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segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

JURID - Ação penal. Prova. Mandado de busca e apreensão. [07/12/09] - Jurisprudência


Ação penal. Prova. Mandado de busca e apreensão. Cumprimento pela Polícia Militar. Licitude.
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Supremo Tribunal Federal - STF.

DJe nº 200 Divulgação 22/10/2009 Publicação 23/10/2009 Ementário nº 2379-7

SEGUNDA TURMA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 404.593-1 ESPÍRITO SANTO

RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO

RECORRENTE(S): RONALDO BELO DE CARVALHO

ADVOGADO(A/S): AMARILDO DE LACERDA BARBOSA

RECORRIDO(A/S): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

1. RECURSO. Extraordinário. Inadmissibilidade. Necessidade de exame prévio de eventual ofensa à lei ordinária. Ofensa meramente reflexa ou indireta à Constituição Federal. Não conhecimento parcial do recurso. Precedente. Se, para provar contrariedade à Constituição da República, se deva, antes, demonstrar ofensa à lei ordinária, então é esta que conta para efeito de juízo de admissibilidade do recurso extraordinário.

2. AÇÃO PENAL. Prova. Mandado de busca e apreensão. Cumprimento pela Polícia Militar. Licitude. Providência de caráter cautelar emergencial. Diligência abrangida na competência da atividade de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública. Recurso extraordinário improvido. Inteligência do artigo 144, parágrafos 4º e 5º da CF. Não constitui prova ilícita a que resulte do cumprimento de mandado de busca e apreensão emergencial pela polícia militar.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência da Senhora Ministra ELLEN GRACIE, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em conhecer, em parte, do recurso e, na parte conhecida, negar-lhe provimento, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Senhores Ministros CELSO DE MELLO e JOAQUIM BARBOSA.

Brasília, 18 de agosto de 2009.

Ministro CEZAR PELUSO - Relator

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - (Relator): 1. Trata-se de recurso extraordinário contra acórdão do Tribunal de Justiça do Espírito Santo e assim ementado:

"APELAÇÃO CRIMINAL - PRELIMINAR DE NULIDADE: PROVAS OBTIDAS POR MEIO ILÍCITO E DESCUMPRIMENTO DO ARTIGO 68 DO CPP - REJEITADAS - MÉRITO: TRÁFICO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE - NÃO SE EXIGE ATOS DE MERCANCIA - CONDUTA 'TER EM DEPÓSITO' - DEPOIMENTOS DE POLICIAIS MILITARES - PROVA VÁLIDA - RECURSO IMPROVIDO - UNANIMIDADE.

I - Preliminar de nulidade: provas obtidas por meio ilícito, rejeitada, unanimidade, pois o mandado de busca e apreensão, devidamente cumprido pela Polícia Militar, não ofendeu o artigo 144, parágrafos 4º e 5º da Constituição Federal, mesmo não estando presentes o Promotor de justiça e o Delegado de Policia.

Ademais, sob o enfoque de menor rigor forma, é inegável que ocorreu a lavratura do auto circunstanciado das ações policiais realizadas na residência do Apelante, quando da sua prisão em flagrante.

II - Preliminar de nulidade: descumprimento do artigo 68 do CPP, rejeitada, unanimidade, vez que no caso em tela o magistrado ao proceder a dosimetria a pena não vislumbrou a incidência da circunstância atenuante do 'desconhecimento da lei', assim, não poderia atenuar a pena do ora Apelante.

III - Mérito: Para a concretização do delito previsto no artigo 12 da Lei de Tóxico não se exige somente atos de mercancia por parte do agente, já que a citada norma descreve 18 formas de conduta punível e que são núcleos do tipo. 'In casu' a conduta do Apelante se amolda na modalidade 'ter em depósito', que significa reter a coisa á sua disposição. Quem tem em depósito a droga pode vir a oferecê-la a outrem, e é este risco social que a lei pune, por isso esse delito é considerado de perigo abstrato.

Os depoimentos dos policiais militares que procederam a diligência e apreenderam a droga na residência do ora Apelante, devem ser admitidos como meio eficaz e válido de prova, conforme jurisprudência já consolidada. O fato de constar registros desabonadores nas condutas funcionais dos policiais militares, não macula o procedimento de busca e preensão, nem coloca sob suspeita seus depoimentos em juízo.

