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quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Informativo STF 560 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF

Informativo STF


Brasília, 21 a 25 de setembro de 2009 - Nº 560.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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SUMÁRIO

Plenário
Ministério Público do Trabalho e Ilegitimidade de Atuação perante o Supremo
Sonegação Fiscal e Esgotamento de Instância Administrativa - 2
Deferimento de Pedido de Extradição e Comunicação Imediata ao Presidente da República
1ª Turma
Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substituição de Pena Privativa de Liberdade por Restritiva de Direitos
Representação Processual e Cópia Não Autenticada - 2
2ª Turma
Repercussão Geral
Clipping do DJ
Transcrições
MP - Ação Civil Pública - Sucumbência - Inaplicabilidade (Regra Geral)/RE 233585/SP
Inovações Legislativas


PLENÁRIO

Ministério Público do Trabalho e Ilegitimidade de Atuação perante o Supremo

Mantendo a orientação fixada no sentido de que a representação do Ministério Público da União no Supremo pertence unicamente ao Procurador-Geral da República, o Tribunal, por maioria, não conheceu de agravo regimental interposto pelo Ministério Público do Trabalho contra acórdão que julgara procedente pedido formulado em reclamação e, declarando a incompetência da Justiça do Trabalho para julgamento do feito, determinara a remessa dos autos à Justiça Comum estadual. O acórdão reclamado vislumbrara ofensa à autoridade da decisão proferida pelo Supremo na ADI 3395 MC/DF (DJU de 10.11.2006), que suspendera qualquer interpretação ao art. 114 da CF/88 que incluísse na competência da Justiça do Trabalho a apreciação de causas instauradas entre o Poder Público e seus servidores, tendo por base o vínculo de ordem estatutária ou jurídico-administrativa. Vencido o Min. Marco Aurélio, que conhecia do recurso por considerar que, em razão de a ação civil pública que deu margem à reclamação estar sendo patrocinada pelo Ministério Público do Trabalho, poderia ele figurar como parte na relação processual da reclamação no Supremo.
Rcl 5543 AgR/GO, rel. Min. Celso de Mello, 23.9.2009. (Rcl-5543)

Sonegação Fiscal e Esgotamento de Instância Administrativa - 2

O Tribunal conheceu de embargos de declaração para, emprestando-lhes efeitos modificativos, negar provimento a recurso ordinário em habeas corpus, de forma a permitir o prosseguimento de inquérito policial instaurado contra a paciente, acusada pela suposta prática dos crimes previstos no art. 2º, I, da Lei 8.137/90 (sonegação fiscal) e no art. 203 do CP (“Frustrar, mediante fraude ou violência, direito assegurado pela legislação do trabalho”) — v. Informativo 513. Na espécie, o acórdão embargado dera parcial provimento ao recurso ordinário para trancar o inquérito policial relativamente ao crime de sonegação fiscal, aplicando o entendimento firmado pela Corte no sentido de que o prévio exaurimento da via administrativa é condição objetiva de punibilidade, não havendo se falar, antes dele, em consumação do crime material contra a Ordem Tributária, haja vista que, somente após a decisão final do procedimento administrativo fiscal é que será considerado lançado, definitivamente, o referido crédito. Asseverou-se que tal orientação jurisprudencial seria inerente ao tipo penal descrito no art. 1º, I, da Lei 8.137/90, classificado como crime material, que se consuma quando as condutas nele descritas produzem como resultado a efetiva supressão ou redução do tributo. Observou-se que o crime de sonegação fiscal, por sua vez, é crime formal que independe da obtenção de vantagem ilícita em desfavor do Fisco, bastando a omissão de informações ou a prestação de declaração falsa, isto é, não demanda a efetiva percepção material do ardil aplicado. Daí que, no caso, em razão de o procedimento investigatório ter por objetivo a apuração do possível crime do art. 2º, I, da Lei 8.137/90, a decisão definitiva no processo administrativo seria desnecessária para a configuração da justa causa imprescindível à persecução penal.
RHC 90532 ED/CE, rel. Min. Joaquim Barbosa, 23.9.2009. (RHC-90532)

Deferimento de Pedido de Extradição e Comunicação Imediata ao Presidente da República

O Tribunal, por maioria, rejeitou embargos de declaração opostos contra acórdão que deferira, em parte, pedido extradicional, e, reputando-os manifestamente procrastinatórios, autorizou a comunicação imediata dessa decisão da Corte ao Presidente da República. Na espécie, tratava-se de pedido de extradição instrutória, formulado pelo Governo de Israel, de seu nacional, relativamente aos crimes de abuso de menor ou pessoa incapaz, violência contra menor ou pessoa incapaz, e conspiração para cometer crime — v. Informativos 533 e 547. Ressaltou-se que a determinação de imediato cumprimento do acórdão embargado referir-se-ia tão-somente à comunicação ao Presidente da República de que o pedido de extradição fora julgado regular, e não à entrega do súdito estrangeiro ao Estado requerente. A Min. Ellen Gracie deixou consignado em seu voto que, em face da circunstância da inexistência de tratado de extradição entre o Brasil e o Estado de Israel, a questão de imediato cumprimento ficaria nos termos em que proposta. Vencido o Min. Marco Aurélio, que acolhia os embargos de declaração, sem eficácia modificativa — para prestar os esclarecimentos constantes do voto do relator —, não os considerando protelatórios. Entendia necessário, ainda, aguardar-se a publicação do acórdão proferido por força desses declaratórios para se comunicar, depois, ao Presidente da República a legalidade do pedido extradicional. Julgou-se, por unanimidade, prejudicado o pedido de transferência formulado pela Superintendência Regional do Departamento de Polícia Federal em São Paulo para a cidade de Brasília.
Ext 1122 ED/Estado de Israel, rel. Min. Carlos Britto, 23.9.2009. (Ext-1122)


PRIMEIRA TURMA

Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substituição de Pena Privativa de Liberdade por Restritiva de Direitos

A Turma deliberou afetar ao Plenário julgamento de habeas corpus em que condenado à pena de 1 ano e 8 meses de reclusão pela prática do crime de tráfico ilícito de entorpecentes (Lei 11.343/2006, art. 33, § 4º) questiona a constitucionalidade da vedação abstrata da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos disposta no art. 44 da citada Lei de Drogas (“Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos.”). Sustenta a impetração que a proibição, no caso de tráfico de entorpecentes, da substituição pretendida ofende as garantias da individualização da pena (CF, art. 5º, XLVI), bem como aquelas constantes dos incisos XXXV e LIV do mesmo preceito constitucional.
HC 97256/RS, rel. Min. Carlos Britto, 22.9.2009. (HC-97256)

Representação Processual e Cópia Não Autenticada - 2

A Turma, tendo em conta o óbito do Min. Menezes Direito — que indicara o adiamento do julgamento —, resolveu questão de ordem no sentido de remeter o processo com vista à Min. Cármén Lúcia. Trata-se, na espécie, de agravo regimental interposto contra decisão daquele ministro, que desprovera agravo de instrumento, do qual relator, em face da intempestividade de recurso extraordinário, inadmitido pelo Tribunal a quo por motivo diverso — v. Informativo 545. O relator afirmara que a ora agravante não juntara aos autos cópia de documentos que comprovassem a alegada suspensão do expediente forense na Corte de origem. Reitera-se a tempestividade do extraordinário, haja vista a ocorrência do mencionado recesso.
AI 741616 QO-AgR/RJ, rel. Min. Menezes Direito, 22.9.2009. (AI-741616)


SEGUNDA TURMA

Não houve sessão ordinária da Segunda Turma.

SessõesOrdináriasExtraordináriasJulgamentos
Pleno23.9.200924.9.200930
1ª Turma22.9.2009255
2ª Turma



R E P E R C U S S Ã O  G E R A L

DJE de 25 de setembro de 2009

REPERCUSSÃO GERAL EM AI N. 742.460-RJ
RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO
EMENTA: RECURSO. Extraordinário. Inadmissibilidade. Circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal. Fixação da pena-base. Fundamentação. Questão da ofensa aos princípios constitucionais da individualização da pena e da fundamentação das decisões judiciais. Inocorrência. Matéria infraconstitucional. Ausência de repercussão geral. Agravo de instrumento não conhecido. Não apresenta repercussão geral o recurso extraordinário que verse sobre a questão da valoração das circunstâncias judiciais previstas no art. 59, do Código Penal, na fundamentação da fixação da pena-base pelo juízo sentenciante, porque se trata de matéria infraconstitucional.

REPERCUSSÃO GERAL EM AI N. 747.522-RS
RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO
EMENTA: RECURSO. Extraordinário. Inadmissibilidade. Princípio da insignificância. Atipicidade da conduta. Ofensa ao art. 5°, incs. XXXV, LV e LIV, da Constituição Federal. Inocorrência. Matéria infraconstitucional. Ausência de repercussão geral. Agravo de instrumento não conhecido. Não apresenta repercussão geral o recurso extraordinário que verse sobre a questão do reconhecimento de aplicação do princípio da insignificância, porque se trata de matéria infraconstitucional.

REPERCUSSÃO GERAL EM AI N. 762.146-PR
RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO
EMENTA: RECURSO. Extraordinário. Transação penal. Homologação. Efeitos de decisão condenatória. Ofensa aos princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da presunção de inocência. Relevância. Repercussão geral reconhecida. Apresenta repercussão geral o recurso extraordinário que verse sobre a imposição de efeitos de sentença penal condenatória à transação penal prevista na Lei nº 9.099/95.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 593.727-MG
RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO
EMENTA: RECURSO. Extraordinário. Ministério Público. Poderes de investigação. Questão da ofensa aos arts. 5º, incs. LIV e LV, 129 e 144, da Constituição Federal. Relevância. Repercussão geral reconhecida. Apresenta repercussão geral o recurso extraordinário que verse sobre a questão de constitucionalidade, ou não, da realização de procedimento investigatório criminal pelo Ministério Público.

Decisões Publicadas: 4



C L I P P I N G  D O  DJ

25 de setembro de 2009

ADI N. 2.904-PR
RELATOR: MIN. MENEZES DIREITO
EMENTA: Ação direta de inconstitucionalidade. Art. 176 da Lei Complementar/PR nº 14/82, com a redação dada pelo art. 1º da Lei Complementar/PR nº 93/02. Regras especiais de aposentadoria do policial civil. Vício de iniciativa (CF, art. 61, §1º, II, “c”). Aplicação do art. 27 da Lei nº 9.868/99 considerando as peculiaridades do caso. Não há prejudicialidade em relação às Emendas Constitucionais n° 91/03 e n° 97/07, considerando o vício formal coberto pelo art. 61, § 1°, II, “c”, da Constituição Federal.
1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que as normas que regem a aposentadoria dos servidores civis estaduais são de iniciativa privativa do Governador do Estado, por força do art. 61, §1º, II, “c” e “f”, da Constituição Federal. Precedentes: ADI nº 872/RS, Relatora a Ministra Ellen Gracie, DJ de 20/9/02; ADI nº 2.115/RS, Relator o Ministro Ilmar Galvão, DJ de 6/9/01; ADI nº 700/RJ, Relator a Ministro Maurício Corrêa, DJ de 24/8/01.
2. É inconstitucional, por afronta ao art. 61, §1º, II, “c”, da Constituição, o art. 176 da Lei Complementar/PR nº 14/82, com a redação dada pelo art. 1º da Lei Complementar/PR nº 93/02, de iniciativa parlamentar, que dispôs sobre regras especiais de aposentadoria do policial civil.
3. Aplicação ao caso do art. 27 da Lei nº 9.868/99 para dar eficácia ex-nunc à declaração de inconstitucionalidade do art. 1º da Lei Complementar/PR nº 93/02, de modo a preservar a situação jurídica de todos os servidores aposentados até a data da sessão deste julgamento.
4. Ação direta julgada procedente.
* noticiado no Informativo 542

Pet N. 3.388-RR
RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO
EMENTA: AÇÃO POPULAR. DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA RAPOSA SERRA DO SOL. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS NO PROCESSO ADMINISTRATIVO-DEMARCATÓRIO. OBSERVÂNCIA DOS ARTS. 231 E 232 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, BEM COMO DA LEI Nº 6.001/73 E SEUS DECRETOS REGULAMENTARES. CONSTITUCIONALIDADE E LEGALIDADE DA PORTARIA Nº 534/2005, DO MINISTRO DA JUSTIÇA, ASSIM COMO DO DECRETO PRESIDENCIAL HOMOLOGATÓRIO. RECONHECIMENTO DA CONDIÇÃO INDÍGENA DA ÁREA DEMARCADA, EM SUA TOTALIDADE. MODELO CONTÍNUO DE DEMARCAÇÃO. CONSTITUCIONALIDADE. REVELAÇÃO DO REGIME CONSTITUCIONAL DE DEMARCAÇÃO DAS TERRAS INDÍGENAS. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL COMO ESTATUTO JURÍDICO DA CAUSA INDÍGENA. A DEMARCAÇÃO DAS TERRAS INDÍGENAS COMO CAPÍTULO AVANÇADO DO CONSTITUCIONALISMO FRATERNAL. INCLUSÃO COMUNITÁRIA PELA VIA DA IDENTIDADE ÉTNICA. VOTO DO RELATOR QUE FAZ AGREGAR AOS RESPECTIVOS FUNDAMENTOS SALVAGUARDAS INSTITUCIONAIS DITADAS PELA SUPERLATIVA IMPORTÂNCIA HISTÓRICO-CULTURAL DA CAUSA. SALVAGUARDAS AMPLIADAS A PARTIR DE VOTO-VISTA DO MINISTRO MENEZES DIREITO E DESLOCADAS PARA A PARTE DISPOSITIVA DA DECISÃO.
1. AÇÃO NÃO CONHECIDA EM PARTE. Ação não-conhecida quanto à pretensão autoral de excluir da área demarcada o que dela já fora excluída: o 6º Pelotão Especial de Fronteira, os núcleos urbanos dos Municípios de Uiramutã e Normandia, os equipamentos e instalações públicos federais e estaduais atualmente existentes, as linhas de transmissão de energia elétrica e os leitos das rodovias federais e estaduais também já existentes. Ausência de interesse jurídico. Pedidos já contemplados na Portaria nº 534/2005 do Ministro da Justiça. Quanto à sede do Município de Pacaraima, cuida-se de território encravado na “Terra Indígena São Marcos”, matéria estranha à presente demanda. Pleito, por igual, não conhecido.
2. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS PROCESSUAIS NA AÇÃO POPULAR. 2.1. Nulidade dos atos, ainda que formais, tendo por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras situadas na área indígena Raposa Serra do Sol. Pretensos titulares privados que não são partes na presente ação popular. Ação que se destina à proteção do patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe (inciso LXXIII do artigo 5º da Constituição Federal), e não à defesa de interesses particulares. 2.2. Ilegitimidade passiva do Estado de Roraima, que não foi acusado de praticar ato lesivo ao tipo de bem jurídico para cuja proteção se preordena a ação popular. Impossibilidade de ingresso do Estado-membro na condição de autor, tendo em vista que a legitimidade ativa da ação popular é tão-somente do cidadão. 2.3. Ingresso do Estado de Roraima e de outros interessados, inclusive de representantes das comunidades indígenas, exclusivamente como assistentes simples. 2.4. Regular atuação do Ministério Público.
3. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS NO PROCESSO ADMINISTRATIVO DEMARCATÓRIO. 3.1. Processo que observou as regras do Decreto nº 1.775/96, já declaradas constitucionais pelo Supremo Tribunal Federal no Mandado de Segurança nº 24.045, da relatoria do ministro Joaquim Barbosa. Os interessados tiveram a oportunidade de se habilitar no processo administrativo de demarcação das terras indígenas, como de fato assim procederam o Estado de Roraima, o Município de Normandia, os pretensos posseiros e comunidades indígenas, estas por meio de petições, cartas e prestação de informações. Observância das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa. 3.2. Os dados e peças de caráter antropológico foram revelados e subscritos por profissionais de reconhecidas qualificação científica e se dotaram de todos os elementos exigidos pela Constituição e pelo Direito infraconstitucional para a demarcação de terras indígenas, não sendo obrigatória a subscrição do laudo por todos os integrantes do grupo técnico (Decretos nos 22/91 e 1.775/96). 3.3. A demarcação administrativa, homologada pelo Presidente da República, é “ato estatal que se reveste da presunção juris tantum de legitimidade e de veracidade” (RE 183.188, da relatoria do ministro Celso de Mello), além de se revestir de natureza declaratória e força auto-executória. Não comprovação das fraudes alegadas pelo autor popular e seu originário assistente.
4. O SIGNIFICADO DO SUBSTANTIVO “ÍNDIOS” NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. O substantivo “índios” é usado pela Constituição Federal de 1988 por um modo invariavelmente plural, para exprimir a diferenciação dos aborígenes por numerosas etnias. Propósito constitucional de retratar uma diversidade indígena tanto interétnica quanto intra-étnica. Índios em processo de aculturação permanecem índios para o fim de proteção constitucional. Proteção constitucional que não se limita aos silvícolas, estes, sim, índios ainda em primitivo estádio de habitantes da selva.
5. AS TERRAS INDÍGENAS COMO PARTE ESSENCIAL DO TERRITÓRIO BRASILEIRO. 5.1. As “terras indígenas” versadas pela Constituição Federal de 1988 fazem parte de um território estatal-brasileiro sobre o qual incide, com exclusividade, o Direito nacional. E como tudo o mais que faz parte do domínio de qualquer das pessoas federadas brasileiras, são terras que se submetem unicamente ao primeiro dos princípios regentes das relações internacionais da República Federativa do Brasil: a soberania ou “independência nacional” (inciso I do art. 1º da CF). 5.2. Todas as “terras indígenas” são um bem público federal (inciso XI do art. 20 da CF), o que não significa dizer que o ato em si da demarcação extinga ou amesquinhe qualquer unidade federada. Primeiro, porque as unidades federadas pós-Constituição de 1988 já nascem com seu território jungido ao regime constitucional de preexistência dos direitos originários dos índios sobre as terras por eles “tradicionalmente ocupadas”. Segundo, porque a titularidade de bens não se confunde com o senhorio de um território político. Nenhuma terra indígena se eleva ao patamar de território político, assim como nenhuma etnia ou comunidade indígena se constitui em unidade federada. Cuida-se, cada etnia indígena, de realidade sócio-cultural, e não de natureza político-territorial.
6. NECESSÁRIA LIDERANÇA INSTITUCIONAL DA UNIÃO, SEMPRE QUE OS ESTADOS E MUNICÍPIOS ATUAREM NO PRÓPRIO INTERIOR DAS TERRAS JÁ DEMARCADAS COMO DE AFETAÇÃO INDÍGENA. A vontade objetiva da Constituição obriga a efetiva presença de todas as pessoas federadas em terras indígenas, desde que em sintonia com o modelo de ocupação por ela concebido, que é de centralidade da União. Modelo de ocupação que tanto preserva a identidade de cada etnia quanto sua abertura para um relacionamento de mútuo proveito com outras etnias indígenas e grupamentos de não-índios. A atuação complementar de Estados e Municípios em terras já demarcadas como indígenas há de se fazer, contudo, em regime de concerto com a União e sob a liderança desta. Papel de centralidade institucional desempenhado pela União, que não pode deixar de ser imediatamente coadjuvado pelos próprios índios, suas comunidades e organizações, além da protagonização de tutela e fiscalização do Ministério Público (inciso V do art. 129 e art. 232, ambos da CF).
7. AS TERRAS INDÍGENAS COMO CATEGORIA JURÍDICA DISTINTA DE TERRITÓRIOS INDÍGENAS. O DESABONO CONSTITUCIONAL AOS VOCÁBULOS “POVO”, “PAÍS”, “TERRITÓRIO”, “PÁTRIA” OU “NAÇÃO” INDÍGENA. Somente o “território” enquanto categoria jurídico-política é que se põe como o preciso âmbito espacial de incidência de uma dada Ordem Jurídica soberana, ou autônoma. O substantivo “terras” é termo que assume compostura nitidamente sócio-cultural, e não política. A Constituição teve o cuidado de não falar em territórios indígenas, mas, tão-só, em “terras indígenas”. A traduzir que os “grupos”, “organizações”, “populações” ou “comunidades” indígenas não constituem pessoa federada. Não formam circunscrição ou instância espacial que se orne de dimensão política. Daí não se reconhecer a qualquer das organizações sociais indígenas, ao conjunto delas, ou à sua base peculiarmente antropológica a dimensão de instância transnacional. Pelo que nenhuma das comunidades indígenas brasileiras detém estatura normativa para comparecer perante a Ordem Jurídica Internacional como “Nação”, “País”, “Pátria”, “território nacional” ou “povo” independente. Sendo de fácil percepção que todas as vezes em que a Constituição de 1988 tratou de “nacionalidade” e dos demais vocábulos aspeados (País, Pátria, território nacional e povo) foi para se referir ao Brasil por inteiro.
8. A DEMARCAÇÃO COMO COMPETÊNCIA DO PODER EXECUTIVO DA UNIÃO. Somente à União, por atos situados na esfera de atuação do Poder Executivo, compete instaurar, sequenciar e concluir formalmente o processo demarcatório das terras indígenas, tanto quanto efetivá-lo materialmente, nada impedindo que o Presidente da República venha a consultar o Conselho de Defesa Nacional (inciso III do § 1º do art. 91 da CF), especialmente se as terras indígenas a demarcar coincidirem com faixa de fronteira. As competências deferidas ao Congresso Nacional, com efeito concreto ou sem densidade normativa, exaurem-se nos fazeres a que se referem o inciso XVI do art. 49 e o § 5º do art. 231, ambos da Constituição Federal.
9. A DEMARCAÇÃO DE TERRAS INDÍGENAS COMO CAPÍTULO AVANÇADO DO CONSTITUCIONALISMO FRATERNAL. Os arts. 231 e 232 da Constituição Federal são de finalidade nitidamente fraternal ou solidária, própria de uma quadra constitucional que se volta para a efetivação de um novo tipo de igualdade: a igualdade civil-moral de minorias, tendo em vista o proto-valor da integração comunitária. Era constitucional compensatória de desvantagens historicamente acumuladas, a se viabilizar por mecanismos oficiais de ações afirmativas. No caso, os índios a desfrutar de um espaço fundiário que lhes assegure meios dignos de subsistência econômica para mais eficazmente poderem preservar sua identidade somática, linguística e cultural. Processo de uma aculturação que não se dilui no convívio com os não-índios, pois a aculturação de que trata a Constituição não é perda de identidade étnica, mas somatório de mundividências. Uma soma, e não uma subtração. Ganho, e não perda. Relações interétnicas de mútuo proveito, a caracterizar ganhos culturais incessantemente cumulativos. Concretização constitucional do valor da inclusão comunitária pela via da identidade étnica.
10. O FALSO ANTAGONISMO ENTRE A QUESTÃO INDÍGENA E O DESENVOLVIMENTO. Ao Poder Público de todas as dimensões federativas o que incumbe não é subestimar, e muito menos hostilizar comunidades indígenas brasileiras, mas tirar proveito delas para diversificar o potencial econômico-cultural dos seus territórios (dos entes federativos). O desenvolvimento que se fizer sem ou contra os índios, ali onde eles se encontrarem instalados por modo tradicional, à data da Constituição de 1988, desrespeita o objetivo fundamental do inciso II do art. 3º da Constituição Federal, assecuratório de um tipo de “desenvolvimento nacional” tão ecologicamente equilibrado quanto humanizado e culturalmente diversificado, de modo a incorporar a realidade indígena.
11. O CONTEÚDO POSITIVO DO ATO DE DEMARCAÇÃO DAS TERRAS INDÍGENAS. 11.1. O marco temporal de ocupação. A Constituição Federal trabalhou com data certa —— a data da promulgação dela própria (5 de outubro de 1988) —— como insubstituível referencial para o dado da ocupação de um determinado espaço geográfico por essa ou aquela etnia aborígene; ou seja, para o reconhecimento, aos índios, dos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam. 11.2. O marco da tradicionalidade da ocupação. É preciso que esse estar coletivamente situado em certo espaço fundiário também ostente o caráter da perdurabilidade, no sentido anímico e psíquico de continuidade etnográfica. A tradicionalidade da posse nativa, no entanto, não se perde onde, ao tempo da promulgação da Lei Maior de 1988, a reocupação apenas não ocorreu por efeito de renitente esbulho por parte de não-índios. Caso das “fazendas” situadas na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, cuja ocupação não arrefeceu nos índios sua capacidade de resistência e de afirmação da sua peculiar presença em todo o complexo geográfico da “Raposa Serra do Sol”. 11.3. O marco da concreta abrangência fundiária e da finalidade prática da ocupação tradicional. Áreas indígenas são demarcadas para servir concretamente de habitação permanente dos índios de uma determinada etnia, de par com as terras utilizadas para suas atividades produtivas, mais as “imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar” e ainda aquelas que se revelarem “necessárias à reprodução física e cultural” de cada qual das comunidades étnico-indígenas, “segundo seus usos, costumes e tradições” (usos, costumes e tradições deles, indígenas, e não usos, costumes e tradições dos não-índios). Terra indígena, no imaginário coletivo aborígine, não é um simples objeto de direito, mas ganha a dimensão de verdadeiro ente ou ser que resume em si toda ancestralidade, toda coetaneidade e toda posteridade de uma etnia. Donde a proibição constitucional de se remover os índios das terras por eles tradicionalmente ocupadas, assim como o reconhecimento do direito a uma posse permanente e usufruto exclusivo, de parelha com a regra de que todas essas terras “são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis” (§ 4º do art. 231 da Constituição Federal). O que termina por fazer desse tipo tradicional de posse um heterodoxo instituto de Direito Constitucional, e não uma ortodoxa figura de Direito Civil. Donde a clara intelecção de que OS ARTIGOS 231 E 232 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL CONSTITUEM UM COMPLETO ESTATUTO JURÍDICO DA CAUSA INDÍGENA. 11.4. O marco do conceito fundiariamente extensivo do chamado “princípio da proporcionalidade”. A Constituição de 1988 faz dos usos, costumes e tradições indígenas o engate lógico para a compreensão, entre outras, das semânticas da posse, da permanência, da habitação, da produção econômica e da reprodução física e cultural das etnias nativas. O próprio conceito do chamado “princípio da proporcionalidade”, quando aplicado ao tema da demarcação das terras indígenas, ganha um conteúdo peculiarmente extensivo.
12. DIREITOS “ORIGINÁRIOS”. Os direitos dos índios sobre as terras que tradicionalmente ocupam foram constitucionalmente “reconhecidos”, e não simplesmente outorgados, com o que o ato de demarcação se orna de natureza declaratória, e não propriamente constitutiva. Ato declaratório de uma situação jurídica ativa preexistente. Essa a razão de a Carta Magna havê-los chamado de “originários”, a traduzir um direito mais antigo do que qualquer outro, de maneira a preponderar sobre pretensos direitos adquiridos, mesmo os materializados em escrituras públicas ou títulos de legitimação de posse em favor de não-índios. Atos, estes, que a própria Constituição declarou como “nulos e extintos” (§ 6º do art. 231 da CF).
13. O MODELO PECULIARMENTE CONTÍNUO DE DEMARCAÇÃO DAS TERRAS INDÍGENAS. O modelo de demarcação das terras indígenas é orientado pela ideia de continuidade. Demarcação por fronteiras vivas ou abertas em seu interior, para que se forme um perfil coletivo e se afirme a auto-suficiência econômica de toda uma comunidade usufrutuária. Modelo bem mais serviente da ideia cultural e econômica de abertura de horizontes do que de fechamento em “bolsões”, “ilhas”, “blocos” ou “clusters”, a evitar que se dizime o espírito pela eliminação progressiva dos elementos de uma dada cultura (etnocídio).
14. A CONCILIAÇÃO ENTRE TERRAS INDÍGENAS E A VISITA DE NÃO-ÍNDIOS, TANTO QUANTO COM A ABERTURA DE VIAS DE COMUNICAÇÃO E A MONTAGEM DE BASES FÍSICAS PARA A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS OU DE RELEVÂNCIA PÚBLICA. A exclusividade de usufruto das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nas terras indígenas é conciliável com a eventual presença de não-índios, bem assim com a instalação de equipamentos públicos, a abertura de estradas e outras vias de comunicação, a montagem ou construção de bases físicas para a prestação de serviços públicos ou de relevância pública, desde que tudo se processe sob a liderança institucional da União, controle do Ministério Público e atuação coadjuvante de entidades tanto da Administração Federal quanto representativas dos próprios indígenas. O que já impede os próprios índios e suas comunidades, por exemplo, de interditar ou bloquear estradas, cobrar pedágio pelo uso delas e inibir o regular funcionamento das repartições públicas.
15. A RELAÇÃO DE PERTINÊNCIA ENTRE TERRAS INDÍGENAS E MEIO AMBIENTE. Há perfeita compatibilidade entre meio ambiente e terras indígenas, ainda que estas envolvam áreas de “conservação” e “preservação” ambiental. Essa compatibilidade é que autoriza a dupla afetação, sob a administração do competente órgão de defesa ambiental.
16. A DEMARCAÇÃO NECESSARIAMENTE ENDÓGENA OU INTRAÉTNICA. Cada etnia autóctone tem para si, com exclusividade, uma porção de terra compatível com sua peculiar forma de organização social. Daí o modelo contínuo de demarcação, que é monoétnico, excluindo-se os intervalados espaços fundiários entre uma etnia e outra. Modelo intraétnico que subsiste mesmo nos casos de etnias lindeiras, salvo se as prolongadas relações amistosas entre etnias aborígines venham a gerar, como no caso da Raposa Serra do Sol, uma condivisão empírica de espaços que impossibilite uma precisa fixação de fronteiras interétnicas. Sendo assim, se essa mais entranhada aproximação física ocorrer no plano dos fatos, como efetivamente se deu na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, não há como falar de demarcação intraétnica, menos ainda de espaços intervalados para legítima ocupação por não-índios, caracterização de terras estaduais devolutas, ou implantação de Municípios.
17. COMPATIBILIDADE ENTRE FAIXA DE FRONTEIRA E TERRAS INDÍGENAS. Há compatibilidade entre o usufruto de terras indígenas e faixa de fronteira. Longe de se pôr como um ponto de fragilidade estrutural das faixas de fronteira, a permanente alocação indígena nesses estratégicos espaços em muito facilita e até obriga que as instituições de Estado (Forças Armadas e Polícia Federal, principalmente) se façam também presentes com seus postos de vigilância, equipamentos, batalhões, companhias e agentes. Sem precisar de licença de quem quer que seja para fazê-lo. Mecanismos, esses, a serem aproveitados como oportunidade ímpar para conscientizar ainda mais os nossos indígenas, instruí-los (a partir dos conscritos), alertá-los contra a influência eventualmente malsã de certas organizações não-governamentais estrangeiras, mobilizá-los em defesa da soberania nacional e reforçar neles o inato sentimento de brasilidade. Missão favorecida pelo fato de serem os nossos índios as primeiras pessoas a revelar devoção pelo nosso País (eles, os índios, que em toda nossa história contribuíram decisivamente para a defesa e integridade do território nacional) e até hoje dar mostras de conhecerem o seu interior e as suas bordas mais que ninguém.
18. FUNDAMENTOS JURÍDICOS E SALVAGUARDAS INSTITUCIONAIS QUE SE COMPLEMENTAM. Voto do relator que faz agregar aos respectivos fundamentos salvaguardas institucionais ditadas pela superlativa importância histórico-cultural da causa. Salvaguardas ampliadas a partir de voto-vista do Ministro Menezes Direito e deslocadas, por iniciativa deste, para a parte dispositiva da decisão. Técnica de decidibilidade que se adota para conferir maior teor de operacionalidade ao acórdão.
* noticiado no Informativo 539

Rcl N. 6.568-SP
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: RECLAMAÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO. POLICIAIS CIVIS. DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE. SERVIÇOS OU ATIVIDADES PÚBLICAS ESSENCIAIS. COMPETÊNCIA PARA CONHECER E JULGAR O DISSÍDIO. ARTIGO 114, INCISO I, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DIREITO DE GREVE. ARTIGO 37, INCISO VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. LEI N. 7.783/89. INAPLICABILIDADE AOS SERVIDORES PÚBLICOS. DIREITO NÃO ABSOLUTO. RELATIVIZAÇÃO DO DIREITO DE GREVE EM RAZÃO DA ÍNDOLE DE DETERMINADAS ATIVIDADES PÚBLICAS. AMPLITUDE DA DECISÃO PROFERIDA NO JULGAMENTO DO MANDADO DE INJUNÇÃO N. 712. ART. 142, § 3º, INCISO IV, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. INTERPRETAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO. AFRONTA AO DECIDIDO NA ADI 3.395. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO PARA DIRIMIR CONFLITOS ENTRE SERVIDORES PÚBLICOS E ENTES DA ADMINISTRAÇÃO ÀS QUAIS ESTÃO VINCULADOS. RECLAMAÇÃO JULGADA PROCEDENTE.
1. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o MI n. 712, afirmou entendimento no sentido de que a Lei n. 7.783/89, que dispõe sobre o exercício do direito de greve dos trabalhadores em geral, é ato normativo de início inaplicável aos servidores públicos civis, mas ao Poder Judiciário dar concreção ao artigo 37, inciso VII, da Constituição do Brasil, suprindo omissões do Poder Legislativo.
2. Servidores públicos que exercem atividades relacionadas à manutenção da ordem pública e à segurança pública, à administração da Justiça — aí os integrados nas chamadas carreiras de Estado, que exercem atividades indelegáveis, inclusive as de exação tributária — e à saúde pública. A conservação do bem comum exige que certas categorias de servidores públicos sejam privadas do exercício do direito de greve. Defesa dessa conservação e efetiva proteção de outros direitos igualmente salvaguardados pela Constituição do Brasil.
3. Doutrina do duplo efeito, segundo Tomás de Aquino, na Suma Teológica (II Seção da II Parte, Questão 64, Artigo 7). Não há dúvida quanto a serem, os servidores públicos, titulares do direito de greve. Porém, tal e qual é lícito matar a outrem em vista do bem comum, não será ilícita a recusa do direito de greve a tais e quais servidores públicos em benefício do bem comum. Não há mesmo dúvida quanto a serem eles titulares do direito de greve. A Constituição é, contudo, uma totalidade. Não um conjunto de enunciados que se possa ler palavra por palavra, em experiência de leitura bem comportada ou esteticamente ordenada. Dela são extraídos, pelo intérprete, sentidos normativos, outras coisas que não somente textos. A força normativa da Constituição é desprendida da totalidade, totalidade normativa, que a Constituição é. Os servidores públicos são, seguramente, titulares do direito de greve. Essa é a regra. Ocorre, contudo, que entre os serviços públicos há alguns que a coesão social impõe sejam prestados plenamente, em sua totalidade. Atividades das quais dependam a manutenção da ordem pública e a segurança pública, a administração da Justiça — onde as carreiras de Estado, cujos membros exercem atividades indelegáveis, inclusive as de exação tributária — e a saúde pública não estão inseridos no elenco dos servidores alcançados por esse direito. Serviços públicos desenvolvidos por grupos armados: as atividades desenvolvidas pela polícia civil são análogas, para esse efeito, às dos militares, em relação aos quais a Constituição expressamente proíbe a greve [art. 142, § 3º, IV].
4. No julgamento da ADI 3.395, o Supremo Tribunal Federal, dando interpretação conforme ao artigo 114, inciso I, da Constituição do Brasil, na redação a ele conferida pela EC 45/04, afastou a competência da Justiça do Trabalho para dirimir os conflitos decorrentes das relações travadas entre servidores públicos e entes da Administração à qual estão vinculados. Pedido julgado procedente.
* noticiado no Informativo 547

HC N. 94.756-BA
RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO
EMENTA: HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. PENDÊNCIA DE RECURSO DE NATUREZA EXTRAORDINÁRIA. SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA QUE ASSEGUROU AO PACIENTE O DIREITO DE AGUARDAR, EM LIBERDADE, O TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO. DECRETO DE PRISÃO CARENTE DE FUNDAMENTAÇÃO VÁLIDA. GARANTIA DA FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS E DIREITO À PRESUNÇÃO DE NÃO CULPABILIDADE. LIMINAR DEFERIDA. ORIENTAÇÃO DO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ORDEM CONCEDIDA.
1. No julgamento do HC 84.078, da relatoria do ministro Eros Grau, o Plenário do Supremo Tribunal Federal assentou, por maioria de votos, a inconstitucionalidade da execução provisória da pena. É que o exaurimento das instâncias ordinárias não afasta, automaticamente, o direito à presunção de não culpabilidade. Direito individual, aclare-se, que tem sua força quebrantada em uma única passagem da Constituição, a saber: “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei” (inciso LXI do art. 5º).
2. Em matéria de prisão provisória, a garantia da fundamentação das decisões judiciais consiste na demonstração da necessidade da custódia cautelar, a teor do inciso LXI do art. 5º da Carta Magna e do art. 312 do Código de Processo Penal. A falta de fundamentação do decreto de prisão inverte a lógica elementar da Constituição, que presume a não culpabilidade do indivíduo até o momento do trânsito em julgado de sentença penal condenatória (inciso LVII do art. 5º da CF). Não é de se confundir prisão provisória com execução provisória da pena, portanto. Aquela, admissível, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal. Esta, por nenhum modo admitida.
3. Ordem concedida.

RE N. 351.750-RJ
RELATOR P/ O ACÓRDÃO: MIN. CARLOS BRITTO
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DANOS MORAIS DECORRENTES DE ATRASO OCORRIDO EM VOO INTERNACIONAL. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. NÃO CONHECIMENTO. 1. O princípio da defesa do consumidor se aplica a todo o capítulo constitucional da atividade econômica. 2. Afastam-se as normas especiais do Código Brasileiro da Aeronáutica e da Convenção de Varsóvia quando implicarem retrocesso social ou vilipêndio aos direitos assegurados pelo Código de Defesa do Consumidor. 3. Não cabe discutir, na instância extraordinária, sobre a correta aplicação do Código de Defesa do Consumidor ou sobre a incidência, no caso concreto, de específicas normas de consumo veiculadas em legislação especial sobre o transporte aéreo internacional. Ofensa indireta à Constituição de República. 4. Recurso não conhecido.
* noticiado no Informativo 539

RE N. 202.987-SP
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE. ENTIDADE DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E EDUCAÇÃO SEM FINS LUCRATIVOS. INAPLICABILIDADE ÀS HIPÓTESES DE RESPONSABILIDADE OU SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA.
IMPOSTO SOBRE OPERAÇÃO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS - ICM/ICMS. LANÇAMENTO FUNDADO NA RESPONSABILIDADE DO SERVIÇO SOCIAL DA INDÚSTRIA - SESI PELO RECOLHIMENTO DE TRIBUTO INCIDENTE SOBRE A VENDA DE MERCADORIA ADQUIRIDA PELA ENTIDADE. PRODUTOR-VENDEDOR CONTRIBUINTE DO TRIBUTO. TRIBUTAÇÃO SUJEITA A DIFERIMENTO. Recurso extraordinário interposto de acórdão que considerou válida a responsabilização tributária do Serviço Social da Indústria - SESI pelo recolhimento de ICMS devido em operação de circulação de mercadoria, sob o regime de diferimento. Alegada violação do art. 150, IV, c da Constituição, que dispõe sobre a imunidade das entidades assistenciais sem fins lucrativos. A responsabilidade ou a substituição tributária não alteram as premissas centrais da tributação, cuja regra-matriz continua a incidir sobre a operação realizada pelo contribuinte. Portanto, a imunidade tributária não afeta, tão-somente por si, a relação de responsabilidade tributária ou de substituição e não exonera o responsável tributário ou o substituto. Recurso extraordinário conhecido, mas ao qual se nega provimento.
* noticiado no Informativo 553

Acórdãos Publicados: 298



T R A N S C R I Ç Õ E S


Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

MP - Ação Civil Pública - Sucumbência - Inaplicabilidade (Regra Geral) (Transcrições)

RE 233585/SP*

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. DEFESA E PROTEÇÃO, EM JUÍZO, DE DIREITOS E INTERESSES METAINDIVIDUAIS. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO CIVIL. IMPOSIÇÃO, AO MINISTÉRIO PÚBLICO, DOS ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA (VERBA HONORÁRIA, CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS). INADMISSIBILIDADE, “SALVO COMPROVADA MÁ-FÉ” (LEI Nº 7.347/85, ART. 18). AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO, NO CASO, DE CONDUTA ABUSIVA OU MALICIOSA POR PARTE DO REPRESENTANTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DOUTRINA. PRECEDENTES.
- O Ministério Público, quando vencido na ação civil pública - instrumento de que se utiliza para viabilizar a defesa e proteção, em juízo, de direitos e interesses metaindividuais -, não se sujeita aos ônus da sucumbência (verba honorária, custas e despesas processuais), exceto se resultar comprovado que o representante do “Parquet” incidiu em comportamento malicioso ou abusivo. Doutrina. Precedentes.

DECISÃO: A controvérsia suscitada na presente causa - possibilidade de o montante pertinente ao ICMS integrar a própria base de cálculo desse tributo estadual, sem que tal importe em transgressão ao princípio da não-cumulatividade - já foi dirimida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (RTJ 184/729, Rel. p/ o acórdão Min. NELSON JOBIM).
O acórdão questionado nesta sede recursal extraordinária diverge desse entendimento jurisprudencial, que tem sido observado por ambas as Turmas do Supremo Tribunal Federal (AI 195.323-AgR/SP, Rel. Min. MOREIRA ALVES - RE 261.393-AgR/SP, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, v.g.).
Sendo assim, pelas razões expostas, conheço e dou provimento ao presente recurso extraordinário (CPC, art. 557, § 1º - A), em ordem a julgar improcedente a ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público.
2. Deixo, contudo, de impor, ao Ministério Público, os ônus da sucumbência, considerada a orientação - que acolho - exposta em autorizado magistério doutrinário (JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO, “Ação Civil Pública”, p. 443/445, item n. 6, 6ª ed., 2007, Lumen Juris; JOÃO BATISTA DE ALMEIDA, “Aspectos Controvertidos da Ação Civil Pública”, p. 139/140, item n. 3.1.1.7, 2ª ed., 2009, RT; HUGO NIGRO MAZZILLI, “A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo”, p. 583/585, item n. 3, 21ª ed., 2008, Saraiva; FRANCISCO ANTONIO DE OLIVEIRA, “Ação Civil Pública”, p. 133/134, item n. 8.17, 2ª ed., 2004, RT; YUSSEF SAID CAHALI, “Honorários Advocatícios”, p. 262/273, item n. 6.3, 3ª ed., 1997, RT; GREGÓRIO ASSAGRA DE ALMEIDA, “Manual das Ações Constitucionais”, p. 192/193, item n. 1.1, 2007, Del Rey, v.g.), que reconhece, a propósito dessa questão, que o Ministério Público, quando vencido na ação civil pública, não fica sujeito ao pagamento da verba honorária (ACO 565/MS, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA), valendo referir, no ponto, ante a extrema pertinência de que se reveste, expressiva decisão proferida pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, consubstanciada em acórdão assim ementado:

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA – Proteção dos direitos do consumidor – Propositura pelo Ministério Público – Hipótese em que age no interesse da coletividade – Condenação nas verbas da sucumbência uma vez julgada improcedente a ação inadmissível – Inteligência do art. 17 da Lei 7.347/85.
O Ministério Público, quando propõe ação civil pública para proteção dos direitos do consumidor, está agindo no interesse da coletividade, tanto que não pode desistir da ação. Assim, não poderá também ser condenado nas verbas da sucumbência quando a demanda for julgada improcedente.”
(RT 639/73, Rel. Des. SILVEIRA NETTO - grifei)

Mesmo, porém, que se reconheça legítima a possibilidade de o Ministério Público sujeitar-se, excepcionalmente, em sede de ação civil pública, aos ônus da sucumbência, o que me parece extremamente razoável em face dos parâmetros éticos que regem a atividade dos sujeitos processuais e que repelem a figura do “improbus litigator” (REsp 577.804/RS, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI - REsp 896.679/RS, Rel. Min. LUIZ FUX - REsp 1.065.401/RS, Rel. Min. ELIANA CALMON – AI 1.042.206-AgR/SP, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, v.g.), ainda assim impor-se-á a necessária demonstração de que o representante do “Parquet”, procedendo de maneira abusiva, agiu com “comprovada má-fé” (Lei nº 7.347/85, art. 18):

“1. É pacífico o entendimento desta Corte Superior no sentido de que, nos casos em que a ação civil pública proposta pelo Ministério Público for julgada improcedente, somente haverá condenação ao pagamento de honorários advocatícios quando comprovada a má-fé do órgão ministerial, nos termos do art. 18 da Lei 7.347/85. Tal hipótese não ficou configurada no caso examinado, o que impõe o afastamento da condenação aos ônus sucumbenciais. (...).”
(REsp 868.279-AgR/MG, Rel. Min. DENISE ARRUDA - grifei)

Cabe assinalar, no entanto, que essa situação anômala (que jamais se presume) – abuso, pelo Ministério Público, de seu poder de demandar, com transgressão ao postulado ético-jurídico da probidade processual – não ficou demonstrada nos autos.
Com efeito, a parte ora recorrente sequer alegou – muito menos comprovou – a ocorrência, na espécie, de comportamento malicioso ou abusivo do representante do Ministério Público, única situação que poderia, desde que regularmente demonstrada, justificar a imposição, ao “Parquet”, dos ônus inerentes à sucumbência, consoante adverte iterativa jurisprudência dos Tribunais em geral (REsp 178.088/MG, Rel. Min. CASTRO MEIRA - REsp 183.089/SP, Rel. Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS - REsp 204.951-AgR/SP, Rel. Min. GILSON DIPP - REsp 258.128/MG, Rel. Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO - REsp 403.599/PR, Rel. Min. ELIANA CALMON - REsp 422.801/SP, Rel. Min. GARCIA VIEIRA, v.g.):

“PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO PROMOVIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS (CURADORIA DE DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO). CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA EXPEDIDA PELO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS NO PROCESSO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS DA PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO GONÇALO DO PARÁ. CONDENAÇÃO DO ‘PARQUET’ EM HONORÁRIOS. ART. 18, LEI 7.437/85. IMPOSSIBILIDADE.
1. A atuação do Ministério Público, ‘pro populo’, nas ações difusas, justifica, ao ângulo da lógica jurídica, sua dispensa em suportar os ônus sucumbenciais, acaso inacolhida a ação civil pública.
2. Consectariamente, o Ministério Público não deve ser condenado ao pagamento de honorários advocatícios e despesas processuais, salvo se comprovada má-fé.
3. Precedentes do STJ.
4. Recurso especial provido (CPC, art. 557, § 1º-A).”
(REsp 480.156/MG, Rel. Min. LUIZ FUX - grifei)

Por tais razões, e não obstante a sucumbência do Ministério Público no caso ora em exame, deixo de fazer incidir, sobre o “Parquet”, os ônus inerentes à verba honorária e às custas processuais.

Publique-se.

Brasília, 09 de setembro de 2009.

Ministro CELSO DE MELLO
Relator

* decisão publicada no DJE de 28.9.2009

INOVAÇÕES LEGISLATIVAS
21 a 25 de setembro de 2009

Supremo Tribunal Federal (STF) - Prazo Processual - Feriado Forense
Portaria nº 197/STF, de 18 de setembro de 2009 - Transfere para 30 de outubro, sexta-feira, as comemorações do Dia do Servidor Público e comunica que nessa data não haverá expediente na Secretaria do Tribunal. Os prazos ficam prorrogados para o dia 3 subseqüente (terça-feira) de novembro. Publicada no DJE/STF de 24/9/2009, n. 180, p. 1.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ)
Poder Judiciário - Estatística
Portaria/CNJ nº 615, de 10 de setembro de 2009 - Constitui o Comitê Gestor Nacional do Sistema de Estatísticas do Poder Judiciário. Publicada no DOU de 22/9/2009, Seção 1, p. 66. Publicada também no DJE/CNJ de 22/9/2009, n. 160, p. 2.

Prisão Provisória - Revisão
Resolução/CNJ nº 89, de 16 de setembro de 2009 - Institucionaliza os mutirões carcerários como mecanismo de revisão periódica das prisões provisórias e definitivas, das medidas de segurança e das internações de adolescentes. Publicada no DOU de 22/9/2009, Seção 1, p. 66. Publicada também no DJE/CNJ de 22/9/2009, n. 160, p. 5.

Documento - Gestão
Portaria/CNJ nº 616, de 10 de setembro de 2009 - Constitui Comitê de Gestão Documental do Judiciário brasileiro. Publicada no DOU de 22/9/2009, Seção 1, p. 66. Publicada também no DJE/CNJ de 22/9/2009, n. 160, p. 2.

Prisão Provisória - Estatística
Resolução/CNJ nº 87, de 15 de setembro de 2009 - Dá nova redação e renumera artigos da Resolução nº 66, de 27 de janeiro de 2009, que cria mecanismo de controle estatístico e disciplina o acompanhamento, pelos juízes e Tribunais, dos procedimentos relacionados à decretação e ao controle dos casos de prisão provisória. Publicada no DOU de 22/9/2009, Seção 1, p. 66. Publicada também no DJE/CNJ de 22/9/2009, n. 160, p. 3.


Assessora responsável pelo Informativo

Anna Daniela de A. M. dos Santos
informativo@stf.jus.br

 
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Informativo STF - 560 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

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