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segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

JURID - Abertura do comércio nos feriados. [22/02/10] - Jurisprudência


Abertura do comércio nos feriados. Leis nº 10.101/00 e 11.603/07.


Tribunal Regional do Trabalho - TRT 3ª Região.

Processo: 00596-2009-104-03-00-1 RO

Data de Publicação: 07/12/2009

Órgão Julgador: Quinta Turma

Juiz Relator: Des. Lucilde D'Ajuda Lyra de Almeida

Juiz Revisor: Juiz Convocado Rogerio Valle Ferreira

RECORRENTE: LOJAS AMERICANAS S.A.

RECORRIDOS: SECUA - SINDICATO DOS EMPREGADOS NO COMÉRCIO DE UBERLÂNDIA E ARAGUARI

EMENTA: ABERTURA DO COMÉRCIO NOS FERIADOS. LEIS Nº 10.101/00 E 11.603/07. AUSÊNCIA DE REVOGAÇÃO DA LEI Nº 605/49 E DO DECRETO 27.048/49. DESNECESSIDADE DE AUTORIZAÇÃO EM NORMA COLETIVA NO QUE TANGE AS ATIVIDADES ELENCADAS NA RELAÇÃO ANEXA AO DECRETO MENCIONADO. A Lei nº 605/49 e o seu Regulamento (Decreto nº 27.048/49) disciplinam o repouso semanal remunerado (art. 67 da CLT) e permitem o trabalho aos domingos e feriados, considerando-se as peculiaridades das atividades da empresa e o interesse público. Assim, as Leis 10.101/00 e 11.603/07 são normas gerais, que não cuidaram, de forma específica, do labor em feriados em atividades especiais, como o comércio varejista de gêneros alimentícios de primeira necessidade. Desta forma, não podem revogar a Lei nº 605/49 e seu decreto regulamentador, prevalecendo a possibilidade de existir o labor em dias de feriado, sem a necessidade de prévia autorização em convenção coletiva, nas atividades discriminadas nesta legislação. Todavia, no caso em apreço, embora a ré se insira no ramo de comercialização de gêneros alimentícios e afins, não se pode dizer que os produtos por ela oferecidos ao mercado consumidor sejam de primeira necessidade, nem suas atividades se aproximam daquelas atividades relacionadas no item II, do Decreto n. 27.048/49. É fato público e notório que a ré, Lojas Americanas, empresa cuja atuação é amplamente conhecida, além de vender bens variados (utilidades domésticas, produtos de higiene pessoal etc), também atua no ramo de comércio de gênero alimentícios - fato este incontroverso entre os litigantes - mas não comercializa os produtos ou realiza as atividades excecpionados pelo decreto regulamentador da Lei 605/49, já que não vende peixes, carnes, aves, ovos, nem tampouco hortaliças, frutas, os chamados "hortifrutigranjeiros", o que rechaça, inclusive, a sua tese de que estaria equiparada a "Feiras Livres e mercados" (item, II, 15, do Decreto n.º 27.048/49). Isto posto, conclui-se que para os empregados da ré não está autorizado a priori, nos temos do Decreto n. 27.048/49, o trabalho em feriados.

Vistos os autos, relatado e discutido o presente Recurso Ordinário, DECIDE-SE:

