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quarta-feira, 21 de outubro de 2009

JURID - Tribunal do júri. Discordância dos co-réus. [21/10/09] - Jurisprudência


Processo penal. Recurso especial. Tribunal do júri. Discordância dos co-réus em relação aos jurados.


Superior Tribunal de Justiça - STJ.

RECURSO ESPECIAL Nº 494.911 - RS (2003/0013143-9)

RELATOR: MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA

RECORRENTE: GIOVANI FERNANDEZ SOLDERA

ADVOGADOS: EDUARDO ANTONIO LUCHO FERRÃO E OUTRO(S)

JOÃO OLÍMPIO DE SOUZA FILHO E OUTRO(S)

RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

EMENTA

PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. TRIBUNAL DO JÚRI. DISCORDÂNCIA DOS CO-RÉUS EM RELAÇÃO AOS JURADOS. NÃO-CISÃO DOS JULGAMENTOS. ANTIGA REDAÇÃO DO ART. 461 DO CPP. NULIDADE RELATIVA. PRECLUSÃO. SÚMULA 7. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.

1. As nulidades relativas devem ser, sob pena de preclusão, argüidas oportunamente, nos termos definidos pela legislação ordinária.

2. Nenhuma das partes poderá argüir nulidade a que haja dado causa ou para que tenha concorrido, visando seu próprio benefício.

3. A análise de eventual prejuízo suportado pela defesa em relação à dispensa de uma testemunha se mostra descabida, pois não há como desconstituir os fundamentos adotados pelo Tribunal a quo, sem que haja uma incursão acurada da matéria fático-probatória contida nos autos, o que é sabidamente inviável em sede especial, consoante determina a Súmula 7 deste Tribunal Superior.

4. Recurso especial conhecido e improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo no julgamento, por unanimidade, conhecer do recurso, mas lhe negar provimento. Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi, Felix Fischer e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.

Sustentou oralmente na Sessão de 16/12/2008: Dr. Marcelo Leal (p/ pacte)

Brasília (DF), 07 de maio de 2009(data do julgamento)

MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA
Relator

RELATÓRIO

MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA:

Trata-se de recurso especial interposto por GIOVANI FERNANDEZ SOLDERA, com fundamento no art. 105, III, a e c, da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul que negou provimento ao recurso de apelação da defesa, deixando de reconhecer a alegada nulidade e mantendo a condenação de 15 (quinze) anos de reclusão em regime fechado pela prática de homicídio qualificado praticado em co-autoria.

O Tribunal estadual afastou a tese de nulidade pela não-cisão do julgamento diante da discordância da defesa em relação à aceitação de alguns jurados, verbis (fl. 1.541):

... não tendo havido qualquer manifestação dos defensores de GIOVANI, quanto aos jurados recusados, nem tendo eles esboçado oportuno protesto pela não-cisão do julgamento, conclui-se tenham concordado com a recusa, ainda que tacitamente.

De qualquer modo, se irregularidade tivesse ocorrido, esta seria causa de nulidade relativa que deveria ter sido oportunamente argüida, nos termos dos arts. 571, VIII e 572 do CPP.

Ademais, conforme o art. 566 do Estatuto Processual Penal, a nulidade não poderá ser argüida por quem para ela tenha concorrido.

Sobreveio, então, o presente recurso especial (fls. 1.561/1.586), no qual o recorrente aponta violação dos arts. 79, § 2º, 461 e 473 do CPP, 5º, incisos XXXVIII, "a" e LIV, da Constituição Federal, bem como divergência jurisprudencial, pugnando pela realização de outro julgamento pelo Tribunal do Júri.

Contra-razões apresentadas (fls. 1.588/1.598) e não admitido o recurso na origem (fls. 1.609/1.613), subiram os autos a esta Corte nos termos do julgamento do Agravo de Instrumento 435.238, provido (fl. 1.691).

O Ministério Público Federal, em parecer do Subprocurador-Geral da República MIGUEL GUSKOW, opina pelo provimento do recurso (fls. 1.713/1.717).

É o relatório.

