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segunda-feira, 19 de outubro de 2009

JURID - Apelação criminal. Apropriação indébita previdenciária. [19/10/09] - Jurisprudência


Apelação criminal. Apropriação indébita previdenciária. Uso de documento falso. Preliminar rejeitada.
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Tribunal Regional Federal - TRF 3ª Região.

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 2000.61.81.005414-1/SP

RELATOR: Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO

APELANTE: LUIS OTAVIO ZAMPAR

ADVOGADO: VALDEK MENEGHIM SILVA e outro

APELANTE: Justica Publica

NÃO OFERECIDA DENÚNCIA: ALVARO ALEXANDRE FERREIRA

: ANTONIO THEODORO DA SILVA falecido

: SONIA REGINA PEDRO BOM ZAMPAR

: BENEDITO DA SILVA CONCEICAO

: FRANCISCO FERREIRA COSTA

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA. USO DE DOCUMENTO FALSO. PRELIMINAR REJEITADA. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. CONDENAÇÃO MANTIDA. PANAS-BASE. MAJORAÇÃO. PERSONALIDADE DO RÉU. CONDUTA SOCIAL. CONTINUIDADE DELITIVA. PATAMAR DE AUMENTO MANTIDO. CONCURSO MATERIAL. REGIME ABERTO. VALOR DO DIA-MULTA. MANUTENÇÃO. PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA SUBSTITUTIVA. DESTINAÇÃO DE OFÍCIO À UNIÃO FEDERAL. RECURSO DA DEFESA IMPROVIDO. RECURSO DA ACUSAÇÃO PROVIDO.

1. Rejeitada a preliminar argüida, ante a inocorrência da prescrição da pretensão punitiva.

2. Materialidade e autoria demonstrada em relação a ambos os delitos.

3. O réu forjou sua retirada da sociedade, utilizando o documento falso para eximir-se das obrigações inerentes ao negócio, dentre as quais a responsabilidade pelo não recolhimento das contribuições previdenciárias.

4. Comprovado que o réu era o único responsável pela gerência da sociedade durante todo o período de não recolhimento, uma vez que a contrafação do INSTRUMENTO PARTICULAR DE ALTERAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS DA ZAMPAR ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO LTDA retira por completo sua validade.

5. Independentemente da empresa ser assessorada por um contador, empregado ou não, a responsabilidade por seus atos, especialmente no que tange à quitação de tributos, é do administrador legal, pois o simples fato de ter contratado um terceiro para cuidar dos assuntos fiscais não é suficiente para eximi-lo de suas obrigações.

6. Condenação mantida.

7. Majoração das penas-base, nos termos do apelo ministerial, em razão da conduta social e da personalidade do réu, que responde a outros processos criminais.

8. No crime de apropriação indébita previdenciária, apesar do delito ter sido cometido por 21 vezes, o que implicaria num aumento de 2/3 pela continuidade delitiva, consoante o critério utilizado por esta 1ª Turma, ficou mantido o aumento de 1/3 estabelecido na sentença, ante a inércia da acusação em relação a este ponto.

9. Aplicada a regra do artigo 69 Código Penal, ficando LUIZ OTÁVIO ZAMPAR condenado a 3 anos, 11 meses e 20 dias de reclusão e 23 dias-multa.

10. Sem reparo o regime inicial aberto para cumprimento da pena privativa de liberdade, bem como o valor do dia-multa fixado no mínimo legal.

11. Mantida a substituição da reprimenda corporal por uma prestação de serviços à comunidade ou à entidade pública e uma prestação pecuniária no valor de 10 salários mínimos que, de ofício, se destina à União Federal - Lei n° 11.457/2007.

12. Recurso da defesa a que se nega provimento.

13. Recurso da acusação provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitou a preliminar argüida, negou provimento ao recurso da defesa, deu provimento ao recurso ministerial para majorar as penas-base e, de ofício, destinou a prestação pecuniária substitutiva à União Federal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 06 de outubro de 2009.

Johonsom di Salvo
Desembargador Federal

VOTO

O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo, Relator:

I. DA INOCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA

Refuto a preliminar argüida.