RELATÓRIO

O MM. Juiz da 4ª Vara do Trabalho de Uberlândia, pela sentença de fls. 135/143, complementada às fls. 148/149 e 155, cujo relatório adoto e a este incorporo, julgou procedentes em parte os pedidos iniciais formulados pelo Sindicato dos Empregados no Comércio de Uberlândia e Araguari para condenar a Lojas Americanas a pagar multa em favor de cada um de seus empregados, lotados no estabelecimento situado na cidade de Uberlândia, à época dos feriados de 25/12/2008, 01/01/2009 e 10/04/2009, arbitrada no valor equivalente a 03 dias de salário do trabalhador pelo labor em cada um desses feriados e honorários advocatícios assistenciais. No julgamento dos embargos de declaração aviados pela reclamada, (fls. 148/149), reconhecendo que a ré trouxe aos autos os registros de ponto dos empregados lotados no estabelecimento de Uberlândia (fl.114), em cumprimento à determinação de fl. 64, o MM. Juiz de origem esclareceu que na apuração da multa arbitrada na r. sentença, observar-se-á o trabalho dos empregados da requerida nos feriados ali mencionados de acordo com os referidos cartões de ponto. Ressaltou (fl.155), ainda, que "houve trabalho por alguns empregados da requerida no dia 10/04/2009 (Athos Fernandes Corrêa, Aline Santos Gomes, Elizangela Vieira da Silva, Emelim Carolina Barbosa, por exemplo), conforme cartões de ponto envelopados e guardados na Secretaria da Vara, como certificado à fl. 114".

A ré recorre às fls. 156/177, argui as preliminares de carência de ação e nulidade por negativa de prestação jurisdicional. Pretendendo, ainda, a reforma da sentença para absolvê-la de toda a condenação. Sucessivamente, postula que as penas impostas sejam transformadas em advertência para eventual situação futura, reduzidas ou sejam excluídas as multas atinentes aos feriados de 25/12/2008 e 01/01/2009, nos quais alega não ter havido prestação de serviço por seus empregados.

Custa e depósito recursais comprovados (fls. 157/158 e 180/184).

Contrarazões pelo autor às fls. 183/206.

Não se vislumbra, no presente feito, interesse público a proteger.

É o relatório.

VOTO

ADMISSIBILIDADE

Satisfeitos os pressupostos legais de admissibilidade, conheço do recurso ordinário e das contrarrazões, tempestivamente apresentadas.

FUNDAMENTOS

PRELIMINARES

CARÊNCIA DE AÇÃO POR FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL - PERDA DO OBJETO DO PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DA LIDE

Alega a recorrente que a liminar requerida pelo autor e concedida pelo MM. Juiz de origem, inclusive com a fixação de multa por descumprimento (fl. 37/39), para fins de evitar a exigência de trabalho no feriado de 01/05/2009 perdeu objeto, pois a intimação só foi expedida em 06/05/2009 e, também, porque a CCT (fls. 27/35) não estipula penalidade ou multa em caso de eventual infração da cláusula objeto do pedido inicial. Argumenta que não é viável a fixação de tutela antecipada em relação aos feriados (25/12/2008, 01/01/2009 e 10/04/2009). Aduz, ainda, que o Decreto n.º 27.048/49 permite o labor em feriados de forma permanente, não tendo a CCT o condão de alterar o disposto neste diploma legal, em face do princípio da hierarquia das normas. Requer, pois, a extinção do feito sem resolução do mérito.

Ao exame.

Por meio da decisão de fls. 37/39, proferida em 29/04/2009, o MM. Juiz a quo, com amparo nos artigos 273, I, §6º, artigo 461, §§4º e 6º, 461-A e 798 do CPC e artigo 652, d, da CLT, concedeu, liminarmente, a antecipação de tutela pretendida pelo autor para determinar à requerida que se abstivesse de exigir o trabalho de seus empregados no feriado de 01/05/2009, conforme previsão da cláusula décima da CCT 2008/2009 e fixou multa, sanção pecuniária processual, astreinte, para o caso de descumprimento da obrigação de fazer.

A recorrente tomou ciência de tal decisão em 29/04/209, conforme se infere do mandado de fl. 41, devidamente assinado por sua gerente comercial. Portanto, apesar de a intimação postal de fl. 42 ter sido expedida apenas em 06/05/2009, não há dúvida de que a ré foi comunicada acerca do conteúdo da liminar em tempo hábil, tanto que é incontroverso nos autos que não houve exigência de trabalho pela ré em 01/05/2009 no estabelecimento de Uberlândia (fl. 138, parágrafos quarto e quinto).

