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sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

JURID - Responsabilidade civil objetiva. Prisão injustificável. [19/02/10] - Jurisprudência


Responsabilidade civil objetiva. Policiais militares que efetuaram disparos contra motociclistas, causando lesão em um deles. Prisão injustificável.
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Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC.

Apelação Cível nº 2009.007439-4, de Caçador

Relator: Desembargador Newton Trisotto

RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA - POLICIAIS MILITARES QUE EFETUARAM DISPAROS CONTRA MOTOCICLISTAS, CAUSANDO LESÃO EM UM DELES - PRISÃO INJUSTIFICÁVEL - ATO ILÍCITO CARACTERIZADO - DEVER DE O ESTADO DE REPARAR OS DANOS MATERIAIS E MORAIS - SENTENÇA EM REEXAME NECESSÁRIO CONFIRMADA - RECURSO DESPROVIDO

Comprovado que os policiais militares ultrapassaram os limites do "estrito cumprimento do dever legal", que praticaram ato ilícito (CC, art. 188, I), cumpre ao Estado reparar os danos dele resultantes.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 2009.007439-4, da Comarca de Caçador (2ª Vara Cível), em que é apelante o Estado de Santa Catarina e apelados Mateus Lourenço de Almeida e outro:

ACORDAM, em Primeira Câmara de Direito Público, por votação unânime, negar provimento ao recurso e, de ofício, isentar o Estado do pagamento das custas. Custas na forma da lei.

RELATÓRIO

Mateus Lourenço de Almeida e Alfredinho Til ajuizaram "ação de indenização por danos materiais e morais" contra o Estado de Santa Catarina.

Apresentadas a contestação (fls. 33/52) e a réplica (fls. 223/227), inquiridas oito testemunhas (fls. 247/261), ofertados os memoriais (fls. 261/274 e 275/280) e ouvido o representante do Ministério Público (fls. 282/284), a Juíza Viviane Isabel Daniel Speck de Souza prolatou a sentença. Pelas razões adiante reproduzidas, julgou procedente o pedido formulado "para condenar a parte ré ao pagamento de: a) indenização por danos materiais ao requerente Mateus Lourenço de Almeida no valor de R$ 150,00 (cento e cinquenta reais), corrigidos monetariamente a partir da data do efetivo desembolso e acrescidos de juros legais de 12% (doze por cento) ao ano a partir do evento danoso, conforme Súmula 54 do Superior Tribunal de Justiça; b) indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) ao requerente Mateus Lourenço de Almeida, e R$ 7.000,00 (sete mil reais) ao requerente Alfredinho Til, corrigidos monetariamente a partir da publicação da sentença e acrescidos de juros legais de 12% (doze por cento) ao ano a partir do evento danoso, conforme Súmula 54 do Superior Tribunal de Justiça". Também o condenou a pagar as custas judiciais e os honorários advocatícios - "10% (quinze por cento) sobre a condenação, nos termos do art. 20, § 3º, do Código de Processo Civil":

"A ré alega que sua conduta foi pautada nos limites do princípio da legalidade, ou seja, que o procedimento adotado pelos policiais militares foi adequado, tendo em vista que os autores não pararam na barreira policial.

Porém, em sua peça de defesa, apresenta cópia do Inquérito Policial Militar, instaurado em razão do ocorrido, que na f. 149 dos autos esclarece:

'Pelas conclusões das averiguações policiais mandadas proceder por intermédio do Capitão PM Heder Martins, através da Portaria nº 523/PMSC/2005, verifica-se que os fatos apurados constituem indícios de Crime Militar por parte do Cabo PM mat 911467-0 LAURO VIEIRA, bem como verifica-se haver indícios de transgressão disciplinar por parte do indiciado, pelo que resolvo:

1. Sejam os presentes autos encaminhados à auditoria da Justiça Militar de Santa Catarina e cópia desta Solução ao Sr. Coronel PM Corregedor Geral da PMDV e ao CPPIa, na forma da legislação vigente;...'

Verifico que a própria instituição da qual o autor do ilícito faz parte reconheceu que o procedimento adotado foi irregular, tanto que o fato resultou em denúncia na Justiça Militar.

