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sexta-feira, 16 de outubro de 2009

JURID - Apelação criminal. Prescrição da pretensão punitiva. [16/10/09] - Jurisprudência


Apelação criminal. Prescrição da pretensão punitiva. Inocorrência.


Tribunal Regional Federal - TRF 3ª Região.

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 1999.61.81.003747-3/SP

RELATOR: Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO

APELANTE: HENRIQUE SCHILLER

ADVOGADO: HERMINIO EJZENBAUM

APELADO: Justiça Pública

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. INOCORRÊNCIA. FALSIDADE DOCUMENTAL. MATERIALIDADE DEMONSTRADA. RECLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA. FALSIDADE IDEOLÓGICA. AUTORIA COMPROVADA. PROCESSO ADMINISTRATIVO. PREJUÍZO PATRIMONIAL. IRRELEVÂNCIA. CONDENAÇÃO MANTIDA. PENA-BASE. REDUÇÃO DE OFÍCIO. CAUSA DE AUMENTO. NÃO APLICADA. NE REFORMATIO IN PEJUS. REGIME ABERTO. VALOR DO DIA-MULTA. SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. MANUTENÇÃO. RECURSO IMPROVIDO.

1. Inocorrência da prescrição da pretensão punitiva.

2. O apelante, prevalecendo-se do cargo que ocupava no DEPARTAMENTO NACIONAL DE ESTRADAS E RODAGENS - DNER, falsificou termos de liberação de ônibus legalmente apreendidos, assinando-os em nome do seu superior, motivo pelo qual foi denunciado como incurso no artigo 297, parágrafo 1º, c/c artigo 69 do Código Penal.

3. Materialidade demonstrada pelos documentos que instruem o procedimento administrativo disciplinar apensado aos autos e pelo Laudo de Exame Documentoscópico.

4. Comprovado que o réu estava autorizado a assinar os termos de liberação de veículo por seu superior, na falta deste e de seu substituto legal.

5. Comprovado, outrossim, que um dos documentos assinados pelo réu é ideologicamente falso.

6. Sem reparo a reclassificação da conduta do apelante, nos termos do artigo 383 do Código de Processo Penal.

7. A persecução criminal não se vincula ao resultado da sindicância administrativa e a configuração do tipo penal imputado ao réu não requer a comprovação de prejuízo patrimonial para a administração pública.

8. Mantida a condenação pelo crime do artigo 299 do Código Penal.

9. Redução, de ofício, da pena-base. A tese sobre enriquecimento ilícito não passa de mera conjectura e as demais circunstâncias apontadas, muito embora pesem em desfavor do réu, não autorizam a elevação da pena-base em seu triplo, tendo em vista que apenas um dos documentos questionados continha contrafação.

10. Não aplicada a causa de aumento descrita no parágrafo único do artigo 299 do Código Penal, apesar do réu ser funcionário público e ter se prevalecido do cargo que ocupava para o cometimento do crime. Tal situação, todavia, é imutável em observância à ne reformatio in pejus.

11. Sem reparo o regime aberto, o valor do dia-multa e a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos.

12. Recurso a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, afastar a alegação de prescrição da pretensão punitiva e, no mérito, negar provimento à apelação, reduzindo, de ofício, a pena privativa de liberdade e de multa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 29 de setembro de 2009.

Johonsom di Salvo
Desembargador Federal

VOTO

O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo, Relator:

Por primeiro, observo que após a inclusão do feito em pauta de julgamento, a defesa requereu o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva, ao argumento que HENRIQUE SCHILLER, nascido em 3/7/1934, conta com mais de 70 anos de idade (fls. 507/508).

Ocorre que mesmo aplicando a regra dos artigos 109, inciso IV, 110 e 115 do Código Penal, à pena em concreto que é de 3 anos de reclusão, o lapso prescricional, até a presente data, não se consumou, considerando que a sentença se tornou pública em 14/10/2005 (fls. 459).

Isto posto, consta dos autos que o jornal paulistano FOLHA DE SÃO PAULO, em 22/4/1999, publicou matéria intitulada ESQUEMA NO DNER COBRA PROPINA EM PARCELAS PARA LIBERAR VEÍCULO IRREGULAR, descrevendo ilicitudes praticadas, em tese, pelos servidores federais HENRIQUE SCHILLER, JOSÉ MÁRIO CENDRETTI e REGINA DEL REI SANTOS, que ocupavam, respectivamente, os cargos de chefe do serviço de operações rodoviárias, chefe do setor de transportes de passageiros e operadora de telefone, no extinto DEPARTAMENTO NACIONAL DE ESTRADAS E RODAGENS - DNER.

