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quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

JURID - Apelação cível. Fornecimento de medicamentos. [03/12/09] - Jurisprudência


Apelação cível. Ação de obrigação de fazer c/c pedido de tutela antecipada. Fornecimento de medicamentos.
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Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte - TJRN.

Julgamento: 05/11/2009

Órgão Julgador: 3ª Câmara Cível

Classe: Apelação Cível

Apelação Cível n° 2009.009583-1

Origem: 1ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Natal/RN.

Apelante: Estado do Rio Grande do Norte.

Procuradora: Adriana Torquato da Silva Ringeisen. 1997/RN

Apelada: Ceres Guerra Porpino Dias.

Advogada: Gladis Rosane Schmidt. 3053/RN

Advogado: João Carlos dos Santos

Advogada: Hígia Betânia Pessoa

Advogado: Dyanne Barbosa de Azevedo

Relator: Desembargador Vivaldo Pinheiro.

EMENTA: CONSTITUCIONAL E PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. TRANSFERÊNCIA PARA O MÉRITO. MÉRITO: OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS. SENTENÇA VÁLIDA. RECONHECIMENTO DO DIREITO. PRECEITO COMINATÓRIO. DIREITO À VIDA, SAÚDE E DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. INAPLICABILIDADE DA RESERVA DO POSSÍVEL. ORIENTAÇÃO DO STF. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTO. SITUAÇÃO DE CARÊNCIA DO PACIENTE. DEVER DO PODER PÚBLICO. PRECEDENTES UNÍSSONOS DESTE EGRÉGIO TRIBUNAL, DO STJ E DO STF. CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO DO RECURSO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas:

Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em transferir a preliminar de nulidade da sentença por ausência de formação de litisconsórcio passivo necessário, suscitadas pelo ora Apelante para o mérito. No mérito, em consonancia com o parecer da 18ª Procuradoria de Justiça, por idêntica votação, conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.

RELATÓRIO

1. Trata-se de Recurso de Apelação Cível interposto pelo Estado do Rio Grande do Norte contra Ceres Guerra Porpino Dias, face à sentença proferida em sede de Ação de Ordinária c/c Pedido de Tutela Antecipada na qual o Juízo de Primeiro Grau julgou procedente o pedido inicial e confirmou a tutela antecipada anteriormente concedida "no que tange ao fornecimento da medicação solicitada".

2. Inconformado, o Estado interpôs recurso de apelação cível apontando, preliminarmente, nulidade da sentença por ausência de formação de litisconsórcio passivo necessário com a União e o Município do Natal, consequentemente deslocando o feito à Justiça Federal.

3. Destacou a impossibilidade de o Poder Judiciário determinar prestações por parte do Poder Público sem que existam meios disponíveis para tanto, sob pena de penalizar os recursos concernentes aos outros deveres do Estado.

4. Afirmou que existem outros medicamentos de menor custo que se prestam ao mesmo fim e representam menor sacrifício ao erário.

5. Ao final, requereu o acolhimento da preliminar e, no mérito, pugnou pelo provimento do recurso para reformar a sentença de Primeiro Grau, julgando improcedente o pedido formulado na incial ou, eventualmente, manifestação explícita das matérias pertinentes às Leis Federais e artigos constitucionais.

6. Às fls. 88/98 a apelada ofereceu contrarrazões ao presente recurso, pugnando pelo seu conhecimento e improvimento.

7. O Ministério Público, através da Décima Oitava Procuradoria de Justiça emitiu parecer de estilo em que ratificou os termos da sentença de Primeiro Grau e opinou pelo não conhecimento da preliminar suscitada, e, no mérito, pelo conhecimento e improvimento do apelo.

8. É o relatório. Segue o voto.

VOTO

PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR AUSÊNCIA DE FORMAÇÃO DO LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO SUSCITADAS PELA PARTE APELANTE

9. Ab initio, verifica-se que a matéria denominada de preliminar pela parte ora apelante se confundem com o próprio mérito da demanda, razão porque voto pela transferência da mesma para a análise do mérito recursal.

10. Ressalta-se, outrossim, que não deixo de conhecer da preliminar suscitada, uma vez que, ao contrário do posicionamento adotado pelo Órgão Ministerial, entendo que não houve preclusão da matéria, por ser a mesma de ordem pública, bem como por ter havido apontamento da matéria em prelimar da contestação.