VOTO

MINISTRO ARNALDO ESTEVES LIMA:

De início, com relação ao dissídio jurisprudencial suscitado, cabe ao recorrente provar o dissenso por meio de certidão, cópia autenticada ou pela citação do repositório, oficial ou credenciado, em que tiver sido publicada a decisão divergente, mencionando as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos em confronto, nos termos dos arts. 541, parágrafo único, do CPC e 255, §§ 1º e 2º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça.

Na hipótese, além de os arestos confrontados não guardarem a necessária similitude fática, o recorrente apenas transcreveu ementas dos acórdãos paradigmas, deixando de realizar o necessário cotejo analítico entre os julgados tidos por divergentes, pelo que não restou demonstrado o dissídio jurisprudencial suscitado. Nesse sentido: AgRg no AG 583.685/RS, Rel. Min. NILSON NAVES, Sexta Turma, DJ 9/2/05.

De igual modo, não cabe ao Superior Tribunal de Justiça o exame de eventual violação a artigos da Constituição Federal, uma vez que sabidamente "é vedado, em sede de recurso especial, exame de matéria constitucional" (REsp 243.793/MS, Rel. Min. GILSON DIPP, Quinta Turma, DJ 10/4/00)

Razão pela qual não se conhece do recurso pelo dissídio jurisprudencial apresentado nem pelos artigos constitucionais dito violados.

No mais, havia preparado voto no sentido de dar provimento ao recurso especial para, reformando o acórdão atacado, determinar que o réu fosse submetido a novo julgamento pelo Tribunal de Júri.

Contudo, após pedido de vista do Min. JORGE MUSSI e os debates ocorridos na sessão de julgamento, revi meu posicionamento para aderir ao entendimento firmado pela 5ª Turma do STJ.

De fato, dois fortes fundamentos afastam o alegado vício procedimental (não-cisão do julgamento) ocorrido no julgamento pela Júri.

Primeiro, tratando-se de nulidade relativa, deveria ter sido, nos termos do art. 571, VIII, do CPP, argüida logo depois que ocorreu, sob pena de preclusão.

Segundo, tendo o réu Giovani concorrido para a ocorrência do vício (calando-se silente), não poderia agora invocá-lo para seu benefício. Essa, a norma inserta no art. 565 do CPP.

Por fim, quanto ao reconhecimento de eventuais prejuízos para a defesa em relação à dispensa da testemunha Manoelina e ao pedido de acareação, impossível seu exame pela via eleita, pois não há como desconstituir os fundamentos adotados pelo Tribunal a quo, sem que haja uma incursão acurada da matéria fático-probatória contida nos autos, o que é sabidamente inviável em sede especial, consoante determina a Súmula 7 deste Tribunal Superior: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja Recurso Especial".

Ante o exposto, aderindo na íntegra ao voto proferido pelo Min. JORGE MUSSI, conheço do recurso especial e nego-lhe provimento.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

QUINTA TURMA

Número Registro: 2003/0013143-9 REsp 494911 / RS

MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 200200038396 46043 70000699710 70001348671

PAUTA: 16/12/2008 JULGADO: 16/12/2008

Relator
Exmo. Sr. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO

Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. LINDÔRA MARIA ARAÚJO

Secretário
Bel. LAURO ROCHA REIS

AUTUAÇÃO

RECORRENTE: GIOVANI FERNANDEZ SOLDERA

ADVOGADOS: EDUARDO ANTONIO LUCHO FERRÃO E OUTRO(S)

JOÃO OLÍMPIO DE SOUZA FILHO E OUTRO(S)

RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

ASSUNTO: Penal - Crimes contra a Pessoa (art.121 a 154) - Crimes contra a vida - Homicídio ( art. 121 ) - Qualificado

SUSTENTAÇÃO ORAL

SUSTENTOU ORALMENTE: DR. MARCELO LEAL (P/ PACTE)

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"Após o voto do Sr. Ministro Relator conhecendo do recurso e lhe dando provimento, pediu vista, antecipadamente, o Sr. Ministro Jorge Mussi."

Aguardam os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho e Laurita Vaz.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Felix Fischer.

