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sexta-feira, 9 de outubro de 2009

JURID - Uso de documento de identidade falso. [09/10/09] - Jurisprudência


Uso de documento de identidade falso. Materialidade e autoria comprovadas.


Tribunal Regional Federal - TRF 1ª Região.

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 2008.41.00.006490-2/RO

Processo na Origem: 200841000064902

RELATOR: JUIZ TOURINHO NETO

APELANTE: EUCIR SOARES RAMIRES (REU PRESO)

ADVOGADO: WASHINGTON FERREIRA MENDONCA

PROCURADOR: HEITOR ALVES SOARES

APELANTE: LUIZ MARCELINO DA SILVA (REU PRESO)

DEFENSOR: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO

APELADO: JUSTICA PUBLICA

EMENTA

PENAL. PROCESSUAL PENAL. USO DE DOCUMENTO DE IDENTIDADE FALSO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. OCULTAÇÃO DE ESTRANGEIROS IRREGULARES (ART. 125, XII, DA LEI Nº 6.815/80 C/C O ART. 70 DO CP). INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. ABSOLVIÇÃO.

1. O crime de uso de documento falsificado consuma-se com a prática de fazer uso, que significa empregar, utilizar qualquer um dos papéis falsificados ou alterados referidos nos artigos 297 a 302 do CP. Consuma-se como o primeiro ato de utilização do documento falso, independente da obtenção de qualquer proveito.

2. Materialidade e autoria do delito de uso de documento falsificado demonstradas pelas confissões do réu, pelos depoimentos e pelos documentos acostados nos autos.

3. Impõe-se a absolvição dos acusados da imputação da prática do crime previsto no art. 125, XII, da Lei nº 6.815/80 c/c o art. 70 do CP, se as provas colhidas nos autos não demonstram, de forma suficiente, a presença do dolo específico para a configuração do crime em tela, consistente na vontade de ocultar estrangeiros que ingressaram no País de forma irregular.

4. Aplica-se o princípio do in dubio pro reu, que tem fundamentação no princípio constitucional da presunção de inocência, segundo o qual o acusado deverá ser absolvido quando a acusação não prove, inequivocamente, sua participação no crime.

5. Apelação de Eucir provida e apelação de Luiz Marcelino parcialmente provida.

ACÓRDÃO

Decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal, por unanimidade, dar provimento ao recurso de apelação do acusado Eucir Soares Ramires e parcial provimento ao recurso de apelação de Luiz Marcelino da Silva, para absolvê-los da imputação da prática do crime previsto no art. 125, XII, da Lei nº 6.815/80 c/c o art. 70 do CP, em razão da insuficiência das provas para embasar um decreto condenatório, na forma do art. 386, VI, do CPP; e manter a condenação do réu Luiz Marcelino da Silva pela prática do crime previsto no art. 304 c/c o art. 297, ambos do CP.

Brasília, 11 de setembro de 2009.

Juiz TOURINHO NETO
Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. JUIZ TOURINHO NETO (RELATOR):

1. Trata-se de apelações interpostas por EUCIR SOARES RAMIRES e LUIZ MARCELINO DA SILVA contra sentença proferida pelo Juiz Federal da 3ª Vara da Seção Judiciária de Porto Velho/RO, Élcio Arruda, que condenou o primeiro à pena de 01 (um) ano e 08 (oito) meses de detenção e o segundo à pena de 02 (dois) anos, 09 (nove) meses e 08 (oito) dias de detenção pela prática do crime previsto no art. 125, XII, da Lei nº 6.815/80 c/c o art. 70 do CP. O segundo também foi condenado à pena de 04 (quatro) anos e 02 (dois) meses de reclusão e 50 (cinqüenta) dias-multa, à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época dos fatos, pela prática do crime previsto no art. 304 c/c o art. 297, ambos do CP.

2. Narra a denúncia que (fls. 03/06):

"[...] No dia 02 de setembro de 2008, por volta das 04h15min, nesta Capital, policiais rodoviários federais abordaram três veículos tipo táxis, conduzidos pelos denunciados Eucir Soares Ramires e Luiz Marcelino da Silva e por um terceiro identificado por Nilton José Silva Santos, veículos estes utilizados para transportar oito estrangeiros de nacionalidade chinesa que haviam ingressado ilegalmente em território brasileiro.

Apurou-se que os denunciados Eucir Soares Ramires e Luiz Marcelino da Silva foram contratados pelas pessoas de GORDO e LUIZ, ambos não identificados neste caderno policial, para transportar, da localidade de Araras até Porto Velho, e ocultar os estrangeiros que haviam ingressado ilegalmente no Brasil.

Os chineses ingressaram no país pela fronteira da Bolívia com Guajará-Mirim/RO e de lá foram trazidos pelos denunciados até Porto Velho, onde então intencionavam partir para São Paulo/SP, destino final dos alienígenas, o que somente não se concretizou em virtude da atuação dos policiais que lograram prender os envolvidos.

Ao que tudo indica, o ingresso dos alienígenas no Brasil e o traslado destes até São Paulo, passando por Porto Velho, era providenciado pelas pessoas de Gordo e Luiz. Estes indivíduos contactaram os denunciados Eucir Soares e Luiz Marcelino para que efetuassem o transporte dos chineses até o aeroporto de Porto Velho/RO, de onde partiriam para São Paulo/SP, além de ocultá-los para evitar que fossem descobertos.

