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quinta-feira, 8 de outubro de 2009

JURID - Reparação em pecúnia. Caráter pedagógico. Dumping social. [08/10/09] - Jurisprudência


Reparação em pecúnia. Caráter pedagógico. Dumping social. Caracterização.
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Tribunal Regional do Trabalho - TRT 3ª Região.

Processo: 00866-2009-063-03-00-3 RO

Data de Publicação: 31/08/2009

Órgão Julgador: Quarta Turma

Juiz Relator: Des. Julio Bernardo do Carmo

Juiz Revisor: Juiz Convocado Eduardo Aurelio P. Ferri

Recorrente(s): JBS S.A.

Recorrido(s): Satiro da Rocha Queiroz

EMENTA: REPARAÇÃO EM PECÚNIA - CARÁTER PEDAGÓGICO - DUMPING SOCIAL - CARACTERIZAÇÃO - Longas jornadas de trabalho, baixos salários, utilização da mão-de-obra infantil e condições de labor inadequadas são algumas modalidades exemplificativas do denominado dumping social, favorecendo em última análise o lucro pelo incremento de vendas, inclusive de exportações, devido à queda dos custos de produção nos quais encargos trabalhistas e sociais se acham inseridos. "As agressões reincidentes e inescusáveis aos direitos trabalhistas geram um dano à sociedade, pois com tal prática desconsidera-se, propositalmente, a estrutura do Estado Social e do próprio modelo capitalista com a obtenção de vantagem indevida perante a concorrência. A prática, portanto, reflete o conhecido 'dumping social'" (1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, Enunciado nº 4). Nessa ordem de idéias, não deixam as empresas de praticá-lo, notadamente em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, quando infringem comezinhos direitos trabalhistas na tentativa de elevar a competitividade externa. "Alega-se, sob esse aspecto, que a vantagem derivada da redução do custo de mão-de-obra é injusta, desvirtuando o comércio internacional. Sustenta-se, ainda, que a harmonização do fator trabalho é indispensável para evitar distorções num mercado que se globaliza" (LAFER, Celso - "Dumping Social", in Direito e Comércio Internacional: Tendências e Perspectivas, Estudos em homenagem ao Prof. Irineu Strenger, LTR, São Paulo, 1994, p. 162). Impossível afastar, nesse viés, a incidência do regramento vertido nos artigos 186, 187 e 927 do Código Civil, a coibir - ainda que pedagogicamente - a utilização, pelo empreendimento econômico, de quaisquer métodos para produção de bens, a coibir - evitando práticas nefastas futuras - o emprego de quaisquer meios necessários para sobrepujar concorrentes em detrimento da dignidade humana.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário, em que figuram como recorrente(s) JBS S.A. e, como recorrido(s), SATIRO DA ROCHA QUEIROZ.

I - RELATÓRIO

A Vara do Trabalho de Ituiutaba, em sentença da lavra do Exmo. Juiz Alexandre Chibante Martins, às folhas 260/290, cujo relatório adoto e a este incorporo, julgou parcialmente procedentes os pedidos para condenar a reclamada ao pagamento de horas extras, assim consideradas as excedentes da oitava diária e/ou 44ª. semanal, com adicional convencional de 55% ou legal, limitando o direito ao adicional, apenas, quanto às horas destinadas à compensação, com reflexos em RSR's, férias mais 1/3, 13º. salários, FGTS + 40%, indenização por dumping social no importe de R$500,00, além de honorários advocatícios.

Inconformada a ré, recorre ordinariamente às fls. 292/331, buscando a reforma, in totum, do julgado. Acena com a existência de acordo de compensação de horas, hábil ao afastamento da condenação imposta, inclusive a título de reparação por um suposto dumping social, cuja ocorrência é negada, defendendo, em apertada síntese, a inexistência de qualquer prática capaz de evidenciar a superexploração dos empregados na busca do lucro exorbitante e fácil. Pugna, ao final, também pelo indeferimento dos honorários advocatícios e benefícios da justiça gratuita concedidos ao autor.

Recolhimento de custas e depósito recursal comprovados às folhas 334/335.

Contra-razões às fls. 339/376, com documentos (fls. 377/391).

É o relatório.

II - VOTO

1 - JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

As partes tiveram ciência do inteiro teor da r. decisão combatida na forma da Súmula 197, do C. TST (fls. 260 e 290), em 23.04.2009, quinta-feira, presentes as partes à audiência (Termo, folha 74), e juntada a sentença na data aprazada, folha 259-verso.