Brasília, 16 de dezembro de 2008

LAURO ROCHA REIS
Secretário

VOTO-VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO JORGE MUSSI: Trata-se de Recurso Especial interposto pelo réu Giovani Hernandez Soldera, com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pela Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, que, à unanimidade, negou provimento ao apelo da defesa e manteve a condenação do réu à pena de 15 (quinze) anos de reclusão, em regime fechado, pela prática do crime de homicídio qualificado.

Consta dos autos que Giovani Hernandez Soldera e Jurandir Pimentel de Oliveira foram denunciados e pronunciados pelo delito previsto no art. 121, § 2º, incisos I e IV, c/c art. 29, ambos do Código Penal, pois no dia 19 de março de 1999, por volta das seis e meia da manhã, na comarca de Cruz Alta/RS, os réus, em comunhão de vontades e conjugação de esforços, mediante disparos de revólver, ceifaram a vida de Edinara Cristina dos Reis. Giovani teria concorrido para a prática do fato ao contratar o codenunciado Jurandir, mediante promessa de pagamento de R$ 6.000,00 (seis mil reais), para que este cometesse homicídio contra Manoelina Fátima dos Reis, tia da vítima e do denunciado Giovani, a qual residia no mesmo endereço em que Edinara foi morta; Jurandir efetuou os disparos de revólver contra a vítima por erro na execução, pois desejava alvejar Manoelina. O réu Giovani teria agido por motivo torpe, já que contratou o corréu para matar sua tia em razão de disputas de terras; referido delito foi praticado mediante recurso que impossibilitou a defesa da ofendida, atingida sem que tivesse tempo de esboçar qualquer reação, no momento em que abria o portão da casa de Manoelina.

Os réus foram submetidos a julgamento pelo Tribunal do Júri, restando condenados pelos crimes descritos na denúncia, sendo fixada pena de 15 (quinze) anos de reclusão para Giovani e 18 (dezoito) anos e seis meses de reclusão para Jurandir.

Interpostas apelações pelo Parquet e pelos defensores dos réus, o Tribunal a quo assim fundamentou o aresto recorrido, in verbis:

"[...]

"A defesa do réu Giovani alega nulidade do julgamento porque, tratando-se de concurso de pessoas, houve discordância das defesas dos apelantes na aceitação dos jurados, o que implicaria em cisão do julgamento.

"Dispõe o art. 461 do CPP: 'Se os réus forem dois ou mais, poderão incumbir das recusas um só defensor; não convindo nisto e se não coincidirem as recusas, dar-se-á a separação dos julgamentos, prosseguindo-se somente no do réu que houver aceito o jurado, salvo se este, recusado por um réu e aceito por outro, for também recusado pela acusação'.

"Consta da Ata de Julgamento: 'A defesa de Jurandir recusou imotivadamente os jurados Neli Bonaldi Alves Lourenço e Ruth Elizabete dos Santos Rocha e o Ministério Público recusou as juradas Fátima Arlete Fernandes e Gelci Terezinha Lopes Campos' (fl. 1268).

"Não consta da ata tenha a defesa de Giovani aceito os dois jurados rejeitados pela defesa de Jurandir.

"Também não há registro de terem os defensores dos réus acordado que os defensores de Jurandir tenham ficado incumbidos da aceitação ou recusa de jurados em nome dos dois réus. Mas no 'termo de sorteio dos juízes de fato' foi consignado: 'A defesa recusou imotivadamente os jurados Neli Bonaldi Alves e Ruth Elizabete dos Santos Rocha' (fl. 1255v).

"Não tendo havido qualquer manifestação dos defensores de Giovani, quanto aos jurados recusados, nem tendo eles esboçado oportuno protesto pela não-cisão do julgamento, conclui-se tenham concordado com a recusa, ainda que tacitamente.

"De qualquer modo, se irregularidade tivesse ocorrido, esta seria causa de nulidade relativa que deveria ter sido oportunamente argüida, nos termos dos arts. 571, VIII, e 572 do CPP.

"Ademais, conforme o art. 565 do Estatuto Processual Penal, a nulidade não poderá ser argüida por quem para ela tenha concorrido.