Embora a ação penal militar ainda não tenha sido julgada, é cediço que o reconhecimento de ilícito civil prescinde da existência de ilícito penal.

Assim determina o art. 935 do Código de Processo Civil:

'A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.'

Nesse contexto, forçoso reconhecer a plausibilidade da veracidade das alegações apresentadas pelos autores. E não poderia ser de outra forma.

Os requerentes são abordados pelos policiais sob a suspeita de estarem dando cobertura ao furto de uma caminhoneta. Não bastasse, um dos autores é baleado e demora para receber atendimento médico, permanecendo algemado na maca, enquanto espera por socorro.

Ainda que o autor fosse realmente suspeito de um delito, sabe-se que as técnicas utilizadas pelos policiais militares, por vezes, podem parecer brutas e inadequadas aos olhos da comunidade, mas têm por finalidade garantir a segurança do policial militar e do cidadão. Entretanto, não se pode confundir a aplicação das técnicas de imobilização do agente tido como criminoso, no momento da abordagem policial, quando este resiste a prisão, com lesão física oriunda do excesso de seu manuseio, o que caracteriza ilícito passível de indenização.

Aliás, nem mesmo o fato de os autores não terem parado na barreira policial autoriza o disparo de arma de fogo e a sua prisão, haja vista que tais condutas são inegavelmente desproporcionais ao comportamento dos autores.

Da mesma forma, importante salientar que, em se tratando de motocicleta, ao disparar contra os autores, o policial tinha plena consciência de que havia forte risco de atingir o condutor ou passageiro da moto. Mesmo assim, optou por disparar em direção a eles.

Não se pode entender, portanto, que os policiais atuaram dentro da legalidade pois extrapolaram os limites da ação permitida.

Ocorre, ademais, que no caso vertente a responsabilidade do Estado de Santa Catarina é objetiva, a teor do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, corolário da Teoria do Risco Administrativo, bastando para que se configure a mera relação causal entre o comportamento e o dano, prescindindo-se de qualquer análise acerca da verificação de culpa.

[...]

O poder inerente à Administração Pública caracteriza-se como um poder-dever, delimitado pelos direitos do cidadão, suas prerrogativas individuais e liberdades públicas. Pelas deficiências ou falhas, no exercício desse poder, se causar danos a terceiros, responde o ente estatal.

Importa sublinhar que o alegado dano foi provocado por uma intervenção estatal, por seus agentes policiais militares, no exercício do poder de polícia, não tendo ocorrido qualquer excludente de responsabilidade, na espécie.

Em sendo a pretensão punitiva uma atividade que o Estado exerce monopolisticamente, se seus agentes não se conduzem estritamente dentro dos limites devidos, atraem a responsabilidade civil do ente público.

[...]

A pessoa, mesmo suspeita, permanece com seu direito inalienável à integridade moral, não podendo o agente público comprometê-la.

O procedimento adotado pelos policiais militares, no caso retratado nos autos, não obedeceu aos ditames legais, porque não foi feita qualquer investigação adequada que conduzisse realmente às pessoas dos autores da ação como partícipes do crime de furto ocorrido, ferida, assim, a Constituição Federal, no seu art. 5º, inc. LXI, verbis:

'Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei'.

Não se pode dizer que era caso de flagrante delito, uma vez que o veículo furtado não estava sendo conduzido pelos autores. Tanto isto foi reconhecido que não foi lavrado nenhum termo de flagrante em relação aos autores.

Ademais, conforme infere-se do depoimento da testemunha Elessandro Braescher, prestado no inquérito policial, às fls. 72 dos autos:

'o declarante e seus colegas estavam em deslocamento para aquele município, quando estavam chegando em Calmon avistaram o veículo furtado passar pela viatura do declarante e demais colegas e em seguida também passou uma moto com dois ocupantes atrás.'

Ora, fazendo um exercício de raciocínio lógico, pode-se concluir que se a motocicleta estivesse mesmo dando cobertura à fuga do autor do furto, não viria atrás do veículo furtado, mas sim em frente, para certificar-se de que o caminho da fuga estava livre.

