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sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

JURID - Crime de falsa identidade. Alegada atipicidade. [18/12/09] - Jurisprudência


Crime de falsa identidade. Alegada atipicidade, em face do princípio da autodefesa. Não acolhimento. Condenação mantida.


Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios - TJDFT.

Órgão: 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais

Classe: APJ - Apelação Criminal no Juizado Especial

N. Processo: 2007.03.1.036199-3

Apelante(s): ANTÔNIO ALDECI MOURA

Apelado(s): PÚBLICO DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS

Relator(a) Juiz(a): ARLINDO MARES

Relator(a) Juiz(a) Designado(a): TAVERNARD LIMA

EMENTA

PENAL. CRIME DE FALSA IDENTIDADE. ALEGADA ATIPICIDADE, EM FACE DO PRINCÍPIO DA AUTODEFESA. NÃO ACOLHIMENTO. CONDENAÇÃO MANTIDA. I. COMETE O CRIME PREVISTO NO ART. 307, DO CÓDIGO PENAL, AQUELE QUE, PRESO CONDUZIDO À DELEGACIA, SOB SUSPEITA DA PRÁTICA DE CRIME, SE ATRIBUI FALSA IDENTIDADE, DECLINANDO NOME FALSO A FIM DE ESCONDER SUA VIDA PREGRESSA CRIMINAL. II. TAL CONDUTA, EMBORA PRATICADA COMO FORMA DE AUTODEFESA, NÃO DESCARACTERIZA O CRIME, VEZ QUE TODO ACUSADO TEM O DIREITO CONSTITUCIONAL DE PERMANECER CALADO E ATÉ DE MENTIR SOBRE OS FATOS OBJETOS DA ACUSAÇÃO, MAS NÃO SOBRE SUA PRÓPRIA IDENTIDADE. (NOME) ATRIBUTO DA PERSONALIDADE. III. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. MAIORIA (VENCIDO O RELATOR). LAVROU O ACÓRDÃO O 1º VOGAL.

ACÓRDÃO

Acordam os Senhores Juízes da 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, ARLINDO MARES - Relator, TAVERNARD LIMA - Vogal e Relator Designado, EDI MARIA COUTINHO BIZZI - Vogal, sob a presidência do Juiz TAVERNARD LIMA, em CONHECER E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, POR MAIORIA, VENCIDO O RELATOR, REDIGIRÁ O ACÓRDÃO O 1º VOGAL, de acordo com a ata do julgamento.

Brasília (DF), 1º de setembro de 2009.

TAVERNARD LIMA
Presidente em exercício e Relator Designado

RELATÓRIO

ANTÔNIO ALDECI MOURA foi denunciado pelo Ministério Público, como incurso nas penas do art. 307, ambos do Código Penal, por duas vezes, porquanto, consoante a peça acusatória (fls. 68/ss):

"FATO I

No dia 10 de fevereiro de 2007, por volta das 22h45, nas dependências da 15ª. DP, Ceilândia/DF, o acusado, com vontade livre e consciente, atribuiu-se falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio.

Naquela oportunidade e local o acusado ao ser interrogado pelo Delegado de Polícia, identificou-se como Antônio Alcertly Alves Batista.

FATO II

No dia 03 de julho de 2007, por volta das 00h54, nas dependências da 15ª. DP, Ceilândia/DF, o acusado, com vontade livre e consciente, atribuiu-se falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio.

Naquela oportunidade e local o acusado ao ser interrogado pelo Delegado de Polícia, identificou-se como Antônio Alcerly Alves Batista".

Após regular transcurso da instrução criminal, sobreveio sentença, às fls. 92/ss, julgando procedente o pedido veiculado na denúncia, condenando o réu a uma pena de 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de detenção, em regime aberto, substituída por pena restritiva de direito a ser especificada pelo juiz da VEC.

Inconformado, apela o réu (fls. 111/ss), pugnando pela absolvição com fulcro no art. 386, III (não constituir o fato infração penal) do CPP.

Contra-razões às fls. 123/ss, nas quais o Ministério Público rebateu os argumentos deduzidos pela defesa, pugnando pela confirmação da decisão combatida.

Em seu parecer, o Ministério Público oficiou pelo conhecimento e improvimento do apelo (fls. 136/ss).

É o relatório.

VOTOS

O Senhor Juiz ARLINDO MARES - Relator

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Dispõe o art. 307 do Código Penal:

"Art. 307. Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem:

Pena: detenção, de 03 (três) meses a 01 (um) ano, ou multa, se o fato não constitui elementos de crime mais grave".