É, assim, próprio e tempestivo o recurso ordinário interposto pela reclamada em 04.05.2009 (fl. 292 - tendo em vista o feriado de primeiro de maio do corrente ano, sexta-feira, que prorrogou o término do octídio legal), devidamente assinado pelo procurador constituído conforme folha 100, além de comprovados o recolhimento das custas e o depósito recursal em escorreitos valores, v.g. dispositivo de folha 290.

Em 25.05.2009, fl. 337, foi o reclamante cientificado do apelo e, assim, igualmente escorreitas as contra-razões protocoladas em 02.06.2009, subscritas, regular a representação (fl. 72). Admito os documentos trazidos à colação pelo autor, de consulta pública no próprio site deste Regional.

Satisfeitos os pressupostos de objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso interposto pela reclamada.

2 - JUÍZO DE MÉRITO

2.1 - HORAS EXTRAS E ADICIONAL DAS HORAS EXTRAS - ACORDO DE COMPENSAÇÃO DE JORNADA

O MM. Juiz de origem, considerando a habitualidade do labor em sobrejornada, descaracterizou o sistema de compensação adotado pela reclamada, no sistema de Banco de Horas, e, aplicando o disposto na Súmula 85 do c. TST, deferiu ao reclamante o pagamento de horas extras, assim consideradas as excedentes da oitava diária e/ou 44ª. semanal, com adicional convencional de 55%, limitando o direito ao adicional, apenas, quanto às horas destinadas à compensação, com reflexos em RSR's, férias mais 1/3, 13º. Salários, FGTS + 40%.

A ré, destituída de razão, não se conforma com o decidido.

Com efeito, o artigo 7o, inciso XIII, da CF/88, ao limitar a jornada normal a oito horas diárias, permitiu a compensação de horários e a redução da jornada por meio de acordo ou convenção coletiva de trabalho, in verbis:

"XIII - Duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho".

Nesse entendimento, as Súmulas 85 do c. TST e 06 deste Regional permitem que o ajuste referente à jornada de trabalho seja feito individualmente com o empregado, ou coletivamente, com a participação do sindicato por meio de negociação. De acordo com a Súmula n. 06 deste Regional:

"é válido o acordo individual para compensação de horas extras, desde que observada a forma escrita. Inteligência do art. 7º, XIII da Constituição da República".

No mesmo diapasão o item I, da Súmula 85, do C. TST:

"I. A compensação de jornada de trabalho deve ser ajustada por acordo individual escrito, acordo coletivo ou convenção coletiva".

Outrossim, acena a recorrente com uma suposta escorreita apresentação de cartões de ponto e recibos de pagamento (documentos de fls. 144/258), nos quais, contudo, se infere quitação habitual a título de sobrejornada, o que nos leva à invalidade do regime compensatório de trabalho adotado, em sistema de Banco de Horas, com espeque nos ditames do item IV, da Súmula 85, do C. TST, que é pontual:

"IV. A prestação de horas extras habituais descaracteriza o acordo de compensação de jornada. Nesta hipótese, as horas que ultrapassarem a jornada semanal normal deverão ser pagas como horas extraordinárias e, quanto àquelas destinadas à compensação, deverá ser pago a mais apenas o adicional por trabalho extraordinário".

Averiguando, nessa linha de raciocínio, que os recibos salariais acostados contêm quitação habitual de sobrejornada, insere-se o contexto dos autos na exceção do verbete sumulado supra transcrito. Equivale dizer, outra não é a constatação, senão a de que o acordo de compensação não atingiu, plenamente, a finalidade prevista nos instrumentos normativos que o autorizam.

Nessa mesma toada a r. decisão vergastada, que com sabedoria explanou, in verbis, fls. 264/265:

"(...)

Os cartões de ponto são prova pré-constituída, cabendo ao reclamante o ônus de demonstrar a inveracidade deles.

Contudo, na audiência de fl. 74, o reclamante declarou que '(...) os cartões de ponto retratam a real jornada;' .

Portanto, os cartões de ponto são aqui tidos por verazes.

(...)