"O Código de Processo Penal, no título atinente às nulidades, visa evitar exatamente situações como estas, em que a parte queda-se silente, concordando com alguma irregularidade processual, aceita a continuação do processo para depois, conforme o resultado do julgamento, argüir, ou não, eventual nulidade.

"[...]

"Não se percebe, outrossim, prejuízo à defesa de Giovani do simples fato de não-inclusão no Conselho dos dois jurados recusados pelos defensores de Jurandir, pois isto não influiu na apuração da verdade substancial, nem na decisão da causa (CPP, art. 566), eis que os elementos de convicção constantes dos autos corroboram, à saciedade, a decisão dos jurados, como se verá mais adiante, tendo estes, outrossim, respondido por unanimidade todos os quesitos referentes aos fatos imputados a Giovani. A inclusão dos jurados recusados não alteraria o resultado do julgamento, ainda que eles pudessem ter votado pela absolvição.

"[...]

"A defesa insiste em que, não tendo ocorrido a cisão, viu-se prejudicada e cerceada pela exigüidade do tempo para expor as teses defensivas.

"Não se desconhece a existência de críticas aos dispositivos contidos nos § § 1º e 2º do art. 474, do CPP. "Essas críticas estão direcionadas, porém, aos casos em que há inúmeros réus, pois, por óbvio, a divisão do tempo para os debates impossibilitaria uma defesa eficiente; este não é o caso dos autos, em que os acusados são somente dois.

"Sem dúvida, não foi a divisão do tempo para os debates, contemplada em lei e idêntica, tanto para a acusação como para as defesas, o fator determinante da decisão unânime dos jurados, acolhendo integralmente a tese acusatória, traduzindo inequívoca manifestação de vontade dos juízes populares.

"Aliás, não há que alegar tempo reduzido para produzir as defesas, quando o defensor de Giovani, em sua primeira intervenção em plenário, usou uma hora e vinte e quatro minutos, quando dispunha de mais seis minutos, e ambas as defesas não utilizaram todo o tempo de que dispunham para a tréplica (fl. 1269).

"[...]" (fls. 1540 a 1543).

Irresignado, o réu Giovane Hernandez Soldera interpôs este Recurso Especial, no qual alega violação dos arts. 79, § 2º, 229, parágrafo único, 461, 470 e 473, todos do Código de Processo Penal; art. 5º, incisos XXXVIII, a e LIV, da Constituição Federal, bem como divergência jurisprudencial, pugnando pela realização de novo julgamento pelo Tribunal do Júri, em razão da nulidade do anteriormente realizado.

Sustenta que, no caso dos autos, o julgamento deveria ter sido cindido, pois um dos jurados foi aceito pelo recorrente e pelo Ministério Público e recusado pela defesa do corréu Jurandir.

Busca demonstrar que o tempo foi dividido meio a meio entre os defensores, o que demonstra claramente a ofensa do princípio constitucional da ampla defesa, já que se houvesse a cisão do julgamento, consoante determinado por lei, teria duas horas para se manifestar.

Assevera que não consta nos autos a informação de eventual acordo entre os réus acerca da escolha do defensor de Jurandir para manifestar as recusas aos jurados em nome da defesa de ambos.

Alega, ainda, a nulidade do julgamento em razão da dispensa da testemunha Manoelina sem a concordância da defesa, quando ainda haviam outros testigos a serem inquiridos em plenário, bem como pela negativa do pedido de acareação formulado entre aquela e Adalberto Abreu de Oliveira.

Em contrarrazões, o Parquet sustenta que inexiste, na espécie, a violação aos arts. 79, § 2º, 461 e 473, todos do Codex Processual Criminal, em razão da ocorrência da preclusão. Alega que a irresignação não merece conhecimento no tocante à alegada negativa de vigência ao art. 5º, XXXVIII e LIV da Carta Magna, por não ser o Especial a via processual adequada para tanto. Por fim, ainda quanto à admissibilidade, pugna pela negativa de seguimento do inconformismo interposto pela alínea c do permissivo constitucional, eis que ausente o cotejo analítico e a demonstração do dissídio jurisprudencial. No mérito, reiterou as razões apresentadas às fls. 1916 a 1931 pelo Ministério Público, requerendo o improvimento do recurso.