Com os denunciados foi encontrada a quantia de R$ 6.720,00 (seis mil setecentos e vinte reais), dos quais R$ 1.720,00 (mil setecentos e vinte reais) estava com Luiz Marcelino da Silva, e R$ 5.000,00 (cinco mil reais) encontrados no painel do veículo conduzido por Eucir Ramires. Estes valores eram provenientes do grupo criminoso e destinava-se ao custeio das despesas com o transporte e hospedagem dos estrangeiros, além do lucro com o negócio.

Com a conduta supra descrita resta evidenciado que os denunciados Integraram esquema criminoso destinado a introdução de estrangeiros clandestinos em território nacional, além de ocultá-los por estarem (os chineses) em situação ilegal.

A comprovação da autoria e da materialidade faz-se com os documentos colacionados neste feito.

2° Fato:

Apurou-se, ainda, que Luiz Marcelino da Silva, além da conduta descrita no item antecedente, também falsificou e usou documento público.

Na ocasião da abordagem realizada pela Polícia Rodoviária Federal, o denunciado Luiz Marcelino da Silva identificou-se com o nome de Marcos Ronei Magalhães dos Santos, apresentando, inclusive, documento de identidade (fl. 59). No entanto, durante a lavratura do flagrante, constatou-se que o denunciado em questão estava usando documento de identidade falso em nome de Ronei Magalhães. Além disso, verificou-se que contra Luiz Marcelino da Silva havia mandado de prisão expedido pela Justiça Estadual (fl. 34).

A autoria e a materialidade ficaram devidamente comprovadas com Laudo de Perícia Papiloscópica incluso às fls. 57/58. [...]".

3. Na sentença, o MM. Juiz a quo disse que a materialidade e autoria do crime previsto no art. 125, XII, da Lei nº 6.815/80 c/c o art. 70 do CP encontram-se demonstradas: pelo Boletim de Ocorrência de fls. 16/24; pelo Auto de Apreensão de fls. 25; pela confissão do réu nas esferas policial e judicial (fls. 12/13 e 162/167); pelo depoimento de João Batista (fls. 150/152); pelo fato de o réu Eucir ter sido novamente preso por fato idêntico, em cujo processo declarou o modus operandi da empreitada ilícita.

Afirmou que a materialidade e autoria do crime de uso de documento falso estão provadas: pelo Auto de Apreensão de fls. 32; pelo laudo pericial de fls. 63/68; e pela confissão do réu Luiz Marcelino (fls. 162/164). Entendeu que o dolo aflora pela conduta do acusado de ter utilizado identidade falsa para se identificar perante os policiais. Diante disso, condenou os réus (fls. 208/234).

4. Em apelação, o réu Eucir alega que não há provas suficientes nos autos de que introduziu estrangeiro no Brasil de forma irregular, pois, conforme os depoimentos testemunhais, desconhecia que os chineses que transportou em seu táxi estavam em situação irregular. Afirma que não confessou a prática do crime, pois apenas disse em seus interrogatórios que foi contratado para fazer uma corrida de táxi.

Assevera que não introduziu os estrangeiros no País, muito menos facilitou o ingresso deles. Aduz que o dinheiro encontrado em seu poder é de origem lícita, referente à venda de um terreno no município de Monte Negro/RO. Requer sua absolvição, ou a fixação da pena no mínimo legal (fls. 249/252).

5. Em contra-razões, o Ministério Público Federal alega que a materialidade e autoria do crime perpetrado pelo réu Eucir estão devidamente comprovadas nos autos pelos documentos, por suas declarações e provas testemunhais, no sentido de que ocultou chineses que ingressaram de forma irregular no país, pela fronteira da Bolívia com o Brasil, promovendo o transporte deles do distrito de Araras até esta Capital. Requer o não provimento do apelo (fls. 254/268).

6. Em apelação, o réu Luiz Marcelino sustenta que não praticou o crime de uso de documento falso, pois não exibiu o documento que portava para a polícia quando foi abordado. Alega que não tem vínculo com qualquer tipo de introdução de estrangeiros no território brasileiro e não há provas de que praticou esse crime nos autos, mas apenas as acusações feitas pela Polícia. Aduz que a pena ficou alta, não considerando seu grau de culpabilidade. Requer sua absolvição, ou a fixação da pena no mínimo legal (fls. 270/276).

7. Em contra-razões, o Ministério Público Federal alega que a materialidade e autoria do crime perpetrado pelo réu Luiz Marcelino estão devidamente comprovadas no feito, eis que confessou os fatos nas esferas policial e judicial. O réu Eunir reforçou sua participação no crime. Afirma que a dosimetria da pena não merece reparo, pois observadas as diretrizes do art. 59 do CP. Requer o não provimento do apelo (fls. 284/287).

8. Nesta instância, o Ministério Público Federal, pelo Procurador Regional da República José Osterno Campos de Araújo, opina pelo não provimento das apelações (fls. 293/297).

9. É o relatório.

10. À eminente Revisora em 1º/06/2009.

VOTO

O EXMO. SR. JUIZ TOURINHO NETO (RELATOR):

1. Trata-se de apelações interpostas por EUCIR SOARES RAMIRES e LUIZ MARCELINO DA SILVA contra sentença que os condenou pela prática do crime previsto no art. 125, XII, da Lei nº 6.815/80 c/c o art. 70 do CP e condenou o réu LUIZ MARCELINO pela prática do crime previsto no art. 304 c/c o art. 297, ambos do CP.