Não se nega a obrigação de o Poder Público e de seus agentes tomarem as medidas necessárias à apuração de delitos e crimes. O que não se admite é a tomada de atitudes extremas, marcadas pela arbitrariedade e pela violência, como se deu na espécie" (fls. 285/301)

Inconformado com o veredicto, o réu interpôs apelação, sustentando, em síntese, que: a) "o pedido de denunciação foi formulado em sede contestatória, momento processual próprio, encontrando-se preenchidos os requisitos do art. 70 e seguintes do CPC. Desta forma não há como ser indeferido o pedido de denunciação por omissão que não pode ser imputada ao Estado, sob pena de restar violado o devido processo legal"; b) "na hipótese dos autos, há de ser ressaltado que, se dano houve, este ocorreu de culpa exclusiva dos apelados. De fato, conforme amplamente demonstrado nos autos, apesar da sinalização dos agentes do Estado determinando que os apelados encostassem o veículo, estes não pararam na Blitz, mas, diferentemente, colocaram-se em fuga, de forma que o tiro desferido na região inferior do corpo de um dos apelados mostra-se legítimo e necessário para a situação. Desnecessário dizer, por óbvio, que, tivessem os apelados atendido à ordem dos policiais militares, encostando o veículo, os fatos teriam se desencadeado de forma diversa"; c) "com o devido respeito à decisão recorrida, não se pode considerar que os infortúnios sofridos pelos apelados sejam aptos a ensejar a reparação por danos morais"; d) "caso superadas as argumentações acima, deve-se ao menos reconhecer a culpa concorrente dos apelados, amenizando-se a responsabilidade do Estado, provendo-se o recurso para, ao menos, minorar-se pela metade o valor da indenização arbitrada. [...] Como visto no tópico 3.1, indubitavelmente, a atitude dos apelados contribuiu de forma decisiva para o acontecimento dos fatos da forma como estes ocorreram, de forma que deve ser o presente recurso provido para reconhecer a culpa recíproca e, como tal, determinar a minoração do valor da indenização pela metade, e o rateio das despesas e custas processuais, arcando cada parte com a verba honorária do respectivo patrono". Arrematou o recurso com requerimentos nos termos que seguem:

"a) o acolhimento do pedido de denunciação à lide do cabo Lauro Viera, com fundamento no que dispõe os arts. 70 e ss., do CPC, a fim de que seja anulada a r. sentença, devolvendo-se os autos à origem para regular processamento.

b) superada a preliminar, seja provido o recurso para que se reconheça a culpa exclusiva das vítimas, julgando-se improcedente o pedido inicial, invertidos os ônus da sucumbência.

c) superado o pedido formulado no item 'b', seja o presente recurso provido para reconhecer a culpa recíproca, determinando-se:

c.1) a minoração do valor da indenização por danos materiais pela metade;

c.2) entendendo-se ocorrido o dano moral para os apelados Mateus e Alfredinho (salientando-se, novamente, que este não foi baleado), que o valor da indenização seja reduzido a patamares muito menores do que o concedido pelo juízo de primeiro grau, determinando-se a minoração do valor pela metade;

c.3) o rateio das despesas e custas processuais, arcando cada parte com a verba honorária do respectivo patrono" (fls. 304/312).

O recurso foi respondido (fls. 315/320).

VOTO

01. Reafirmo:

- "As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa' (CR, art. 37, § 6º). 'Em virtude de direito de regresso existente entre o Estado e o funcionário de seus quadros, é admissível a denunciação da lide, com arrimo no art. 70, III, do CPC, para que o servidor causador do dano integre a relação processual na condição de litisdenunciado' (REsp nº 156.289/SP, Min. Demócrito Reinaldo)" (AI nº 2000.021823-5).