A materialidade do crime restou comprovada por meio dos autos de prisão em flagrante (fls. 16/ss e 26/ss, do laudo de perícia papiloscópica,(fls. 05/ss). A autoria também restou demonstrada por meio da confissão do apelante na Delegacia e em Juízo (fls. 13/ss), a qual se encontra em harmonia e coerência com o conjunto probatório constante dos autos.

A defesa interpõe o presente apelo visando à absolvição sob a alegação de que o réu agiu em autodefesa, uma vez que foi preso em flagrante e não quis identificar-se com o intuito de não auto incriminar-se e, que, por isso, sua atitude não pode ser censurada, por constituir exercício da ampla defesa.

De fato, merece guarida o recurso do apelante.

Não obstante o pronunciamento do Ministério Público pelo improvimento do recurso, impõe-se, certamente a absolvição do réu pela prática dos delitos do art. 307 do CP.

Não restam dúvidas de que o réu declarou nome falso à autoridade policial para evitar sua identificação. Contudo, o seu proceder não constitui fato típico, tendo em vista as garantias constitucionais do direito ao silêncio e não ser obrigado a depor contra si mesmo, consoante tem reiteradamente decidido o Superior Tribunal de Justiça e deste Tribunal, verbis:

HABEAS CORPUS. PENAL. ART. 157, INCISOS I E II, E ART. 307 DO CÓDIGO PENAL. CRIME DE FALSA IDENTIDADE. EXERCÍCIO DE AUTODEFESA. CONDUTA ATÍPICA. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DOS MAUS ANTECEDENTES. AUMENTO DA PENA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL EM RAZÃO DA PRESENÇA DE DUAS MAJORANTES. ILEGALIDADE.

EXASPERAÇÃO SEM FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. FASE INQUISITORIAL. RETRATAÇÃO EM JUÍZO. CONDENAÇÃO BASEADA EM ELEMENTOS DA CONFISSÃO. ATENUANTE. RECONHECIMENTO.

1. A conduta de se atribuir falsa identidade perante autoridade policial, para ocultar antecedentes criminais, não configura o crime descrito no art. 307 do Código Penal, tratando-se de hipótese de autodefesa, consagrada no art. 5.º, inciso LXIII, da Constituição Federal.

2. O acórdão de apelação, examinando as circunstâncias judiciais do caso concreto, consideraram desfavoráveis as circunstâncias e consequências do crime e os antecedentes e a personalidade do réu, razão pela qual, fundamentadamente, fixaram a pena-base acima do mínimo legal.

3. Entretanto, não pode o acórdão impugnado, dando provimento ao apelo acusatório, reconhecer como desfavoráveis os antecedentes do ora Paciente, mesmo porque, como bem entendeu a sentença monocrática, não restou provado que a folha de antecedentes juntada aos autos se referia ao réu, que não foi sequer devidamente identificado.

4. A presença de duas majorantes no crime de roubo (emprego de arma de fogo e concurso de agentes) não é causa obrigatória de majoração da punição em percentual acima do mínimo previsto, quando se faz necessária a indicação de circunstâncias que justifiquem o aumento.

5. Aplica-se a atenuante da confissão espontânea quando a confissão extrajudicial efetivamente serviu para alicerçar a sentença condenatória, ainda que tenha havido retratação em juízo.

6. Ordem concedida para restabelecer a sentença de primeiro grau, na parte em que absolveu o Paciente do crime de falsa identidade e, quanto ao crime de roubo qualificado, reformar o acórdão no tocante à individualização da pena, determinando que a Corte a quo afaste o aumento da pena-base pelos maus antecedentes, observe a atenuante da confissão espontânea e complemente os fundamentos utilizados na fixação do aumento de pena em decorrência da duas qualificadoras, sob pena de aplicação no mínimo legal.

(STJ - HC 120.249/RJ, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 24/03/2009, DJe 20/04/2009)

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PENAL - HABEAS CORPUS - CORRUPÇÃO DE MENOR - APRESENTAÇÃO DE FALSA IDENTIDADE NA FASE POLICIAL - ATIPICIDADE - ROUBO MAJORADO POR DUAS CIRCUNSTÂNCIAS ESPECIAIS - AUMENTO COM BASE TÃO SÓ NO QUANTITATIVO DAS CAUSAS DE AUMENTO - AUSÊNCIA DE OUTROS FUNDAMENTOS - IMPOSSIBILIDADE. ORDEM CONCEDIDA PARA ABSOLVER O PACIENTE PELO CRIME DE FALSA IDENTIDADE E FAZER AS PENAS PARA OS DEMAIS CRIMES RETORNAREM AO QUANTITATIVO DETERMINADO NA SENTENÇA.

