Habeas corpus. Tentativa de furto (CP, art. 155, caput c/c art. 14, II). Progressão de regime.
Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC.
Habeas Corpus n. 2009.072610-1, de São José
Relatora: Desa. Salete Silva Sommariva
HABEAS CORPUS - TENTATIVA DE FURTO (CP, ART. 155, CAPUT C/C ART. 14, II) - PROGRESSÃO DE REGIME - MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DA EXECUÇÃO - ADMISSÃO DO WRIT QUANDO CONSTATADA A MANIFESTA ILEGALIDADE NO PROCEDIMENTO EXECUCIONAL - AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS HÁBEIS AO EXAME DO PLEITO - NÃO CONHECIMENTO.
I - Em hipóteses cuja discussão cinge-se à matéria atinente à execução criminal, eventuais insurgências devem ser manejadas por intermédio do recurso de agravo, conforme dispõe o art. 197 da Lei de Execuções Penais. Contudo, nas situações em que o habeas corpus é impetrado como sucedâneo do agravo, a impropriedade deve ser atenuada em decorrência da possível configuração da coação ilegal. Na presente conjuntura, o exame da privação de liberdade sobreleva-se à formalidade estabelecida no ordenamento jurídico e, desde que, de plano, seja constatada a ilegalidade no procedimento execucional, de modo a se reputar necessário analisarem os fundamentos do pleito.
II - Em se tratando o habeas corpus, exige-se que o apontado ato coator venha consubstanciado em prova pré-constituída, já que sabidamente restrita a análise instrutória inerente ao remédio heroico, de modo a incumbir ao impetrante a juntada à inicial dos documentos hábeis a demonstrar o alegado contrangimento ilegal, bem como aqueles aptos a fundamentar o pleito de concessão da ordem.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus n. 2009.072610-1, da comarca de São José (2ª Vara Criminal), em que é impetrante Marcelo Madeira Cunha, e paciente Evandro Machado da Costa:
ACORDAM, em Segunda Câmara Criminal, por votação unânime, não conhecer do habeas corpus.
RELATÓRIO
Trata-se de habeas corpus impetrado por Marcelo Madeira Cunha, advogado, em benefício de Evandro Machado da Costa, figurando como autoridade coatora o MM. juiz de direito da 2ª Vara Criminal da comarca de São José (SC).
Alega o impetrante que o paciente encontra-se segregado em decorrência de prisão em flagrante na data de 11-3-2009, pela suposta prática de crime de furto, na sua modalidade tentada (CP, art. 155, caput c/c art. 14, II), tendo sido formalmente denunciado por tanto, bem como recebida a peça acusatória (autos n. 064.09.004658-0).
Sustenta a existência de constrangimento ilegal sobre o paciente, uma vez que já fora proferida sentença no referido feito em que condenou-o ao cumprimento da pena corporal de 1 (um) ano de reclusão, em regime inicialmente fechado, e, considerando-se que se encontra preso cautelarmente por mais de 8 (oito) meses, entende que já seria beneficiário da progressão de regime.
Por entender presente o fumus boni juris e o periculum in mora, postula a concessão liminar da ordem, colacionando os documentos por meio dos quais pretende corroborar suas assertivas (fls. 05/18).
Em decisão monocrática de fls. 20/24, indeferiu-se a liminar pleiteada em razão da ausência de documentos essenciais ao respectivo exame.
Após prestadas as informações da autoridade apontada como coatora (fls. 27/28), a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Dr. Robison Westphal (fls. 31/32), manifestou-se pelo não conhecimento da presente ordem.
VOTO
Trata-se de habeas corpus impetrado por Marcelo Madeira Cunha, advogado, em benefício de Evandro Machado da Costa, figurando como autoridade coatora o MM. juiz de direito da 2ª Vara Criminal da comarca de São José (SC).
A impetração cinge-se ao fato de o paciente se encontrar preso preventivamente por mais de 8 (oito) meses, ao passo que a sentença condenatória prolatada nos autos n. 064.09.004658-0 fixou a reprimenda em 1 (um) ano de reclusão, em regime inicialmente fechado, de modo a se vislumbrar que, a esta altura, o paciente já poderia estar cumprindo pena em regime semiaberto.
De início, vale ressaltar que, em hipóteses cuja discussão cinge-se à matéria atinente à execução criminal, como é o caso em apreço, qualquer irresignação deve ser manejada por intermédio do recurso de agravo, conforme dispõe o art. 197 da Lei de Execuções Penais.
Contudo, a jurisprudência pátria já admite a impetração deste remédio constitucional quando se verificar que a decisão proferida no processo de execução penal violar o direito de liberdade do condenado.
Nesse sentido, colhe-se do Superior Tribunal de Justiça:
PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. PROGRESSÃO DE REGIME. WRIT NÃO CONHECIDO NA CORTE DE ORIGEM. ART. 197 DA LEP. POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE HABEAS CORPUS.
I - Não havendo manifestação do e. Tribunal a quo a respeito do pedido de progressão de regime, é vedado a esta Corte examinar tal alegação, sob pena de indevida supressão de instância. (Precedentes).