MÉRITO

11. Preenchidos os requisitos de admissibilidade conheço da presente Apelação Cível.

12. Inicialmente, sustentou o recorrente a deficiência na formação do pólo passivo da demanda, sob o argumento de haver responsabilidade solidária entre o Estado, o Município e a União, nos ônus da política pública de saúde.

13. Segundo as disposições constitucionais, a saúde pública consubstancia direito fundamental do homem e dever do Poder Público, ou seja, a União, os Estados-membros, o Distrito Federal e os Municípios, conjuntamente, devem garantir o direito à saúde aos cidadãos, que inclui, por razões lógicas, o fornecimento gratuito de medicamentos e congêneres a pessoas desprovidas de recursos financeiros para a cura, controle ou atenuação de enfermidades.

14. Cumpre transcrever o art. 196 da Constituição Federal:

"Art. 196 - A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação."

15. Assim, à luz do art. 196 da Constituição Federal, trata-se de responsabilidade solidária entre os entes federados, desempenhando atividades de forma conjunta, assegurando o direito fundamental à saúde, uma vez que conforme se observa o artigo supramencionado se refere ao Estado de forma dilatada, albergando todas as pessoas políticas.

16. Conseqüentemente, o Estado, a União e o Município são responsáveis solidários, podendo figurar no pólo passivo deste tipo de feito tanto em conjunto, quanto separadamente.

17. Assim, o necessitado de medicamento pode pleitear a qualquer ente federativo, sem a necessidade de chamamento ao processo, conforme, aliás, orientação desta Corte:

"EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INTRUMENTO. DECISÃO QUE DEFERIU PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DA TUTELA, PARA DETERMINAR AO AGRAVANTE QUE FORNECESSE MEDICAMENTO PARA TRATAMENTO INDISPENSÁVEL À SAÚDE. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM E DE NECESSIDADE DE FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO, AMBAS SUSCITADAS PELO AGRAVANTE. DESNECESSIDADE DE INCLUSÃO DA UNIÃO E DO ESTADO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO PODER PÚBLICO. REJEIÇÃO. MÉRITO. COMPROVAÇÃO DA NECESSIDADE DE MEDICAMENTOS. DIREITO À SAÚDE. GARANTIA FUNDAMENTAL ASSEGURADA NAS CONSTITUIÇÕES FEDERAL E ESTADUAL. CONSTATAÇÃO DO PERIGO DE DANO IRREPARÁVEL À SAÚDE DA AGRAVADA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO." (AI 2007.005731-6, 2ª Câmara, Rel. Des. Claudio Santos, j. 13.11.07)

18. Compulsando os autos verifica-se que o cerne recursal consiste na análise da responsabilidade do Estado em fornecer ao autor medicamento indispensável à saúde.

19. O Estado do Rio Grande do Norte aduziu a violação ao princípio da legalidade orçamentária que, ao meu sentir, não merece prosperar. Ocorre que, as ações e serviços na área da saúde têm por escopo o atendimento integral do indivíduo, no qual se inclui o fornecimento do medicamento necessário à preservação da saúde e da vida, ainda que não padronizado pelo Ministério da Saúde, haja vista o direito fundamental que deve ser garantido pelo Estado, ora agravante, independentemente da existência de orçamento específico para tanto.

20. Sobre o tema, é válido salientar o posicionamento da Jurisprudência dos Tribunais no sentido de garantir judicialmente o direito à saúde, ainda que, aparentemente, não haja recurso financeiro disponível. Fala-se em 'aparentemente', pois sabe-se que há a possibilidade de utilização de créditos adicionais ou remanejamentos de verbas de uma rubrica menos importante para outra mais essencial. Há precedente desta Corte e Câmara no mesmo sentido:

"EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA. PRESTAÇÃO QUE PODE SER EXIGIDA DA UNIÃO, DOS ESTADOS E DOS MUNICÍPIOS, ISOLADAMENTE, CONTRA DOIS DELES, OU ATÉ MESMO CONTRA TODOS. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE ORÇAMENTÁRIA E DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. DIREITO À SAÚDE. GARANTIA CONSTITUCIONAL. PRESENÇA DOS PRESSUPOSTOS AUTORIZADORES DA CONCESSÃO DA TUTELA ANTECIPADA. PACIENTE QUE APÓS SER SUBMETIDO AO TRATAMENTO CONVENCIONAL DE QUIMIOTERAPIA, APRESENTOU RECIDIVA DA DOENÇA. NECESSIDADE DE INTRODUÇÃO DE NOVO MEDICAMENTO, FACE À FALÊNCIA DOS ESQUEMAS ANTERIORES. CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO DO RECURSO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA."