Como se vê, não houve fixação de multa ou sanção pecuniária processual para evitar o labor nos feriados de 25/12/2008, 01/01/2009 e 10/04/2009, justamente porque tais datas já estavam ultrapassadas.

Todavia, tal pedido não esgota a pretensão inicial, vez que além da abstenção do trabalho pelos empregados da ré em Uberlândia (item a, fl. 08), o sindicato autor, ainda, postulou a condenação dela ao pagamento de multas pela exigência de labor por seus empregados em outros feriados, quais sejam 25/12/2008, 01/01/2009 e 10/04/2009.

Com efeito, não há falar em falta de interesse de agir ou em perda do objeto do pedido de antecipação de tutela ou da ação.

No mais, a legalidade ou não da exigência de trabalho em feriados, bem o campo de aplicação do Decreto n.º 27.048/49, tratam-se de matéria de mérito e como tais serão apreciadas, não autorizando a extinção prematura do processo.

Rejeito.

NULIDADE DA DECISÃO DE ORIGEM - NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL

Argui a recorrente a preliminar de negativa de prestação jurisdicional, buscando a declaração de nulidade da sentença de origem, ao argumento de que não houve apreciação e pronunciamento sobre os documentos necessários à elucidação dos fatos em discussão. Assevera que, atendeu a determinação de fl. 64, apresentando os registros de ponto dos meses de dezembro de 2008, janeiro de 2009, abril e maio de 2009, no prazo fixado, tal como certificado à fl. 14. Alega que o sindicato autor efetuou a carga dos autos e dos cinco cadernos apartados contendo os referidos documentos, mas sobre eles não se manifestou ou apontou qualquer irregularidade. Insiste que, mesmo após a interposição de embargos de declaração, o MM. Juiz a quo manteve a sentença sem apreciação da prova documental e das circunstâncias supra mencionadas, se limitando a verificar apenas o trabalho no feriado de 10/04/2009. Destaca que os controles de jornadas trazidos comprovam ausência de labor em 25/12/2008 e 01/01/2009.

Ao exame.

De fato, na sentença (fl. 138139), o MM. Juiz de origem foi induzido a erro, ao considerar que a ré descumpriu determinação de juntada dos registros de ponto dos empregados lotados no estabelecimento de Uberlândia relativos aos meses de dezembro de 2008, janeiro, abril e maio de 2009, isto porque os referidos documentos não constavam dos autos, mas estavam sob a guarda da secretaria da Vara, conforme certificado à fl. 114.

Por tal razão, com fulcro no artigo 359 do CPC e na Súmula 338, I, do TST, prevaleceu a presunção de que todos os empregados da requerida, no estabelecimento de Uberlândia trabalharam nos dias 25/012/2008, 01/01/2009 e 10/04/2009, em descumprimento à Cláusula 10º da CCT 2008/2009 (fl. 30).

Alertado, em embargos de declaração aviados pela ré, o magistrado reconheceu a omissão apontada e julgou parcialmente procedente o apelo, esclarecendo "na apuração da multa arbitrada na r. sentença proferida, observar-se-á o trabalho dos empregados da requerida nos feriados ali mencionados de acordo com os cartões de ponto (fl148/149). Ressaltou (fl.155), ainda, que "houve trabalho por alguns empregados da requerida no dia 10/04/2009 (Athos Fernandes Corrêa, Aline Santos Gomes, Elizangela Vieira da Silva, Emelim Carolina Barbosa, por exemplo), conforme cartões de ponto envelopados e guardados na Secretaria da Vara, como certificado à fl. 114".

Portanto, ao revés do que considera a recorrente, não vislumbro negativa de prestação jurisdicional.

A sentença de primeira instância, complementada pelas decisões proferidas no julgamento dos embargos de declaração, conferiu exame adequado à lide e se não mencionou expressamente determinada alegação da parte, não significa que esta não tenha sido levada em consideração. O princípio da informalidade do processo trabalhista autoriza que o julgador sintetize as razões da sentença, sem que isto configure nulidade.

