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segunda-feira, 26 de outubro de 2009

JURID - Responsabilidade civil. Dentista. Colocação de aparelho. [26/10/09] - Jurisprudência


Responsabilidade civil. Dentista. Colocação de aparelho ortodôntico. Dano material e dano moral.
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Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul - TJRS.

Apelação Cível

Quinta Câmara Cível

Nº 70025519687

Comarca de Santa Maria

APELANTE/RECORRIDO ADESIVO MARLENE HUBNER

APELANTE/RECORRIDO ADESIVO EMPRESA SAO MIGUEL ODONTOLOGOS ASSOCIADOS LTDA

RECORRENTE ADESIVO/APELADO GLAUCE MARIANE BITTENCOURT MENDES

RESPONSABILIDADE CIVIL. DENTISTA. COLOCAÇÃO DE APARELHO ORTODÔNTICO. DANO MATERIAL E DANO MORAL.

De acordo com o art. 14, § 4º, do CDC, a responsabilidade do dentista é de ordem subjetiva. Envolve, outrossim, obrigação de resultado. Ausente a prova da inexistência do defeito ou da culpa exclusiva da autora, há o dever das demandadas reparar os danos causados.

Valor da indenização mantido.

Apelo e recurso adesivo desprovidos.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em desprover o apelo e o recurso adesivo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores Des. Jorge Luiz Lopes do Canto e Des. Gelson Rolim Stocker.

Porto Alegre, 30 de setembro de 2009.

DES. LEO LIMA,
Relator.

RELATÓRIO

Des. Leo Lima (RELATOR)

GLAUCE MARIANE BITTENCOURT MENDES ajuizou ação dita ordinária de ressarcimento de despesas, cumulada com devolução de valores pagos e indenização por danos materiais e morais contra MARLENE HÜBNER E SÃO MIGUEL ODONTÓLOGOS ASSOCIADOS LTDA. Alega que, em 20.03.1999, aderiu ao "Plano de Assistência Odontológica São Miguel - Plus", oferecido pela segunda demandada, São Miguel Odontólogos Associados Ltda. Diz que, passado o período de carência, em agosto de 1999, submeteu-se à colocação de um aparelho ortodôntico, a fim de corrigir pequenos problemas em sua arcada dentária. Salienta que, para tanto, efetuou o pagamento de R$ 1.140,00. Registra que os serviços, bem como as manutenções, foram executados pela primeira requerida, Marlene Hübner, odontóloga credenciada à primeira demandada. Frisa que, para a manutenção do aparelho, vinha efetuando o pagamento de R$ 31,00 mensais. Observa que, durante todo o período decorrente entre a colocação do aparelho e o mês de dezembro de 2002, queixou-se de dores à primeira ré, sendo-lhe informado que as dores eram normais. Destaca que, após todo o período de reclamações, a primeira demandada concordou em lhe encaminhar para uma colega, Ana Marise Silva da Silveira, ortodontista e especialista em ortopedia funcional dos maxilares. Diz que tal profissional lhe comunicou que o tratamento deveria ser todo refeito, pois não havia sido corretamente executado. Menciona ter retornado ao consultório da primeira ré, tendo retirado o aparelho ortodôntico. Aponta ter agendado nova consulta com Ana Marise, indagando-a de quem seriam os custos do refazimento do tratamento. Salienta que tal profissional lhe informou que não tinha qualquer vinculação com as requeridas, devendo arcar com as despesas do tratamento. Acrescenta ter retornado ao consultório da primeira demandada, a qual se negou a atendê-la. Argumenta que, por conta disso, procurou novo ortodontista, Luiz Carlos Pinto, que confirmou a "péssima qualidade" do serviço prestado pela primeira demandada. Diz ter sido encaminhada à clinica Imagem Centro de Radiologia e Documentação Ortodôntica Ltda., a fim de realizar uma perícia, ocasião em que foram constatadas disfunções em sua arcada dentária por conta do serviço executado pela primeira ré. Pede seja liminarmente determinado às demandadas que efetuem o pagamento do valor total do tratamento ortodôntico a ser refeito, sob pena de multa diária. Outrossim, requer a condenação solidária das requeridas ao ressarcimento, em dobro, dos valores pagos pelo tratamento mal sucedido, bem como ao pagamento das despesas atinentes ao novo tratamento e de indenização por dano moral, em quantia correspondente a cinqüenta vezes a que foi paga pelo tratamento. Por fim, pugna pela inversão do ônus da prova.

A autora atribuiu novo valor à causa, pagando as custas respectivas.

A liminar restou indeferida.

Na sua contestação, SÃO MIGUEL ODONTÓLOGOS ASSOCIADOS LTDA. argúi, preliminarmente, a falta de interesse processual. De resto, sustenta ser inviável o pedido da autora, de ressarcimento do valor das mensalidades pagas do plano, pois usufruiu de vários serviços. Frisa que, após o segundo ano de tratamento, em face das constantes reclamações, a primeira demandada acabou encaminhando a autora à outra colega, Ana Marise, a qual lhe informou que deveria dar continuidade ao tratamento ou usar contenção. Diz ter comunicado à demandante que, por conta do seu desentendimento com a primeira requerida, daria continuidade ao tratamento. Destaca que a autora, no entanto, compareceu ao seu consultório uma única vez, retornando somente após oito meses, o que evidencia que os danos alegados na inicial foram causados em razão da sua desistência em prosseguir com o tratamento. Observa que a autora tinha conhecimento de que não poderia retirar o aparelho sem prosseguir com o tratamento.

MARLENE HÜBNER PEREZ, por sua vez, destaca que, sendo diretora da segunda demandada, a contestação foi apresentada em peça única, não lhe podendo ser aplicados os efeitos da revelia.

A autora se manifestou sobre a contestação.

Designada audiência preliminar, foi rejeitada a preliminar de falta de interesse processual e indeferida a inversão do ônus da prova, contra o que a autora interpôs agravo retido.

Deferida a prova pericial, as partes formularam quesitos.

O laudo pericial foi juntado aos autos, com vista às litigantes.

À fl. 121, foi indeferida a realização de nova perícia.

Na instrução, foi tomado o depoimento pessoal das partes, bem como foram ouvidas testemunhas.

Lançada a sentença, a ação acabou julgada procedente, para condenar as demandadas ao pagamento de indenização por danos materiais, no valor de R$ 1.140,00, além de R$ 31,00, os quais foram pagos mensalmente, desde setembro de 1999 até janeiro de 2003, para a manutenção do aparelho, corrigidos, monetariamente, pelo IGP-M, a contar da data do desembolso e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação, bem como ao pagamento de indenização por dano moral, no valor de R$ 5.000,00, corrigidos, monetariamente, pelo IGP-M, a contar da sentença, Outrossim, diante do decaimento mínimo da autora, as demandadas foram condenadas ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em 20% do valor da condenação.

Irresignadas, as demandadas apelaram, reforçando anteriores argumentos, para requerer a improcedência da ação ou a redução do valor da indenização por dano moral.

A autora, por sua vez, interpôs recurso adesivo, requerendo a majoração do valor da indenização.

Com as respostas, os autos vieram à apreciação desta Corte, sendo distribuídos ao Desembargador Marco Aurélio dos Santos Caminha, que declinou da competência, vindo-me por redistribuição.

Registro que foi observado o disposto nos arts. 549, 551 e 552 do CPC, tendo em vista a adoção do sistema informatizado.

É o relatório.

VOTOS

Des. Leo Lima (RELATOR)

Os recursos não merecem prosperar.

Nos termos do § 4º do art. 14 do CDC, a responsabilidade do dentista é de ordem subjetiva, sendo que, de acordo com o § 3º do mesmo dispositivo, o profissional liberal somente não será responsabilizado quando provar que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; ou quando provar a culpa exclusiva do consumidor ou terceiro.

Outrossim, no que respeita ao dentista, a obrigação a que se compromete é de resultado.

Nesse sentido, merece destaque lição de Sergio Cavalieri Filho:

"E assim é porque os processos de tratamento dentário são mais regulares, específicos, e os problemas menos complexos. A obturação de uma cárie, o tratamento de um canal, a extração de um dente etc., embora exijam técnica específica, permitem assegurar a obtenção do resultado esperado.

