Processo civil. Comissão do leiloeiro.
Tribunal Regional Federal - TRF 4ª Região.
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2008.04.00.011221-4/RS
RELATORA: Juíza Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
AGRAVANTE: OSVALDO JORGE
ADVOGADO: Valerio Pimpao Echeverria
AGRAVADO: VERA REGINA MESSINA DOS SANTOS
ADVOGADO: Manoel da Rosa Freitas Neto e outro
AGRAVADO: UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO: Procuradoria-Regional da Fazenda Nacional
INTERESSADO: TRANSAZUL INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE CEREAIS LTDA/
EMENTA
PROCESSO CIVIL. COMISSÃO DO LEILOEIRO.
O desfazimento da hasta pública implica a devolução dos valores pagos a título de comissão de leiloeiro.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 16 de dezembro de 2009.
Juíza Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Relatora
RELATÓRIO
Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu o pedido de restituição do valor pago a título de comissão ao leiloeiro.
Sustenta o agravante - arrematante do bem penhorado, cuja arrematação foi desfeita, em razão da procedência de embargos de terceiro - que deve ser incluída, na restituição das quantias desembolsadas por ocasião da arrematação, a comissão paga ao leiloeiro. Alega que não pode ser responsabilizado por esse pagamento, porque o resultado útil - concretização da alineação - não ocorreu efetivamente. Argumenta que "a responsabilidade ao pagamento da comissão e custas do leiloeiro é da parte que deveria fiscalizar a regularidade da penhora, pois é ela quem deve suportar os efeitos da subseqüente invalidade da arrematação."(fl. 09).
Indeferido o pedido de efeito suspensivo e sem contraminuta, vieram os autos conclusos.
É o relatório.
VOTO
O indeferimento do pedido de devolução do valor pago a título de comissão ao leiloeiro baseou-se nos seguintes fundamentos:
"A meu sentir, a comissão da leiloeira é indiscutivelmente devida quando realiza o trabalho que lhe é atribuído como auxiliar da Justiça, o que se dá com a efetiva alienação do bem levado a leilão, como acabou ocorrendo no presente feito.
Fatos posteriores, como o desfazimento da arrematação, são totalmente indiferentes àquela profissional, uma vez que, traduzindo-se em despesas processuais, estas são adiantadas por quem promove a ação e, se for o caso, serão oportunamente carreadas à parte adversa.
Na espécie, a culpa pela anulação da penhora deve ser imputada à exeqüente Fazenda Nacional, haja vista que deveria fiscalizar a regularidade daquele ato processual sobre referido bem e, não o fazendo, permitiu que fosse constrito bem de sócio da empresa executada, sem que fosse redirecionada a demanda contra ele ou que ele tivesse manifestado o seu consentimento, como está deveras estampado no acórdão do Tribunal Regional Federal. Por conseguinte, ele e só ele há de suportar os efeitos da subseqüente invalidade da arrematação, promovendo o ressarcimento daquela despesa processual. "
Sobre o tema há precedentes jurisprudenciais reconhecendo o direito do arrematante à restituição dos valores desembolsados por ocasião da arrematação, que, posteriormente, foi tornada sem efeito, quando não tenha dado causa para o desfazimento da alienação do bem: "(...) Correta a decisão que, por ter sido declarado nulo o ato avaliatório e perdido a eficácia os atos subseqüentes, determinou a devolução da importância paga a título de comissão ao leiloeiro. Inexistência de violação ao art. 23, § 2º da Lei n. 6.830/80 (...)" (STJ, 2ª Turma, REsp 289641/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, j. 15.02.2001, DJ 30.04.2001, p. 129).
Nesse sentido: " (...) 1. O leiloeiro oficial exerce um mandato, recebendo comissão pelo seu serviço, conforme arbitrado ou previsto em contrato. 2. A comissão só é devida, efetivamente, quando finda a hasta ou leilão sem pendência alguma. 3. O desfazimento da alienação por fato da Justiça, sem culpa do arrematante, não gera para o leiloeiro direito à comissão (precedentes desta Turma) (...)" (STJ, 2ª Turma, RMS 13.130/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, j. 24.09.2002, DJ 21.10.2002, p. 327).
Na mesma linha, a decisão proferida por esta Turma no julgamento do AG 2008.04.00.015921-8/PR (Rel. Des. Fed. Vilson Darós, j. 06.05.2009, DE 20.05.2009):
"Faço minhas as bem lançadas palavras da MM. Magistrada de origem (fls. 391/392v):
"(...)
Trata-se de pedido de desfazimento da arrematação. Para decidir faço o breve apanhado do histórico processual.
Em março de 2004 houve a penhora do imóvel de matrícula nº 19.545, aparentemente, de propriedade da executada.
Requerido o leilão, este ocorreu com manifestação do exeqüente no sentido da possibilidade de parcelamento, o que não foi previsto no edital. Houve a arrematação por Sulide Esgarbi. Após ter sido lavrado o auto de arrematação, a arrematante argüiu que o Cartório de Registro de Imóveis a informou que a área arrematada pertencia de fato e de direito a outro proprietário, o qual exercia posse mansa e pacífica sobre o bem. Apurou, também, tratar-se matrícula superposta requerendo, deste modo, a devolução dos valores pagos ou sua imissão na posse do imóvel.