1. A declaração de falsa identidade, na fase policial, para evitar o conhecimento dos antecedentes constitui figura atípica, porque amparado pela garantia constitucional de permanecer calado, ex vi do art. 5º, LXIII, da CF/88.

2. A existência de maus antecedentes justifica a aplicação das penas-base um pouco acima do mínimo legal.

3. O acréscimo pelas majorantes específicas só pode ir além do mínimo legal quando houver especial motivo para a exacerbação, devidamente fundamentado.

4. Ordem parcialmente concedida para absolver o paciente pelo crime de falsa identidade e fazer as penas para os demais crimes retornarem ao quantitativo fixado na sentença.

(STJ - HC 101.391/MS, Rel. Ministra JANE SILVA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG), SEXTA TURMA, julgado em 04/11/2008, DJe 01/12/2008)

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HABEAS CORPUS. FALSA IDENTIDADE PERANTE AUTORIDADE POLICIAL. AUTODEFESA. ATIPICIDADE. TENTATIVA DE ROUBO E RESISTÊNCIA. DESDOBRAMENTO. ABSORÇÃO. CONCURSO DE CRIMES. INOCORRÊNCIA. PRESENÇA DE DUAS QUALIFICADORAS. AUMENTO ACIMA DO MÍNIMO. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. INVIABILIDADE. MAUS ANTECEDENTES. AÇÕES PENAIS EM CURSO. EXASPERAÇÃO DA PENA. IMPOSSIBILIDADE. REINCIDÊNCIA ESPECÍFICA. AGRAVAMENTO DA PENA. AUSÊNCIA DE EXCESSO. PENA SUPERIOR A 4 (QUATRO) ANOS. REINCIDÊNCIA E CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL. REGIME FECHADO PARA O INÍCIO DE CUMPRIMENTO DA PENA.

ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.

1.Não se pode atribuir o crime previsto no art. 307 do Código Penal ao agente que se atribui falsa identidade perante autoridade policial para evitar sua prisão.

2. Para a configuração do delito de resistência é indispensável que haja lapso temporal entre a prática do roubo e a perpetração da violência.

3. A simples presença de duas qualificadoras não acarreta, por si só, o aumento da pena acima do mínimo previsto na lei.

4. Em obediência ao princípio constitucional da presunção de inocência, ações penais em curso não podem ser tidas como maus antecedentes.

5. Não se mostra desarrazoado o agravamento decorrente de reincidência específica do paciente.

6. Considerando que a pena foi fixada em patamar superior a 4 (quatro) anos, a existência de circunstância judicial desfavorável e o fato de o paciente ser reincidente, deve ser estabelecido o regime fechado para o início de cumprimento da pena.

7. Ordem parcialmente concedida.

(STJ - HC 97.857/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 21/10/2008, DJe 10/11/2008)

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PENAL. PROCESSO PENAL. ATRIBUIÇÃO DE FALSA IDENTIDADE. AUTODEFESA. ATIPICIDADE. RECURSO PROVIDO.

1- É atípica a conduta de atribuir-se falsa identidade perante autoridade policial, objetivando encobrir antecedentes criminais e evitar uma possível prisão.

2- Trata-se do exercício do direito de autodefesa assegurado constitucionalmente. Precedentes do STJ e TJDFT.

3- Recurso provido. Sentença reformada para absolver o denunciado.

4-. Sem custas e sem honorários.

(TJDFT - 20080110016155APJ, Relator CARMEN BITTENCOURT, Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do D.F., julgado em 28/04/2009, DJ 15/05/2009 p. 106)

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PENAL. CRIME DE FALSA IDENTIDADE (ART. 307 DO CÓDIGO PENAL). AUTODEFESA. ATIPICIDADE.

É atípica a conduta do acusado que, ao ser preso em flagrante, atribui-se falsa identidade para obter vantagem em proveito próprio, perfazendo sua declaração mecanismo de autodefesa. Precedentes do STJ. Ressalvado entendimento do relator.

Apelação desprovida.

(TJDFT -20060110482858APR, Relator MARIO MACHADO, 1ª Turma Criminal, julgado em 02/04/2009, DJ 26/05/2009 p. 160).