Os cartões de ponto acostados pelo reclamado (fls. 215/258), e tidos por verídicos (conforme fundamentação aposta no item C apontam jornada, na maioria das vezes, superior às oito horas diárias (por exemplo, dia 11/11/03, fl. 222; 02/10/08, fl. 253).

Há pagamento de horas extras conforme recibos de pagamento de fls. 147/214 (por exemplo, fl. 161, fl. 177).

Os ACT's acostados possuem a previsão de banco de horas (cláusula 5ª, CCT 03/04; cláusula 8ª, ACT 04/05; cláusula 9ª do ACT05/06; cláusula 9ª do ACT 06/07; cláusula 8ª do ACT 07/08 e cláusula 8ª do ACT 08/09).

O reclamante afirma que há ofensa ao disposto na Súmula nº 85 do Col. TST por parte do reclamado.

A questão a ser examinada é a aposta no inc. IV da Súmula n. 85: há ou não prestação habitual de sobrejornada?

Analisemos os recibos de pagamento de fls. 174/214, por amostragem. Verifica-se que há pagamento de horas extraordinárias em vários meses , por exemplo: março/07, fl. 189= 01,33HE; abril/08, fl. 205= 21,50HE. Observe-se, também, o demonstrativo de fls. 03/04, produzido pelo reclamante.

Portanto, houve labor em jornada extraordinária na maioria dos meses trabalhados. Assim, as horas extraordinárias eram habituais.

(...)

Importa destacar que, ao meu sentir, não se apresentaria válida a cumulação de um acordo de prorrogação de jornada e um acordo para compensação de horas de trabalho.

Em primeiro lugar, se estaria pré-contratando horas

extraordinárias, elevando-se, pois, a jornada para além das 08 (oito) horas diárias (o que abaixo se analisará e se demonstrará), o que contraria o disposto no art. 7º, inc. XIII da CF/88 (...).

Por outro lado, a jurisprudência do Col. TST não admite a pré-contratação de horas extraordinárias, nos termos da Súmula nº 199, aqui utilizada por analogia.

Como ensina o Professor José Affonso Dallegrave Neto '(...)Acordo de compensação de jornada é, pois, o pacto firmado para legitimar o excesso de jornada de um determinado dia da semana, em face do decréscimo parcial ou total de outro, desde que observada a carga máxima semanal, prevista genericamente em lei ou em norma especial mais benéfica ao empregado (...) Por acordo de prorrogação de jornada se entende, 'em primeiro lugar, o ajuste de vontades entre empregado e empregador, tendo por fim legitimar a prorrogação da jornada normal de trabalho. Em segundo lugar, significa o documento escrito no qual materializa-se a vontade das partes, para o fim acima mencionado).

Pelo próprio conceito visto, percebe-se a baliza entre o acordo de prorrogação (que tem como finalidade legitimar o fazimento de horas extras permanentes e pré-avençadas) e o acordo de compensação (que visa a legalizar o excesso de labor de um dia com a mitigação em outro, desde que dentro da mesma semana e com observância do limite legal de 44 horas).

(...)

Ainda que inócuo o estudo hodierno desses acordos prorrogativos de horas, enfatize-se a correta e precisa posição jurisprudencial que, com esteio no art. 115 do Código Civil (atual art. 122 - adendo meu), proíbe a acumulação de acordos de compensação e de prorrogação, traduzida na ementa

a seguir grafada: 'Permitir a cumulação de ajustes que visam a prorrogar e a compensar a jornada de trabalho implica sujeitar o reclamante ao exclusivo arbítrio da reclamada quanto à forma de adimplemento de obrigação contratual, o que é vedado pelo art. 115 do Código Civil' (TRT 9ª R., Ac. unânime, 5ª T., nº 5545/95, in DJPR 17.03.1995, pág. 276).

(...)

O festejado jurista AMAURI MASCARO NASCIMENTO há muito já advertia 'que uma legislação que permite horas extras habituais desvirtua-se. O que é extraordinário torna-se normal. A duração diária do trabalho, que deveria ter limitação, ultrapassa, com base na própria lei, os parâmetros que foram estabelecidos como aceitáveis'. Exatamente por tal motivo, 'a contratação antecipada de horas extraordinárias é rejeitada sob a pecha de cláusula nula' (...), conforme, inclusive, o entendimento do TST, consubstanciado na Súmula 199.(...).