A exeqüente, por seu lado, opinou pela anterioridade da matrícula da executada e a sua prevalência sobre a matrícula do pretenso proprietário, com a conseqüente imissão na posse da arrematante.
Em seguida, foi certificado a não interposição de embargos à arrematação e acatou-se a tese levantada pela União, determinando-se o recolhimento do ITBI e a expedição da Carta de Arrematação com a respectiva imissão na posse do imóvel.
Posteriormente, o Sr. Flávio Pacheco, sob a alegação de ser o real proprietário do imóvel, peticionou requerendo a anulação do mandado de imissão na posse. Suspensa a referida ordem, a arrematante requereu a devolução dos valores pagos até que seja decidido a quem pertence a área em litígio, enquanto a União pleiteou a confirmação da decisão que acatou a sua tese.
Mantida a decisão na execução fiscal, o sr. Flávio Pacheco propôs ação ordinária onde conseguiu "ad cautelam" a suspensão da imissão na posse.
Diante da confusão a respeito da titularidade da área, novamente, a arrematante requereu a desistência da aquisição e a devolução imediata dos valores despendidos com a arrematação. Ademais, porque a Fazenda Nacional renegociou e parcelou a dívida da executada, a qual deixou de ser certa e exigível, não podendo a exeqüente permanecer com todas as garantias.
É o breve relatório. Passo a decidir.
Cabe analisar se a arrematação deve ser mantida ou não.
Em primeiro lugar, há que ser considerado o disposto no art. 694, do Código de Processo Civil:
"Assinado o auto pelo juiz, pelo arrematante e pelo serventuário da justiça ou leiloeiro, a arrematação considerar-se-á perfeita, acabada e irretratável, ainda que venham a ser julgados procedentes os embargos do executado."
As hipóteses de desfazimento estão relacionadas nos incisos do parágrafo 1º do referido artigo. O primeiro empecilho para o desfazimento da arrematação está no fato de que não só já houve a lavratura do auto de arrematação, mas também da própria carta de arrematação.
Contudo, entendo não haver obstáculos para o juiz, mesmo após a assinatura do auto de arrematação, declarar, de ofício, a nulidade do ato. Isso porque, tão somente após a expedição da carta de arrematação e de seu registro é que se poderá cogitar em prejuízo de terceiros, pois antes disso o bem ainda não ingressou em outras esferas patrimoniais, eis que em nosso sistema jurídico a transferência de domínio de bens imóveis se opera com a transcrição no registro imobiliário. Neste caso, verifico que mesmo expedida a Carta de Arrematação, ainda não ocorreu o respectivo registro, de forma que o imóvel ainda não ingressou em qualquer outro patrimônio.
Destarte, como não houve transcrição no registro imobiliário da carta de arrematação, é possível que o julgador monocrático declare a nulidade da arrematação, sem necessidade de ação própria.
Colho, a propósito, a lição de Humberto Theodoro Junior: " O desfazimento da arrematação nos casos do art. 694 não depende de processo especial e poderá ser promovido mediante simples petição do interessado nos próprios autos de execução. Se, porém, já houver verificado expedição da carta de arrematação e sua transcrição no Registro Imobiliário, a pretensão só poderá ser examinada em ação própria."( in Curso de Direito Processual Civil, Volume II, 36ª edição, Editora Forense, 2004, p.232 - grifos nossos).
As razões invocadas pela arrematante, de que não poderá tomar posse do imóvel enquanto não for dirimida a titularidade de área, são suficientes para que se desfaça a arrematação, uma vez que a incerteza sobre a existência do imóvel leiloado, tal como descrito no edital de leilão, é causa para anulação da arrematação.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL . EXECUÇÃO FISCAL. NULIDADE DA ARREMATAÇÃO. ART. 694, DO CPC. AGRAVO IMPROVIDO.
1. Dispõe o art. 694, "caput", do CPC, que, assinado o auto pelo juiz, pelo arrematante e pelo serventuário da justiça ou leiloeiro, a arrematação considerar-se-á perfeita, acabada e irretratável. Porém, entre outros casos, é admitido o desfazimento da arrematação por vício de nulidade (inciso I do art. 694 do CPC).
2. No caso concreto, o próprio arrematante postulou a nulidade da arrematação porque não conseguiu obter o registro do auto no cartório de registro de imóveis, uma vez que o imóvel estava registrado em nome de terceiro. Não se trata, portanto, de anulação de arrematação relativa à imóvel cuja propriedade já tinha sido transferida a terceiro. Se a nulidade poderia ser reconhecida nos próprios autos na hipótese de o preço não ser pago pelo arrematante (art. 694, II, do CPC), da mesma forma pode sê-lo quando inviabilizado o exercício do direito à propriedade diante de nulidade evidente do ato expropriatório. Independe, portanto, de ação própria a ser promovida pelo arrematante o reconhecimento da nulidade do auto de arrematação por vício no processamento da execução fiscal.