No caso, foi imputado aos réus Eucir Soares Ramires e Luiz Marcelino da Silva a conduta de terem ocultado estrangeiros, chineses, que ingressaram ilegalmente no Brasil, por meio da fronteira da Bolívia com Guajará-Mirim/RO, mediante o transporte deles da localidade de Araras até Porto Velho, de onde intencionavam partir para São Paulo/SP, destino final dos alienígenas, o que somente não se concretizou em virtude da atuação dos policiais que lograram prender os envolvidos.

Também restou apurado que o réu Luiz Marcelino da Silva, quando de sua abordagem pela Polícia Rodoviária Federal, utilizou documento de identidade falso, com o nome de Marcos Ronei Magalhães dos Santos.

3. Materialidade e Autoria

3.1 Ocultar Estrangeiro Clandestino ou Irregular

O crime de ocultação de estrangeiro encontra-se previsto no art. 125, XII, da Lei nº 6.815/80, veja:

Art. 125. Constitui infração, sujeitando o infrator às penas aqui cominadas:

XII - introduzir estrangeiro clandestinamente ou ocultar clandestino ou irregular:

Pena: detenção de 1 (um) a 3 (três) anos e, se o infrator for estrangeiro, expulsão.

Esse crime consiste em esconder, encobrir estrangeiro que se encontre no Brasil de modo clandestino - sem o conhecimento das autoridades - ou irregular - sua situação não mais se coaduna com o Estatuto do Estrangeiro. O tipo é misto alternativo, de forma que se consuma com a prática de qualquer uma de suas condutas.

A materialidade está comprovada pelo Auto de Prisão em Flagrante (fls. 08/13); pelo Boletim de Ocorrência de fls. 16/24; pelo Auto de Apreensão de fls. 25; pela declaração do réu nas esferas policial e judicial (fls. 12/13 e 162/167); e pelo depoimento de João Batista (fls. 150/152) e das testemunhas. Vejamos.

Com relação à autoria, todavia, não há provas suficientes de que os réus tinham ciência de que estavam ocultando estrangeiros que ingressaram no País de forma irregular, haja vista que o réu Eucir realizou apenas o transporte deles da localidade de Araras até Porto Velho, de onde intencionavam partir para São Paulo/SP. Assim, não há provas inequívocas de que eles efetivamente tinham a vontade e foram contratados para ocultar os chineses. Vejamos.

Na esfera policial, o réu Eucir afirmou que foi contratado por Luiz para buscar um grupo de nove pessoas em Araras e levá-los até a capital, no Hotel Rey, juntamente com mais dois taxistas, sendo que seriam pagos R$ 350,00 para cada taxista. Disse, ainda, que o pagamento seria feito pelo réu Marcelino. Veja (fls. 13):

[...] QUE alega não conhecer LUIZ; QUE, afirma que foi contratado por LUIZ para buscar um grupo em ARARAS; QUE, LUIZ telefonou para o interrogado sendo que LUIZ lhe pediu que fosse até ARARAS e disse que mais dois taxistas estavam indo também para buscar um grupo de nove pessoas; QUE, então disse a LUIZ que iria levar NILTON, motorista auxiliar, por que estava cansado e tinha ingerido bebida alcoólica; QUE, afirma não conhecer GORDO; QUE, afirma não saber o endereço, telefone ou nome completo de LUIZ; QUE, diz que LUIZ é paraguaio ou boliviano; QUE, afirma não saber se os chineses estavam irregulares no país; QUE, afirma que os R$ 5.000,00 encontrados no interior do seu táxi recebeu como pagamento da venda de um terreno que tinha em Montenegro; QUE, não sabe o destino dos chineses; QUE afirma que apenas foi contratado para trazer o grupo até a capital e deixá-lo no Hotel Rey; QUE, afirma que não conhecia MARCOS; QUE, conhece os outros dois taxistas pelo fato de trabalharem nesta capital; QUE, por volta das 22hOOmin de 01/09/2008 buscou LUIZ no HOTEL REY (em frente a rodoviária) e o levou até o aeroporto; QUE, acredita que LUIZ tenha ido para SÃO PAULO no vôo da madrugada; QUE, LUIZ teria dito que voltaria de SÃO PAULO para pegar o grupo de chineses; QUE, afirma que cada taxista iria receber R$ 350,00 para trazer o grupo até a capital; QUE, esse pagamento seria feito por MARCOS; QUE, afirma já ter feito uma corrida antes, contratado por LUIZ, para o transporte de estrangeiros chineses; QUE, quanto a transação de venda do terreno alegada, se compromete a apresentar documento comprobatório; QUE, afirma conhecer detalhes sobre o grupo ou esquema para introdução irregular de estrangeiros no país. [...].

