Anúncios


quinta-feira, 8 de outubro de 2009

JURID - Abordagem inadequada à consumidora por suspeita de furto. [08/10/09] - Jurisprudência


Civil. Ação indenizatória por danos morais. Abordagem inadequada à consumidora por suspeita de furto em estabelecimento comercial.
Obras jurídicas digitalizadas, por um preço menor que as obras impressas. Acesse e conheça as vantagens de ter uma Biblioteca Digital!


Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC.

Apelação Cível n. 2007.011079-7, de Palmitos

Relator: Des. Luiz Carlos Freyesleben

CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS. ABORDAGEM INADEQUADA À CONSUMIDORA POR SUSPEITA DE FURTO EM ESTABELECIMENTO COMERCIAL. CONSTRANGIMENTO INJUSTO E VEXATÓRIO. DEVER DE INDENIZAR CARACTERIZADO. VALOR CONDENATÓRIO. CRITÉRIOS PARA ARBITRAMENTO. OBSERVÂNCIA DAS PARTICULARIDADES DA ESPÉCIE E RAZOABILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSOS DESPROVIDOS.

"Mesmo que não ocorra repercussão na esfera patrimonial da vítima, a indenização por dano moral é devida quando for constatada ofensa à sua honra em razão de imputação de ato calunioso em local público. A acusação de prática de ato ilícito, não comprovado, ofende direito constitucionalmente assegurado, devendo a indenização ser incontestavelmente admitida como meio de ressarcimento pelo dano sofrido" (Des. Mazoni Ferreira).

O valor da indenização do dano moral há de ser fixado pelo juiz de modo a minorar a dor psíquica experimentada pelo ofendido e exercer função pedagógica, além de representar séria reprimenda ao ofensor, com vistas a evitar sua recidiva, devendo o juiz de direito dosar, de tal modo, a quantificação dos danos que o autor não venha a enriquecer sem causa, nem lançar o réu na ruína.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2007.011079-7, da comarca de Palmitos, em que são apelantes e apelados Leonita Maurer e Mercado Schena Ltda ME:

ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Civil, por votação unânime, desprover ambos os recursos. Custas legais.

RELATÓRIO

A autora Leonita Maurer e o réu Mercado Schena Ltda ME interpuseram apelações cíveis contra a sentença do doutor juiz de direito da comarca de Palmitos que, em ação indenizatória, movida pela pessoa física contra a jurídica, julgou procedente o pedido e condenou o réu ao pagamento de R$ 3.000,00 por danos morais, por ter imputado, falsamente, à autora o crime de furto. Ademais, condenou o réu em custas processuais e em honorários advocatícios, os quais fixou em 20% do valor da condenação.

A autora, Leonita Maurer, visa, tão somente, à majoração do valor indenizatório por danos morais para R$ 7.000,00 (fls. 127-130). Entretanto, o supermercado réu quer a reforma integral da sentença para a improcedência do pedido. Destarte, revisitando a argumentação de mérito contida na contestação, o réu alega que sua sócia proprietária não acusou a autora de furto; apenas lhe perguntou se pagaria um pacote de salgadinhos que apanhara, no expositor, antes de dirigir-se ao caixa. Assim, tendo em vista a resposta negativa da autora, dando conta de que não trazia consigo o produto, o funcionário pediu-lhe desculpas e nada mais ocorreu.

Destacou que a versão constante da inicial, segundo a qual a autora teria sido vítima de falsa imputação de crime de furto e alvo de revista corporal, feita pela sócia proprietária do estabelecimento, é fantasiosa e desprovida de provas. Afora isso, aduziu que os depoimentos testemunhais são-lhe favoráveis, pois as pessoas arroladas pela autora contradisseram-se em seus relatos. Assim, requereu a reforma da sentença para a improcedência do pedido ou a minoração do valor indenizatório (fls. 131-137).

A autora contra-arrazoou (fls. 142-143), e o réu se manteve silente (fl. 144).

VOTO

Cuida-se de apelações cíveis de Leonita Maurer e Mercado Schena Ltda ME, ambas desferidas contra sentença do doutor Juiz de Direito da comarca de Palmitos que, em ação indenizatória por danos morais, movida por pessoa física contra pessoa jurídica, julgou procedente o pedido para condenar a empresa ré em R$ 3.000,00, ante a falsa imputação do crime de furto e constrangimento ilegal perpetrados contra a autora.

Analisam-se os dois apelos simultaneamente.

A questão medular reside na alegada falsa imputação de furto, cuja prática é atribuída à sócia proprietária da mercearia, seguida de revista corporal na pessoa da autora.