Admissibilidade negativa na origem (fls. 1609 a 1613), os autos subiram a este Sodalício em razão do provimento ao Agravo de Instrumento nº 435.238, interposto pela defesa (fls. 1691).

A Subprocuradoria-Geral da República, em parecer de fls. 1713 a 1717, opina pelo conhecimento em parte do Especial e, nesta extensão, por seu provimento.

Em voto proferido pelo Relator, o Excelentíssimo Senhor Ministro Arnaldo Esteves Lima, foi conhecido parcialmente o recurso para, nesta parte, dar-lhe provimento a fim de reformar o aresto objurgado e determinar que o réu seja submetido ao novo julgamento pelo Tribunal do Júri.

Pedi vista dos autos para melhor análise.

Quanto ao não conhecimento do recurso interposto com fulcro na divergência pretoriana, bem como por violação ao art. 5º, XXXVIII e LIV, da Constituição Federal, acompanho o nobre Relator.

Contudo, no tocante à violação do art. 461 do Código de Processo Penal (em sua antiga redação), pela nulidade do júri em face da não cisão do julgamento, não obstante os relevantes e judiciosos argumentos expostos pelo ilustre Relator, ouso divergir.

Verifica-se que o cerne da questão é a definição acerca da alegada mácula ocorrida nos autos, se absoluta ou relativa, sendo mister trazer à colação a ensinança do doutrinador GUILHERME DE SOUZA NUCCI, veja-se:

"Deve-se, sempre, observar o grau e a intensidade da falha processual, vale dizer, o vício do qual padece determinado ato processual pode ser classificado, basicamente, de dois modos: grave, gera-se a nulidade absoluta, impossível de ser convalidada, exigindo-se o refazimento do ato. Para esta situação, não há preclusão, podendo alegar o vício em qualquer momento, inclusive após o trânsito em julgado, ao menos de decisão condenatória. Há interesse público no reconhecimento dessa espécie de nulidade, pois concernente à lisura do devido processo legal.

"Se a falha contrastar com a lei vigente em intensidade média, torna-se capaz de gerar a nulidade relativa, admitindo-se a convalidação do ato, sem necessidade de seu refazimento obrigatório. Deve ser alegada em determinado prazo, sob pena de preclusão. O interesse em seu reconhecimento liga-se muito mais à parte do que ao interesse público.

"[...]

"Afora o âmbito do contraste com os princípios constitucionais regentes da instituição do júri, outras falhas podem decorrer do desatendimento de comandos legais, a maior parte deles constante do Código de Processo Penal.

"Para isso, novamente, retomamos o anteriormente exposto, salientando dever o Judiciário buscar o máximo equilíbrio e a prudência redobrada para evitar a anulação de processos do Tribunal do Júri, que, por si sós, são complexos, de trâmite lento, com várias fases e variadas formalidades" (in Tribunal do Júri, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 479 a 482).

Para melhor elucidação do tema, transcrevo o teor do citado dispositivo legal, antes de sua alteração pela Lei nº 11.689/2008, in verbis:

Art. 461 - Se os réus forem dois ou mais, poderão incumbir das recusas um só defensor; não convindo nisto e se não coincidirem as recusas, dar-se-á a separação dos julgamentos, prosseguindo-se somente no do réu que houver aceito o jurado, salvo se este, recusado por um réu e aceito por outro, for também recusado pela acusação.

Parágrafo único - O réu, que pela recusa do jurado tiver dado causa à separação, será julgado no primeiro dia desimpedido.

Comentando aludido artigo, o mestre JULIO FABBRINI MIRABETE assim lecionava:

"Quando num julgamento há dois ou mais co-réus, permite a lei que, embora haja dois ou mais defensores, seja apenas um deles incumbido das recusas. Caso não haja concordância dos defensores quanto à incumbência, e não concordando os defensores a respeito da recusa de qualquer jurado sorteado, dar-se-á a separação dos julgamentos (art. 79, § 2º), prosseguindo-se somente no do réu que houver aceito o jurado. Não haverá separação, porém, se o jurado, recusado por um acusado e aceito por outro, for também recusado pela acusação. "Nesta última hipótese o jurado não servirá e o julgamento será realizado normalmente. Aceito o jurado por um dos defensores e pela acusação, o réu, que pela recusa tiver dado causa à separação, deve ser julgado no primeiro dia desimpedido (in Código de processo penal interpretado, 11. ed., São Paulo: Atlas, p. 1197).