Por outro lado, é mais freqüente nessa área de atividade profissional a preocupação com a estética. A boca é uma das partes do corpo mais visíveis, e, na boca, os dentes. Ninguém desconhece o quanto influencia negativamente na estética a falta dos dentes da frente, ou os defeitos neles existentes.

Conseqüentemente, quando o cliente manifesta interesse pela colocação de aparelho corretivo dos dentes, de jaquetas de porcelana e, modernamente, pelo implante de dentes, está em busca de um resultado, não lhe bastando mera obrigação de meio.

Tenha-se, ainda, em conta que o menor defeito no trabalho, além de ser logo por todos percebido, acarreta intoleráveis incômodos ao cliente" (Programa de Responsabilidade Civil, SP: Malheiros, 6ª edição, 2005, págs. 409/410).

Pois bem, na situação em exame, as demandadas não lograram comprovar nenhuma das excludentes de responsabilidade mencionadas no § 3º do art. 14 do CDC.

Começa que a existência do defeito é evidente.

Segundo se depreende do quadro probatório contido nos autos, não há dúvida que a execução do tratamento da autora foi redirecionada para outro profissional por queixa de dores, as quais não foram adequadamente solucionadas pela primeira demandada, bem como pelo descontentamento da demandante com o respectivo serviço.

Do depoimento da autora, depreende-se que, muitas vezes, ao questionar se o tratamento "estava andando bem", pois não mais conseguia morder do lado esquerdo, a primeira demandada respondeu que "era assim mesmo", que "tinha que ter paciência e que o tratamento estava tudo certo", tendo também, a demandante, referido que: "quando chegou num ponto que não tinha mais condições, por que a minha arcada do lado esquerdo estava totalmente sem encontrar os dentes superiores com os inferiores. Ai ela viu que não tinha...Eu acredito que ela percebeu que estava meio perdida no meu tratamento. Aí ela me encaminhou pra outra profissional, a doutora Ana Marise da Silveira. Daí essa doutora me avaliou lá na clínica" (fl. 210 e verso).

Como se verifica, não foi apenas pelo desentendimento com a primeira demandada que o tratamento da autora foi redirecionado para Ana Marise, mas porque a demandante vinha apresentando problemas na arcada dentária esquerda, os quais não estavam sendo solucionados.

A requerida Marlene Hübner, por sua vez, no depoimento de fls. 214/217, confirmou a existência de tais problemas, ao registrar: "Existiam alguns ajustes, mas tem coisas na odontologia e na área da saúde que não é, muito das situações, a gente não conseguiria avaliar em números. Não existe uma ciência exata. No caso de dor tem gente que relata um tipo de dor. Caso de desconforto, a parte subjetiva eu não consigo avaliar. Eu não enxergava alguma coisa assim e então pedi ajuda pra um colega" (fl. 215).

Outrossim, quando questionada como estava o andamento do tratamento quando a autora foi encaminhada para Ana Marise, a primeira requerida não se desincumbiu do ônus de demonstrar que o procedimento vinha sendo executado de modo correto e satisfatório:

"Eu lhe sou franca e eu não tenho o modelo e não sei lhe dizer exatamente a clinica médica que teve. Teria que ver a finalização da intercuspidação. Se a finalização do tratamento está coincidindo com a queixa de dor e desconforto. Um atraso e demora. Eu não sei lhe dizer exatamente assim o motivo assim, pois não tenho guardado essa documentação e não sei lhe dizer exatamente o que é. Eu só pedi a finalização, que é aquela intercuspidação. Aquela plasticazinha final que tem que fazer" (fl. 215).

Igualmente, quando lhe foi perguntado se "o resto estava tudo pronto e os dentes estavam todos no lugar?", disse: "Infelizmente eu vou falhar com a resposta, por que um modelo final daquele dia eu não tenho" (fl. 215).