De mais a mais, na fase recursal as partes têm oportunidade de submeter a reexame toda a matéria, jurídica e fática, como faz agora a recorrente (artigo 515 do CPC).

Assim, preenchidos todos os requisitos dos artigos 832 da CLT e 458 do CPC, não há nulidade a ser declarada, sob alegação de insuficiência de prestação jurisdicional.

Por fim, necessário frisar que a análise acerca da força obrigacional e da interpretação da Cláusula 10ª, da CCT 2008/2009 e da prova do labor em feriados diz respeito ao mérito da lide e serão apreciados em momento oportuno.

Rejeito.

MÉRITO

TRABALHO EM FERIADOS -LEI Nº 605/49 E DECRETO 27.048/49. LEIS 10.101/2000 E 11.603/2007 - DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER ESTIPULADA EM INSTRUMENTO COLETIVO

A recorrente pugna pela reforma da sentença de origem, ao argumento de que a CCT em que se fundou o pedido inicial não prevê aplicação de multa ou penalidade em caso de eventual infração. Alega, ainda, que não pode prosperar a "astreinte" fixada, por se tratarem de feriados anteriores à fixação judicial da pena. Insiste que a cominação de "astreinte" visa compelir a parte a cumprir determinada obrigação fixada judicialmente ou extrajudicialmente, mas não serve para penalizar infrações previamente cometidas.

Aduz que a Cláusula 10ª e as repercussões da CCT 2008/2009 (fls.27/36) são manifestamente inconstitucionais, pois atentam contra o estado democrático de direito, a livre iniciativa e de concorrência, a liberdade, os princípios da legalidade, da reserva legal e do livre mercado, engessam as atividades econômicas, sociais, familiares e de interesse geral da sociedade.

Com fulcro no princípio da especialidade, pugna pela aplicação do Decreto n.º 27.048/49, em detrimento da Lei 10.101/00. Defende sua condição de supermercado, sendo, pois, aplicável em seu favor as regras contidas no artigo 7º do Decreto n.º 27.048/49, que permite o labor em feriados civis e religiosos de forma permanente para as empresas que exercem as atividades elencadas em seu Anexo, dentre as quais destaca o disposto no item II, n.º 15, referente a "Feiras-livres e mercados, inclusive os transportes inerentes aos mesmos".

Insiste que não houve labor nos dias 25/12/2008 e 01/01/2009.

Sucessivamente, se não forem afastadas por completo as multas impostas, pretende a fixação de pena apenas para efeito de advertência, com amparo no artigo 75 da CLT, ou mesmo a redução do valor arbitrado, considerando-se que houve labor apenas no feriado de 10/04/2009.

Por fim, alerta que a citada cláusula coletiva não estipula abstenção completa de trabalho, pois ressalva a possibilidade do labor em atividades essenciais da empresa, o que deve se observado em caso manutenção da multas. Insiste que não existiu prévia fixação de multa para eventual infração da norma convencional.

Ao exame.

De início, cumpre ressalvar que as partes concordam que o objeto social da ré se insere predominante no comércio varejista de mercadorias em geral, com predominância de produtos alimentícios.

Infere-se do instrumento normativo colacionado aos autos - CCT de 2008/2009, invocado com fundamento das pretensões deduzidas pelo sindicato autor - fl. 30, estipulação no seguinte sentido:

"CLÁUSULA DÉCIMA - COMÉRCIO DE GÊNEROS ALIMENTÍCIOS E AFINS: - Faculta-se às empresas do comercio varejista de gêneros alimentícios e afins - Supermercados, Mercearias, Sacolões e Similares - o trabalho em dias de feriados, exceto nos dias 25 (vinte e cinco) de Dezembro/2008 (Natal), 1º (primeiro) de Janeiro/2009 (C. Universal), 10 (dez) de abril de 2009 (Sexta-feira da Paixão) e 1º (primeiro) de Maio/2009 (Trabalho).