Nos termos da exordial, a autora esteve na mercearia, em 17 de julho de 2005, para comprar ossos de porco e salame. Ao ingressar no estabelecimento, teria apanhado um pacote de salgadinhos, no expositor de mercadorias, antes de dirigir-se ao açougue; mas desistiu da aquisição do produto, enquanto caminhava em direção ao caixa. Entretanto, depois de comprar os produtos que a levaram à mercearia, abordou-a a sócia proprietária do estabelecimento, acusando-a da prática de furto, razão por que a revistou, o que lhe causou grande constrangimento.

Os proprietários da mercearia apresentaram versão diferente, segundo a qual a sócia proprietária apenas indagou se a autora teria apanhado o pacote de salgadinhos que trazia consigo, sem afirmar e nem sugerir a prática do aludido ilícito penal. De outra parte, negaram que tivessem revistado a autora, razão por que classificaram a narrativa como fantasiosa. Todavia, incontroversa é a ocorrência de um desentendimento entre autora e sócia proprietária da mercearia, de fácil constatação, não só à vista dos relatos das partes, como também dos depoimentos judiciais das testemunhas. Aliás, a solução da lide depende, necessariamente, da análise da prova testemunhal, e, nessa senda, não esteve equivocado o Juiz ao optar pela escolha do melhor direito, que julgou ser o da autora, cujas testemunhas confirmaram o comportamento lesivo da ré. E tanto isto é veraz que as testemunhas Sônia da Silva, Alair Walter e Juleide Siqueira Lopes da Silva (fls. 69-72) confirmaram a estória alinhada na peça inicial, alegando terem visto Inês, proprietária da mercearia, revistando a autora, levantando-lhe a blusa para constatar se houvera escondido os salgadinhos. Contudo, como não teria encontrado a prova procurada, desculpou-se a seguir, o que não neutralizou o vexame a que expôs a vítima.

Vejamos o que disseram as testemunhas supracitadas:

[...] em dado momento, a depoente ouviu a autora respondendo que não havia pego nada; e então olhou para dentro e viu Inês erguendo a blusa de lã da autora; foi determinado que se consignasse que a depoente mencionou que Inês estava "revistando Cleonice" [...] Inês pediu desculpas para a autora depois do ocorrido (Sônia da Silva, fl. 69).

[...] viu Inês indagando a autora "cadê o salgadinho?" e a autora respondia "que salgadinho, Inês?, eu não peguei salgadinho"; Inês olhava fixamente para a blusa da autora, então saiu do caixa e foi até a autora e ergueu a blusa desta, passando em seguida a apalpar-lhe as perna; vendo que a autora não tinha nada, Inês pediu desculpas (Alair Walter, fl. 71).

[...] quando a autora estava passando no caixa, Inês perguntou se ela havia mais alguma coisa, tendo a autora respondido que não; Inês perguntou onde estava o salgadinho, sendo que a autora respondeu que não havia pego nenhum salgadinho; então Inês saiu do caixa e ergueu a blusa da autora; vendo que a autora não havia pego nada, Inês pediu desculpas a autora" (Juleide Siqueira Lopes da Silva, fl. 72).

Entre as testemunhas da ré, Luiz Carlos Alves, empregado da mercearia, destacou que a autora "estava bastante alterada e houve uma discussão no caixa, mas o depoente não pode ouvir o que efetivamente se discutia" (fls. 73).

Maria Bregalda, proprietária do prédio em que se localiza a mercearia, disse que a autora "pegou um salgadinho numa prateleira" e, depois, dirigiu-se ao caixa, ocasião em que Inês perguntou "se não iria pagar o salgadinho; [...] a autora respondeu que não havia pego salgadinho; Inês lhe disse que poderia marcar, se a autora não tinha dinheiro, então a autora se exaltou, ficou nervosa e passou a dizer que não havia roubado nada". Além disso, relatou que "Inês não pediu à autora que erguesse a blusa e nem o fez pessoalmente" (fl. 74).

Clair Lopes, ao depor, repetiu a testemunha antecedente (fl. 75).

Sem ignorar a existência de relatos em sentido contrário aos que favorecem a autora, afiguram-se mais robustas as provas sobraçadas pela autora, pois, em essência, todas as testemunhas coonestaram a versão segundo a qual houve discussão acalorada, envolvente das partes, e, em que pese Luiz Carlos Alves não saber nem sequer o que originou os fatos, todas as demais testemunhas, tanto as da autora quanto as da ré, confirmaram que a animosidade brotou da pergunta feita à autora pela sócia proprietária da mercearia, querendo saber se a consumidora pagaria ou não o pacote de salgadinhos que apanhara em uma das prateleiras do mercadinho. Destarte, forçoso é concluir que a discussão trazia, em seu bojo, uma acusação de furto, tendo ocorrido, no mínimo, sério e evidente constrangimento à pessoa da freguesa. Assim, há motivação bastante para considerar-se a ocorrência de danos morais, praticados pela ré contra a autora, e é certo que a Constituição Federal consagra o direito à honra e à dignidade (art. 5º, X) e proclama a necessidade de reparação da lesão, mesmo quando o dano seja, exclusivamente, moral.

