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quinta-feira, 1 de outubro de 2009

JURID - Direito de família. Guarda de menor pleiteada por avós. [01/10/09] - Jurisprudência


Direito de família. Guarda de menor pleiteada por avós. Possibilidade. Prevalência absoluta do interesse da criança e do adolescente observada.


Superior Tribunal de Justiça - STJ.

RECURSO ESPECIAL Nº 945.283 - RN (2007/0079129-4)

RELATOR: MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

RECORRIDO: E P DE A E OUTRO

ADVOGADO: GUERRISON ARAÚJO PEREIRA DE ANDRADE

EMENTA

DIREITO DE FAMÍLIA. GUARDA DE MENOR PLEITEADA POR AVÓS. POSSIBILIDADE. PREVALÊNCIA ABSOLUTA DO INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE OBSERVADA.

1. É sólido o entendimento segundo qual mesmo para fins de prequestionamento, a oposição de embargos de declaração não prescinde de demonstração da existência de uma das causas listadas no art. 535 do CPC, inocorrentes, no caso.

2. No caso em exame, não se trata de pedido de guarda unicamente para fins previdenciários, que é repudiada pela jurisprudência. Ao reverso, o pedido de guarda visa à regularização de situação de fato consolidada desde o nascimento do infante (16.01.1991), situação essa qualificada pela assistência material e afetiva prestada pelos avós, como se pais fossem. Nesse passo, conforme delineado no acórdão recorrido, verifica-se uma convivência entre os autores e o menor perfeitamente apta a assegurar o seu bem estar físico e espiritual, não havendo, por outro lado, nenhum fato que sirva de empecilho ao seu pleno desenvolvimento psicológico e social.

3. Em casos como o dos autos, em que os avós pleiteiam a regularização de uma situação de fato, não se tratando de "guarda previdenciária", o Estatuto da Criança e do Adolescente deve ser aplicado tendo em vista mais os princípios protetivos dos interesses da criança. Notadamente porque o art. 33 está localizado em seção intitulada "Da Família Substituta", e, diante da expansão conceitual que hoje se opera sobre o termo "família", não se pode afirmar que, no caso dos autos, há, verdadeiramente, uma substituição familiar.

4. O que deve balizar o conceito de "família" é, sobretudo, o princípio da afetividade, que "fundamenta o direito de família na estabilidade das relações socioafetivas e na comunhão de vida, com primazia sobre as considerações de caráter patrimonial ou biológico".

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJ/AP), Fernando Gonçalves, Aldir Passarinho Junior e João Otávio de Noronha votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 15 de setembro de 2009 (data do julgamento).

Ministro Luis Felipe Salomão
Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

1. E. P. de A. e J. B. de A. requereram judicialmente a guarda do menor P. E. A. B. de A., neto dos autores, alegando que desde o nascimento da criança, em 16.01.1991, esta vem sendo mantida sob a dependência dos requerentes, que desde então prestam-lhe assistência material e afetiva. Os genitores da criança, por não possuírem "condições financeiras suficientes para mantê-la e educá-la", aquiescem com o pedido formulado na inicial.

Em sentença proferida pelo Juízo de Direito da 2º Vara Cível da Comarca de Caicó, foi julgado improcedente o pedido autoral, ao fundamento de que a pretensão espelha apenas interesses previdenciários.

Em grau de apelação, todavia, a sentença foi reformada, julgando-se procedente o pedido de guarda, nos termos da seguinte ementa:

DIREITO CIVIL - GUARDA DE MENOR - CONCESSÃO A SER CONFERIDA NO INTERESSE EXCLUSIVO DO MENOR - POSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO FORA DA SITUAÇÃO DE TUTELA OU ADOÇÃO - INTELIGÊNCIA DO § 2º DO ART. 33 DA LEI 8.069/90. A legislação de proteção à criança e ao adolescente impõe que a concessão da guarda de infante deve ser deferida, exclusivamente, com lastro no interesse deste. Ainda que não se objetive a tutela ou adoção, é possível o deferimento em situações excepcionais.

Apelação conhecida e provida. (fl. 63)

Opostos embargos de declaração pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte, foram estes rejeitados pelo acórdão de fls. 81/87.

Sobreveio, assim, recurso especial interposto pelo Parquet estadual, fulcrado na alínea "a" do permissivo constitucional, no qual se alega ofensa ao art. 535, CPC; arts. 23, 19, 166, § único, e 33, §§ 1º, 2º e 3º, todos do Estatuto da Criança e do Adolescente; art. 1.634, inciso II, do CC/02, e arts. 348, 351 e 334, inciso III, do CPC.