Na esfera policial, o réu Luiz Marcelino afirmou que foi contratado por 'Gordo" para transportar um grupo de pessoas de Araras até Porto Velho, tendo recebido para tanto valor de R$ 1.720,00 para custear despesas de transporte e hotel. Disse que cada pessoa a ser transportada pagaria R$ 50,00 para os taxistas. Veja (fls. 12):

[...] QUE afirma que foi contratado por um homem chamado GORDO para fazer o transporte de alguns estrangeiros de ARARAS até PORTO VELHO; QUE afirma que GORDO é boliviano e mora em GUAYARAMERIN; QUE afirma que não sabe o nome completo nem endereço de GORDO; QUE foi até ARARAS de táxi; QUE recebeu o valor de R$ 1.720,00 de GORDO para custear despesas como transporte e hotel; QUE, alega nunca ter feito esse tipo de trabalho antes; QUE, afirma não conhecer LUIZ; QUE cada pessoa a ser transportada pagaria R$ 50,00 para os taxistas; QUE os três taxistas que transportavam o grupo até PORTO VELHO foram contatados diretamente por GORDO; QUE GORDO estava em ARARAS quando o interrogado foi buscar os estrangeiros; QUE no trajeto até PORTO VELHO o grupo foi parado por POLICIAIS RODOVIARIOS FEDERAIS; QUE, após todos foram trazidos para a Polícia Federal; QUE, afirma que GORDO lhe falou que um homem chamado LUIZ estaria em Porto Velho aguardando os chineses para levá-los até SÃO PAULO; QUE não conhece os três taxistas que transportavam o grupo; QUE junto com o grupo também havia um outro homem que dirigia um táxi por que um dos taxistas estava com sono; QUE GORDO ficou de telefonar depois para acertar o pagamento do interrogado; QUE muito embora afirme não conhecer GORDO afirma que aceitou fazer o trabalho acreditando que iria receber algum valor posteriormente. [...].

A testemunha João Batista Queiroz Neto, policial que participou do flagrante delito dos réus, afirmou em Juízo que abordou o acusado Eucir transportando chineses em seu táxi, juntamente com outros dois taxistas, com destino a Porto Velho, afirmando ter sido contratado por Luiz. Declarou que o réu Luiz Marcelino seria o guia do grupo de chineses, o qual lhe disse que foi contratado por 'Gordo' para transportar esse grupo até Porto Velho, tendo recebido para tanto o valor de R$ 1.720,00.

Disse que ele apresentou um documento de identidade falso e que o réu Eucir afirmou que sabia que as corridas eram para buscar chineses, mas que não sabia que situação deles era irregular, pois o objetivo da passagem em Porto Velho/RO era a obtenção de vistos. Veja (fls. 150/152)

(...) que, por ocasião dos fatos, em abordagem rotineira, no Posto da Polícia Rodoviária Federal do quilômetro 760, foram abordados três veículos do tipo táxi; que, num deles, o acusado EUCIR, ora reconhecido nesta audiência, ocupava o banco do carona; que, num outro veículo, o acusado LUIZ MARCELINO DA SILVA, também ora reconhecido nesta audiência, estava no banco traseiro; que, no veículo em que estava o acusado EUCIR, um SIENA, havia dois chineses; que, já no veículo onde estava LUIZ MARCELINO, cujo modelo não se recorda, havia outros três chineses; que, no terceiro veículo, cujo modelo também não se recorda, havia o motorista e três outros chineses; que o motorista do veículo onde estava o acusado EUCIR fora contratado pelo último, a fim de realizar a corrida; que o táxi era de EUCIR; que os outros dois motoristas também haviam sido contratados pelo acusado EUCIR; que EUCIR referiu ter sido contratado por um tal de LUIZ, a fim de apanhar alguns chineses no Distrito de Araras, embora não esteja bem certo quanto ao nome, e trazê-los até um hotel, nesta capital; que ele referiu, ainda, que o réu LUIZ MARCELINO DA SILVA fora apanhado junto com os chineses e seria o "guia"; que, naquela abordagem, EUCIR afirmou estar o co-réu logo atrás, noutro táxi, com outros chineses e que haveria ainda um terceiro veículo; que, realmente, no contexto da abordagem, chegaram, no Posto da Polícia Rodoviária Federal, os outros dois táxis; que, por cada táxi, EUCIR receberia R$ 300,00; que o pagamento total dele seria R$ 900,00; que, com a chegada do veículo ocupado pelo réu LUIZ MARCELINO, EUCIR o apontou como sendo o "guia"; que LUIZ MARCELINO disse ter sido contratado por um tal de GORDO, para acompanhar os chineses do Distrito de Araras até o hotel em Porto Velho/RO; que ele estava com R$ 1.720,00, no bolso; que ele pagaria os R$ 900,00 de EUCIR e o hotel dos chineses, ficando com o remanescente, a título de pagamento; que LUIZ MARCELINO, quando da identificação, apresentou um documento, identidade, em nome de MARCOS RONEI MAGALHÃES DOS SANTOS, como consta de f. 65, com uma fotografia própria; que os três motoristas dos táxis apenas disseram da contratação para realização de uma corrida; que fora EUCIR quem os contratara; que EUCIR contratara aqueles três motoristas na rodoviária de Porto Velho/RO; que, dos oito chineses, havia mulheres dentre eles, nenhum referia situação regular, os passaportes se ressentiam de vistos de entrada; que havia carimbos dando conta da entrada por outros países, Guatemala e Equador; que eles haviam saído de Hong Kong, realizado passagens em diversos países, até aportarem no Brasil; que, no trajeto até a sede da Polícia Federal, o celular do acusado LUIZ MARCELINO tocava insistentemente, mas, ele não atendeu; que todos foram conduzidos à Polícia Federal, nesta capital; que, ainda no trajeto, o acusado EUCIR revelou ter ciência de que as corridas eram para buscar chineses, desconhecendo se a situação deles era regular, mas, o objetivo da passagem em Porto Velho/RO era a obtenção de vistos; que fora aquele LUIZ, quem o contratara, o responsável pelo repasse da informação; que foi realizado busca mais minuciosa nos veículos; que, no carro de EUCIR, foram encontrados R$ 5.000,00, ocultos no painel; que ele referiu ser o dinheiro produto da venda de um terreno; que, como o segundo acusado pronunciasse dados divergentes em relação àqueles constantes da base de dados, acabou se descobrindo a falsidade da identidade apresentada, na seqüência dos fatos; que os acusados foram atuados em flagrante; que não sabe do destino dos chineses; que os chineses tinham dinheiro, pouca coisa; que eles falavam apenas a língua de origem deles; que os oito chineses carregavam apenas três mochilas pequenas, pouca coisa, apesar de o grupo ser expressivo; que o hotel onde os chineses iriam ficar seria informado por GORDO; que, até então, não conhecia os acusados. Que o segundo acusado pagaria cada um dos motoristas em separado, R$ 300,00 para cada; que os R$ 300,00 referentes ao táxi de EUCIR seriam pagos a ele próprio, cabendo-lhe repassar alguma coisa ao motorista sub-contratrado. [...].