IV - Recurso improvido, à unanimidade". (fls.228-229)

Alega o recorrente, com fundamento no artigo 102, inc. III, a, infração aos artigos 5º, LVI, e 144, parágrafos 4º e 5º da Constituição Federal, porque teriam sido juntadas provas obtidas por meio ilícito, consistentes em cumprimento de mando de busca e apreensão por policiais militares. Aduz que:

"AO SE DEFERIR O MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO À POLÍCIA MILITAR, NEGOU-SE VIGÊNCIA AOS PARÁGRAFOS 4º E 5º DO ARTIGO 144 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL:

Para o par. 5º do artigo Supra, 'às policias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública'.

Duas são as atribuições dessa Polícia: a policia ostensiva, ou seja, à vista do público e a preservação da ordem pública, cujo próprio nome diz tudo.

Não sendo constitucionalmente competente para investigar crimes, só restaria ao juízo de primeiro grau indeferir a solicitação do Comando daquela Instituição, dando plena validade ao estatuído no parágrafo quarto do mesmo texto legal supra invocado, que declara: 'às polícias civis, dirigidas por delegados de policia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de policia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares'.

Não se poderia deferir à policia militar uma investigação afeta à policia civil como se fez, com a negação total dos textos legais supra invocados". (fls.268-269)

O Ministério Público do Estado do Espírito Santo apresentou contra-razões a fls. 282-286, pugnando pelo não conhecimento do recurso por ausência de prequestionamento e, no mérito, por seu improvimento, tendo em vista que o "doc. de fls.46/47 dos autos comprova que o Comando de Policiamento Ostensivo objetivava realizar uma diligência repressiva e preventiva, razão pela qual foi autorizada pelo Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da 2ª Vara da Comarca de Barra de São Francisco, neste Estado. Não há menção a investigação que, constitucionalmente, incumbe à Polícia Civil. A realização de diligência de cunho preventivo pela Polícia Militar não fere a previsão do artigo 144, parágrafo quinto, da CF/88". (fl. 284)

A Procuradoria-Geral da República opinou pelo não conhecimento do recurso e, no mérito, pelo seu desprovimento (fls.312-317).

É o relatório.

VOTO

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - (Relator): 1. Não conheço da argüição de descumprimento dos requisitos do artigo 245, parágrafo sétimo, do Código de Processo Penal.

É que suposta violação das garantias constitucionais mencionadas configuraria, aqui, o que se chama mera ofensa reflexa, também dita indireta, à Constituição da República, porque eventual juízo sobre sua caracterização dependeria de reexame prévio do caso à luz das normas infraconstitucionais, em cuja incidência e interpretação, para o decidir, se apoiou o acórdão impugnado, designadamente regras do Código de Processo Penal.

É, ao propósito, velhíssima a postura desta Corte no sentido de que, se, para provar contrariedade à Constituição, se deva, antes, demonstrar ofensa à lei ordinária, então é esta que conta para efeito de juízo de admissibilidade do recurso extraordinário (cf., por todos, RE nº 92.264-SP, Rel. Min. DECIO MIRANDA, in RTJ 94/462-464). E este enunciado sintetiza raciocínio de certa simplicidade, que está no seguinte.

É natural que, propondo-se a Constituição como fundamento jurídico último, formal e material, do ordenamento, toda questão jurídico-normativa apresente ângulos ou aspectos de algum modo constitucionais, em coerência com os predicados da unidade e da lógica que permeiam toda a ordem jurídica.

Mas tal fenômeno não autoriza que, para efeitos de admissibilidade de recurso extraordinário, sempre se dê relevo ou prevalência à dimensão constitucional da quaestio iuris, sob pretexto de a aplicação da norma ordinária encobrir ofensa à Constituição, porque esse corte epistemológico de natureza absoluta equivaleria à adoção de um atalho que, de um lado, degradaria o valor referencial da Carta, barateando-lhe a eficácia, e, de outro, aniquilaria todo o alcance teórico das normas infraconstitucionais, enquanto materialização e desdobramento necessário do ordenamento, destinadas, que são, a dar atualidade, conseqüência e sentido prático ao conteúdo normativo inscrito nas disposições constitucionais.

Tal preponderância só quadra à hipótese de o recurso alegar e demonstrar que o significado normativo atribuído pela decisão ao texto da lei subalterna, no ato de aplicá-la ao caso, guarde possibilidade teórica de afronta a princípio ou regra constitucional objeto de discussão na causa. E, ainda assim, sem descurar-se da falácia de conhecido estratagema retórico que, no recurso, invoca, desnecessariamente, norma constitucional para justificar pretensão de releitura da norma infraconstitucional aplicada, quando, na instância ordinária, não se discutiu ou, o que é mais, nem se delineie eventual incompatibilidade entre ambas. É coisa que não escapou a velho precedente da Corte, do qual consta o seguinte:

"[...] observo, com relação [á questão constitucional], que é incomum que, para se interpretar um texto infraconstitucional, haja necessidade de, para reforçar a exegese, se invocarem textos constitucionais, exceto quando seja preciso conciliar a lei ordinária com a Constituição por meio da técnica da interpretação conforme a Carta Magna." (voto do Min. MOREIRA ALVES, no RE nº 147.684, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, in RTJ 148/2).

Neste caso, não há questão constitucional capaz de tornar admissível o recurso extraordinário, porque o que, no fundo, sustenta o recorrente é que, aplicando normas subalternas, revestidas de incontroversa constitucional idade formal e material, a fatos insusccetíveis de rediscussão nestavia, quando não poderia tê-lo feito, porque tais fatos não corresponderiam às suas fattispecie abstratas, teria o tribunal a quo proferido decisão errônea (error in indicando), cujo resultado prático implicaria violação de normas constitucionais. É hipótese típica do que se costuma definir como ofensa reflexa ou indireta, que, a bem ver, não tipifica ofensa alguma à Constituição.

Desse modo, nem se excogita existência de repercussão geral, que só convém a questões constitucionais.

Não conheço, pois, do recurso no tocante a tal alegação.

2. Mas examino a de uso de prova ilícita.

O cumprimento do mandado de busca e apreensão pela polícia militar não fere os parágrafos 4º e 5º do artigo 144 da Constituição Federal. Eis o que esta prescreve:

"Parágrafo quarto - às policias civis, dirigidas por delegados de policia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de policia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.

Parágrafo quinto - - às policias militares cabem a policia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil."

Dessas normas tira-se que não houve usurpação de competência, porque não foram realizados atos de investigação nem de instrução, reservados à função de polícia judiciária.

O mandado de busca e apreensão foi expedido em resposta à solicitação feita por comandante da polícia militar, em virtude da verificação de tráfico de drogas, na localidade, pelo Serviço Reservado da Companhia da polícia militar (fl.46).

Sobre este aspecto, foi esta a decisão do juízo de primeiro grau, integralmente subscrita pelo acórdão recorrido:

"A Defesa alega a invalidada da prova trazida aos autos, posto que entende obtida por meio ilícito. Como primeira preliminar, diz que o mandado de busca e apreensão não poderia ser deferido por este Juízo à Policia Militar, por falta de competência constitucional para a apuração de infrações penais.

Tal alegação improcede posto que a busca e apreensão determinada por este Juízo, para ser cumprida pela Policia Militar não ofende a Carta Magna, eis que a medida é meramente cautelar e não enseja, por si só, em ato de apuração de apreensão do próprio corpo de delito, que no caso se constituía na substância causadora de dependência física e psíquica apreendida.

Tratou-se a providência deferida, de medida cautelar de caráter emergencial, e neste particular, não contrariou o texto constitucional, eis que não esgotante das apurações a serem levadas a termo pela Polícia judiciária Estadual.

Importante ressaltar, como aliás antes exposto nas informações prestadas às fls.92, que o mandado teve seu cumprimento direcionado à autoridade policial militar porque as sindicância preliminares relativas aos locais suspeitos foram realizadas pelo Serviço de informações da Unidade Policial Militar local, sendo de bom sendo que os mandados fossem cumpridos pelos funcionários públicos estaduais que realizaram as diligências racial anteriores.