O recurso ministerial, em breve síntese, afirma que o Tribunal não apreciou todas as teses jurídicas alteadas em apelação, vulnerando o art. 535, CPC. Ademais, sustenta que o acórdão recorrido baseou-se na capacidade financeira dos avós para conferir-lhes a guarda do adolescente. De outra parte, o só fato de serem avós "é evidente que, nessa condição, proporcionam-lhe amparo financeiro e afetivo", o qual não seria suficiente para a guarda pretendida.

Admitido o especial na origem (fls. 114/116), opina o e. Subprocurador-Geral da República Pedro Henrique Távora Niess pelo conhecimento parcial do recurso e, nessa parte, pelo seu improvimento (fls. 122/130).

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

2. Afasto, de saída, a alegada ofensa ao art. 535 do CPC. As alegações do recorrente são genéricas quanto ao ponto, não indicando, com exatidão, como o acórdão recorrido teria sido omisso, contraditório ou obscuro. Incide, no particular, a Súmula nº 284/STF.

Ressalte-se que mesmo para fins de prequestionamento, a oposição de embargos de declaração não prescinde de demonstração da existência de uma das causas listadas no art. 535 do CPC, inocorrentes, no caso (AgRg no REsp 860.601/PR, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/10/2006).

3. Em relação aos artigos do CPC listados como violados pelo acórdão recorrido, é de se notar que estes não foram objeto de análise pelo Tribunal a quo, nem mesmo nos embargos de declaração opostos, circunstância que faz incidir o Verbete nº 211 da Súmula do STJ.

4. Quanto ao mérito, a pretensão do Ministério Público Estadual não comporta acolhida, uma vez que não atende à prevalência absoluta do interesse do menor, tampouco coaduna-se com os princípios sociais inspiradores do Estatuto da Criança e do Adolescente, no que concerne à guarda.

Por primeiro, insta observar que, diante da moldura fática entregue pelo Tribunal a quo, não se trata de pedido de guarda unicamente para fins previdenciários, que é repudiada pela jurisprudência (REsp 95.606/RJ, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/03/2000; REsp 94.369/RJ, Rel. Ministro WALDEMAR ZVEITER, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/10/1997).

Ao reverso, o pedido de guarda visa à regularização de situação de fato consolidada desde o nascimento do infante (16.01.1991), situação essa qualificada pela assistência material e afetiva prestada pelos avós, como se pais fossem.

Confira-se:

De igual modo, não se trata de guarda fracionada ou proposta exclusivamente para fins previdenciários. Como exposto à exaustão, o menor, diante das condições financeiras insuficientes dos pais, os quais, frise-se, concordam com a concessão da guarda em tela, não só sobrevive às expensas dos apelantes, como também recebe todo o carinho, amor e dedicação necessários a um salutar desenvolvimento psicológico. (fls. 65/66)

Nesse passo, conforme delineado no acórdão recorrido, verifica-se uma convivência entre os autores e o menor perfeitamente apta a assegurar o seu bem estar físico e espiritual, não havendo, por outro lado, nenhum fato que sirva de empecilho ao seu pleno desenvolvimento psicológico e social.

Ademais, os pais moram em casa lateral com a dos avós, havendo inclusive passagem interna que liga ambas as residências, circunstância que leva a crer que o menor terá livre acesso aos seus genitores, o que é hoje, sabidamente, importante fator na formação moral da pessoa em desenvolvimento, e que deve ser levado em consideração na regulamentação judicial de guarda.

4.1. Em recente alteração do Código Civil de 2002, o legislador, atento às já consolidadas diretrizes doutrinárias e jurisprudenciais, explicitou, em linhas gerais, os quesitos que, objetivamente, satisfariam o melhor interesse da criança, no que concerne à guarda unilateral do genitor, mas que se aplicam ao caso.

Trata-se do § 2º, do art. 1.583, do Código Civil de 2002, com redação dada pela Lei nº 11.698/08:

§ 2o A guarda unilateral será atribuída ao genitor que revele melhores condições para exercê-la e, objetivamente, mais aptidão para propiciar aos filhos os seguintes fatores:

I - afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar;

II - saúde e segurança;

III - educação.

4.2. Em realidade, em casos como o dos autos, em que os avós pleiteiam a regularização de uma situação de fato há muito consolidada, e não se tratando de "guarda previdenciária", o Estatuto da Criança e do Adolescente deve ser aplicado mais pelos princípios protetivos dos interesses da criança.

Note-se que o art. 33 está localizado em seção intitulada "Da Família Substituta", e, diante da expansão conceitual que hoje se opera sobre o termo "família", não se pode afirmar que, no caso dos autos, há verdadeiramente uma substituição familiar.

A melhor interpretação dada ao art. 33, § 2º, do ECA, deveras, contempla a solução adotada na origem:

O § 2º prevê duas situações a serem consideradas, embora englobadas no mesmo dispositivo.