Em Juízo, Nilton José Silva Santos declarou é motorista auxiliar do acusado Eucir e que, nos dias dos fatos, foi chamado por ele para transportar chineses de Araras, uma cidade próxima de Guajará-Mirim/RO, até Porto Velho/RO. Disse que os outros dois táxis foram dirigidos por Marcelo Cristiano Oliveira Andrade e Paulo da Conceição Pereira. Afirmou que o acusado Luiz Marcelino providenciou o abastecimento dos outros dois taxistas. Veja (fls. 154/155):

(...) que trabalha de motorista auxiliar para o acusado EUCIR, no táxi dele, um SIENA; que, no dia do fato, estava o depoente de folga, quando EUCIR o chamou para realizar uma corrida, já que ele próprio estava cansado; que foi dirigindo o carro, até uma cidade próxima de Guajará-Mirim/RO, uma vila, conhecida por Araras; que, lá, embarcaram dois chineses; que, no local de apanhar os chineses, havia outros e, também, já dois outros táxis; que o segundo acusado, ora reconhecido nesta audiência, já estava no local, com os chineses; que não houve uma combinação específica de pagamento em seu favor, até porque já trabalhava para o acusado EUCIR; que os outros dois táxis eram dirigidos por MARCELO CRISTIANO OLIVEIRA ANDRADE e PAULO DA CONCEIÇÃO PEREIRA, conhecidos seus, por conta da profissão; que não sabe quanto eles ganhariam pela corrida; que EUCIR não referiu quem contratara; que o segundo acusado embarcou com alguns chineses num dos outros táxis; que, no trajeto de volta, sendo o destino Porto Velho/RO, um hotel, cujo nome não sabe, foram abordados no Posto da Polícia Rodoviária Federal e, daí, todos conduzidos à Polícia Federal, nesta capital; que, através de seu irmão, tomou conhecimento de que ele comprara um terreno de EUCIR, cujo valor desconhece; que não sabia da existência de dinheiro no carro; que não sabe onde o terreno se localizaria; que, ainda hoje, trabalha para o acusado EUCIR; que nada sabe a desabonar a conduta do primeiro acusado; que, em relação ao segundo réu, não o conhecia, até então; que não sabe de prisão posterior envolvendo o segundo acusado. Que o acusado LUIZ MARCELINO providenciou o abastecimento dos outros dois taxistas. Que os chineses foram apanhados num bar, pela noite, havia apenas eles, o segundo acusado e o dono do comércio; que os chineses tinham pouca bagagem, havia homens e mulheres; que o segundo acusado foi quem diretamente pagou a gasolina ao fornecedor. [...].

As testemunhas Marcelo Cristiano Oliveira Andrade (fls. 157/158) e Paulo da Conceição Pereira (fls. 159/160), taxistas, declararam, em Juízo, que, no dia dos fatos, receberam uma chamada da Central do Rodotáxi para apanhar passageiros no Distrito de Araras, área de garimpo, madeireiras e comércio, sendo que havia necessidade de dois táxis. Declararam que no local já estava o réu Marcelino com o grupo e o táxi do réu Eucir, acompanhado pelo motorista auxiliar dele, Nilton José Silva Santos. Disseram que transportaram cerca de oito chineses com destino em Porto Velho/RO, no Hotel Rey. Afirmou que seria pago R$350,00 por cada táxi. Veja:

FLS. 157/158 - (...) que, no dia do fato, a CENTRAL DO RODOTÁXI recebera uma chamada para apanhar passageiros no Distrito de Araras, área de garimpo, madeireiras e comércio; que havia necessidade de dois táxis; que, daí, foi convidado por seu colega taxista PAULO DA CONCEIÇÃO PEREIRA, a fim de realizarem o serviço; que, ainda pela noite, para lá se deslocaram; que, antes, abasteceu o veículo de PAULO; que, no local, numa lanchonete, bem à beira da rodovia, encontraram os passageiros, havia cerca de nove pessoas de feições orientais, chineses ou japoneses; que o segundo acusado, ora reconhecido nesta audiência, já estava no local, com aquele grupo; que, igualmente, no local, já estava o táxi do primeiro acusado, também acompanhado pelo motorista auxiliar dele, NILTON JOSÉ SILVA SANTOS; que, no táxi do depoente, embarcaram três integrantes daquele grupo; que o destino seria Porto Velho/RO, um hotel, parecendo ser aquele do nome REY; que PAULO lhe repassou R$50,00, obtidos do segundo acusado, a fim de realizar o abastecimento para a volta; que o pagamento a ser recebido seria de R$350,00 por cada táxi; que os integrantes do grupo tinham pouca bagagem, apenas mochilas; que eles não falavam nada de português ou inglês; que, no Posto da Polícia Rodoviária Federal, foram abordados e, a seguir, todos conduzidos à Polícia Federal local; que não conheceu o segundo acusado; que, em relação ao primeiro, conhecia-o de profissão, da praça, nada sabendo a desaboná-lo; que PAULO fora contratado pelo sistema RADIOTÁXI, nada referindo quanto a EUCIR. [...].

FLS. 159/160 - (...) que, no dia do fato, a CENTRAL DO RODOTÁXI recebera uma chamada para apanhar passageiros no Distrito de Araras, área de garimpo, madeireiras e comércio; que havia necessidade de dois táxis; que, daí, convidou seu colega taxista MARCELO CRISTIANO OLIVEIRA ANDRADE, a fim de realizarem o serviço; que, ainda pela noite, para lá se deslocaram; que, antes, seu veículo foi abastecido por MARCELO; que, no local, num restaurante, bem à beira da rodovia, encontraram os passageiros, havia cerca de oito chineses; que o segundo acusado, ora reconhecido nesta audiência, já estava no local, com aquele grupo; que, igualmente, no local, já estava o táxi do primeiro acusado, também acompanhado pelo motorista auxiliar dele, NILTON JOSÉ SILVA SANTOS; que, no táxi do depoente, embarcaram três chineses e o segundo acusado; que o destino seria Porto Velho/RO, precisamente o HOTEL REY; que o segundo acusado repassou R$50,00 para o depoente e igual valor ao seu colega MARCELO, a fim de realizar o abastecimento para a volta; que o pagamento a ser recebido seria de R$350,00 por cada táxi, devendo se abater os R$50,00 adiantados para o combustível; que os integrantes do grupo tinham pouca bagagem, apenas mochilas; que eles não falavam nada de português ou inglês; que, no Posto da Polícia Rodoviária Federal, foram abordados e, a seguir, todos conduzidos à Polícia Federal local; que não presenciou o segundo acusado se identificar na Polícia Rodoviária Federal; que o táxi de EUCIR já estava na Polícia Rodoviária Federal, quando lá chegaram o depoente e seu colega MARCELO, o táxi do depoente foi o segundo a chegar; que não conhecia o segundo acusado; que, em relação ao primeiro, conhecia-o de profissão, da praça, nada sabendo a desaboná-lo; que o primeiro acusado não o contratou, a contratação ocorreu através do RADIOTÁXI; que não realizou outras corridas de igual natureza. [...].

Entendo que esses depoimentos não comprovaram, de forma inequívoca, a presença do elemento subjetivo do tipo, ou seja, o dolo específico para a configuração do crime em tela, consistente na vontade de ocultar estrangeiros que ingressaram no País de forma irregular, haja vista que, além do réu Eucir, outros três taxistas foram contratados para fazer o transporte dos chineses e todos afirmaram não saber da situação irregular deles no País.

Não há nos autos a declaração de qualquer testemunha ou um documento que demonstre a ciência pelos réus da situação irregular dos chineses no Brasil. Assim, mesmo que contratados para os transportarem e acompanharem, é indispensável essa prova.

Ora, não há provas irrefutáveis de que os réus sabiam, sem sombra de dúvidas, da situação irregular dos estrangeiros neste País, de forma que não há como lhes ser imputada a prática do crime em discussão, por ausência de configuração de elementar do tipo delituoso. E, se não provada a autoria do crime, forçosa é a absolvição dos réus.

Assim, não comprovada, inequivocamente, o dolo dos acusados na prática do crime em discussão, merece aplicação o princípio do in dubio pro reu, que tem fundamentação no princípio constitucional da presunção de inocência, segundo o qual o acusado deverá ser absolvido quando a acusação não tenha logrado provar sua participação no crime.

Nesse aspecto, manifesta-se Paulo Rangel(1) que:

"O princípio do favor rei é a expressão máxima dentro de um Estado Constitucionalmente Democrático, pois o operador do direito, deparando-se com uma norma que traga interpretações antagônicas, deve optar pela que atenda ao jus libertatis do acusado.

Trata-se de regra do processo penal que impõe ao juiz seguir tese mais favorável ao acusado sempre que a acusação não tenha carreado prova suficiente para obter condenação. Nesse aspecto, o princípio do favor rei se enlaça com a presunção de inocência que, como vimos, inverte o ônus da prova. O órgão que acusa é quem tem de apresentar a prova da culpa e demonstrar a culpabilidade do cidadão presumido inocente. Caso a acusação não logre criar no tribunal a certeza da culpabilidade, então, o que se impõe é uma decisão favorável ao acusado (Alexandra Vilela, ob. cit., p. 74).