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PENAL. PROCESSO PENAL. ATRIBUIÇÃO DE FALSA IDENTIDADE (ART. 307, CAPUT, DO CP). AUTODEFESA. ATIPICIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. É atípica a conduta de atribuir-se falsa identidade perante autoridade policial, objetivando encobrir antecedentes criminais e evitar uma possível prisão. 2. Trata-se do exercício do direito de autodefesa assegurado constitucionalmente. Precedentes do STJ e TJDFT. 3. Recurso conhecido e provido. Sentença reformada para absolver o denunciado. 4. Sem custas e sem honorários.

(TJDFT - 20070310085365APJ, Relator ANA MARIA FERREIRA DA SILVA, Segunda Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do D.F., julgado em 03/03/2009, DJ 24/04/2009 p. 134)

Ante o exposto, dou provimento ao recurso para absolver o réu, com fundamento no art. 386, III do CPP.

É o voto.

O Senhor Juiz TAVERNARD LIMA - Presidente em exercício e Vogal

Peço vista.

A Senhora Juíza EDI MARIA COUTINHO BIZZI - Vogal

Aguardo.

DECISÃO

O Relatou deu provimento ao Recurso. Pediu vista o 1º Vogal. Aguarda a 2ª Vogal. Em 18.08.2009.

VOTO-VISTA

O Senhor Juiz TAVERNARD LIMA - Presidente em exercício e Relator Designado

O cerne da discussão reside na (a)tipicidade do crime de falsa identidade (CP, Art. 307: "Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem") à luz do direito de permanecer calado ou da autodefesa (CF, Art. 5º, LXIII: "o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado"), quando o provável móvel do agente dirige-se ao encobrimento de seus antecedentes criminais ou para não ser preso.

O ilustre Relator, na esteira de precedentes dos Tribunais Superiores e do TJDFT, envereda-se ao reconhecimento da atipicidade dessa conduta.

Com todo o respeito de que é merecedor o nobre Relator, não compartilharei dessa conclusão jurídica.

O eixo das garantias individuais é a dignidade da pessoa humana (CF, Art. 1º, III), e entre os seus atributos encontram-se os intransmissíveis e irrenunciáveis direitos de personalidade, nos quais se inserem o direito ao nome (CC, Art. 11 e 16). Esse direito ao nome - e, portanto à identificação - para a obtenção da prerrogativas inerentes à cidadania tem sido tão enfatizado que se tem a gratuidade do registro de nascimento perante o respectivo Cartório.

Se o direito ao nome é intransmissível e irrenunciável, todos, indistintamente, devem exercê-lo em plenitude, não só para o efeito de se distinguirem dos demais, com principalmente para serem não confundidos (ou se passarem) por outrem.

Essa cautela se acentua porque a liberdade de locomoção no território nacional em tempo de paz (CF, Art. 5º, XV) não é acompanhada de mínima averiguação do fluxo migratório, ou seja, os Municípios raramente possuem registros de seus habitantes para efeito de planejamento (e cumprimento de metas), o que se agrava em face da não interligação de dados entre as polícias judiciárias estaduais para fins de pronta identificação dos detidos.

Nesse quadro é que se revela, ainda, passível de punibilidade a conduta do agente que falseia a própria identidade perante as autoridades policiais ou judiciais por ensejo do interrogatório, porquanto afeta diretamente bem jurídico maior do Estado: a FÉ PÚBLICA.

O interesse de se evitar qualquer tipo de falsidade quanto à identificação pessoal não se resume ao tipo penal do Artigo 307 do CP, mas se irradia na Lei de Contravenção Penal (LCP, Art. 68: "Recusar à autoridade, quando por esta justificadamente solicitados ou exigidos, dados ou indicações concernentes à própria identidade, estado, profissão, domicílio e residência"), no Código Penal Militar (CPM, Art. 318: "Atribuir-se, ou a terceiro, perante a administração militar, falsa identidade, para obter vantagem em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem"), no Código Eleitoral (CE, Art. 309: "Votar ou tentar votar mais de uma vez, ou em lugar de outrem" ou Art. 352: "Reconhecer, como verdadeira, no exercício da função pública, firma ou letra que o não seja, para fins eleitorais), entre outros diplomas legais.