3. Agravo de instrumento improvido.
(TRF 4ª Região, AG 2004.04.01.017986-5/SC, Segunda Turma, Rel. Juiz Federal ALEXANDRE ROSSATO DA SILVA ÁVILA , 23/10/2007).
Outrossim, nosso ordenamento jurídico estabelece expressamente a nulidade da arrematação na hipótese de desrespeito à exigência consagrada no inciso V, do art. 686 do CPC, qual seja, a menção da existência de ônus, recurso ou causa pendente sobre os bens a serem arrematados. Ora, se a falta de menção da existência de ônus reais nulifica o ato alienatório, o que não dizer se os bens arrematados pertencerem a terceiros ou se simplesmente não houver certeza sobre a sua existência real. Assim, nestas situações cabe, evidentemente, a anulação da arrematação, pois resta inviabilizado o direito à propriedade diante da nulidade evidente do ato expropriatório.
Desta maneira, por reconhecer a nulidade da arrematação, determino que a situação seja reconduzida a seu estado anterior, mediante a devolução dos valores pagos a título de arrematação, devidamente corrigidos, assim como os honorários pagos ao leiloeiro, valores estes que serão devolvidos ao arrematante, independente de qualquer outro pedido administrativo.
Relevante esclarecer, por oportuno, que o parcelamento posterior concedido pelo exeqüente não tem o condão de liberar as contrições pretéritas. Assim, embora tenha sido determinado o desfazimento da arrematação, a penhora sobre o bem continua hígida até que a dívida seja paga.
Desta forma, tendo em vista a notícia do parcelamento da dívida através de acordo extrajudicial, é necessária a suspensão da execução durante o prazo concedido pelo credor para que o devedor cumpra a obrigação, nos termos do art. 792 do CPC.
Isto posto, declaro a nulidade da arrematação. Intimem-se todas as partes, inclusive o arrematante.
Intime-se o leiloeiro que procedeu a alienação para depositar em conta vinculada a estes autos, no prazo de 05 (cinco) dias, os valores recebidos a título de comissão referente a esta venda judicial.
O exeqüente deverá requerer o que entender devido, além de providenciar o necessário para o cumprimento da determinação da devolução dos valores, na forma decidida.
Traslade-se cópia desta decisão para os autos em apenso.
Francisco Beltrão/PR, 27 de março de 2008.
Ivanise Corrêa Rodrigues Perotoni
Juíza Federal"
De fato, cabe a anulação da arrematação no caso concreto, pois resta inviabilizado o direito à propriedade diante da nulidade evidente do ato expropriatório.
Assim, nada a modificar na decisão agravada.
Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo de instrumento." (grifei)
In casu, a arrematação foi tornada sem efeito, por força de decisão proferida em embargos de terceiro, restando afastada a responsabilidade do arrematante pela irregularidade apurada no ato de constrição judicial do bem. Com efeito, é devida a devolução do valor correspondente à comissão do leiloeiro, desde que comprovadamente paga por ele.
Caberá ao leiloeiro, querendo, reclamar à exequente eventual remuneração/indenização pelos serviços prestados, pois, como bem ressaltado na decisão agravada, "a culpa pela anulação da penhora deve ser imputada à exeqüente Fazenda Nacional, haja vista que deveria fiscalizar a regularidade daquele ato processual sobre referido bem e, não o fazendo, permitiu que fosse constrito bem de sócio da empresa executada, sem que fosse redirecionada a demanda contra ele ou que ele tivesse manifestado o seu consentimento, como está deveras estampado no acórdão do Tribunal Regional Federal."
Ante o exposto, voto por dar provimento ao agravo de instrumento.
Juíza Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Relatora
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 16/12/2009
AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2008.04.00.011221-4/RS
ORIGEM: RS 9613005307
RELATOR: Juiza Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
PRESIDENTE: ÁLVARO EDUARDO JUNQUEIRA
PROCURADOR: Dr Francisco Luiz Pitta Marinho
AGRAVANTE: OSVALDO JORGE
ADVOGADO: Valerio Pimpao Echeverria
AGRAVADO: VERA REGINA MESSINA DOS SANTOS
ADVOGADO: Manoel da Rosa Freitas Neto e outro
AGRAVADO: UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL)
ADVOGADO: Procuradoria-Regional da Fazenda Nacional
INTERESSADO: TRANSAZUL INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE CEREAIS LTDA/
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 16/12/2009, na seqüência 222, disponibilizada no DE de 09/12/2009, da qual foi intimado(a) UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL), o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 1ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.
RELATOR ACÓRDÃO: Juiza Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
VOTANTE(S): Juiza Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
: Des. Federal ALVARO EDUARDO JUNQUEIRA
: Des. Federal JOEL ILAN PACIORNIK
LEANDRO BRATKOWSKI ALVES
Diretor de Secretaria
D.E. Publicado em 20/01/2010
JURID - Processo civil. Comissão do leiloeiro. [17/02/10] - Jurisprudência
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