- "Admite-se a exegese ampla ao art. 70, III, do CPC, não cabendo restringir a denunciação da lide apenas à hipótese em que há relação jurídica de garantia' (Min. Costa Leite). Ademais, 'a denunciação da lide favorece a economia processual. É óbvia a vantagem econômica da inclusão de uma segunda demanda no processo pendente, em vez de obrigar a parte a instaurar novo processo. Num processo só realizam-se as tarefas de dois. Alarga-se o seu objeto (objeto do processo, Streitgegenstand) e a sentença que julgar a demanda 'principal' julgará também, simultaneamente, a demanda hipotética do litisdenunciante (CPC, art. 76) [...] Depois, a harmonia de julgados. Preso o litisdenunciante ao teor do que ficar decidido entre denunciante e seu adversário, e ainda condenado a ressarcir aquele pela sucumbência sofrida, tem-se com isso um conjunto coerente de julgamentos. De outro modo, correria a parte o risco de perder a causa e depois, quando fosse em busca do regresso, ser-lhe dito que não se justificava aquela primeira derrota. Perderia dos dois lados do processo' (Cândido Rangel Dinamarco)" (AC nº 2006.012072-6).

"'Os princípios da economia e da celeridade podem justificar a não anulação parcial do processo onde indevidamente não se admitiu a denunciação da lide (CPC, art. 70, III), ressalvado ao denunciante postular seus eventuais interesses na via autônoma' (RSTJ 63/212)" (AC nº 1997.002093-7).

Colaciono ementas de acórdãos do Superior Tribunal de Justiça versando sobre a matéria:

"Indeferida a denunciação da lide, e julgada a causa, com ressalva do direito de regresso contra o autor do ato danoso, não houve prejuízo ao denunciante, que deva ser reparado, não se justificando a anulação do processo" (REsp nº 94.274, Min. Hélio Mosimann).

"A inadmissão da litisdenunciação, além de harmonizar-se com o princípio da celeridade processual, não impede que exerça o denunciante o direito de regresso" (REsp nº 228.964, Min. Eliana Calmon).

"Conquanto possível a denunciação da lide, indeferido ou omitido o pedido, é injustificável a anulação do processo, conflitando-se com o princípio da economia processual. Demais, fica resguardado o direito de regresso em ação autônoma" (REsp nº 128.051, Min. Milton Luiz Pereira).

"I - Admite-se que o Estado promova a denunciação da lide envolvendo agente seu nas ações de responsabilidade civil, no entanto, tal denunciação não é obrigatória, podendo o Estado, em ação própria, exercer o seu direito de regresso em face do agente causador do dano.

II - Assim, entende esta Corte Superior que, em observância aos princípios da economia e da celeridade processuais, o indeferimento da denunciação da lide ao preposto estatal não seria causa de nulidade do processo já iniciado" (AgRgREsp nº 313.886, Min. Francisco Falcão).

No caso em exame, sequer seria necessária essa introdução. Ocorre que o pedido de denunciação da lide foi deduzido na contestação (fls. 34/35) e não mereceu exame. Sem oposição do litisdenunciante, foi designada audiência (fl. 234), inquiridas testemunhas (fls. 246/260) e ofertadas as razões finais (fls. 275/280). Há, portanto, preclusão, o que impede a suscitação da nulidade do processo em sede recursal.

02. As pessoas jurídicas de direito público são civilmente responsáveis "pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros" (CR, art. 37, § 6º). Em relação aos atos comissivos, a responsabilidade é objetiva, circunstância que não desonera o autor do ônus de demonstrar o "nexo causal entre o fato lesivo (comissivo ou omissivo) e o dano, bem como o seu montante. Comprovados esses dois elementos, surge naturalmente a obrigação de indenizar. Para eximir-se dessa obrigação incumbirá à Fazenda Pública comprovar que a vítima concorreu com culpa ou dolo para o evento danoso. Enquanto não evidenciar a culpabilidade da vítima, subsiste a responsabilidade objetiva da Administração. Se total a culpa da vítima, fica excluída a responsabilidade da Fazenda Pública; se parcial, reparte-se o quantum da indenização" (Hely Lopes Meirelles, Direito administrativo brasileiro, Malheiros, 2007, 33ª ed., p. 660; REsp nº 38.666, Min. Garcia Vieira).

Cumpre destacar que "o fato de ser o Estado sujeito à teoria da responsabilidade objetiva não vai ao extremo de lhe ser atribuído o dever de reparação de prejuízos em razão de tudo que acontece no meio social" (José dos Santos Carvalho Filho, Manual de direito administrativo, Ed. Lumen Juris, 2007, 19ª ed., p. 504).