Assim, apesar da aplicação literal do citado dispositivo legal determinar a cisão do julgamento na hipótese de discordância dos corréus quanto à recusa dos jurados, observa-se que o caso dos autos possui certas peculiaridades que não permitem a classificação da nulidade como absoluta e, consequentemente, a anulação do júri pelos fundamentos elencados no Especial.

Primeiramente, porque consta, de forma expressa na Ata da Sessão de Julgamento, que ambas as defesas não utilizaram todo o tempo de que dispunham para a tréplica, restando dispensados sete minutos de sustentação oral, nos termos da seguinte transcrição, in verbis:

"Tréplica - As defesas retornaram em tréplica das 4h51 às 5h44min, ratificando seus pedidos anteriores" (p. 1269).

Portanto, a alegação de que houve cerceamento de defesa em razão da divisão do tempo destinado à manifestação oral por parte dos defensores não merece acolhida, pois estes não consideraram necessária a utilização de todo o período que dispunham para tréplica.

Em segundo lugar, porque, como bem salientado no aresto objurgado, "não consta da ata tenha a defesa de Giovani aceito os dois jurados rejeitados pela defesa de Jurandir" (fls. 1540), sendo certo que a Corte gaúcha entendeu que a ausência de manifestação por parte da defesa do recorrente configuraria concordância tácita com as recusas.

Não consta, ainda, nenhuma manifestação em ata, por parte de ambas as defesas, acerca da cisão do julgamento, as quais ficaram silentes, manifestando-se a defesa do réu Giovani apenas neste recurso especial.

Ora, nos termos do art. 571, inciso VIII, do CPP, as nulidades ocorridas em plenário devem ser arguidas logo depois que ocorrerem, sob pena de preclusão, consoante entendimento já esposado neste Sodalício, veja-se:

"PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. TRIBUNAL DO JÚRI. NOTIFICAÇÃO DE TESTEMUNHAS DE DEFESA DURANTE A SESSÃO DE JULGAMENTO. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE NULIDADE. PRECLUSÃO. RECURSO DESPROVIDO.

"1. Já iniciada a sessão de julgamento pelo Tribunal do Júri, o Juiz presidente determinou a notificação das testemunhas de defesa, que compareceram e prestaram depoimento a pedido da própria defesa do ora recorrente, não lhe sendo possível, nesta via, alegar possível nulidade a que deu causa.

"2. As eventuais nulidades do julgamento em plenário do Júri deverão ser argüidas logo após a sua ocorrência, sob pena de preclusão.

"3. A intervenção do Juiz na atividade processual ocorre para dirigir a marcha da ação penal e julgá-la, sendo-lhe facultado ordenar, de ofício, provas que conduzam ao esclarecimento da verdade.

"4. Recurso desprovido" (RHC 16.602/DF, rel. Min. OG FERNANDES, Sexta Turma, p. no DJe de 20-10-2008).

Não discrepa o seguinte decisum:

"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADA. ART. 571, INCISO VIII, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PRECLUSÃO. APLICAÇÃO DO VERBETE SUMULAR N.º 284 DO STF. SÚMULA N.º 07 DO STJ.

"[...]

"3. Nos termos do art. 571, inciso VIII, do Código de Processo Penal, as possíveis nulidades ocorridas no Júri devem ser argüidas na sessão de julgamento do Plenário, logo depois de ocorrerem, sob pena de preclusão.

"[...]

"6. Agravo regimental desprovido" (AgRg no Ag 796.003/PE, rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, p. no DJe de 12-05-2008).

Dessa forma, considerando-se que a defesa do réu Giovani concorreu para a ocorrência da alegada nulidade, por não tê-la arguido durante a sessão de julgamento, não pode invocá-la, neste momento processual, para requerer a anulação do julgamento, haja vista o disposto no art. 565 do Código Processual Penal, in verbis:

"Art. 565. Nenhuma das partes poderá argüir nulidade a que haja dado causa, ou para que tenha concorrido, ou referente a formalidade cuja observância só à parte contrária interesse".

Em comentário ao citado dispositivo, JULIO FABBRINI MIRABETE asseverava que "[...] o silêncio da parte pode constituir uma concausa para a nulidade, impedindo-o de argui-la. É evidente o fundamento da regra; ninguém pode alegar a própria torpeza em seu benefício" (op. cit., p. 1398).

Ademais, como todos os quesitos relativos aos fatos imputados ao recorrente foram respondidos por unanimidade pelos jurados, a inclusão daqueles dois recusados pelo réu Jurandir não ocasionaria mudança na decisão final do júri.

Por fim, quanto à nulidade do julgamento em razão da dispensa da testemunha Manoelina sem a concordância da defesa, quando ainda haviam outras a serem inquiridas em plenário, bem como pela negativa do pedido de acareação formulado entre referido testigo e Adalberto Abreu de Oliveira, verifica-se que o Tribunal a quo, com base nas provas colhidas nos autos, determinou a dispensa da testemunha apontada, bem como entendeu desnecessária a medida pleiteada, veja-se:

"A partir do momento em que, como pretendia a defesa, a segunda testemunha, Delegado Adalberto Abreu de Oliveira, reconheceu a assinatura da Delegada Lylian no documento de fl. 53 dos autos (que se constitui no termo de declarações prestadas por Manoelinha Fátima dos Reis na polícia), esvaziava-se o objeto da acareação, expressamente declinado pelas defesas, até porque, como ficou consignado, o Delegado não presenciou aquele ato inquisitorial.

"Cabe frisar, ainda, que a acareação não é providência obrigatória, fica ao prudente arbítrio do juiz, pois somente será admitido se a contradição versar sobre ponto essencial da causa, e não se puder chegar à verdade por intermédio das demais provas produzidas.

"[...]

"A testemunha Manoelinha, primeira a ser ouvida, somente foi dispensada depois de inquirida a segunda testemunha em plenário, após ficar à disposição da justiça por cerca de 10 horas; e a circunstância alegada pelas defesas, de que poderia haver interesse em confrontá-la com outra testemunha ou por ocasião do debate, não se fez presente, consoante registrado em ata, não havendo falar em cerceamento de defesa" (fls. 1544 e 1545).

Dessa forma, constata-se que o conhecimento do recurso, neste ponto, encontra óbice na Súmula nº 7 do Superior Tribunal de Justiça, porquanto para a emissão de juízo de valor sobre aludida quaestio, seria necessário o reexame do acervo fático-probatório.

Acerca do tema, já decidiu este Superior Tribunal:

"PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. INADMISSIBILIDADE. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA 284/STF. NÃO INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL VIOLADO. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA E ECONÔMICA E CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO. CERCEAMENTO DE DEFESA. DISPENSA DE TESTEMUNHAS. AUTENTICAÇÃO DE DOCUMENTOS. DOSIMETRIA DA PENA. INÉPCIA DA DENÚNCIA.

"[...]

"V - Não se conhece do recurso especial no tópico relativo ao cerceamento de defesa sofrido pelo réu, em face da dispensa de oitiva de testemunha arrolada pela defesa, seja porque a fundamentação do apelo raro, nessa parte, é deficiente (não houve indicação do dispositivo legal tido por violado), seja porque a súplica esbarra na impossibilidade de reexame de questão de fato (Súmula 7/STJ).

"[...]

"Pelo exposto, nego provimento ao recurso quanto ao último tópico, no qual se alegou dissídio jurisprudencial, e não o conheço quanto aos demais" (REsp 260.562/RS, rel. Min. FELIX FISCHER, Quinta Turma, p. no DJ de 16-10-2000, p. 334).

Seguindo idêntica direção, colhe-se:

"PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. SÚMULA 182 DO STJ. ART. 40, II, DA LEI 8.038/90. INAPLICABILIDADE. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE EM RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282 DO STF. PEDIDOS DE ACAREAÇÃO E DE REINQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHAS. INDEFERIMENTO. REEXAME DE PROVA. SÚMULA 7 DO STJ.

"[...]

"O indeferimento do pedido de acareação, bem como de reinquirição de testemunhas, por si só, não configura cerceamento de defesa, haja vista que cabe ao juiz da causa decidir acerca da necessidade de tais diligências.

"A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial." (Súmula 7 do STJ) Agravo regimental de que se conhece em parte e que, nessa extensão, é desprovido" (AgRg no Ag 576.714/MS, rel. Min. PAULO MEDINA, Sexta Turma, p. no DJ de 20-02-2006, p. 377).

Assim, inexistindo qualquer mácula referente ao julgamento popular, merece preservada a soberania do veredicto exarado pelo Tribunal do Júri, razão por que, a despeito da judiciosa posição do ilustre Relator, entendo que o recurso especial deve ser conhecido em parte para, nesta extensão, ser-lhe negado provimento.

É o voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

QUINTA TURMA

Número Registro: 2003/0013143-9 REsp 494911 / RS

MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 200200038396 46043 70000699710 70001348671

PAUTA: 16/12/2008 JULGADO: 07/05/2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO

Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. ÁUREA MARIA ETELVINA N. LUSTOSA PIERRE

Secretário
Bel. LAURO ROCHA REIS

AUTUAÇÃO

RECORRENTE: GIOVANI FERNANDEZ SOLDERA

ADVOGADOS: EDUARDO ANTONIO LUCHO FERRÃO E OUTRO(S)

JOÃO OLÍMPIO DE SOUZA FILHO E OUTRO(S)

RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

ASSUNTO: Penal - Crimes contra a Pessoa (art.121 a 154) - Crimes contra a vida - Homicídio ( art. 121 ) - Qualificado

SUSTENTAÇÃO ORAL

SUSTENTOU ORALMENTE NA SESSÃO DE 16/12/2008: DR. MARCELO LEAL (P/ PACTE)

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"Prosseguindo no julgamento, a Turma, por unanimidade, conheceu do recurso, mas lhe negou provimento."

Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi, Felix Fischer e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 07 de maio de 2009

LAURO ROCHA REIS
Secretário

Documento: 849524

Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 19/10/2009




JURID - Tribunal do júri. Discordância dos co-réus. [21/10/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

3 comentários:

  1. Uma sessão do Tribunal do Júri foi devidamente instalada pelo Juiz Presidente com a presença de 14 jurados. Como não houve qualquer recusa por parte do Ministério Público e da Defensoria Pública, o Conselho de Sentença foi composto adequadamente. O acusado restou condenado e a defesa apelou, alegando ato juridicamente inexistente por desrespeito ao número mínimo de jurados para sorteio do Conselho de Sentença. O Ministério Público alegou, nas contrarrazões, preclusão do ato, não podendo a defesa dar causa a invalidade com que compactou. Pergunta-se: quem tem razão: a defesa, o Ministério Público ou nenhum dos dois? pode mandar a resposta para meu email? lucy.vinuto@hotmail.com
    Grata

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  2. Em audiência preliminar realizada na 35ª Unidade dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais da Comarca de Sobral, João Pedro compareceu sem o acompanhamento de advogado. Recusou a proposta de composição civil dos danos, bem como a de transação penal. Oferecida a denúncia, João Pedro compareceu à audiência de instrução e julgamento acompanhado de advogado, e, mais uma vez, recusou a proposta. Pergunta-se: existe nulidade no fato de ele ter comparecido à audiência preliminar sem advogado? Por quê?

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  3. Pedro, com 18 anos de idade à época do fato, foi denunciado pelo crime de apropriação indébita (art. 168, caput, CP). Nas alegações finais o defensor do acusado alegou nulidade absoluta, visto que não houve oferecimento da proposta de suspensão condicional do processo. Pergunta-se: você, como juiz, acolheria a tese defensiva elaborada pelo advogado de Pedro? Por quê? Fundamente sua resposta com base na legislação e no entendimento jurisprudencial.

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