II - Esta Corte tem se posicionado no sentido de que, não obstante a previsão de recurso específico para o caso em tela, qual seja, o agravo em execução (art. 197 da Lei de Execuções Penais), é admissível a utilização do mandamus na espécie, dada a possibilidade de lesão ao direito de locomoção do paciente. (Precedentes). (HC n. 74.024, rel. Min. Felix Fischer, j. em 21-6-2007). (grifou-se).
E também:
A existência de recurso específico para impugnar as decisões proferidas pelo juízo da execução não obsta, consoante firme jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, a utilização de habeas corpus, dada a possibilidade de lesão ao direito de locomoção do paciente. (HC n. 17797, rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. em 18-9-2001).
De fato, nas situações em que o habeas corpus é impetrado como sucedâneo do agravo, a impropriedade deve ser atenuada em decorrência da possível existência de constrangimento ao direito de liberdade.
Na presente conjuntura, o exame da privação de liberdade sobreleva-se à formalidade estabelecida no ordenamento jurídico e, desde que, de plano, seja constatada a ilegalidade no procedimento execucional, de modo a se reputar necessário analisar os fundamentos do pleito liberatório.
Ocorre que, no caso em apreço, os documentos anexos não são suficientes a demonstrar, de forma inconteste, o alegado constrangimento, porquanto nem sequer o pedido de progressão de regime fora acostado ao caderno processual, bem como existem outras peculiaridades que merecem consideração.
Com efeito, anexados à impetração, encontram-se somente a sentença condenatória, o recurso de apelação contra ela interposto e o espelho de movimentação da referida apelação criminal, autuada sob o número 2009.050441-9, distribuída a esta relatora e ainda pendente de julgamento.
Nesta alheta, compulsando-se os supracitados autos, verifica-se que, realmente, o paciente fora preso em flagrante da maneira como narrado na inicial do writ, ou seja, por supostamente haver perpetrado uma tentativa de furto.
Por outro lado, vislumbra-se também que, ao chegar na delegacia, foi certificado que havia um mandado de prisão expedido contra o paciente, contando como motivo fuga da Penitenciária de Florianópolis em 1-9-2006 (fl. 10).
Ademais, às fls. 12/14 dos autos n. 064.09.004658-0 (atualmente Ap. Crim. n. 2009.050441-9), atesta-se que o paciente possui outras sentenças condenatórias, essas já transitadas em julgado, que, somadas, atingem 33 (trinta) e 3 (três) anos e 7 (sete) meses de reclusão.
Dessa forma, percebe-se que o caso não se trata somente da progressão de regime em benefício de um paciente segregado cautelarmente há oito meses em decorrência de uma pena de um ano.
O cometimento do novo crime, que ainda pende de julgamento nesta corte de justiça, poderia ensejar diversos outros procedimentos, tal qual um incidente de regressão de regime por cometimento de falta grave, ou, ainda, o incidente de unificação das penas após o trânsito em julgado.
Ressalte-se, outrossim, que a análise da referida benesse não poderia ser feita diretamente por este órgão colegiado, como postulado pelo impetrante, sob pena de supressão de instância.
A propósito:
HABEAS CORPUS - CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DE CRIME HEDIONDO - PRETENSÃO DE PROGRESSÃO DE REGIME - MATÉRIA AINDA NÃO ANALISADA PELO JUÍZO DA EXECUÇÃO - INVIABILIDADE DE ANÁLISE, SOB PENA DE SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA - NÃO CONHECIMENTO. (Habeas corpus n. 2006.040441-9, da Capital, rel. Des. Souza Varella).
De mais a mais, sem comprovação dos motivos que realmente ensejam a manutenção do paciente em regime fechado e, principalmente, em não se obtendo documento algum que ateste a vida carcerária do paciente, a fim de que se conheça exatamente a situação que é posta, impossível a análise do pedido, a ponto de ensejar o não conhecimento do writ.
Nesse sentido, extrai-se do Superior Tribunal de Justiça:
Não há como examinar, na hipótese, a legalidade ou não da decisão judicial que indeferiu o pedido de liberdade provisória formulado pelo Paciente, pois não foi juntado aos autos o seu inteiro teor. A insuficiência da instrução implica na impossibilidade de se conhecer os exatos termos da fundamentação judicial, obstando a exata compreensão da controvérsia nos termos em que foi aduzida. (RHC n. 20.850, rel. Mina. Laurita Vaz, j. em 18-10-2007).
No mesmo diapasão, já decidiu a corte catarinense:
Sujeitando-se o habeas corpus a procedimento especial, que não contempla produção de provas, incumbe ao impetrante instruir o pedido com os documentos necessários ao respectivo exame, sob pena de inviabilizá-lo, máxime se detiver capacidade postulatória. (HC n. 2007.023761-5, de Joinville, rel. Des. Sérgio Paladino, j. em 26-6-2007).
Isso posto, não se conhece do habeas corpus.
DECISÃO
Nos termos do voto da relatora, decide a Câmara, à unanimidade, não conhecer do habeas corpus.
Participaram do julgamento, em 12 de janeiro de 2010, os Exmos. Srs. Desembargadores Sérgio Paladino (Presidente) e Tulio Pinheiro.
Florianópolis, 20 de janeiro de 2009.
Salete Silva Sommariva
Relatora
Publicado em 17/02/10
JURID - Habeas corpus. Tentativa de furto. Progressão de regime. [23/02/10] - Jurisprudência
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