PARÁGRAFO PRIMEIRO: Para os feriados citados como exceção no "caput", é facultado o trabalho apenas nas atividades essenciais da empresa, que requeiram a utilização de mão-de-obra contínua, nas funções ligadas aos setores de segurança, manutenção preventiva, corretiva e de sistemas de CPD e telefonia, operadores de câmaras frigoríficas e atividades afins, que não possam ser interrompidas por 24 (vinte e quatro) horas consecutivas, sendo vedado, para todos os efeitos, o trabalho na atividade fim das empresas, salvo modificações na legislação vigente que devem ser observadas pelas partes."

Transcrito o conteúdo da norma coletiva em discussão, ressalto meu entendimento de que Leis nº 10.101/00 e 11.603/07, esta que inclui na primeira os artigos 6º-A e 6º-B, não revogou a Lei nº 605/49 e seu decreto regulamentador.

Vejamos a evolução normativa acerca do tema.

O descanso semanal aos domingos foi instituído no Brasil pelo Decreto nº 21.186/32, cujo art. 3º previa:

"O descanso semanal terá duração de 24 horas consecutivas e ser-lhe-á destinado o domingo, salvo Convenção em contrário entre empregadores e empregados ou motivos, quer de interesse público, quer de natureza de ocupação".

As Constituições de 1934 e 1937 deram ao repouso semanal preferentemente aos domingos o status de direito fundamental do trabalhador.

Sobreveio a CLT e o seu art. 67 basicamente repetiu o Decreto nº 21.186/32, ou seja, manteve o repouso semanal aos domingos, "salvo motivo de conveniência pública ou necessidade imperiosa do serviço".

Além do repouso aos domingos, a CLT, no art. 70, proibiu o trabalho nos feriados sem estabelecer exceções. Enquanto a vedação de trabalho aos domingos foi relativizada pelo interesse público ou necessidade imperiosa do serviço, a proibição quanto aos feriados era absoluta no âmbito da CLT.

Conclui-se que, desde a década de 40, havia a preocupação com o interesse público, maior que o interesse particular dos trabalhadores, vindo a ser editada, em 1949, a Lei nº 605, que passou a regular tanto o repouso semanal remunerado quanto o repouso nos feriados civis e religiosos.

O art. 8º da referida lei dispõe que: "excetuados os casos em que a execução do serviço for imposta pelas exigências técnicas das empresas, é vedado o trabalho nos dias feriados civis e religiosos...", cabendo ao art. 10 da mesma lei remeter ao Poder Executivo a definição das atividades em relação às quais não se proíbe o trabalho em domingos e feriados.

Assim, sobreveio o Decreto nº 27.048/49 para regulamentar a Lei nº 605/49, inclusive no tocante às atividades em relação as quais o interesse público do trabalho em domingos e feriados prevalece sobre o interesse particular dos trabalhadores:

"Art. 8º. É concedida em caráter permanente e de acordo com o disposto no §1º do art. 6º, permissão para o trabalho nos dias de repouso a que se refere o art. 1º, nas atividades constantes da relação anexa ao presente regulamento".

A tabela anexa ao Decreto n. 27.048, que autoriza o trabalho em domingos e feriados em várias atividades comerciais, foi atualizada pelo Decreto nº 94.591/87, dentre as quais se inserem as seguintes atividades:

1)Varejistas de peixes;

2)Varejistas de carnes frescas e caça;

3)Venda de pão e biscoitos;

4)Varejistas de frutas e verduras;

5)Varejistas de aves e ovos;

(...)

15) Feiras Livres e mercados, inclusive os transportes inerentes aos mesmos."

Estas atividades são exercidas, via de regra, pelos supermercados e são absolutamente necessárias à população, cujos interesses a Lei nº 605 e os decretos nº 27.048/49 e 94.591/87 visam resguardar.

Tem-se que o interesse particular dos trabalhadores e dos respectivos sindicatos não pode se sobrepor à necessidade que a população tem de adquirir produtos alimentícios. É por tal razão que as normas específicas autorizam o trabalho em feriados nestas atividades citadas, abrangendo supermercados, padarias, restaurantes e outros.