Verifico que a pena máxima em abstrato prevista aos crimes imputados ao réu, descritos nos artigos 168-A e 304 c/c 298 do Código Penal, corresponde a 5 anos de reclusão, que, ao teor do artigo 109, inciso III, do mesmo diploma legal prescreve em 12 anos. E, como a sentença condenatória não transitou em julgado para a acusação, este é o lapso a ser considerado para contagem da prescrição, na hipótese dos autos.

Assim, em relação à apropriação indébita previdenciária, não ocorreu a prescrição da pretensão punitiva, pois não passaram 12 anos entre a data dos fatos, 6/1997 a 2/1999, e recebimento da denúncia, em 21/11/2005, e nem desta data em diante.

De igual forma, o uso de documento falso não está prescrito, uma vez que entre a data do fato, 27/11/2000, quando o instrumento particular de alteração de contrato social foi apresentado à autoridade policial, e o recebimento da denúncia, em 21/11/2005, e desta data em diante não transcorreram 12 anos.

II. DA MATERIALIDADE

A materialidade do crime previsto no artigo 168-A está demonstrada pela NFLD nº 32.369.388-1, lavrada com base nos documentos acostados aos autos, que comprova a retenção das contribuições previdenciárias dos salários dos segurados não repassadas à autarquia previdenciária no período de 6/1997 a 2/1999, e pelo ofício do INSS, de 14/12/2003, informando que débito em questão, não quitado, é objeto da execução fiscal nº 2001.61.82.022954-9 (fls. 15/39 e 355/360).

Já a materialidade do crime do artigo 304 c/c 298 do Código Penal está demonstrada pela cópia do INSTRUMENTO PARTICULAR DE ALTERAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS DA ZAMPAR ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO LTDA (fls. 127/130) e pelo Laudo de Exame Documentoscópico (Grafotécnico) nº 2863/02-SR/SP, que concluiu que a assinatura em nome de BENEDITO DA SILVA CONCEIÇÃO é falsa (fls. 304/306).

III. DA AUTORIA DO CRIME DE USO DE DOCUMENTO FALSO

Compulsando os autos verifico que dentre a documentação reunida no procedimento administrativo intentado pelo INSS, consta o INSTRUMENTO PARTICULAR DE ALTERAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS DA ZAMPAR ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO LTDA, onde LUIZ OTÁVIO ZAMPAR e SÔNIA REGINA PEDRO BOM ZAMPAR, até então únicos sócios da empresa, repassam a totalidade de suas cotas a FRANCISCO FERREIRA COSTA e BENEDITO DA SILVA CONCEIÇÃO, retirando-se da sociedade em 31/3/1998 (fls. 49/52).

Todavia, BENEDITO DA SILVA CONCEIÇÃO, ao ser ouvido pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a quem o processo administrativo foi remetido, declarou que a assinatura aposta no referido documento não é sua e que só ficou sabendo que seu nome constava no mesmo quando foi notificado da oitiva. Afirmou, outrossim, que não conhece LUIZ OTÁVIO ZAMPAR e SÔNIA REGINA PEDRO BOM ZAMPAR (fls. 80).

Diante deste fato, o órgão ministerial requisitou a instauração de inquérito policial. Nesta sede, LUIZ OTÁVIO ZAMPAR e SÔNIA REGINA PEDRO BOM, por seu defensor, requereram a exclusão do pólo passivo do inquérito, ao argumento de que a empresa havia sido vendida em 31/3/1998 a FRANCISCO FERREIRA COSTA e BENEDITO DA SILVA CONCEIÇÃO, juntando cópia autenticada do INSTRUMENTO PARTICULAR DE ALTERAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS DA ZAMPAR ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO LTDA (fls. 120/130).

BENEDITO DA SILVA CONCEIÇÃO, perante a autoridade policial, reiterou que nunca foi sócio da ZAMPAR ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO LTDA e que a assinatura aposta no documento não é sua (fls. 201).

SÔNIA REGINA PEDRO BOM, por sua vez, afirmou que sua participação no quadro societário era meramente formal, pois a empresa sempre foi gerida por seu ex-marido LUIZ OTÁVIO ZAMPAR. Também, que não conheceu FRANCISCO FERREIRA COSTA e BENEDITO DA SILVA CONCEIÇÃO e que assinou o documento no escritório do advogado VALDECK MENEGHIM SILVA, por ocasião da sua separação judicial (fls. 206).

