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quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

JURID - Ação Civil Pública. Venda fracionada de medicamentos. [17/02/10] - Jurisprudência


Ação Civil Pública. Venda fracionada de medicamentos. Pretensão de suspender os efeitos da decisão.


Tribunal de Justiça do Mato Grosso - TJMT.

QUARTA CÂMARA CÍVEL

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 105701/2009 - CLASSE CNJ - 202 - COMARCA DE SORRISO

AGRAVANTE: DROGARIA FLORISO LTDA

AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO

Número do Protocolo: 105701/2009

Data de Julgamento: 19-01-2010

EMENTA

AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - VENDA FRACIONADA DE MEDICAMENTOS - PRETENSÃO DE SUSPENDER OS EFEITOS DA DECISÃO - AUSÊNCIA DOS REQUISITOS ESSENCIAIS AO DEFERIMENTO DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - APLICABILIDADE DO RDC 80/2006 DA ANVISA E ART. 39, INCISO I, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - DECISÃO MANTIDA - RECURSO IMPROVIDO.

Para a concessão da tutela antecipada, impende seja demonstrada prova inequívoca a consubstanciar o pedido formulado pela parte, além da possibilidade da ocorrência de dano irreparável ou de difícil reparação.

Não demonstrados tais requisitos, o indeferimento da tutela antecipatória é medida que se impõe.

R E L A T Ó R I O

EXMO. SR. DES. MÁRCIO VIDAL

Egrégia Câmara:

Trata-se de Recurso de Agravo de Instrumento, interposto pela Drogaria Floriso Ltda., contra a decisão proferida pelo Juízo da 6ª Vara Cível da Comarca de Sorriso que, nos autos da Ação Civil Pública n. 375/2009, determinou que a Requerida adote, no prazo de três meses, a sistemática de fracionamento de medicamentos, a fim de proporcionar aos consumidores da cidade de Sorriso/MT a venda fracionada de medicamentos, nos termos do Decreto n. 5.775/06, da Resolução da Diretoria Colegiada da ANVISA - RDC n. 80/2006 - e demais legislações pertinentes ao caso, sob pena de multa diária no valor de R$500,00 (quinhentos reais), sem prejuízo de outras sanções previstas na legislação em vigor.

Relata a Agravante que a concessão da liminar, obrigando-a a fazer o fracionamento de medicamentos, no prazo estipulado de 90 dias, é uma obrigação impossível de ser cumprida, dada a falta de estrutura física, de recursos financeiros e de medicamento no mercado para ser vendido de forma fracionada.

Aduz que não fora juntada na Ação Civil nenhuma prova de que algum consumidor do município tenha sido prejudicado por ação ou omissão da Agravante; nenhuma receita de medicamento fracionado, que a Recorrente tenha se negado a aviar e, também, nenhuma prova concreta de que o referido produto exista e que esteja à disposição da farmácia ou drogaria para ser fracionado. Além disso, alega que não fora lançado nenhum dispositivo legal que obrigue a farmácia ou drogaria a implantar o serviço de fracionamento em seu estabelecimento.

Verbera que a manutenção da decisão recorrida poderá acarretar prejuízo irreparável à Agravante, pois o início do fracionamento não depende somente dela, mas de fatores alheios a sua vontade.

Com essas razões, pugna pelo provimento do agravo.

O efeito suspensivo pretendido foi indeferido, consoante se verifica da decisão às fls. 176 e 177-TJ.

O Juízo da causa prestou informações às fls. 252 e 253-TJ.

A parte agravada apresentou contraminuta às fls. 258 a 302-TJ, pugnando pelo improvimento do agravo.

A Procuradoria-Geral de Justiça, às fls. 338 a 344-TJ, opinou pelo desprovimento do recurso.

É a síntese.

P A R E C E R (ORAL)

O SR. DR. ASTÚRIO FERREIRA DA SILVA FILHO.

Ratifico o parecer escrito.