Por outro lado, a testemunha Ana Marise Silva, no seu depoimento de fls. 220/223, confirma a versão apresentada pela autora, ao registrar: "a Marlene me encaminhou a paciente e pediu que eu examinasse a paciente e se fosse possível seu eu poderia continuar o tratamento que elas não tinham se acertado mais as duas. Aí a Glauce foi lá no consultório e pediu pra mim fazer um orçamento e examinar o caso e foi o que eu fiz e passei pra Marlene. Pois ela disse que se fosse o caso, a Marlene disse pra mim que pagava o tratamento e foi o que ela fez. Aí a Glauce foi lá e fiz o orçamento e ela depois ficou um tempo, não me lembro quanto tempo depois ela apareceu depois de novo e pediu um novo orçamento, Só que ela me disse que queria fazer um novo tratamento. Daí eu disse pra ela que se ela fosse fazer um tratamento tudo de novo aí não seria responsabilidade da Marlene. A Marlene pagaria se ela fosse seguir o tratamento. Só que depois ela não apareceu mais" (fl. 220 verso).

Ora, se o tratamento estivesse realmente sendo bem executado, não há dúvida que as queixas apresentadas pela autora seriam desprezadas, porquanto decorrentes do normal andamento do procedimento em questão, não havendo qualquer razão para Ana Marise apresentar um orçamento à demandante para a execução de novo tratamento. Ainda mais que a própria Marlene disse que pagaria as despesas decorrentes da finalização do procedimento que havia iniciado, sem qualquer ônus para a autora.

Ao que tudo indica, então, o tratamento que vinha sendo executado pela dentista Marlene não estava satisfatório, tendo sido indicado para a demandante novo procedimento, cujas despesas seriam por sua conta.

Diante disso, ainda que a prova pericial não permita assegurar que foi empregada técnica errada, a verdade é que a primeira demandada não optou pela melhor técnica, tanto é que não atingiu o resultado a que se responsabilizou.

Frise-se que não se pode imputar à autora a culpa pela má execução do procedimento, pois, não querendo continuar o tratamento com a requerida Marlene e, sendo-lhe proposto novo tratamento por Ana Marise, com a cobrança da integralidade das despesas atinentes, alternativa não lhe restou senão a retirada do aparelho ortodôntico, em face das dores que vinha sofrendo.

Ademais, mesmo que a autora tivesse retirado o aparelho antecipadamente, sem a utilização da contenção que lhe havia sido recomendada, tal fato não afasta a responsabilidade das demandadas pela má execução do tratamento até então, pois, de qualquer forma e como já registrado, esse teria que ser totalmente refeito, como se depreende do depoimento da testemunha Ana Marise, dando conta que havia entregado um novo orçamento à demandante, contento as despesas referentes à integralidade do novo procedimento.

Restando incontroversa, portanto, a má prestação do serviço e a culpa das requeridas, há o dever de indenizar os danos material e moral causados à autora.

Relativamente ao valor da indenização por dano moral e conforme conhecida lição de Caio Mário da Silva Pereira:

"A vítima de uma lesão a algum daqueles direitos sem cunho patrimonial efetivo, mas ofendida em um bem jurídico que em certos casos pode ser mesmo mais valioso do que os integrantes de seu patrimônio, deve receber uma soma que lhe compense a dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo juiz, atendendo às circunstâncias de cada caso, e tendo em vista as posses do ofensor e a situação pessoal do ofendido. Nem tão grande que se converta em fonte de enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva" (Responsabilidade Civil, nº 49, pág. 60, 4ª edição, 1993).

Diante de tais parâmetros, o valor da reparação, estabelecido pelo nobre julgador de primeiro grau, deve ser mantido.

Ante o exposto, nego provimento ao apelo e ao recurso adesivo.

Des. Jorge Luiz Lopes do Canto (REVISOR)

De acordo com o insigne Relator, tendo em vista as peculiaridades do caso concreto, que autorizam a conclusão exarada no voto.

Des. Gelson Rolim Stocker

Acompanho no caso concreto.

DES. LEO LIMA - Presidente - Apelação Cível nº 70025519687, Comarca de Santa Maria: "NEGARAM PROVIMENTO AO APELO E AO RECURSO ADESIVO. UNÂNIME"

Julgador(a) de 1º Grau: ELIANE GARCIA NOGUEIRA

Publicado em 08/10/09




JURID - Responsabilidade civil. Dentista. Colocação de aparelho. [26/10/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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