O favor rei é o que autoriza o juiz (ou tribunal) a absolver o réu quando, verificando ter ocorrido a prescrição, o feito já estiver suficientemente maduro para proferir uma decisão de mérito, absolvendo-o (cf. item 13.9.1, infra). Ou ainda, havendo a ocorrência de vício processual que autorize a declaração de invalidade do processo ao mesmo tempo que há provas que autorizem a absolvição. Esta deve ser declarada em nome do favor rei.

O elemento impulsionador da interpretação que se deve adotar para alcançar a norma mais favorável ao acusado, diante de dois caminhos que se possa adotar, é exatamente o do favor rei.

Não são poucas as passagens do Código de Processo Penal em que observamos este princípio, porém mal se compreende sua aplicação.

Diz o art. 386, VI, do CPP:

O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:

VI - não existir prova suficiente para a condenação.

Portanto, estando o juiz diante de prova para condenar, mas não sendo esta suficiente, fazendo restar a dúvida, surgem dois caminhos: condenar o acusado, correndo o risco de se cometer uma injustiça, ou absolvê-lo, correndo o risco de se colocar nas ruas, em pleno convívio com a sociedade, um culpado.

A melhor solução será, indiscutivelmente, absolver o acusado, mesmo que correndo o risco de se colocar um culpado nas ruas, pois antes um culpado nas ruas do que um inocente na cadeia.

Outra regra em que impera o princípio do favor rei é a do art. 615 do CPP, que diz:

Art. 675. O tribunal decidirá por maioria de votos.

§ 1º Havendo empate de votos no julgamento de recursos, se o presidente do tribunal, câmara ou turma, não tiver tomado parte na votação, proferirá o voto de desempate; no caso contrário, prevalecerá a decisão mais favorável ao réu. (no original, sem grifo)

Ou seja, havendo dois caminhos a serem seguidos, um prejudicial ao réu e o outro favorável em decorrência de empate na votação, segue-se o caminho que melhor protege a liberdade.

Há dispositivos no Código de Processo Penal que expressamente estabelecem o princípio em comento; são eles: art. 607; parágrafo único do art. 609 e art. 621. Em todas estas hipóteses, somente o réu pode interpor os referidos recursos e ação, respectivamente". [...].

Nesse diapasão, impõe-se a absolvição dos réus Eucir e Luis Marcelino da imputação da prática do crime previsto no art. 125, XII, da Lei nº 6.815/80 c/c o art. 70 do CP, em razão da insuficiência das provas para embasar um decreto condenatório, na forma do art. 386, VI, do CPP.

3.2 Uso de Documento Falso

O crime de uso documento falso encontra-se tipificado no art. 304 c/c o art. 297, caput, ambos do Código Penal, que dispõem:

Art. 304 - Fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 297 a 302:

Pena - a cominada à falsificação ou à alteração

Falsificação de documento público

Art. 297 - Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro:

Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.

§ 1º - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de sexta parte.

§ 2º - Para os efeitos penais, equiparam-se a documento público o emanado de entidade paraestatal, o título ao portador ou transmissível por endosso, as ações de sociedade comercial, os livros mercantis e o testamento particular.

Esse crime de uso de documento falsificado consuma-se com a prática de fazer uso, que significa empregar, utilizar qualquer um dos papéis falsificados ou alterados referidos nos artigos 297 a 302 do CP. Consuma-se como o primeiro ato de utilização do documento falso, independente da obtenção de qualquer proveito.

A objetividade jurídica desse crime de falsidade é a fé pública, no que tange à autenticidade dos documentos públicos e particulares. O elemento subjetivo é a vontade de falsificar documento, prejudicando direito, criando obrigações ou alterando a verdade. A consumação ocorre com a produção do documento, contendo a falsidade, independente da ocorrência de dano. Trata-se, portanto, de crime formal.

A materialidade e autoria do crime de uso de documento falso estão provadas: pelo Auto de Apreensão de fls. 32; pelo laudo pericial de fls. 63/68; e pela confissão do réu (fls. 162/164), no sentido de que, quando foi abordado pela polícia, em razão de estar no táxi com chineses, apresentou o documento falso, em nome de Marcos Ronei Magalhães dos Santos, no qual colocou sua fotografia e a plastificou. Disse que utilizou esse documento por ser foragido. Veja (fls. 162/164):

