Execução por título extrajudicial. Bem de família. Imóvel locado. Penhora.
Superior Tribunal de Justiça - STJ.
RECURSO ESPECIAL Nº 714.515 - SP (2005/0002209-8)
RELATOR: MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR
RECORRENTE: ALCIDES ANTÔNIO PAES DE CAMARGO
ADVOGADO: ANTONIO BENEDITO DE CAMPOS
RECORRIDO: BANCO NOSSA CAIXA S/A
ADVOGADO: ÉRICA MIGUEL XAVIER DA SILVA
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO POR TÍTULO EXTRAJUDICIAL. BEM DE FAMÍLIA. IMÓVEL LOCADO. PENHORA. JURISPRUDÊNCIA DO STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVIMENTO.
I. A orientação predominante nesta Corte é no sentido de que a impenhorabilidade prevista na Lei n. 8.009/90 se estende ao único imóvel do devedor, ainda que este se ache locado a terceiros, por gerar frutos que possibilitam à família constituir moradia em outro bem alugado ou utilizar o valor obtido com a locação desse bem como complemento da renda familiar.
II. Recurso especial conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Luis Felipe Salomão, Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJ/AP) e Fernando Gonçalves votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 10 de novembro de 2009(Data do Julgamento)
MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR
Relator
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR: Alcídes Antônio Paes de Camargo interpõe, pelas letras "a" e "c" do art. 105, III, da Constituição Federal, recurso especial contra acórdão do colendo Primeiro Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, assim ementado (fl. 59):
"Penhora - Bem de família - Imóvel alugado a terceiros - Descaracterização de bem de família - Requisito legal que exige a moradia do devedor ou de sua família - Renda revertida em proveito de residência, também alugada - Irrelevância - Não incidência do art. 1º da Lei 8.009/90 - Penhora mantida - Agravo improvido."
Sustenta o recorrente que o aresto violou os artigos 1º e 5º da Lei n. 8.009/1990. Diz que o banco recorrido apontou para penhora na execução que promove contra Fecularia Santo Antônio Ltda., do qual é sócio, a penhora de metade ideal de imóvel familiar. Apesar de não residir no bem, pois objeto de locação, com os valores do contrato aluga outro imóvel que melhor atende à rotina do núcleo familiar.
Confronta o acórdão estadual com o REsp n. 98.958-DF, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar.
Contrarrazões às fls. 88/94, onde defende a higidez do acórdão recorrido e a inaplicabilidade da Lei n. 8.009/1990 ao caso concreto.
O recurso especial foi admitido na instância de origem pelo despacho presidencial de fls. 104/105.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR (Relator): Trata-se de recurso especial, com fundamento nas letras "a"e "c" do autorizador constitucional, contra acórdão do colendo I Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, o qual considerou que, a despeito do imóvel penhorado do avalista ser o único do núcleo familiar, o fato de não se encontrar nele residindo, afasta a incidência da Lei n. 8.009/1990.
É apontada ofensa aos artigos 1º e 5º da Lei n. 8.009/1990, e divergência jurisprudencial com o REsp n. 98.958-DF, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar.
Preenchidos os requisitos recursais de admissibilidade, passo à análise meritória.
Sobre o tema, a orientação predominante nesta Corte é no sentido de que a impenhorabilidade prevista na Lei n. 8.009/90 se estende ao único imóvel do devedor, ainda que este se ache locado a terceiros, por gerar frutos que possibilitam à família constituir moradia em outro bem alugado ou utiliza o valor obtido com a locação desse bem como complemento da renda familiar.
Nesse sentido:
"EXECUÇÃO FISCAL. IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA. IMÓVEL OBJETO DA PENHORA. RESIDÊNCIA DA GENITORA E DO IRMÃO DO EXECUTADO. ENTIDADE FAMILIAR.
I - Conforme consignado no v. acórdão, o imóvel objeto da penhora serve de moradia ao irmão e à genitora do recorrido-executado, sendo que este mora em uma casa ao lado, a qual não lhe pertence, pois a casa de sua propriedade, objeto da penhora em questão, não comporta a moradia de toda a sua família.
II - O fato de o executado não morar na residência que fora objeto da penhora não tem o condão de afastar a impenhorabilidade do imóvel, sendo que este pode estar até mesmo alugado, porquanto a renda auferida pode ser utilizada para que a família resida em outro imóvel alugado ou, ainda, para a própria manutenção da entidade familiar. Precedentes, dentre outros: AgRg no Ag nº 902.919/PE, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe de 19/06/2008; REsp nº 698.750/SP, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJ de 10/05/2007.
III - No que toca à presença da entidade familiar, destaque-se que o recorrido mora ao lado de seus familiares, restando demonstrada a convivência e a interação existente entre eles.
IV - Outrossim, é necessário esclarecer que o espírito da Lei nº 8.009/90 é a proteção da família, visando resguardar o ambiente material em que vivem seus membros, não se podendo excluir prima facie do conceito de entidade familiar o irmão do recorrido, muito menos sua própria genitora. Precedentes: REsp nº 186.210/PR, Rel. Min. ARI PARGENDLER, DJ de 15/10/2001; REsp nº 450.812/RS, Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, DJ de 03/11/2004; REsp nº 377.901/GO, Rel. Min. FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, DJ de 11/04/2005.
V - Desse modo, tratando-se de bem imóvel do devedor em que residem sua genitora e seu irmão, ainda que nele não resida o executado, deve ser aplicado o benefício da impenhorabilidade, conforme a melhor interpretação do que dispõe o artigo 1º da Lei 8.009/90.