Desse modo, alerta MARCIO TÚLIO VIANA, 'ainda que feito o ajuste, pode o empregado resistir à ordem para trabalhar além da jornada, a não ser, naturalmente, nas hipóteses do artigo 61 da CLT (necessidade imperiosa ou de força maior)'.

(...)

Gize-se que o pacto compensatório tem como escopo legalizar o excesso de jornada diária, desde que observado o limite semanal. Assim, qualquer acordo que, na prática, violar esse requisito essencial de validade, incorrerá em nulidade e, por conseguinte, o empregador pagará como extras as horas excedentes dos limites legais, quais sejam, da oitava diária e da quadragésima quarta semanal. (...)

Logo, o acordo é nulo. Sendo nulo, aplicam-se os limites da lei: oito horas diárias e quarenta e quatro semanais. O que extrapolar esses limites será tido como horas extraordinárias.

(...)

Atualmente, enquanto o artigo 59, § 2º, da CLT estiver vigendo, persiste o limite de 10 (dez) horas diárias como requisito de eficácia dos Acordos de Compensação. Há que se considerar que essa exigência legal colima proteger o obreiro da presumida fadiga resultante do labor superior a dez horas diárias.

Vejam-se os exemplos citados pelo reclamante às fls. 03/04.

Normalmente trabalhava o reclamante mais de oito horas diárias, chegando à média de mais de dez horas diárias.

Em vários dias de trabalho gozou menos de uma hora de intervalo descanso/refeição (isto, de acordo com os cartões de ponto acostados aos autos).

Portanto, pelo acima exposto, aplica-se à espécie o teor do disposto no inc. IV da Súmula nº 85 do Col. TST.

Restam descaracterizados e não válidos os acordos de prorrogação e compensação de jornada além do banco de horas: 'As horas que ultrapassarem a jornada semanal normal deverão ser pagas como horas extraordinárias e, quanto àquelas destinadas à compensação, deverá ser pago a mais apenas o adicional por trabalho extraordinário'.

(...)

São devidas as horas extraordinárias além da 8ª diária e/ou 44ª semanal, com adicional convencional (55%) e, dada a habitualidade a integração na remuneração, diferenças de DSR, férias mais 1/3, 13º salário e FGTS, limitadas ao período de 59 (cinquenta e nove meses).

A apuração das horas extraordinárias laboradas será feita mediante os cartões de ponto acostados aos autos, destacando-se que o reclamante afastou-se do trabalho por cerca de dois anos em decorrência de percepção de benefício previdenciário de auxílio doença.

As horas extraordinárias pagas nos recibos de pagamento serão compensadas. (...)"

Nada mais precisa ser dito, soterrada a argumentação empresária.

Não há, no caso em exame, como dar prevalência aos acordos celebrados, mas não se trata, absolutamente, de desconsiderar a ampla valorização das normas coletivas pela Constituição Federal.

É que diante da habitual prestação de horas extras, considera-se irretocável o entendimento esposado em primeiro grau de que os acordos de compensação de jornada celebrados entre as partes, na modalidade de banco de horas previsto coletivamente, não atingiram sua finalidade, incidindo o disposto no item IV da Súmula 85 do c. TST.

Ou seja, se os contracheques adunados demonstram a quitação habitual, praticamente mensal de horas extras, emerge a constatação de que o acordo de compensação não atingiu a finalidade prevista nos instrumentos normativos que o autorizavam, servindo, tão somente, para imposição habitual de serviços extraordinários em desvirtuamento escancarado do instituto que deveria se destinar à compensação do exigido labor em extenuante carga horária.

Dessa compreensão, a propósito, não destoa a Corte Superior Trabalhista:

"Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. VALIDADE DO REGIME DE COMPENSAÇÃO. HORAS EXTRAS HABITUAIS. A prestação de horas extras habituais descaracteriza o acordo de compensação de jornada. Inteligência da Súmula nº 85, IV, do TST. Agravo de instrumento desprovido"(TST-AIRR - 1600/2005-292-04-40.5, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 27/02/2009).

E também:

"Ementa: RECURSO DE REVISTA. ACORDO DE COMPENSAÇÃO. HORAS EXTRAS. A prestação habitual de horas extras, além do trabalho nos próprios dias destinados a folgas, descaracteriza o acordo de compensação, sendo devido, neste caso, o pagamento da hora normal acrescida do adicional, quanto a toda a sobrejornada havida além da 8ª diária e da 44ª semanal. Súmula nº 85, IV do TST. Regional em conformidade com a referida súmula. Recurso de revista de que não se conhece" (TST-RR-16379/2000-651-09-00.0, Relatora Ministra Kátia Magalhães Arruda, DEJT 21/11/2008).

