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sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

JURID - Indenização por danos morais reduzidos. Exercício de guerra. [26/02/10] - Jurisprudência


Responsabilidade civil. Indenização por danos morais reduzidos. Exercício de guerra. Abuso de autoridade.

Tribunal Regional Federal - TRF2ªR.

APELAÇÃO CÍVEL - 451593

Processo: 2005.51.01.015835-9 UF: RJ

Órgão Julgador: SEXTA TURMA ESPECIALIZADA

Data Decisão: 11/01/2010 Documento: TRF-200225412

Fonte DJU - Data::29/01/2010 - Página::84

RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL GUILHERME COUTO DE CASTRO

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

APELADO: ALEX FERREIRA DE SOUZA

ADVOGADO: OTAVIO FERREIRA E OUTROS

ORIGEM: SÉTIMA VARA FEDERAL DO RIO DE JANEIRO (200551010158359)

EMENTA

RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS REDUZIDOS. EXERCÍCIO DE GUERRA. ABUSO DE AUTORIDADE.

1) O autor busca reparação pelas humilhações pelas quais passou, em 2005, durante treinamento no exército. O magistrado não pode se imiscuir na questão de como o treinamento militar deve ser realizado, e nem valorá-lo de acordo com critérios próprios de outras atividades. É manifestamente impertinente, portanto, pedir reparação à conta de suposto mau tratamento verbal, com ofensas morais, quando a hipótese era de submissão a treinamento de guerra.

2) Ainda que se possa achar exagerado, não cabe avaliar com critérios de quem não é especialista a ordem de "enfiar a cara na lama" e tentar fazer borbulhas. O magistrado apenas deve avaliar a legalidade, e o caso dos autos era de treinamento de guerra, e, sem qualquer sentido de ofender, não se tratava de curso de etiqueta. Formam-se soldados, isto é, guerreiros por definição.

3) Entretanto, está correta a sentença quando considerou abusiva a conduta de atirar no impetrante com bala de festim, à queima roupa, aparentemente para puni-lo por não acompanhar os exercícios a contento. Aqui, já não se tratava de exercício, e os próprios agentes da União o confessam.

4) Remessa necessária (conhecida de ofício) e apelo da União Federal parcialmente providos para reduzir o valor do dano moral para R$15.000,00 (quinze mil reais).

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a 6ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, na forma do voto do Relator, dar parcial provimento à remessa necessária (conhecida de ofício) e ao apelo da União Federal.

Rio de Janeiro, 11 de janeiro de 2010.

GUILHERME COUTO DE CASTRO
Desembargador Federal - Relator

RELATÓRIO

Trata-se de remessa necessária (conhecida de ofício) e apelação interposta pela União Federal postulando a reforma de sentença que julgou procedente em parte o pedido, e condenou-a a pagar danos morais no valor equivalente a R$30.000,00 (trinta mil reais) corrigido a partir da data da sentença e com juros de mora de 6% ao ano, contados da citação (fls. 133/138).

O autor afirma ter sofrido constrangimentos em decorrência de abuso de poder em acampamento militar (Forte Imbuí - Niterói/RJ). Narra que em 25/06/2005 foi submetido, com mais trinta soldados, a exercícios de treinamento de guerra e após o término da instrução seu superior hierárquico e supervisor daquele treinamento - Sargento Jefferson Luiz Granadero de Lima - deu, somente para o autor, a ordem para que deitasse o rosto virado para uma poça de lama e nela fizesse bolhas de ar. O autor cumpriu tal ordem e enquanto se encontrava de rosto virado para a poça de lama, foi surpreendido com uma forte dor na nádega direita, causada por um tiro de festim de um fuzil mosquetão calibre 762, dado à queima roupa pelo Sargento e, mesmo ferido, o autor foi submetido a 10 minutos de exercícios, não sendo consentido que procurasse socorro médico. Alega ainda que após sair do local de instrução foi autorizado por outro Sargento a procurar o posto médico e ficou 7 dias sem poder prestar serviços no quartel (fls. 128).

Em suas razões a União Federal alega que "(...) não há como reconhecer (...) a responsabilidade civil da União pelo evento danoso, uma vez que, conforme demonstrado na instrução probatória, foi dado ao autor pronto atendimento médico quando do sinistro, não se verificando portanto qualquer falha do serviço. (...) a quantia indenizatória fixada é excessiva, revelando assim chancela judicial de pretensão de enriquecimento às custas dos Cofres Públicos, transformando o dano em fonte de lucro. (...) não é razoável conceder-se indenização de R$30.000,00 em decorrência de disparo de tiro de FESTIM, especialmente porque (...) não consta que a parte autora tenha sofrido sequela duradoura nem redução de capacidade laboral. (...)."(fls. 149/152).

As contra-razões do autor assinalam estar a sentença correta (fls. 154/163). O Ministério Público apenas anexou peça de poucas linhas, pela manutenção da sentença (fls. 168). É o relatório.

GUILHERME COUTO DE CASTRO
Desembargador Federal - Relator

VOTO

A sentença merece parcial reforma.