(...) que, por ocasião dos fatos, trabalhava no garimpo de Araras; que um conhecido seu do garimpo, GORDO, cujo nome desconhece, solicitou-lhe que acompanhasse alguns chineses, que também estavam vindo de lotação até Porto Velho/RO; que a lotação é cumprida em táxi; que o interrogado deveria acompanhá-los, caso eles necessitassem de alguma coisa; que nada receberia pelo serviço, tratava-se de favor; que GORDO não referiu onde estariam os chineses; que, melhor esclarecendo, GORDO já se fazia acompanhar dos chineses; que estava na parada, quando GORDO chegou no local; que havia oito chineses, entre homens e mulheres; que eles nada falavam de português ou inglês; que o interrogado não é versado em inglês ou espanhol, fala apenas português; que chegaram três táxis, o interrogado embarcou em um, com três chineses; que não sabe quem contratou os táxis; que pagou R$ 50,00 ao motorista do táxi, PAULO DA CONCEIÇÃO PEREIRA; que os R$ 50,00 correspondiam à sua passagem; que não pagou a passagem dos chineses; que não conversou com os motoristas dos outros táxis, os chineses restantes entraram nos outros dois veículos; que o táxi foi abordado no Posto da Polícia Rodoviária Federal; que, na ocasião, o interrogado se identificou com o documento de f. 65, em nome de MARCOS RONEI MAGALHÃES DOS SANTOS; que assim fez por se tratar de foragido; que um amigo seu fora quem lhe presenteara com o documento, cerca de três meses antes; que o documento estava sem fotografia, o interrogado tratou de fixar a sua e plastificar; que, quando parados na Polícia Rodoviária Federal, já havia um táxi parado e, logo depois, chegou o terceiro táxi; que todos foram conduzidos à Polícia Federal local; que continuou se identificando falsamente, até ser descoberto, com a coleta de digitais; que não sabe o destino dos chineses; que o próprio interrogado ficaria no bairro Cidade Nova; que, no trajeto até a Polícia Federal local, seu telefone tocou, mas, não sabe quem era; que foi preso; que não conhecia nenhum dos taxistas ou dos chineses, só conhecia GORDO, a quem prestaria um favor; que, até então, nunca utilizara o documento falso; que se arrependeu bastante; que não conhece as testemunhas arroladas pela acusação e nada tem a lhes opor; que não conhece as provas do inquérito policial; que, quando foi abordado, trazia R$1.720,00, obtidos com trabalho no garimpo, onde já estava há um mês; que GORDO estava direto no garimpo. [...].

Além disso, a testemunha João Batista Queiroz Neto, policial que participou do flagrante delito dos réus, confirmou que o réu Luiz Marcelino lhe apresentou um documento de identidade falso em nome de Marcos Ronei Magalhães dos Santos, conforme acima transcrito seu depoimento (fls. 150/152).

Nesse diapasão, pelo exame do próprio documento falso, onde consta a foto do réu, pelas confissões dele e pelas declarações da testemunha, verifica-se estar devidamente demonstrada a presença do elemento subjetivo do tipo, ou seja, que o acusado utilizou documento de identidade falsa perante a Polícia Federal. Assim, não merece reparo a sentença condenatória em face do réu pela prática do crime de uso de documento falso.

4. Dosimetria da pena

Na análise das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, o julgador monocrático entendeu que, para o réu Luiz Marcelino: intensa a culpabilidade, porque, imputável, detinha consciência potencial da ilicitude, exigindo-se-lhe conduta diversa; registra antecedentes criminais turbulentos, por conta do envolvimento em receptação (duas vezes), rixa, falsa identidade e porte de substância entorpecente (f. 125-127 e 139-140); a conduta social é reprochável, porque, ao invés de se dedicar ao trabalho lícito e honesto, fez opção por seguir "carreira do crime"; a personalidade desponta anuviada, com propensão à delinqüência, insubmissão aos valores éticos e sociais norteadores da vida em sociedade, com alto grau de rebeldia contra a lei, máxime porque foragido; os motivos das infrações são injustificáveis: quanto ao crime de uso de documento falso, o propósito era se furtar, a todo custo, ao cumprimento das penas; as circunstâncias são ordinárias; as conseqüências foram graves, ante a vulneração à fé pública; não há de se falar em comportamento da vítima.

Diante disso, pelo crime de uso de documento materialmente falso (CP, art. 304 c/c o art. 297), ficou a pena-base em 04 (quatro) anos de reclusão e 48 (quarenta e oito) dias-multa, mitigando-a em 1/6 (um sexto), por força da atenuante genérica da confissão espontânea (art. 65, III, "d"), e aumentando-a em 1/4 (um quarto), por força da reincidência tríplice (CP, art. 61, I), ficando definitiva em 04 (quatro) anos, 02 (dois) meses e 50 (cinqüenta) dias-multa, à razão da 1/30 (trigésima parte) do salário-mínimo vigente ao tempo do fato.

Na hipótese, entendo que a pena-base não merece reparo, haja vista que devidamente analisadas as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, tendo sido devidamente observado o princípio da individualização da pena. Ademais, justifica-se a pena imposta em razão de que 06 (seis) das 08 (oito) circunstâncias judiciais do art. 59 do CP foram consideradas desfavoráveis ao réu.

Mesmo tendo sido absolvido da prática do crime previsto no art. 125, XII, da Lei nº 6.815/80 c/c o art. 70 do CP, permanece o regime fechado para o início do cumprimento da pena, na forma do art. 33 do CP, haja vista que o réu é reincidente.

Não cabe a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos, em razão de o réu ser reincidente (art. 44, II, do CP).

O pedido de restituição de bens formulado pelo apelante Eucir deverá aguardar o trânsito em julgado deste acórdão.

5. Ante o exposto, dou provimento ao recurso de apelação de Eucir e parcial provimento ao recurso de apelação de Luiz Marcelino, para absolvê-los da imputação da prática do crime previsto no art. 125, XII, da Lei nº 6.815/80 c/c o art. 70 do CP, em razão da insuficiência das provas para embasar um decreto condenatório, na forma do art. 386, VI, do CPP. Mantenho a condenação do réu LUIZ MARCELINO pela prática do crime previsto no art. 304 c/c o art. 297, ambos do CP.

6. É o voto.

Publicado em 25/09/09



Notas:

1 - Direito Processual Penal. 7ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p. 34/36. [Voltar]




JURID - Uso de documento de identidade falso. [09/10/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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