Portanto, desconsiderados os ajustes, as horas que ultrapassarem a jornada semanal deverão ser pagas como horas extraordinárias e, quanto àquelas destinadas à compensação, deverá ser pago a mais apenas o adicional, tal qual decidido na origem.

Finalmente, registre-se que a alusão a processo outro (recurso, fl. 308), que tive oportunidade de apreciar enquanto Relator designado, 00286-2007-063-03-00-4 RO, DJMG 30/10/2007, em nada altera o posicionamento que se adota.

Cada caso é um caso, analisado de acordo com suas próprias especificidades e, dependendo, sob a ótica da distribuição do ônus da prova. Com muito maior razão em se tratando de matéria fática trazida à discussão, não impressionando tenha havido indeferimento de horas extras lá, e deferimento aqui. Aliás, traz a ré decisões que lhe foram favoráveis, mas, obviamente, omite aquelas em sentido diametralmente oposto exaradas, igualmente neste Regional, em discussões idênticas à ora sub judice:

"EMENTA: HORAS EXTRAS HABITUAIS. DESCARACTERIZAÇÃO DO ACORDO DE COMPENSAÇÃO. APLICAÇÃO DA SÚMULA 85, IV DO TST. A prestação de horas extras habituais descaracteriza o acordo de compensação da jornada. Nesta hipótese, as horas que ultrapassarem a jornada semanal normal deverão ser pagas como horas extraordinárias e, quanto àquelas destinadas à compensação, deverá ser pago o adicional por trabalho extraordinário. Incidência do item IV, da Súmula 85 do TST" (00589-2009-063-03-00-9 RO, Relator Desembargador Luiz Ronan Neves Koury, DJMG 15/07/2009).

Veja-se, para arrematar, julgamento proferido nesta E. 4ª. Turma, em processo no qual atuei como Revisor:

EMENTA: BANCO DE HORAS - REQUISITOS - NÃO OBSERVÂNCIA - INVALIDADE. Após a edição da Lei 9.601/98, passaram a coexistir dois modelos de compensação de jornada no ordenamento jurídico trabalhista: o tradicional, previsto nos arts. 7o., XIII, da CF c/c 59, caput, da CLT e o de compensação anual ou banco de horas, regulamentado no art. 59, parágrafo 2o., da CLT (o prazo legal de 120 dias foi aumentado para um ano a partir da MP 2164-41). O modelo compensatório anterior à Lei 9.601/98 é considerado tanto pela doutrina, quanto pela jurisprudência, como benéfico ao Obreiro, sendo sua pactuação amplamente admitida por meio de acordo bilateral escrito (Súmula 85 do TST). O mesmo não ocorre com o modelo compensatório anual (ou banco de horas), por se revelar extremamente lesivo à saúde, higiene e segurança dos trabalhadores. Nesse sistema compensatório, autoriza-se a pactuação de horas complementares à jornada padrão por diversas semanas e meses, o que provoca inevitavelmente alterações profundas no relógio biológico do trabalhador, acarretando-lhe fadiga física e psíquica, alterações do sono, distúrbios gástricos, além de lhe dificultar o lazer e a convivência social. Por isso, há exigência legal de que o acordo de compensação anual de jornada ou banco de horas seja pactuado estritamente pela via negocial coletiva, com ampla participação do sindicato representativo dos Obreiros, nunca por acordo individual escrito. A exigência de negociação coletiva para a pactuação do banco de horas vai ao encontro dos princípios tutelares do Direito do Trabalho. Objetiva-se com a participação do Sindicato representativo do Obreiro equalizar a grande desigualdade existente entre o empregado individualmente considerado e o empregador que se constitui coletivamente, além de ser o detentor do poder hierárquico, disciplinar, fiscalizatório e econômico. Embora tenha sido demonstrado no caso dos presentes autos que o regime de compensação adotado encontrava-se devidamente autorizado pelas normas autônomas, o fato é que a referida pactuação, como se vê da leitura dos instrumentos coletivos, traz consigo a necessidade de controle rígido do número de créditos e de débitos de horas extras, do qual o empregado interessado deveria ter plena ciência. Entretanto, a Reclamada não trouxe aos autos nenhuma prova de que efetuasse tal controle, tampouco de que este contava com a ciência do trabalhador. O controle, se havia, era unilateral, não tendo o Autor ciência dos registros ali inseridos, não podendo saber, com certeza, qual o saldo de horas que teria para gozo oportuno com folgas e se, de fato, as usufruía, dentro do período de fechamento do mês, conforme determinam as normas autônomas. Ademais, como se infere dos registros de ponto, as horas extras trabalhadas não eram sequer lançadas nos respectivos controles e, dessa forma, não poderia haver compensação regular, pois o empregado não tinha conhecimento de todo o trabalho realizado em sobretempo. Em conclusão, o sistema de compensação de jornada adotado pela Reclamada não pode ser validado por esta Especializada, eis que não obedece aos requisitos legais e normativos" (00467-2007-063-03-00-0 RO, Relator Desembargador Luiz Otávio Linhares Renault, DJMG 16/02/2008).