É nesse contexto que deve ser interpretada a Lei nº 10.101/2000, eis que o texto da Medida Provisória n. 1539-35, art. 6º, estabelecia o seguinte: "Fica autorizado o trabalho aos domingos no comércio varejista em geral, respeitadas as normas de proteção ao trabalho e observado o art. 30, inciso I da Constituição".

O dispositivo da Medida Provisória, que se converteu em lei (Lei nº 10.101/00) destinava-se claramente ao "comércio varejista em geral" e não àquelas atividades em que já era autorizado o trabalho aos domingos, desde 1949.

A Lei nº 11.603/07 inseriu novos dispositivos na Lei nº 10.101/00, no sentido de permitir o trabalho em feriados nas atividades do "comércio em geral", desde que autorizado em Convenção Coletiva, verbis:

"Art. 6º-A. É permitido o trabalho em feriados nas atividades do comércio em geral, desde que autorizado em convenção coletiva de trabalho e observada a legislação municipal, nos termos do art. 30, inciso I, da Constituição".

Art.6º-B. As infrações ao disposto nos arts. 6º e 6º-A desta Lei serão punidas com multa prevista no artigo 75 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei n. 5.452, de 1º de maio de 1943.

Parágrafo único. O processo de fiscalização, de autuação e de imposição de multas reger-se-á pelo disposto no Título VII da Consolidação das Leis do Trabalho."

Como se vê, trata-se de norma geral, que sequer tangencia as normas autorizadoras do trabalho em feriados em atividades especiais, como o comércio varejista de gêneros alimentícios de primeira necessidade, regulados por norma especial, contida na Lei 605/1949 e seu decreto. Desta forma o artigo 8º da Lei 605/49 autoriza o trabalho nos dias de feriados civis e religiosos, nos casos em que a execução do serviço for imposta pelas exigências técnicas das empresas, ao passo que o artigo 10 da mesma norma atribui ao Poder Executivo a competência para definir em quais atividades não está proibido o trabalho aos domingos e feriados. O Decreto 27.048/49 regulamentou a Lei 605/1949, discriminando as atividades que seriam permitidas nos dias de repouso, para atendimento do interesse público, as quais foram citadas anteriormente.

Ressalte-se, finalmente, que a matéria não se sujeita às normas municipais, que são insuscetíveis de regular os direitos do trabalhador, matéria de competência privativa da União (artigo 22, I, da CF/88). É verdade que o município pode legislar sobre o horário de funcionamento dos estabelecimentos comerciais, mas o que se decide nestes autos pertence à seara do direito do trabalho.

Contudo, o caso em apreço apresenta peculiaridades.

Não obstante a ré se insira no ramo de comercialização de gêneros alimentícios e afins, não se pode dizer que os produtos por ela oferecidos ao mercado consumidor sejam de primeira necessidade, nem suas atividades se aproximam daquelas atividades relacionadas no item II, atividades constantes do Decreto n. 27.048/49, supra mencionas. É fato público e notório que a ré, Lojas Americanas, empresa cuja atuação é amplamente conhecida, atua no ramo de comércio de gênero alimentícios, fato este incontroverso entre os litigantes, mas não comercializa os produtos ou realiza as atividades excecpionados pelo decreto regulamentador da Lei 605/49, já que não vende peixes, carnes, aves, ovos, nem tampouco produtos tais como hortaliças, frutas, os chamados "hortifrutigranjeiros", o que rechaça, inclusive, a sua tese de que estaria equiparada a "Feiras Livres e mercados" (item, II, 15, do Decreto n.º 27.048/49).

Isto posto, conclui-se que para os empregados da ré não está autorizado, nos temos do Decreto n. 27.048/49, que permite em hipóteses específicas, nas quais, repito, não se enquadram a recorrente, o trabalho em feriados.