Nessa esteira, na ementa do acórdão relativo ao Recurso Extraordinário nº 109.615-2, inscreveu o Ministro Celso de Mello:

"Os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o eventus damni e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva, imputável a agente do Poder Público, que tenha, nessa condição funcional, incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional (RTJ 140/636) e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal (RTJ 55/503 - RTJ 71/99 - RTJ 91/377 - RTJ 99/1155 - RTJ 131/417).

O princípio da responsabilidade objetiva não se reveste de caráter absoluto, eis que admite o abrandamento e, até mesmo, a exclusão da própria responsabilidade civil do Estado, nas hipóteses excepcionais configuradoras de situações liberatórias - como o caso fortuito e a força maior - ou evidenciadoras de ocorrência de culpa atribuível à própria vítima (RDA 137/233 - RTJ 55/50)".

03. O formalismo processual tem se constituído em sério entrave à celeridade da prestação jurisdicional. Sucedem-se as instâncias recursais e, não raro, os fundamentos da primeira decisão são repetidos, com outras palavras, nos acórdãos. Visando contribuir para a superação dos obstáculos à efetividade do processo, os tribunais têm decidido que: a) "'Não é nula a decisão sucintamente fundamentada, desde que contenha o essencial' (REsp nº 7.870, Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira). A concisão é necessária ante o expressivo movimento forense e o justo anseio da sociedade por uma célere prestação jurisdicional" (AC nº 2001.004845-0, Des. Newton Trisotto); b) "Acórdão que adota, como razão de decidir, o parecer, que transcreve, do Ministério Público, funcionando como 'custos legis', não fere os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório" (HC nºs 69.002 e 77.583, Min. Sepúlveda Pertence; HC nº 84.438, Min. Carlos Velloso).

Com essa perspectiva, extraordinária inovação no sistema processual adveio com a Lei nº 9.099, de 1995, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Conforme o § 5º do art. 82, "se a sentença for confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão". Lamentavelmente, não constitui regra a ser aplicada a todos os processos ou, ao menos, àqueles de pouca expressão econômica e complexidade jurídica.

Evitando tautologia, adoto os fundamentos da sentença, reproduzidos no relatório, aos quais acrescento que, conforme registros do SAJ - Sistema de Automação do Judiciário - pelo Promotor Sidney Eloy Dalabrida, da Justiça Militar, foi proposta a "transação penal", que foi aceita pelo causador do dano (fls. 160/161).

04. Para o apelante, "não se pode considerar que os infortúnios sofridos pelos apelados sejam aptos a ensejar a reparação por danos morais". Disse que: a) "ainda que se considere que o apelado Mateus necessitou ser hospitalizado, deve-se ter em mente que não houve sequelas irreversíveis nem dano estético, inexistindo nos autos qualquer prova de que tenha ocorrido alguma debilidade para o membro inferior atingido. Embora tenha o apelado Mateus passado por um susto, que, saliente-se, foi por ele provocado, em momento algum correu risco de morte a justificar o pleito indenizatório no valor do concedido"; b) "o apelado Alfredinho não foi baleado, tendo apenas sido conduzido à delegacia para averiguação de praxe, haja vista não terem os apelados parado na blitz mas, sim, colocando-se em fuga, conduta que torna legítima e adequada a atuação estatal, sendo desprovido de apoio fático e jurídico garantir-lhe o direito de indenização por danos morais" (fl. 310). Para a hipótese de ser mantida a condenação, pede que seja reduzido o quantum.

Não lhe assiste razão.

Há situações em que o autor não necessita demonstrar os elementos identificadores do dano moral - que consiste "na dor, na angústia, no sofrimento, na tristeza pela ausência de um ente querido falecido; no desprestígio, na desconsideração social, no descrédito à reputação, na humilhação pública, no devassamento da privacidade; no desequilíbrio da normalidade psíquica, nos traumatismos emocionais, na depressão ou no desgaste psicológico" (Yussef Said Cahali, Dano moral, Revista dos Tribunais, 2ª ed., p. 20/21); basta que prove o fato e a sua ilicitude. Todavia, quando do fato não for ele presumível, cumpre ao ofendido não só comprovar o fato mas também os elementos caracterizantes do dano moral e os que concorrem para determinação do valor da indenização.