Mantenho irretocável o decisum.

2.2 - RESPONSABILIDADE SOCIAL - INDENIZAÇÃO - DUMPING SOCIAL

No tópico, a recorrente argumenta, em síntese, que o dumping social seria a prática abusiva de mão-de-obra barata e super explorada, praticada na produção de produtos que tornariam os seus preços mais competitivos para o mercado, em busca de "burlar" a lei trabalhista, o que não ocorreu no presente caso. Alega que não restou provado que os produtos que comercializa possuem os preços mais competitivos do mercado e que não está incluída no rol de empresas que exploram seus empregados, tampouco utiliza mão-de-obra barata, tendo em vista que o piso salarial da categoria é corretamente reajustado pelo índice IGP-M acumulado todo ano no mês de maio. Assevera que não se trata, ademais, de intermediação de empresa, mas de relação de trabalho entre empresa e colaborador, o que descaracteriza o dumping social e afirma que cabe ao Ministério Público e não ao juiz a quo, a fiscalização sobre a existência de jornada de trabalho excessiva em alguns dias e aplicação de sanções legais, se for o caso.

Pretende, sob enfoques tais, seja excluída da condenação a indenização no importe de R$500,00 deferida, ou fixado valor bem inferior ao estabelecido.

Ab initio, segundo Jorge Luiz Souto Maior, denomina-se dumping social a prática na qual se busca vantagens comerciais através da adoção de condições desumanas de trabalho.

Pode ser também definido - ou caracterizado - como o desrespeito às normas trabalhistas, por meio da utilização de formas precárias de trabalho como o escravo. Podemos também entendê-lo através da prática de produzir produtos mais baratos com a exploração da mão-de-obra adquirida a baixos custos, não condizentes com os direitos humanos e trabalhistas. Com o emprego dessa prática, produtos importados a preços inferiores aos praticados pelo país importador, que cumpre as normas trabalhistas e internacionais, desequilibram seu mercado interno.

O Brasil, como vários países periféricos, caracteriza-se por praticá-lo: longas jornadas de trabalho, baixos salários, utilização da mão-de-obra infantil e condições de labor inadequadas são algumas modalidades exemplificativas do denominado dumping social, favorecendo em última análise o lucro pelo incremento de vendas, inclusive de exportações, devido à queda dos custos de produção nos quais encargos trabalhistas e sociais se acham inseridos. "Alega-se, sob esse aspecto, que a vantagem derivada da redução do custo de mão-de-obra é injusta, desvirtuando o comércio internacional. Sustenta-se, ainda, que a harmonização do fator trabalho é indispensável para evitar distorções num mercado que se globaliza" (LAFER, Celso - "Dumping Social", in Direito e Comércio Internacional: Tendências e Perspectivas, Estudos em homenagem ao Prof. Irineu Strenger, LTR, São Paulo, 1994, p. 162).

Para o direito do trabalho o dumping social ocorre mediante agressões reincidentes aos direitos trabalhistas, gerando um dano à sociedade, dano esse que configura ato ilícito, por exercício abusivo do direito, já que extrapola limites econômicos e sociais, nos exatos termos dos artigos 186, 187 e 927 do Código Civil. Encontra-se no art. 404, parágrafo único do Código Civil, o fundamento de ordem positiva para impingir ao agressor contumaz uma indenização suplementar, como, aliás, já previam os artigos 652, "d", e 832, § 1º, da CLT e, nessa ordem de idéias, tanto doutrina, quanto jurisprudência, têm se pronunciado no sentido de admitir a responsabilização das empresas pela desconsideração dos direitos sociais coletivamente assegurados.