Aplica-se ao caso em apreço, portanto, a regra estipulada no artigo 6º-A, da Lei 10.101/2000 e a Cláusula 10ª da CCT 2008/2009, alusiva às empresas do comércio varejista de gêneros alimentícios e afins, que veda o labor nos feriados de 25/12/2008 (Natal), 1º/01/2009 (Confraternização Universal), 10/04/2009 (Sexta-Feira da Paixão) e 01/05/2009 (Dia do Trabalho).

Encontrando óbice na lei, por conseguinte, o trabalho em determinados feriados, que não foram autorizados pela norma coletiva, mormente na presente hipótese que o labor em alguns feriados foi expressamente proibido por norma coletiva, válida e eficaz (fl.30, Cláusula 10ª).

Não se pode negar que o artigo 7º, XXVI, da Constituição da República conferiu plena eficácia aos instrumentos coletivos de trabalho legitimamente firmados pelas correspondentes representações sindicais, incentivando a negociação coletiva entre empregadores, empregados e suas respectivas entidades sindicais, como, de resto, sempre se pautou o próprio Direito do Trabalho, que prestigia a autocomposição das partes na solução dos litígios.

Torna-se desnecessária, repito, a discussão acerca da observância da legislação municipal, que legisla sobre o horário de funcionamento do comércio em geral e sobre os feriados municipais, não tendo o poder de disciplinar matéria de Direito do Trabalho, conforme interpretação sistemática dos artigos 22, I e 30, I, da CF/88.

Estando a Lei 11.603/07, que acrescentou os artigos 6º-A e 6º-B à Lei 10.101/2000, em acordo com o disposto nos incisos XIII, XV e XXVI do artigo 7º, da CR/88 deve ser respeitada e prestigiada pelo Poder Judiciário. Não há falar em afronta aos princípios constitucionais invocados pela recorrente eis que a estipulação de normas coletivas também é manifestação do princípio da liberdade de iniciativa e é inegavelmente incentivada pela Constituição Federal, que em seu artigo 170 propugna por uma ordem econômica fundada na valorização do trabalho humano e na função social da propriedade.

Fixadas tais premissas, cumpre lembrar que, no julgamento dos embargos de declaração aviados pela reclamada (fl. 148/149), o MM. Juiz de origem reconheceu que a ré trouxe aos autos os registros de ponto dos empregados lotados no estabelecimento de Uberlândia (fl.114), em cumprimento à determinação de fl. 64, e esclareceu que na apuração das multas arbitradas na r. sentença proferida, observar-se-á o trabalho dos empregados da requerida nos feriados ali mencionados de acordo com os cartões de ponto. Ressaltou (fl.155), ainda, que "houve trabalho por alguns empregados da requerida no dia 10/04/2009 (Athos Fernandes Corrêa, Aline Santos Gomes, Elizangela Vieira da Silva, Emelim Carolina Barbosa, por exemplo), conforme cartões de ponto envelopados e guardados na Secretaria da Vara, como certificado à fl. 114".

A análise de tais registros de jornada, que foram remetidos à instância recursal a requerimento desta Relatora, não evidencia, entretanto, o labor dos empregados da reclamada nos feriados de 25/12/2009 e 01/01/09, fato alardeado pela reclamada em sua defesa (fl.71) e não impugnado pelo sindicato autor, que tampouco questionou o valor probatório dos documentos apresentados e aos quais teve acesso (fls. 115/133). O que se confirma dos citados cartões de ponto é, tão somente, que inúmeros empregados laboram no feriado de 10/04/2009, tal como constatado na decisão a qua.

Doutro tanto, registre-se, por oportuno, que o art. 6º-A, da Lei 10.101/2000 não proíbe em termos absolutos a abertura do comércio em feriados, determinando apenas que, para efeito de funcionamento regular, deverá existir autorização da norma coletiva ou Lei Municipal.

Todavia, se houver funcionamento do comércio nos feriados de forma irregular, ou seja, quando proibido por norma coletiva, situação que se vislumbra no caso em apreço, as infrações serão punidas na forma do preconizado no art. 6º-B e respectivo parágrafo, da mencionada Lei 10.101/2000, que prevê o seguinte: "As infrações ao disposto nos arts. 6º e 6º-A desta Lei serão punidas com a multa prevista no art. 75 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943."

Logo, inexistindo previsão na CCT (fls.27/36) firmada entres os sindicatos representantes das categorias profissional e econômica de penalidade por descumprimento das obrigações de não fazer previstas no instrumento coletivo, não cabe à Justiça do Trabalho impor à reclamada multa pecuniária em face da constatação da ocorrência de trabalho em feriado excepcionado pela norma negocial, porquanto o dispositivo legal apenas estipula a aplicação da penalidade administrativa prevista no art. 75, da CLT, cujo processo de fiscalização, autuação e imposição de multas reger-se-á pelo disposto no Título VII, da CLT, consoante o que dispõe o parágrafo único do art. 6º.-B, da Lei 11.603/07.

Data venia, o artigo 652, caput e alínea d, da CLT segundo o qual "Compete às Varas do Trabalho" "impor multas e demais penalidades relativas aos atos de sua competência" não ampara a pretensão do sindicato autor. Isto porque tal dispositivo diz respeito a atos relacionados ao poder de direção do processo conferido ao magistrado, remete, portanto, a penalidades por litigância de má-fé, atuação temerária das partes ou de seus procuradores, ausência injustificada de testemunha, dentre outras de mesma natureza, mas não permite ao julgador substituir a vontade dos entes coletivos que, em negociação livremente entabulada, deixaram de estipular pena pecuniária para o descumprimento de obrigação de não fazer prevista na convenção coletiva de trabalho. Tampouco poderia o Poder Judiciário invadir o âmbito de atribuições dos órgãos responsáveis pela fiscalização, atuação e imposição de multas administrativas (artigo 2º, da CF/88), cuja atuação se encontra regulamentada no Título VII, da CLT, a que se refere expressamente o artigo 6º-B, da Lei 10.101/2000.

Portanto, em consonância com os dispositivos legais atinente à matéria em apreço e com a CCT (fls. 27/36) invocada na inicial e que embasa o pedido, não há como prevalecer a condenação da reclamada ao pagamento de multa em favor de cada um dos seus empregados, lotados no estabelecimento de Uberlândia, arbitrada em 03 dias de salário do trabalhador que indevidamente laborou no feriado de 10/04/2009 e, muito menos no que tange aos feriados de 25/12/2008, 01/01/2009, já que não comprovado o trabalho em tais datas.

Pelos fundamentos supra, dou provimento ao recurso, para absolver a reclamada das condenações a ela imposta.

CONCLUSÃO

Conheço do recurso ordinário da reclamada, rejeito as preliminares de carência da ação e nulidade por negativa de prestação jurisdicional e, no mérito, dou provimento ao apelo para absolvê-la das condenações impostas pela sentença de origem.

Invertidos os ônus da sucumbência, as custas processuais, no importe de R$620,00, calculadas sobre o valor dado à causa na inicial (R$31.000,00), deverão ser pagas pelo Sindicato-autor (artigo 789, II, da CLT), devendo a Secretaria da Vara oficiar à Receita Federal para devolver à recorrente o valor por ela recolhido.

FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, por sua Quinta Turma, à unanimidade, conheceu do recurso ordinário da reclamada; sem divergência, rejeitou as preliminares de carência da ação e nulidade por negativa de prestação jurisdicional e, no mérito, deu provimento ao apelo para absolvê-la das condenações impostas pela sentença de origem; invertidos os ônus da sucumbência, as custas processuais, no importe de R$620,00, calculadas sobre o valor dado à causa na inicial (R$31.000,00), deverão ser pagas pelo Sindicato-autor (artigo 789, II, da CLT), devendo a Secretaria da Vara oficiar à Receita Federal para devolver à recorrente o valor por ela recolhido.

Belo Horizonte, 24 de novembro de 2009.

LUCILDE D'AJUDA LYRA DE ALMEIDA
Desembargadora Relatora




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