O dano de que se trata é presumido, porquanto brote do próprio fato que contém inegável carga de ofensividade, como se tem da lição dada em brilhante voto subscrito pelo eminente Ministro Jorge Scartezzini:

Ademais, como, também, já tem decidido esta Corte, em casos como este "não é preciso que se demonstre a existência do dano extrapatrimonial. Acha-se ele in re ipsa, ou seja, decorre dos próprios fatos que deram origem à propositura da ação". Precedentes (Resp. n. 880035/PR, j. 21-11-2006).

A jurisprudência desta Corte também assentou esse entendimento:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - CONSTRANGIMENTO DE CLIENTE EM FACE DE INJUSTA ACUSAÇÃO DE FURTO EM SUPERMERCADO - DANO CARACTERIZADO - DEVER DE INDENIZAR - CRITÉRIOS PARA O ESTABELECIMENTO DO QUANTUM REPARATÓRIO - DECISÃO QUE ANALISOU A INTENSIDADE DO SOFRIMENTO DO OFENDIDO, INTENSIDADE DO DOLO OU GRAU DA CULPA DO RESPONSÁVEL E A SITUAÇÃO ECONÔMICA DAS PARTES - VALOR DETERMINADO EM 1º GRAU MANTIDO - RECURSO DESPROVIDO.

Mesmo que não ocorra repercussão na esfera patrimonial da vítima, a indenização por dano moral é devida quando for constatada ofensa à sua honra em razão de imputação de ato calunioso em local público. A acusação de prática de ato ilícito, não comprovado, ofende direito constitucionalmente assegurado, devendo a indenização ser incontestavelmente admitida como meio de ressarcimento pelo dano sofrido (Ap. Cív. n. 2000.012309-9, de Tubarão, rel. Des. Mazoni Ferreira, j. 21-06-2002).

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - LOJA DE DEPARTAMENTOS - IMPUTAÇÃO DE FURTO A OUTREM PERANTE VÁRIAS PESSOAS - CONSUMIDOR ATINGIDO PUBLICAMENTE EM SUA DIGNIDADE - ACUSAÇÃO DE PRÁTICA DE ATO ILÍCITO FUNDADO EM SUSPEITA - SENTENÇA DANDO ACOLHIMENTO AO PLEITO RESSARCITÓRIO POSTO EM JUÍZO - INDENIZAÇÃO FIXADA EM VALOR ADEQUADO - SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA - INEXISTÊNCIA - RECLAMO DESPROVIDO.

"Na reparação do dano moral, que tem feição preventiva e punitiva, não se busca atribuir preço à honra, ao afeto, à imagem, à vida, mas oferecer uma compensação, um lenitivo à vítima ou a seus familiares, pela dor injustamente infligida. Visa-se mitigar o sofrimento, minimizar os efeitos da lesão e não eliminar o dano, porque uma vez perpetrado não é possível a sua reversão" (ACV n. 50.461 de Criciúma, Des. Pedro Manoel Abreu) (Ap. Cív. n. 2000.023365-0, da Capital, rel. Des. Orli Rodrigues, j. 05-03-2002).

Caracterizadas, pois, a lesão moral e necessidade de a ré repará-la, passa-se à análise do valor indenizatório fixado pelo Juiz de Direito em R$ 3.000,00, objeto de ambos os apelos.

Não há, na legislação pátria, parâmetros seguros com vistas à fixação de valores para danos morais, o que torna a tarefa judicial bastante árdua, ante a quase imponderabilidade do preço da dor moral.

Difícil, senão impossível, aquilatar-se, numa justa medida, o abalo infligido à alma do ser humano moralmente ofendido. Contudo, contrariaria o senso de justiça deixar sem reparo o abalo ou lesão moral cometida contra o cidadão. Assim, atenta a isto, a Justiça tem punido os infratores das regras protetoras da honra, do bom nome, da boa imagem e do psiquismo de todos quantos venham a sofrer ofensas capazes de gerar dores n'alma dos ofendidos. E esse reparo monetário dá-se da mesma forma que é devida a reparação por lesões de ordem patrimonial ou à integridade física do ser humano, ainda que os métodos de reconhecimento do fato danoso e o modo de reparação guardem, entre si, algumas diferenças, tantas vezes já comentadas em ações desta natureza.