A propósito, o dano moral gerado é coletivo, uma vez que a reparação dele, em alguns casos, pode ter natureza social e não meramente individual, atingindo toda a massa trabalhadora (portanto, parcela determinável da sociedade) e não difuso, que atinge indistintamente toda a sociedade.

As empresas não podem considerar irrelevante o dumping social, pois essa prática pode acarretar problemas comerciais, de ordem financeira, bem como de ordem punitiva como barreiras não-tarifárias (restrições quantitativas, licenciamento de importações, procedimentos alfandegários e medidas antidumping), como formas de sanção aos países que não cumprirem as normas mínimas de trabalho internacional e praticarem o dumping social ou, ainda, o pagamento de multas e autuações pela inadequação às normas internacionais de trabalho criadas por organismos internacionais, tais como a OIT - Organização Internacional do Trabalho e a OMC - Organização Mundial do Comércio, sendo que esta levou a debate a inclusão de cláusulas sociais em seus estatutos.

Não se pode deixar de mencionar, ainda, o fator da responsabilidade social, ao qual as empresas estão sujeitas e são avaliadas pelos compradores de seus produtos e serviços e, também, pelos órgãos governamentais.

Existem países que se recusam a comprar produtos de empresas que utilizam dessa prática desleal, lembrando que a adoção de cláusulas sociais nas negociações internacionais reflete o fenômeno da globalização.

A propósito, vale ressaltar que foi aprovado, na 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, realizada no final de 2007, o Enunciado nº 4, justamente a respeito do tema, in verbis:

"DUMPING SOCIAL. DANO À SOCIEDADE. INDENIZAÇÃO SUPLEMENTAR. As agressões reincidentes e inescusáveis aos direitos trabalhistas geram um dano à sociedade, pois com tal prática desconsidera-se, propositalmente, a estrutura do Estado Social e do próprio modelo capitalista com a obtenção de vantagem indevida perante a concorrência. A prática, portanto, reflete o conhecido 'dumping social', motivando a necessária reação do Judiciário trabalhista para corrigi-la. O dano à sociedade configura ato ilícito, por exercício abusivo do direito, já que extrapola limites econômicos e sociais, nos exatos termos dos arts. 186, 187 e 927 do Código Civil. Encontra-se no art. 404, parágrafo único, do Código Civil, o fundamento de ordem positiva para impingir ao agressor contumaz uma indenização suplementar, como, aliás, já previam os artigos 652, 'd', e 832, § 1º, da CLT".

Nesse contexto, verifica-se que restará caracterizado o dumping social quando a empresa, por meio da burla na legislação trabalhista, acaba por obter vantagens indevidas, através da redução do custo da produção, o que acarreta um maior lucro nas vendas. Logo, representa uma prática prejudicial e condenável, haja vista uma conduta desleal de comércio e de preço predatório, em prejuízo da dignidade da pessoa humana.

Na espécie, o d. Juízo a quo ressaltou que foram julgados, desde 2008, cerca de 20 (vinte) processos propostos contra a reclamada, somente sobre o não pagamento de horas extras - como, aliás, também aponta a documentação trazida pelo autor à colação, em razões de contrariedade.

Em contrapartida, os autos demonstram o cumprimento de jornada extraordinária além da 10ª hora diária em empresa enquadrada no risco três - INSS - em termos de riscos ergonômicos para os trabalhadores e o risco de acidentes, configurando-se o dano social.

Portanto, considera-se escorreita a fixação de uma sanção pecuniária, em prol do reclamante, a ser paga pelo reclamado, no importe de R$500,00 (quinhentos reais), em parcela única, com espeque nos arts. 186, 187, parágrafo único do art. 404, 927 e 1553 todos do Código Civil; arts. 8º caput 652, 'd', 769 e 832, § 1º todos da CLT.

Tal valor, inclusive, a meu ver, comportaria majoração, obstada, na espécie, pelo princípio da non reformatio in pejus.

Nego provimento.