LUIZ OTÁVIO ZAMPAR, aduziu que não conheceu pessoalmente os sucessores de sua empresa, FRANCISCO FERREIRA COSTA e BENEDITO DA SILVA CONCEIÇÃO, pois a transferência foi toda elaborada pelo escritório de contabilidade ATS ORGANIZAÇÃO CONTÁBIL S/C LTDA e pelo advogado VALDECK MENEGHIM SILVA. Em novas declarações, disse que a transferência da empresa ficou a cargo do contador ANTONIO THEODORO DA SILVA e que apresentou o documento a VALDECK MENEGHIM SILVA antes da assinatura dos adquirentes FRANCISCO FERREIRA COSTA e BENEDITO DA SILVA CONCEIÇÃO (fls. 233 e 404).

O advogado VALDECK MENEGHIM SILVA, entretanto, afirmou que tão-somente examinou e aprovou a alteração contratual que LUIZ OTÁVIO ZAMPAR lhe apresentou, já assinada por FRANCISCO FERREIRA COSTA e BENEDITO DA SILVA CONCEIÇÃO, que não conhecia (fls. 323).

Por fim, em sede policial ainda foram ouvidas as ex-funcionárias da ZAMPAR ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO LTDA, MÁRCIA CÂNDIDA BRITER CHAIM e ANA PAULA FERREIRA. MÁRCIA, que trabalhou na empresa entre 1996 e 1997, afirmou que seu patrão era LUIZ OTÁVIO ZAMPAR e que quem cuidava da contabilidade era o escritório ATS ORGANIZAÇÃO CONTÁBIL S/C LTDA, de ANTONIO THEODORO DA SILVA (fls. 276). ANA PAULA, que trabalhou na empresa entre 3/1997 e o final de 1998, igualmente aduziu que seu patrão era LUIZ OTÁVIO ZAMPAR, mas que tinha ciência de que este foi substituído por outro sócio, que não conheceu (fls. 178).

No decorrer da investigação, adveio a notícia que o contador ANTONIO THEODORO DA SILVA faleceu em 22/10/2000 (fls. 309). No tocante a FRANCISCO FERREIRA COSTA, todas as diligências realizadas no intuito de localizá-lo restaram infrutíferas.

Posteriormente, em juízo, LUIZ OTÁVIO ZAMPAR mais uma vez afirmou que foi sócio da empresa até 3/1998, quando a mesma foi vendida à FRANCISCO FERREIRA COSTA e BENEDITO DA SILVA CONCEIÇÃO e que quem cuidava da administração do negócio era o contador ANTONIO THEODORO DA SILVA (fls. 515/516).

A única testemunha ouvida, arrolada pela defesa, nada sabia dos fatos narrados na inicial (fls. 599).

Isto posto, não há dúvida de que a alteração contratual da ZAMPAR ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO LTDA apresentada à Polícia, mas que já constava no procedimento administrativo do INSS, é falsa, pois a assinatura de BENEDITO DA SILVA CONCEIÇÃO, consoante o laudo elaborado pela perícia técnica, não partiu de seu punho (fls. 304/306). Também não há dúvida de que o réu tinha ciência da contrafação.

LUIZ OTÁVIO ZAMPAR, em sede policial e em juízo, limitou-se a alegar que desconhecia a falsidade do documento, elaborado pelo falecido contador ANTONIO THEODORO DA SILVA, bem como os supostos adquirentes de sua empresa, não trazendo aos autos nada que comprovasse sua versão dos fatos. Contudo, não parece crível que uma transação deste porte tenha se realizado sem que as partes interessadas tenham tido algum contato, mesmo porque, presume-se, envolve dinheiro, ou, no mínimo, algum interesse.

Desta forma, do contexto dos autos e da razoabilidade das coisas do mundo, extrai-se que LUIZ OTÁVIO ZAMPAR, muito provavelmente em conluio com o contador, forjou sua retirada da sociedade, utilizando o documento falso para eximir-se das obrigações inerentes ao negócio, dentre as quais a responsabilidade pelo não recolhimento das contribuições previdenciárias, razão pela qual fica mantida sua condenação pelo crime do artigo 304 c/c 298 do Código Penal.

IV. DA AUTORIA DO CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA

A autoria em relação a este crime é igualmente inconteste.

Restou claro no decorrer da instrução processual que o réu era o único responsável pela gerência da sociedade durante todo o período de não recolhimento, uma vez que a contrafação do INSTRUMENTO PARTICULAR DE ALTERAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS DA ZAMPAR ENGENHARIA E CONSTRUÇÃO LTDA retira por completo sua validade.

De outro lado, a alegação de que a administração financeira da empresa competia exclusivamente ao contador ANTONIO THEODORO DA SILVA, oportunamente já falecido, não merece guarida.

Isto porque, independentemente da empresa ser assessorada por um contador, empregado ou não, a responsabilidade por seus atos, especialmente no que tange à quitação de tributos, é do administrador legal, pois o simples fato de ter contratado um terceiro para cuidar dos assuntos fiscais não é suficiente para eximi-lo de suas obrigações. Fosse assim, muito fácil seria gerir um negócio.

Ressalte-se que mesmo que este administrador trouxesse prova de que entregou os valores necessários para o pagamento dos tributos e que foi enganado pelo profissional contratado, dificilmente conseguiria a atenuação de sua responsabilidade, considerando que na qualidade de gestor do negócio tem por obrigação precípua acautelar-se em relação a todos os assuntos relativos ao funcionamento da empresa, especialmente os que dizem respeito às obrigações legais.

Assim, no caso dos autos, a atribuição da responsabilidade pelo não pagamento das contribuições previdenciárias a terceiro em nada favorece o réu, legalmente responsável pela gerência e administração da sociedade, motivo pelo qual também fica mantida sua condenação pelo crime do artigo 168-A do Código Penal.

V. DA DOSIMETRIA DA PENA

Assiste razão ao MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ao requerer a majoração das penas-base em razão da conduta social e da personalidade do réu, que responde a outros processos criminais (fls. 509 e 512/513). Decerto, o envolvimento do apelante/apelado em outros delitos demonstra que os episódios tratados nestes autos não perfazem fato isolado em sua vida e é indicativo de personalidade predisposta à prática criminosa e de conduta social distorcida.

Então, para o uso de documento falso, aumento a pena-base em 1/12 (um doze avos), o que perfaz 1 ano e 1 mês de reclusão e 10 dias-multa, que torno definitiva, na ausência de agravantes, atenuantes, causas de aumento e de diminuição.

Para o crime de apropriação indébita previdenciária, igualmente aumento a pena-base em 1/12 (um doze avos), o que perfaz 2 anos e 2 meses de reclusão e 10 dias-multa. Não há agravantes e atenuantes a serem consideradas. Na terceira fase verifico que o crime foi cometido por 21 vezes, o que implicaria num aumento de 2/3 pela continuidade delitiva, consoante o critério utilizado por esta 1ª Turma. Todavia, como a acusação quedou-se inerte em relação a este ponto, fica mantido o aumento de 1/3 estabelecido na sentença, o que soma 2 anos, 10 meses e 20 dias de reclusão e 13 dias-multa.

Aplicada a regra do artigo 69 Código Penal, fica LUIZ OTÁVIO ZAMPAR condenado a 3 anos, 11 meses e 20 dias de reclusão e 23 dias-multa.

Sem reparo o regime inicial aberto para cumprimento da pena privativa de liberdade, bem como o valor do dia-multa fixado no mínimo legal.

No mais, fica mantida a substituição da reprimenda corporal por uma prestação de serviços à comunidade ou à entidade pública e uma prestação pecuniária no valor de 10 salários mínimos que, de ofício, destino à União Federal, conforme o disposto no artigo 16 da Lei n° 11.457/2007, pois existindo vítima identificada, descabe agraciar entidade social.

Por todo o exposto, rejeito a preliminar argüida, nego provimento ao recurso da defesa, dou provimento ao recurso ministerial para majorar as penas-base e, de ofício, destino a prestação pecuniária substitutiva à União Federal.

É como voto.

Johonsom di Salvo
Desembargador Federal

D.E. Publicado em 15/10/2009




JURID - Apelação criminal. Apropriação indébita previdenciária. [19/10/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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