A competência constitucional da Policia Civil foi respeitada, eis que o auto de prisão em flagrante delito foi lavrado pela Autoridade Policial Civil, na Delegacia de Polícia desta Cidade, assim como todo o inquérito foi presidido por dita Autoridade, sendo também certo que os laudos periciais, tanto o preliminar quanto o toxicológico definitivo foram confeccionados por servidores policiais civis.

A busca e apreensão realizada nestas circunstâncias por Policiais Militares não viola o texto constitucional, posto que tratou-se, como já dito, de mera medida cautelar emergencial que objetivou a obtenção da prova do crime em apuração, consubstanciada na apreensão do corpo de delito, que, no caso, é a própria Cannabis Sativa Lineu, conhecida como MACONHA." (fls.166-167)

A ação, como se vê, cabia no âmbito de atribuições conferidas à polícia militar, podendo ser classificada como atividade de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública.

A Corte, aliás, já se manifestou a respeito, em caso idêntico, no julgamento do HC nº 91.481, (Rel. Min. MARCO AURÉLIO, DJe de 23.10.2008):

BUSCA E APREENSÃO - TRÁFICO DE DROGAS ORDEM JUDICIAL - CUMPRIMENTO PELA POLÍCIA MILITAR Ante o disposto no artigo 144 da Constituição Federal, a circunstância de haver atuado a policia militar não contamina o flagrante e a busca e apreensão realizadas. AUTO CIRCUNSTANCIADO - PARÁGRAFO SÉTIMO DO ARTIGO 245 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. Atende ao disposto no parágrafo sétimo do artigo 245 do Código de Processo Penal procedimento a revelar auto de prisão em flagrante assinado pela autoridade competente, do qual constam o condutor, o conduzido e as testemunhas; despacho ratificando a prisão em flagrante; nota de culpa e consciência das garantias constitucionais; comunicação do recolhimento do envolvido á autoridade judicial; lavratura do boletim de ocorrência; auto de apreensão e solicitação de perícia ao Instituto de Criminalística.

Por fim, a prisão em flagrante poderia ser efetivada por qualquer pessoa (artigo 301 do Código de Processo Penal), ato porque se considera existente tal situação, nos crimes permanentes, enquanto não cesse a permanência (artigo 303 do CPP). Não havia óbice, portanto, a que os policiais militares a tivessem realizado.

Também com relação a estoutro aspecto, a Corte já decidiu:

EMENTA:- Habeas corpus. Paciente condenado como incurso no artigo 12, DA Lei nº 6.368, de 1976, à pena de 6 anos de reclusão e 100 dias-multa. 2. Sustentação de que a condenação fora embasada em prova ilícita, obtida no domicílio do paciente. 3. Parecer da Procuradoria Geral da República pelo indeferimento do writ. 4. Não há falar-se em ilicitude de prova, com a busca domiciliar ocorrida, eis que à vista de flagrante delito. 5. Habeas corpos indeferido. (HC nº 73.921, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA, DJ de 18.08.2000)

3. Isto posto, conheço, em parte, do recurso extraordinário, e, na parte conhecida, nego-lhe provimento.

Ministro CEZAR PELUSO - Relator

EXTRATO DE ATA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 404.593-1

PROCED.: ESPÍRITO SANTO

RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO

RECTE.(S): RONALDO BELO DE CARVALHO

ADV.(A/S): AMARILDO DE LACERDA BARBOSA

RECDO.(A/S): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

Decisão: A Turma, à unanimidade, conheceu, em parte, do recurso e, na parte conhecida, negou-lhe provimento, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Senhores Ministros Celso de Mello e Joaquim Barbosa. 2ª Turma, 18.08.2009.

Presidência da Senhora Ministra Ellen Gracie. Presentes à sessão os Senhores Ministros Cezar Peluso e Eros Grau. Ausentes, justificadamente, os Senhores Ministros Celso de Mello e Joaquim Barbosa.

Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco Adalberto Nóbrega.

Carlos Alberto Cantanhede - Coordenador




JURID - Ação penal. Prova. Mandado de busca e apreensão. [07/12/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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