VI - Recurso especial improvido."
(1ª Turma, REsp 1.095.611/SP, Rel. Min. Francisco Falcão, unânime,
DJe de 01.04.2009
- - - - - - -- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. BEM DE FAMÍLIA. IMÓVEL LOCADO. IMPENHORABILIDADE.
1.Não obstante a Lei 8.009/90 mencionar "um único imóvel (...) para moradia permanente", a orientação desta Corte firmou-se no sentido de que a impenhorabilidade prevista na referida lei estende-se ao único imóvel do devedor, ainda que se encontre locado a terceiros, porquanto a renda auferida pode ser utilizada para que a família resida em outro imóvel alugado ou, ainda, para a própria manutenção da entidade familiar.
Nesse sentido: AgRg no Ag 679.695/DF, 5ª Turma, Rel. Min. Felix Fischer, DJ de 28.11.2005; REsp 670.265/SE, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 14.11.2005; REsp 735.780/DF, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 22.8.2005; REsp 698.332/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 22.8.2005; AgRg no Ag 576.449/SP, 4ª Turma, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ de 9.2.2005.
2. Recurso especial desprovido."
(1ª Turma, REsp 698.750/SP, Relatora Ministra Denise Arruda, unânime, DJU de 10.05.2007)
- - - - - - -- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
"BEM DE FAMÍLIA - IMÓVEL LOCADO - IMPENHORABILIDADE - INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DA LEI Nº 8.009/90.
O fato de o único imóvel residencial vir a ser alugado não o desnatura como bem de família, quando comprovado que a renda auferida destina-se à subsistência da família.
Recurso especial provido."
(3ª Turma, REsp 439.920/SP, Rel. Min. Castro Filho, unânime, DJU de 09.10.2003)
- - - - - - -- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. PENHORA DE IMÓVEL. BEM DE FAMÍLIA. LOCAÇÃO A TERCEIROS. CONSTRIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. LEI N. 8.009/90. SÚMULAS 7 E 83 DO STJ.
I. Inexiste maltrato ao art. 535 da Lei Adjetiva Civil, quando a matéria enfocada é devidamente abordada no âmbito do acórdão recorrido.
II. A orientação predominante no STJ é no sentido de que a impenhorabilidade prevista na Lei n. 8.009/90 se estende ao único imóvel do devedor, ainda que este se ache locado a terceiros, por gerar frutos que possibilitam à família constituir moradia em outro bem alugado.
III. 'A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial' - Súmula n. 7-STJ.
IV. 'Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida' - Súmula n. 83-STJ.
V. Agravo improvido.'
(4ª Turma, AgR-AG 576.449/SP, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, unânime, DJ 09.02.2005)
- - - - - - -- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -
'RECURSO ESPECIAL - EXECUÇÃO FISCAL - PENHORA - BENS DE FAMÍLIA - LEI N. 8.009/90 - ÚNICO IMÓVEL DA FAMÍLIA LOCADO A TERCEIROS - IMPENHORABILIDADE - PRECEDENTES.
Predomina nesta egrégia Corte Superior de Justiça o entendimento segundo o qual a locação a terceiros do único imóvel de propriedade da família não afasta o benefício legal da impenhorabilidade do bem de família (art. 1º da Lei n. 8.009/90). Com efeito, o escopo da lei é proteger a entidade familiar e, em hipóteses que tais, a renda proveniente do aluguel pode ser utilizada para a subsistência da família ou mesmo para o pagamento de dívidas (cf. REsp 462.011/PB, da relatoria deste Magistrado, DJ 02.02.2004).
'Dentro de uma interpretação teleológica e valorativa, calcada inclusive na teoria tridimensional do Direito-fato, valor e norma (Miguel Reale), faz jus aos benefícios da Lei 8.009/90 o devedor que, mesmo não residindo no único imóvel que lhe pertence, utiliza o valor obtido com a locação desse bem como complemento da renda familiar, considerando que o objetivo da norma foi observado, a saber, o de garantir a moradia familiar ou a subsistência da família' (REsp 159.213/ES, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, DJ 21.06.99).
Recurso especial improvido.'
(2ª Turma, REsp 445.990/MG, Rel. Min. Franciulli Netto, unânime, DJ de 11.04.2005)
Ante o exposto, conheço do recurso especial e lhe dou provimento, para afastar a penhora sobre o imóvel referenciado. Custas recursais pelo recorrido.
É como voto.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA
Número Registro: 2005/0002209-8 REsp 714515 / SP
Números Origem: 106901 12385190 200100001069
PAUTA: 10/11/2009 JULGADO: 10/11/2009
Relator
Exmo. Sr. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro FERNANDO GONÇALVES
Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. ANA MARIA GUERRERO GUIMARÃES
Secretária
Bela. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI
AUTUAÇÃO
RECORRENTE: ALCIDES ANTÔNIO PAES DE CAMARGO
ADVOGADO: ANTONIO BENEDITO DE CAMPOS
RECORRIDO: BANCO NOSSA CAIXA S/A
ADVOGADO: ÉRICA MIGUEL XAVIER DA SILVA
ASSUNTO: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, conheceu do recurso especial e deu-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Luis Felipe Salomão, Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJ/AP) e Fernando Gonçalves votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 10 de novembro de 2009
TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI
Secretária
Documento: 927750
Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 07/12/2009
JURID - Bem de família. Imóvel locado. Penhora. [17/12/09] - Jurisprudência
Nenhum comentário:
Postar um comentário