(Agravo de Instrumento N.º 2007.002154-8, 1ª Câmara. Rel. Dr. Nilson Cavalcanti - juiz convocado, DJ 18/07/2007).

"EMENTA: CONSTITUCIONAL E PROCESSO CIVIL. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. INOCORRÊNCIA. PROCESSO NECESSÁRIO, ÚTIL E ADEQUADO. CARÊNCIA DE AÇÃO NÃO VERIFICADA. REJEIÇÃO. DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. OBRIGAÇÃO ESTATAL. REMESSA NECESSÁRIA CONHECIDA E NÃO PROVIDA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA A QUO.

1. Constitui obrigação estatal, prescrita na Carta Magna, proporcionar ao cidadão o tratamento necessário, bem como fornecer os medicamentos imprescindíveis à cura ou prolongação da vida.

2. Remessa necessária conhecida e não provida."

(Apelação Cível N.º 2005.004864-1, 1ª Câmara. Rel. Des. Expedito Ferreira, DJ 18/07/2007).

21. Não se pode olvidar que, in casu, o que se pretende tutelar é bem jurídico da maior importância, qual seja, a vida humana, cuja proteção decorre de imperativo constitucional, como prevê o art. 5º, caput, da Constituição Federal, tendo primazia sobre qualquer bem ou interesse meramente patrimonial.

22. Neste diapasão, tendo em consideração que os medicamentos pleiteados serão utilizados na tentativa de prolongar a vida do apelado - vivência com dignidade da pessoa humana, qualidade - observado o espírito da lei, entendo que o magistrado de Primeiro Grau agiu com acerto, determinando ao apelante e ao Município de Natal que arcasse com os custos do tratamento.

23. É preciso aplicar a proporcionalidade e a razoabilidade para investigar qual a maneira mais eficiente de proteção da pessoa humana, encontrando um ponto de equilíbrio que atenda o fim da supremacia do interesse público, o que, no caso em testilha, leva à forçosa conclusão de que a economia proporcionada aos cofres públicos diante do risco à saúde e vida de um ser humano é um valor secundário a ser considerado.

24. Quanto à questão da reserva do possível, compreendo que não pode ser utilizada pelo Estado com o fito de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, sendo que, conforme precedentes do próprio STF não cabe ser aplicada contra pretensões razoáveis e quando houver lastro financeiro por parte da administração para a empreitada. Ressalte-se que não basta afirmar a inexistência de disponibilidade orçamentária, é preciso comprová-la.

25. Não se aplica a reserva legal quanto ao presente caso pois vida e saúde são, nas letras do STF: "bens máximos e impossíveis de ter sua proteção postergada". (AgRg no Resp 921590/RS, Ministra Eliana Calmon - julgado em 29/08/2007).

26. No que tange a alegação do Estado Apelante no que diz respeito a escolha do medicamento, igualmente não merece prosperar, uma vez que na receita firmada pelos médicos responsáveis pelo acompanhamento clínico da apelada, encontra-se a prescrição do tratamento medicamentoso buscado na petição inicial, devendo, até prova em contrário, ser o medicamento mais adequado para o controle da patologia, salvo no caso de ser comprovado que outro medicamento cumpra com os mesmo benefícios.

27. Ante o exposto, em consonância com parecer da 18ª Procuradoria de Justiça, conheço e nego provimento ao presente recurso de Apelação Cível para manter a decisão de Primeiro Grau por seus próprios e jurídicos fundamentos, bem como nos termos deste voto.

É como voto.

Natal, 05 de novembro de 2009.

Desembargador AMAURY MOURA SOBRINHO
Presidente

Desembargador VIVALDO PINHEIRO
Relator

Doutora DARCI DE OLIVEIRA
2ª Procuradora de Justiça




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