A verdade é que se sabe que a fixação de um valor em dinheiro, como forma de aliviar a dor anímica da vítima, não é uma simples indenização criada para apagar as sequelas da ofensa. É, mais do que isso, uma forma de informar ao ofensor sobre a existência de normas de prevenção contra atos de tal natureza, a fim de preveni-lo para que, no futuro, não volte a repetir o ato quiçá impensado. Além disso, há uma carga repressora na imposição ao infrator de uma obrigação de recompor o dano por ele ocasionado. Entretanto, para a aferição da importância em dinheiro destinada à vítima, há que se atender a critérios básicos, tais como:

a) a intensidade e duração da dor sofrida; b) a gravidade do fato causador do dano; c) a condição pessoal (idade, sexo etc.) e social do lesado; d) o grau de culpa do lesante; e) a situação econômica do lesante. (cf. Prof. Fernando Noronha) (Ap. Cív. n. 97.003972-7, de Mafra, rel. Des. Pedro Manoel Abreu, j. 13-05-1999).

Evidente que, à míngua dos já mencionados parâmetros fixos com que trabalhar, o juiz de direito vê-se em conflito, no mais das vezes, com o seu bom senso, e tanto mais se aproximará da justiça quanto mais agudo for esse bom senso, pois, ao arbitrar a verba, deverá ter o cuidado de não atingir profundamente a situação econômico-financeira do causador do dano, evitando entregar à vítima um importe monetário insuportável para lesante e enriquecedor sem causa do lesado.

A este respeito, prestadio é invocar, aqui, o escólio do eminente José Raffaelli Santini:

na verdade, inexistindo critérios previstos por lei a indenização deve ser entregue ao livre arbítrio do julgador que, evidentemente, ao apreciar o caso concreto submetido a exame fará a entrega da prestação jurisdicional de forma livre e consciente, à luz das provas que forem produzidas. Verificará as condições das partes, o nível social, o grau de escolaridade, o prejuízo sofrido pela vítima, a intensidade da culpa e os demais fatores concorrentes para a fixação do dano, haja vista que costumeiramente a regra do direito pode se revestir de flexibilidade para dar a cada um o que é seu. [...] Melhor fora, evidentemente, que existisse em nossa legislação um sistema que concedesse ao juiz uma faixa de atuação, onde se pudesse graduar a reparação de acordo com o caso concreto. Entretanto, isso inexiste. O que prepondera, tanto na doutrina, como na jurisprudência, é o entendimento de que a fixação do dano moral deve ficar ao prudente arbítrio do juiz (Dano moral: doutrina, jurisprudência e prática. Campinas: Agá Júris, 2000, p. 45).

Assim, conclui-se que a estimação de um valor para a indenização, a ser paga à vítima, há de corresponder, tanto quanto possível, à situação socioeconômica de ambas as partes, sem perda de vista da indispensabilidade de se avaliar a amplitude da repercussão do evento danoso na vida diuturna da vítima.

Na hipótese, o valor fixado em primeiro grau é adequado ao que vem decidindo esta Câmara, preocupada sempre em zelar pelo princípio da razoabilidade.

A autora é pessoa de baixa condição financeira, havendo admitido beneficiar-se da distribuição de gêneros alimentícios a pessoas carentes, promovida pelo Clube dos Idosos do município.

Por certo, há de refazer-se da lesão sofrida com o que lhe foi fixado a título de danos morais. E mais não se lhe podia conceder, pois a ré também é empresa de pequeno porte, cujo capital social, conforme o contrato social de fls. 35-37, é de apenas R$ 40.000,00.

A indenização fixada em primeiro grau, então, não se mostra excessiva. Não gerará enriquecimento da vítima, sem causa, nem ocasionará a bancarrota da ré. Assim, é de manter-se a sentença fixadora dos danos morais em R$ 3.000,00.

Pelo exposto, conheço de ambos os apelos e lhes nego provimento.

DECISÃO

Nos termos do voto do Relator, por votação unânime, conheceram dos recursos e os desproveram.

O julgamento foi realizado no dia 18 de junho de 2009 e dele participaram os Exmos. Srs. Des. Mazoni Ferreira (Presidente) e Sérgio Izidoro Heil.

Florianópolis, 31 de julho de 2009.

Luiz Carlos Freyesleben
Relator

Publicado em 09/09/09




JURID - Abordagem inadequada à consumidora por suspeita de furto. [08/10/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário