmbio houvesse sido para taxa inferior àquela calculada pela contratante no momento de apresentação de sua proposta, certamente se beneficiaria com um aumento do lucro, o qual seguramente não seria partilhado com a União. Mas ao lado desta possibilidade sujeitou-se a empresa também ao risco de aumento do preço da moeda americana em seu desfavor, como de fato veio a ocorrer.

O requisito da imprevisibilidade, desta feita, não se afigura no caso ora examinado, na medida em que a possibilidade de alteração da taxa de câmbio era realidade presente e conhecida pela empresa recorrente ao tempo da apresentação de sua proposta, bem como no momento da assinatura do contrato de fornecimento de helicópteros ao Departamento de Polícia Rodoviária Federal. Vale dizer: a possibilidade de oscilação da moeda estrangeira consubstancia risco ordinário das operações cambiais.

Sendo este risco imanente a contratações desta natureza - preço contratual em moeda nacional e pagamento ao fornecedor em moeda estrangeira, não há que se falar em socorro à teoria da imprevisão com o objetivo de buscar reparação da União por diferença decorrente da oscilação da taxa de câmbio, pois, como acima dito, a imprevisibilidade é condição sine qua non para que o prejudicado pleiteie o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato.

Acerca do requisito, confira-se o seguinte aresto do Superior Tribunal de Justiça:

"ADMINISTRATIVO. CONTRATO. EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO. AUMENTO SALARIAL. DISSÍDIO COLETIVO. APLICAÇÃO DA TEORIA DA IMPREVISÃO. IMPOSSIBILIDADE.

1. O aumento salarial determinado por dissídio coletivo de categoria profissional é acontecimento previsível e deve ser suportado pela contratada, não havendo falar em aplicação da Teoria da Imprevisão para a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato administrativo. Precedentes do STJ.

2. Agravo Regimental provido." (AgRg no Resp 417989/PR, rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, publ. DJe 24/03/2009)

Ao julgar improcedente o Resp 549873/SC, o STJ manteve acórdão que consignou o entendimento de que "ao contratar em moeda estrangeira, o empresário sabe e espera que sua obrigação seja quantificada segundo a variação cambial. O mercado de câmbio, por natureza, é variável. Tanto é assim que para livrar-se dos efeitos de uma valorização inesperada do dólar, existe a opção de contratação de operações de hedge. Ainda que se pudesse considerar imprevisível a súbita liberação do mercado cambial, pelo BACEN, em 18/01/99, através do Comunicado 6565, e a correspondente maxidesvalorização do real, não é possível transferir ao Estado os prejuízos decorrentes da álea de negócio vinculado à variação futura do dólar norte-americano". A ementa do referido acórdão teve a seguinte redação:

"RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PARIDADE CAMBIAL. INTERVENÇÃO ESTATAL NO DOMÍNIO ECONÔMICO. PRETENSÃO DE IMPUTAÇÃO DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA POR FORÇA DE ALTERAÇÃO DA PARIDADE CAMBIAL. CONSEQÜENTE DEVER DE INDENIZAR À UNIÃO E AO BACEN. FATORES INERENTES À CONJUNTURA INTERNACIONAL QUE SE ASSEMELHAM AO FATO DO PRÍNCIPE. IMPROCEDÊNCIA.

1. A intervenção estatal no domínio econômico é determinante para o setor público e indicativa para o setor privado, por força da livre iniciativa e dos cânones constitucionais inseridos nos arts. 170 e 174, da CF.

2. Deveras, sólida a lição de que um "dos fundamentos da Ordem Econômica é justamente a 'liberdade de iniciativa', conforme dispõe o art. 170, o qual, em seu inciso IV, aponta, ainda a 'livre concorrência' como um de seus princípios obrigatórios.: 'A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados o s seguintes princípios: (...) IV - livre concorrência'. Isto significa que a Administração Pública não tem título jurídico para aspirar reter em suas mãos o poder de outorgar aos particulares o direito ao desempenho da atividade econômica tal ou qual; evidentemente, também lhe faleceria o poder de fixar o montante da produção ou comercialização que os empresários porventura intentem efetuar. De acordo com os termos

constitucionais, a eleição da atividade que será empreendida assim como o quantum a ser produzido ou comercializado resultam de uma decisão livre dos agentes econômicos. O direito de fazê-lo lhes advém diretamente do Texto Constitucional e descende mesmo da própria acolhida do regime capitalista, para não se falar dos dispositivos constitucionais supramencionados. No passado ainda poderiam prosperar dúvidas quanto a isto; porém, com o advento da Constituição Federal de 1988, tornou-se enfaticamente explícito que nem mesmo o planejamento econômico feito pelo Poder Público para algum setor de atividade ou para o conjunto deles pode impor-se como obrigatório para o setor privado. É o que está estampado, com todas as letras, no art. 174: 'Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. (...)" (Celso Antônio Bandeira de Mello in "Curso de Direito Administrativo", 14ª ed. Malheiros, 2002, p. 619-620).

3. No afã de regular o comércio exterior e manter a sua balança de pagamentos equilibrada, o Estado-Soberano pode preconizar a paridade cambial, previsivelmente sujeita, quanto à sua estabilidade, ao comércio externo e à política internacional, fatos inimputáveis ao Estado Nacional, quer à luz da responsabilidade objetiva quer à luz da responsabilidade subjetiva, inerentes às hipóteses de atos omissivos, nos quais é imperioso detectar que a entidade pública tinha o dever de evitar o imprevisto que gerou dano a terceiros.

4. Consoante escorreitamente assentado no aresto recorrido "1. A União é parte ilegítima para figurar no pólo passivo das ações em que se discute direito à indenização por prejuízos decorrentes da súbita modificação da política cambial, estando legitimado, com exclusividade, o BACEN, que decidiu e implementou a liberação do mercado de câmbio. 1. (sic) Ao contratar em moeda estrangeira, o empresário sabe e espera que sua obrigação seja quantificada segundo a variação cambial. O mercado de câmbio, por natureza, é variável. Tanto é assim que para livrar-se dos efeitos de uma valorização inesperada do dólar, existe a opção de contratação de operações de hedge. 2. Ainda que se pudesse considerar imprevisível a súbita liberação do mercado cambial, pelo BACEN, em 18/01/99, através do Comunicado 6565, e a correspondente maxidesvalorização do real, não é possível transferir ao Estado os prejuízos decorrentes da álea de negócio vinculado à variação futura do dólar norte-americano. A teoria da imprevisão aplica-se aos contratantes, não vinculando terceiros. 3. A liberação do mercado de câmbio, pelo BACEN, na ocasião, é tida por regular, pois surgiu como alternativa capaz de proteger as reservas cambiais do Brasil. A volatização do mercado financeiro e de capitais, produto da globalização, é capaz de provocar súbitos desequilíbrios nas reservas cambiais, o que exige dos Governos modificações em sua política cambial, muitas vezes inesperadas ou mais drásticas que as esperadas, na tentativa de conter a liquidação da economia do país.(...)"

5. A existência de norma legal indicativa do exercício da intervenção no domínio econômico revela exercício regular de direito, mercê de não se inferir da norma jurídica qualquer atuar omissivo posto inexistente o dever legal de manutenção da paridade, o qual, se existente, poderia conduzir à culpa in ommittendo.

6. O fato do príncipe é argüível intra muros entre os particulares e extraterritorialmente pelo Estado, desde que o suposto fato imprevisível e danoso dependa de conjunturas internacionais, imprevisíveis, ad substantia.

7. A ciência jurídica-econômica não é mutável e eterna, como não são os ordenamentos voltados à regulação das atividades econômicas, sujeitas estas às mais diversas espécies de injunções internas e internacionais, como guerras, estratégias de proteção de produtos alienígenas, rompimento de relações diplomáticas, etc.

8. O Estado responde objetivamente pelos seus atos e de seus agentes que nessa qualidade causem a terceiros e, por omissão, quando manifesto o dever legal de impedir o ato danoso, hipótese em que a sua responsabilidade é subjetiva decorrente de imperícia ou dolo.

9. A ingerência de fatores exteriores aliada à possibilidade de o particular prevenir-se contra esses fatores alheios à vontade estatal, acrescido da mera natureza indicativa da política econômica revela a ausência de responsabilização do Estado.

10. Recurso Especial desprovido." (Resp 549873/SC, rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, publ. DJ 25/10/2004 p. 224)

A apelante exerceu sua liberdade de contratar com o Poder Público e, assim agindo, sujeitou-se às circunstâncias do negócio jurídico, dentre as quais se incluiu a necessidade de se valer de fornecedor internacional para fazer frente à obrigação contratual assumida com a parte adversa. Poderia se abster de participar da concorrência se não queria assumir os riscos naturais do negócio.

A título de argumentação, há que se considerar que se a contratante fosse a própria fabricante das aeronaves não estaria exposta a expressivos danos patrimoniais decorrente de possíveis oscilações da taxa de câmbio, porquanto o cumprimento do contrato não estaria a depender da aquisição do produto de fornecedores externos, permanecendo imune a variações cambiais.

A recorrente, não obstante a dificuldade financeira causada pela variação na cotação da moeda americana, adquiriu os helicópteros conforme a previsão contratual. Ora, se a avença tornou-se de difícil ou incerto adimplemento, deveria ter renunciado ao cumprimento do contrato e arcado com as sanções nele previstas, e não pretender obter, indiretamente, a majoração do contrato por meio administrativo ou judicial sob a forma de indenização, com fundamento na desvalorização cambial.

Entendo, com estas considerações, que a pretensão indenizatória postulada pela empresa Líder Taxi Aéreo nestes autos não merece prosperar, na medida em que inaplicável ao caso o disposto no art. 65, II, "d", da Lei nº 8.666/93, uma vez que ausente o requisito da imprevisibilidade exigido pela norma legal.

Pelo exposto, nego provimento ao agravo retido, bem como à apelação da autora.

É o voto.

e-DJF1: 27/11/2009



Notas:

1 - Curso de Direito Administrativo, 19ª ed., Malheiros Editores, 2005, p. 602-615. [Voltar]

2 - Klang, Márcio. A teoria da imprevisão e a revisão dos contratos, Revista dos Tribunais, 1983, p. 14-15. [Voltar]

3 - Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 13ª ed., São Paulo, Dialética, 2009, p.749-750. [Voltar]




JURID - Ação indenizatória. Agravo retido. Prova testemunhal. [11/12/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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