Esta reportagem deflagrou a instauração de inquérito policial por requisição do Ministério Público Federal e de sindicância no âmbito do DNER.

Consoante o relatório final do processo administrativo disciplinar, HENRIQUE SCHILLER e JOSÉ MÁRIO CENDRETTI receberam pena de advertência por agirem em desconformidade com a legislação pertinente ao transporte de passageiros, principalmente no que concerne ao parcelamento de multa de veículos apreendidos e sua liberação, ao passo que REGINA DEL REI SANTOS e NÍVIO AQUINO BUENO, também investigados, foram inocentados (fls. 155/167).

De outro lado, restou apurado pela Polícia Federal que o apelante, prevalecendo-se do seu cargo, nos dias 27/11 e 7/12/1998 e 19/4/1999, falsificou "termos de liberação" de ônibus legalmente apreendidos, assinando-os em nome de DEUZEDIR MARTINS, chefe do 8º DISTRITO RODOVIÁRIO FEDERAL DO DEPARTAMENTO NACIONAL DE ESTRADAS DE RODAGEM (fls. 136, 167 e 211 do Apenso II), motivo pelo qual foi denunciado como incurso no artigo 297, parágrafo 1º, c/c artigo 69 do Código Penal, sendo a inicial recebida em 10/5/2002 (fls. 254).

A materialidade está demonstrada pelos documentos que instruem o procedimento administrativo disciplinar apensado aos autos, em especial os "termos de liberação" datados de 27/11 e 7/12/1998 e 19/4/1999 (fls. 136, 167 e 211 do Apenso II), e, também, pelo Laudo de Exame Documentoscópico (Grafotécnico) nº 2920/01-SR/SP, que concluiu que as rubricas apostas sobre as impressões de carimbo "Engº DEUZEDIR MARTINS", nos "termos de liberação" de fls. 136, 167 e 211 (Apenso II), partiram do punho de HENRIQUE SCHILLER (fls. 245/248).

No que tange à autoria, verifico que o apelante, no interrogatório (fls. 292/295), declarou que ele e seu superior DEUZEDIR MARTINS convencionaram que a liberação de veículo seria assinada pelos dois ou, na ausência de um ou de outro, por seus substitutos ou, ainda, na ausência de todos, só por ele, razão pela qual não falsificou nenhum documento. Salientou que tal "convenção" tornou-se um costume no órgão, pois não há determinação legal sobre quem deva assinar a liberação de veículos. Por fim, afirmou que nas ocasiões em que assinou por DEUZEDIR MARTINS, os veículos realmente deveriam ser liberados e que as supostas irregularidades relacionadas ao pagamento/parcelamento de multas foram afastadas pelo próprio DNER, no procedimento administrativo.

DEUZEDIR MARTINS, ao testemunhar pela acusação, confirmou que o réu poderia assinar a liberação de veículo em seu nome, lançando o termo "de ordem", caso nem ele nem seu substituto legal se encontrassem no órgão. Disse que os documentos de fls. 136, 167 e 211 (Apenso II), enquadram-se nesta categoria, que apenas faltou o termo "de ordem".

As demais testemunhas ouvidas pela acusação, TERESA VALDY RETO e NILDENOR FERREIRA AMORIM, nada acrescentaram sobre as assinaturas falsificadas (fls. 319/320 e 321/322). Todavia, NILDENOR FERREIRA AMORIM, empresário que noticiou o esquema de pagamento de propina no DNER ao jornal FOLHA DE SÃO PAULO, corroborou o depoimento que prestou em sede policial (fls. 142/144), atribuindo a HENRIQUE SCHILLER, com a participação de JOSÉ MÁRIO CENDRETTI, NÍVIO AQUINO BUENO e REGINA DEL REI SANTOS, a autorização para quitar a multa decorrente da apreensão de um ônibus no próprio órgão, em três parcelas, mediante entrega de cheques pós-datados que deveriam ser trocados por dinheiro nas datas dos vencimentos.