O autor busca reparação pelas humilhações pelas quais passou, em 2005, durante treinamento no exército. A sentença reconheceu a ocorrência de dano moral.

Há que se considerar, inicialmente, que o magistrado não pode se imiscuir na questão de como o treinamento militar deve ser realizado, e nem valorá-lo de acordo com critérios próprios de outras atividades. É manifestamente impertinente, portanto, pedir reparação à conta de suposto mau tratamento verbal, com ofensas morais, quando a hipótese era de submissão a treinamento militar.

Também, ainda que se possa achar exagerado, não cabe avaliar com critérios de quem não é especialista a ordem de "enfiar a cara na lama" e tentar fazer borbulhas. O magistrado apenas deve avaliar a legalidade, e não se imiscuir no modo de treinamento militar.

Afinal, o treinamento é de guerra, e, sem qualquer sentido de ofender, não se trata de curso de etiqueta. Formam-se soldados, isto é, guerreiros, por definição.

O subscritor está entre os muitos que esperam um mundo sem guerreiros, sem guerra e sem necessidade de guerra. Mas nada autoriza quebrar a lógica do art. 2º da Lei Maior e afirmar a ilegalidade, até os pontos listados, do treino militar.

No entanto, nada justifica o tiro dado à queima roupa nas nádegas do autor. Aí, não se trata de treinamento ou algo parecido, tanto que o próprio sargento, autor do disparo, disse que ele ocorreu por erro, e foi acidental (fls. 98/99). A versão dos dois soldados ouvidos é a de que ele foi proposital. Seja como for, ainda que se admita a tese do sargento, trata-se de conduta culposa e ilegal do sargento.

Em suma, por essa conta o pedido prospera, e a sentença deve ser mantida, mas reduzida a condenação arbitrada.

Veja-se, a propósito, o posicionamento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, in verbis (grifos meus):

ADMINISTRATIVO. CORTE NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. PROVA DO DANO MORAL. SUFICIÊNCIA DA DEMONSTRAÇÃO DO ATO ILÍCITO. REMESSA DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE ORIGEM.

1. Interposto o recurso pela alínea "c" e admitido, cumpre ao Tribunal eleger a tese prevalente e, incontinenti, rejulgar a causa.

2. É cediço na Corte que "como se trata de algo imaterial ou ideal, a prova do dano moral não pode ser feita através dos mesmos meios utilizados para a comprovação do dano material. Por outras palavras, o dano moral está ínsito na ilicitude do ato praticado, decorre da gravidade do ilícito em si, sendo desnecessária sua efetiva demonstração, ou seja, como já sublinhado: o dano moral existe in re ipsa. Afirma Ruggiero: "Para o dano ser indenizável, 'basta a perturbação feita pelo ato ilícito nas relações psíquicas, na tranqüilidade, nos sentimentos, nos afetos de uma pessoa, para produzir uma diminuição no gozo do respectivo direito." (RESP 608918/RS, Relator Ministro José Delgado, Primeira Turma, DJ de 21.06.2004).

3. Precedentes desta Corte: RESP 575469/RJ, Relator Ministro Jorge Scartezzini, Quarta Turma, DJ de 06.12.2004; RESP 204825/RR, Relatora Ministra Laurita Vaz, Segunda Turma, DJ de 15.12.2003; AgRg nos EDcl no AG 495358/RJ, Relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Terceira Turma, DJ de 28.10.2003; RESP 496528/SP, Relator Ministro Sálvio DE Figueiredo Teixeira, Quarta Turma, DJ de 23.06.2003; RESP 439956/TO, Relator Ministro Barros Monteiro, Quarta Turma, DJ de 24.02.2003.

4. Recurso especial provido.

Além do mais, ao contrário do que alega a União Federal, não foi dado ao autor pronto atendimento médico por ocasião do acidente, tendo permanecido no exercício e se juntado aos outros, impossibilitado o atendimento devido. O evento se deu em 25/06/2005 e em 05/07/2005 foi recomendada a dispensa de "esforço físico e serviço por 7 dias" (fls. 125/128).

Quanto ao valor da condenação, como já se disse, merece reforma a sentença. Por certo, o valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) é excessivo, pois arbitrado a partir de julgamentos de valor sobre treinamento que é para a guerra. Apenas em relação ao ato ilegal, alheio ao treinamento, e reconhecido pelo agente, é que se arbitra valor a título de reparação moral.

Por isso, considerando as próprias justificativas da sentença, razoável reduzir o valor da condenação para R$ 15.000,00 (quinze mil reais), a ser corrigido a partir de hoje (súmula nº 362 do STJ) e com juros na forma da sentença. É mantida a verba honorária em 10%, já que a redução da condenação já a adequou a contento.

Voto, pois, dando parcial provimento à remessa necessária (conhecida de ofício) e ao apelo da União Federal para reduzir o valor arbitrado, nos termos do parágrafo anterior.

É o voto.

GUILHERME COUTO DE CASTRO
Desembargador Federal - Relator




JURID - Indenização por danos morais reduzidos. Exercício de guerra. [26/02/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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