De outro ângulo, o direito à autodefesa está umbilicalmente ligado à imputação fática ou jurídica atribuída ao agente. Nesse espectro, ele tem garantida a faculdade de mentir ou de calar-se, desde que também não afete esfera jurídica de terceiro. Mas, o mesmo não se dá quanto à identificação, tanto que o Artigo 186 do CPP estatui que: "Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe foram formuladas" (grifo nosso), o que aplicável na fase inquisitiva por força do Art. 6º, V do CPP.

A gênese da garantia constitucional em foco (CF, Art. 5º, LXIII) não pode ser interpretada a ponto de deixar o Estado refém da "boa-fé" dos detidos, sobretudo se todo o expediente administrativo ou processual foi levado a termo com dados falsamente fornecidos pelo detido.

De fato, se o agente, no exato momento da detenção, fornece identificação falsa e logo é descoberta a fraude, poder-se-ia cogitar da situação de crime impossível (ineficácia absoluta do meio - CP, Art. 17), todavia se o autor do crime identifica-se perante a autoridade policial, em duas ocasiões distintas (em 10.2.2007 e em 03.7.2007 - lavratura de auto de prisão em flagrante), e se atribui nome falso em proveito próprio (ANTONIO ALCERLY ALVES BATISTA - e vez do verdadeiro ANTONIO ALDECI MOURA), é irrefutável a tipicidade das condutas.

Não posso deixar de registrar que enfocada conduta típica e antijurídica proporcionou um trabalho maior para o Estado (despesa e perda de tempo e de trabalho), ou seja, confecção de laudo de perícia papiloscópica (f. 06/08 e 46/49), a par de retificações em todas as documentações levadas a cabo, isto, sem descurar que efetivamente existe a pessoa de ANTONIO ALCERLY ALVES BATISTA que poderia experimentar o risco de ser confundido (e preso) em razão da ação criminosa do apelante, o que redundaria grave afetação ao seu direito de personalidade acima mencionado.

E, tradicionalmente quem comete aludido crime (CP, Art. 307), se vale de documentos extraviados ou falsificados, e no presente caso não foi diferente (f. 14).

Por derradeiro, mera recusa de fornecer os dados pessoais não afetaria a esfera jurídica de terceiro, o que diferencia - e muito - de indicá-los de modo fraudulento e para proveito próprio, ao extremo de causar o risco potencial de confusão entre as pessoas e de cerceamento de algum direito da vítima do uso indevido de seus dados pessoais.

Nesse trilhar, aponto a doutrina de GUILHERME DE SOUZA NUCCI:

"(...) Ora, se a lei permite que a pessoa já presa possa fugir, sem emprego de violência, considerando isso fato atípico, é natural que a atribuição de falsa identidade para atingir o mesmo fim também possa ser assim considerada. Não abrange, no entanto, o momento de qualificação, seja na polícia, seja em juízo, pois, o direito de silenciar ou mentir que possui o acusado não envolve essa fase do interrogatório. Não há, como já visto em itens anteriores, qualquer direito absoluto, de modo que o interesse na escorreita administração da justiça, impedindo-se que um inocente seja julgado em lugar do culpado, prevalece nesse ato. Daí por que, falseando quanto à sua identidade, pode responder pelo crime do art. 307." (in Código Penal Comentado, RT, 2ª Tiragem, 7ª edição, 2007, p. 986).

E, colaciono os precedentes acerca da tipicidade da conduta em comento: (20040910090088APJ, 1ª Turma Recursal do TJDFT, Rel. NILSONI DE FREITAS CUSTÓDIO, DJU 13.6.2005 e 20040310120199APJ, 2ª Turma Recursal, Rel. MARCO ANTONIO DA SILVA LEMOS, DJU 08.8.2005; 20060110471389APJ, 1ª Turma Recursal, Rel. SANDOVAL OLIVEIRA, DJU 28.11.2007; 20070110569872APJ, Rel. JESUÍNO RISSATO, 2ª Turma Recursal, DJ 18.11.2008).

Forte nesses argumentos, peço vênia ao ilustre Relator para manter a sentença condenatória em todos os seus termos.

É como voto

A Senhora Juíza EDI MARIA COUTINHO BIZZI - Vogal

Em minhas pesquisas sobre o assunto, verifiquei que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que configura crime.

Assim, peço vênia ao eminente Relator para acompanhar o voto da divergência e negar provimento ao recurso.

DECISÃO

Conhecido. Negado provimento. Maioria.

Publicado em 17/12/09




JURID - Crime de falsa identidade. Alegada atipicidade. [18/12/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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