Na primeira parte o preceito cuida da concessão da guarda, fora dos casos de tutela e adoção, para atender situações peculiares, como nos casos de guarda requerida por parentes próximos, com a concordância dos pais; ou da guarda especial, quando inexistente fundamento legal para a suspensão ou destituição do pátrio poder e visando a suprir a falta eventual dos pais ou responsáveis, ou falecidos ou com paradeiro ignorado. (CAHALY, Youssef Said. In. Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado - Comentários jurídicos e sociais. 7. ed. CURY, Munir (COORD). São Paulo: Malheiros Editores, 2005, p. 147)

Em fim, o que deve balizar o conceito de "família" é, sobretudo, o princípio da afetividade, que "fundamenta o direito de família na estabilidade das relações socioafetivas e na comunhão de vida, com primazia sobre as considerações de caráter patrimonial ou biológico" (LÔBO, Paulo. 2. ed. - São Paulo: Saraiva, 2009. (Direito Civil), p. 47).

4.3. Com efeito, mostra-se escorreito o acórdão recorrido, uma vez que vislumbrou na situação fática delineada nos autos a excepcionalidade do art. 33, § 2º, do ECA, a ensejar a concessão de guarda fora dos casos de tutela ou adoção.

A solução proposta na origem deve ser mantida, porquanto a prevalência do interesse do menor foi preservada, tal como determina o espírito da Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente).

4.4. Nas Turmas de Direito Privado, há precedentes semelhantes, confiram-se:

GUARDA DE FILHO. Prevalência do interesse da criança.

- Criança com oito anos idade, que vive desde os primeiros meses de vida sob a guarda do pai e na companhia da avó paterna, que lhe oferecem boas condições materiais e afetivas, com estudo social favorável à conservação dessa situação.

- Ação de guarda definitiva promovida pelo pai julgada procedente na sentença e na apelação, com reforma em grau de embargos infringentes.

- Recurso especial conhecido e provido para restabelecer o acórdão proferido na apelação.

(REsp 469914/RS, Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 04/02/2003, DJ 05/05/2003 p. 310)

______________________________

Direito da criança e do adolescente. Pedido de guarda formulado pela avó. Consentimento dos pais. Melhor interesse da criança.

- Sob a tônica da prevalência dos interesses da pessoa em condição peculiar de desenvolvimento deve-se observar a existência da excepcionalidade a autorizar o deferimento da guarda para atender situação peculiar, fora dos casos de tutela e adoção, na previsão do art. 33, § 2º, do ECA.

- A avó busca resguardar situação fática já existente, por exercer a posse de fato da criança desde o nascimento, com o consentimento dos próprios pais, no intuito de preservar o bem estar da criança, o que se coaduna com o disposto no art. 33, § 1º, do ECA.

- Dar-se preferência a alguém pertencente ao grupo familiar - na hipótese a avó - para que seja preservada a identidade da criança bem como seu vínculo com os pais biológicos, significa resguardar ainda mais o interesse do menor, que poderá ser acompanhado de perto pelos genitores e ter a continuidade do afeto e a proximidade da avó materna, sua guardiã desde tenra idade, que sempre lhe destinou todos os cuidados, atenção, carinhos e provê sua assistência moral, educacional e material.

- O deferimento da guarda não é definitivo, tampouco faz cessar o poder familiar, o que permite aos pais, futuramente, quando alcançarem estabilidade financeira, reverter a situação se assim entenderem, na conformidade do art. 35 do ECA.

- Se as partes concordam com a procedência do pedido de guarda, não será o Poder Judiciário que deixará a marca da beligerância nessa relação pacífica, quando deve apenas assegurar que o melhor interesse da criança seja o resultado da prestação jurisdicional.

- Se restou amplamente demonstrado que os interesses da criança estarão melhor preservados com o exercício da guarda pela avó, a procedência do pedido de guarda é medida que se impõe.

Recurso especial provido.

(REsp 993458/MA, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 07/10/2008, DJe 23/10/2008)

______________________________

5. Diante do exposto, não conheço do recurso especial.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

QUARTA TURMA

Número Registro: 2007/0079129-4 REsp 945283 / RN

Números Origem: 101030032709 20060025196

PAUTA: 15/09/2009 JULGADO: 15/09/2009

SEGREDO DE JUSTIÇA

Relator
Exmo. Sr. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro FERNANDO GONÇALVES

Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. DULCINÉA MOREIRA DE BARROS

Secretária
Bela. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI

AUTUAÇÃO

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

RECORRIDO: E P DE A E OUTRO

ADVOGADO: GUERRISON ARAÚJO PEREIRA DE ANDRADE

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Família - Relações de Parentesco - Guarda

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJ/AP), Fernando Gonçalves, Aldir Passarinho Junior e João Otávio de Noronha votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 15 de setembro de 2009

TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI
Secretária

Documento: 912212

Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 28/09/2009




JURID - Direito de família. Guarda de menor pleiteada por avós. [01/10/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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