Pela defesa foram arrolados os servidores do DNER, REGINA DEL REI SANTOS (fls. 333/335), JOSÉ MÁRIO CENDRETTI (fls. 366), BEATRIZ SOARES DE CARVALHO (fls. 421/423) e JULIO TASHIO INAOKA (fls. 424/426), que declararam que o procedimento adotado pelo réu era um costume plenamente aceito na repartição.

Ou seja, mesmo afastando os testemunhos de REGINA DEL REI SANTOS (fls. 333/335) e JOSÉ MÁRIO CENDRETTI (fls. 366), envolvidos na denúncia de corrupção, resta claro que o réu estava autorizado a assinar os termos de liberação de veículo por DEUZEDIR MARTINS, na falta deste e de seu substituto legal.

O I. Juiz sentenciante, então, na esteira das alegações finais do Ministério Público Federal (fls. 432/435), de que o documento de fls. 211 é ideologicamente falso, reclassificou a conduta do apelante para condená-lo como incurso no artigo 299 do Código Penal.

Com efeito, no "termo de liberação" datado de 19/4/1998, consta a seguinte observação "veic.liberado após o pagamento das multas decorrentes e da taxa de liberação de veic., através das guias n/s BB 05840069 19/04/99" (fls. 211 - Apenso II). Ocorre que a mencionada guia (fls. 208 - Apenso II), diz respeito, apenas, à taxa de liberação de veículo, no valor de R$ 13,50.

Assim, considerando que o réu se defende dos fatos narrados na inicial, não obstante a superação da hipótese relativa à veracidade das assinaturas lançadas nos "termos de liberação", a prova dos autos evidencia que ao menos um dos documentos é inautêntico por trazer declaração falsa, agiu com acerto o MM. Juiz a quo ao dar nova capitulação à conduta, nos termos do artigo 383 do Código de Processo Penal.

Por derradeiro, frise-se que além da persecução criminal não estar vinculada ao resultado da sindicância administrativa, como bem colocou a Procuradoria Regional da República no parecer apresentado, a configuração do tipo penal imputado ao apelante não requer a comprovação de prejuízo patrimonial para a administração pública.

Fica, assim, mantida a condenação de HENRIQUE SCHILLER pelo crime do artigo 299 do Código Penal.

A dosimetria da pena, no entanto, merece reparo.

O I. Juiz sentenciante levando em conta o elevado grau de culpabilidade do réu, o prejuízo ao bom funcionamento da administração e os motivos e as conseqüências do crime que propiciaram, respectivamente, enriquecimento ilícito e descrédito ao serviço público, fixou a pena-base acima do mínimo legal, 3 anos de reclusão e 175 dias-multa.

Primeiramente, não há que se falar em enriquecimento ilícito, mesmo porque tal fato não passa de mera conjectura. Decerto, na presente ação penal discute-se tão-somente a autenticidade de documentos assinados pelo apelante, não obstante tenha se originado da investigação propulsionada pela notícia estampada no jornal FOLHA DE SÃO PAULO, que apontava a existência de um esquema de corrupção no DNER.

De outro lado, as demais circunstâncias apontadas, muito embora pesem em desfavor do réu, não autorizam a elevação da pena-base em seu triplo, tendo em vista que apenas um dos documentos questionados continha contrafação. Assim, de ofício, reduzo a pena-base para 2 anos de reclusão e 20 vinte dias-multa, considerando que à multa devem ser observados os mesmos critérios utilizados para a pena privativa de liberdade.

Ausentes agravantes e atenuantes, na terceira fase verifico que não foi aplicada a causa de aumento descrita no parágrafo único do artigo 299 do Código Penal, apesar do réu ser funcionário público e ter se prevalecido cargo que ocupava para o cometimento do crime. Tal situação, todavia, é imutável em razão da falta de recurso do órgão ministerial (ne reformatio in pejus).

No mais, ficam mantidos o regime aberto, o valor do dia-multa e a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos nos termos da sentença.

Por todo o exposto, afasto a alegação de prescrição da pretensão punitiva, e, no mérito, nego provimento à apelação, reduzindo, de ofício, a pena privativa de liberdade e de multa.

É o voto.

Johonsom di Salvo
Desembargador Federal

D.E. Publicado em 15/10/2009




JURID - Apelação criminal. Prescrição da pretensão punitiva. [16/10/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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