2.3. - JUSTIÇA GRATUITA

Contrariamente às alegações recursais, a única exigência para que o reclamante faça jus ao benefício da justiça gratuita consiste na apresentação de declaração de miserabilidade, nos termos do artigo 4º, da Lei n. 1.060/50, com redação dada pela Lei n. 7.510/86.

Nesse toar, ressalta-se o entendimento consubstanciado na Orientação Jurisprudencial n. 304 da SDI-I do TST, no sentido de que "Atendidos os requisitos da Lei n. 5.584/70 (art. 14, § 2º), para a concessão da assistência judiciária, basta a simples afirmação do declarante ou de seu advogado, na petição inicial, para se considerar configurada a sua situação econômica." (grifos nossos).

Na espécie, foi acostada à folha 71 a declaração de pobreza, em que afirma o autor não dispor de meios para arcar com o pagamento das despesas processuais, sendo o quanto basta para o deferimento dos benefícios da justiça gratuita.

Questionável, inclusive, é o próprio interesse em recorrer da ré quanto ao tema, diante da completa ausência de prejuízo.

2.4 - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

A reclamada argumenta, na essência, que os honorários advocatícios deferidos são incabíveis no caso concreto porque não preenchidos os requisitos previstos na Lei 5584/70, e que, ademais, não foram atendidos os pressupostos da Súmula n. 329 e item I da Súmula 219/TST.

O entendimento deste Relator encontra-se vazado nos seguintes termos:

"A hipótese em apreço é, realmente, aquela alusiva a honorários advocatícios contratuais, tendo em vista a condição de hipossuficiente do autor que não tem condições de arcar com as despesas oriundas do processo, valendo-se o trabalhador da contratação de um advogado, para propor ação judicial com o intuito de receber direitos legais que não foram atendidos durante o período contratual.

E razão assiste à ré, conforme venho reiteradamente defendendo.

Com efeito, segundo o art. 5º da Instrução Normativa n. 27, editada pela Resolução TST n. 126, de 16/02/2005, "salvo nas lides decorrentes da relação de emprego, os honorários advocatícios são devidos pela mera sucumbência".

Desse modo, nas lides decorrentes da relação de emprego permanece íntegro o entendimento jurisprudencial pacificado na Súmula 219 do TST, no sentido de que o deferimento dos honorários advocatícios subordina-se à verificação dos seguintes requisitos: prova da miserabilidade jurídica da parte e encontrar-se o trabalhador assistido pelo sindicato da categoria profissional.

A presente reclamação versa sobre direitos decorrentes de contrato de trabalho mantido entre as partes, não havendo nos autos prova de que o obreiro se encontra assistido pelo sindicato de sua categoria profissional, o que, efetivamente, não se pode extrair do instrumento coligido à folha 72 do processado.

Ressalte-se que em face da existência de lei específica (Lei n. 5.584/70) regulando a questão dos honorários no processo trabalhista, norma que se mantém íntegra, não prevalece, no caso vertente, a disposição do caput do art. 20 do CPC (art. 8º, parágrafo único, da CLT).

Assim, os requisitos exigidos para o deferimento de honorários advocatícios nesta Especializada encontram-se pacificados pela Súmula n. 219, I, do C. TST, quais sejam, o estado de pobreza da reclamante e a assistência prestada pelo Sindicato.

In casu, como já observado, o reclamante não se encontra assistido por advogado credenciado pelo sindicato da categoria, mas por profissional particular, o que importa na improcedência do pedido relativo à condenação da reclamada ao pagamento dos honorários advocatícios."

Não obstante, a d. Turma julgadora, por sua maioria, acatando a divergência formulada pelo Exmo. Desembargador revisor Antônio Álvares da Silva, entendeu por bem manter a condenação originária pelos seus próprios e jurídicos fundamentos.

Neste sentido, vencido este Relator, nego provimento ao apelo no particular. (.jbc.).

III - CONCLUSÃO

Conheço do recurso interposto pela reclamada e, no mérito, vencido este Relator quanto aos honorários advocatícios, nego-lhe provimento.

FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, pela sua Quarta Turma, à unanimidade, conheceu do recurso da reclamada; no mérito, por maioria de votos, negou-lhe provimento, vencido, parcialmente, o Exmo. Desembargador Relator.

Belo Horizonte, 19 de agosto de 2009.

JÚLIO BERNARDO DO CARMO
Desembargador Relator




JURID - Reparação em pecúnia. Caráter pedagógico. Dumping social. [08/10/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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