Tenho que as circunstâncias em que ocorreram os fatos e o ocorrido posteriormente à prisão dos autores autorizam presumir que sofreram eles dano moral.

A lei não fixa critérios objetivos para a quantificação do dano moral.

De acordo com Carlos Alberto Bittar, "diante da esquematização atual da teoria em debate, são conferidos amplos poderes ao juiz para a definição da forma e da extensão da reparação cabível, em consonância, aliás, com a própria natureza das funções que exerce no processo civil (CPC, arts. 125 e 126). Com efeito, como julgador e dirigente do processo, pode o magistrado ter conhecimento direto das partes, dos fatos e das respectivas circunstâncias, habilitando-se, assim, à luz do direito aplicável, a definir de modo mais adequado, a reparação devida no caso concreto" (Reparação civil por danos morais, Revista dos Tribunais, 1999, 3ª ed., p. 218). Sustenta ele, ainda, que "a indenização por danos morais deve traduzir-se em montante que represente advertência ao lesante e à sociedade de que não se aceita o comportamento assumido, ou o evento lesivo advindo. Consubstancia-se, portanto, em importância compatível com o vulto dos interesses em conflito, refletindo-se, de modo expressivo, no patrimônio do lesante, a fim de que sinta, efetivamente, a resposta da ordem jurídica aos efeitos do resultado lesivo produzido. Deve, pois, ser quantia economicamente significativa, em razão das potencialidades do patrimônio do lesante" (p. 233).

Humberto Theodoro Júnior, depois de assinalar que ao magistrado resta "a penosa tarefa de dosar a indenização, porquanto haverá de ser feita em dinheiro, para compensar uma lesão que, por sua própria natureza, não se mede pelos padrões monetários", acrescenta que "o problema haverá de ser solucionado dentro do princípio do prudente arbítrio do julgador, sem parâmetros apriorísticos e à luz das peculiaridades de cada caso, principalmente em função do nível sócio-econômico dos litigantes e da menor ou maior gravidade da lesão" (Alguns aspectos da nova ordem constitucional sobre o direito civil, RT 662/7-17).

No expressivo dizer do eminente Desembargador Amaral e Silva, "a reparação do dano moral para a vítima não passa de compensação, satisfação simbólica; para o ofensor uma pena para que sinta o mal praticado" (AC nº 35.339).

Nessa linha, na ementa do acórdão da Apelação Cível nº 1999.010959-3, consignei:

"A indenização por dano moral tem dupla natureza: reparação da dor causada ao ofendido e punição ao ofensor, para que não torne a reincidir no ilícito. Porém, 'deve sofrer os temperos da lei e da vida. Sua incidência há que se dar numa faixa dita tolerável. Se o dano causado, injustamente a outrem, integra uma faixa da ruptura das relações sadias, a reparação do mesmo não pode servir de motivo para se gerar mais uma espécie de desagregação social' (Des. Décio Erpen)".

O réu foi condenado a pagar indenização no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais) para Mateus Lourenço de Almeida e de R$ 7.000,00 (sete mil reais) para Alfredinho Til. Penso que os parâmetros recomendados pela doutrina e pela jurisprudência foram observados.

05. Nos termos do art. 35, h, da Lei Complementar nº 156, de 1997 (Regimento de Custas e Emolumentos do Estado de Santa Catarina), com a redação do art. 9º da Lei Complementar nº 161, de 1997, é isento de custas e emolumentos "o processo em geral, no qual tenha sido vencida a fazenda do Estado e dos municípios, direta ou por administração autárquica, quanto a ato praticado por servidor remunerado pelos cofres públicos".

06. À vista do exposto, nego provimento ao recurso e, de ofício, isento o Estado do pagamento das custas judiciais.

DECISÃO

Nos termos do voto do relator, negaram provimento ao recurso e, de ofício isentaram o Estado do pagamento das custas judiciais.

Participaram do julgamento, realizado no dia 22 de setembro de 2009, os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Vanderlei Romer e Sérgio Roberto Baasch Luz.

Florianópolis, 14 de dezembro de 2009

Newton Trisotto
Presidente e Relator

Publicado em 09/02/10




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