V O T O

EXMO. SR. DES. MÁRCIO VIDAL (RELATOR)

Egrégia Câmara:

O presente recurso visa à reforma da decisão proferida pelo Juízo da 6ª Vara Cível da Comarca de Sorriso que, nos autos da Ação Civil Pública, deferiu o requerimento do Ministério Público Estadual, para determinar que a Requerida - Drogaria Floriso Ltda. -, adote, no prazo de três meses, a sistemática de fracionamento de medicamento com vistas a proporcionar a todos os consumidores a venda fracionada de remédio, nos moldes preconizados na Resolução da Diretoria Colegiada - RDC n. 80, de 11 de maio de 2006 -, da ANVISA, sob pena de multa diária fixada em R$500,00 (quinhentos reais), sem prejuízo da imposição de outras sanções cabíveis.

À guisa de introdução, permitam-me tecer algumas considerações acerca da matéria de fundo discutida.

Em 10 de maio de 2006, foi editado o Decreto Federal n. 5.775, que disciplinou a nova sistemática sobre o comércio de drogas e medicamentos, além de autorizar a venda fracionada em farmácias e drogarias. De acordo com essa redação, é facultado às farmácias e drogarias aderir ao novo sistema de fracionamento, diante da regulamentação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA (Resolução da Diretoria Colegiada - RDC n. 80, de 11 de maio de 2006).

Não obstante o advento do Decreto n. 5.775/2006, não se visualiza, prima facie, a obrigatoriedade da norma, razão pela qual a medida não tem sido adotada por inúmeros estabelecimentos, incluindo a Agravante. Este fato levou o Ministério Público Estadual a propor a presente Ação Civil Pública, objetivando a imposição da adoção da nova sistemática de comercialização.

Como se sabe, a venda fracionada de medicamentos é bandeira do Governo Federal para baixar os custos da saúde. A autorização para venda de medicamentos, passíveis de fracionamento, já foi regulamentada, mas não tem gerado efeitos práticos, dado o desinteresse da indústria farmacêutica, preocupada com os riscos envolvidos nesse tipo de comercialização no Brasil e por sua reduzida eficiência econômica.

Nota-se que, no Brasil, luta-se contra o grave problema da automedicação irresponsável, pois os medicamentos que não demandam retenção de receita são comprados livremente, sem observância da prescrição médica pelos farmacêuticos e, portanto, sem acompanhamento médico ou fiscalização de nenhuma espécie.

Certo é que a venda fracionada de medicamentos, além de reduzir os gastos, evitaria o desperdício e a automedicação, incentivada pelas "sobras" que permanecem em poder do consumidor.

Como efeito, não resta sombra de dúvidas de que o sistema da venda fracionada de medicamentos é benéfico para o consumidor e para a própria saúde pública.

Portanto, a presente Ação Civil Pública visa garantir, ao consumidor de medicamentos do Município de Sorriso, a possibilidade de adquirir um insumo essencial ao restabelecimento da saúde e a uma vida digna.

Ao analisar o pedido de antecipação de tutela, o Juiz da causa deferiu o pedido.

Contra essa decisão se insurge a Agravante, pugnando pela atribuição do efeito suspensivo ao presente recurso, a fim de sobrestar os efeitos da decisão recorrida.

É cediço que o art. 273 do Código de Processo Civil permite ao juiz antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança das alegações e haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.

Desta forma, vê-se que a antecipação da tutela só pode ser concedida, mediante o concurso concomitante dos dois requisitos arrolados no citado artigo.

Tal instituto processual foi esculpido para dar maior efetividade ao processo e evitar a prolação de sentenças inócuas.

Prova inequívoca, ensejadora da verossimilhança da alegação, segundo a lição de Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, deve ser assim conceituada:

"A denominada 'prova inequívoca' capaz de convencer o juiz da 'verossimilhança da alegação' somente pode ser entendida como a 'prova suficiente' para o surgimento do verossímil, entendido como o não suficiente para a declaração de existência ou da inexistência do direito." (In: Manual do Processo de Conhecimento, 4ª ed., São Paulo, RT, 2005, p. 209)

O fundado receio de dano irreparável, ou de difícil reparação, previsto no artigo 273, do CPC, é aquele capaz de comprometer a efetividade do direito defendido pela parte requerente.

Corroborando o entendimento, trago à baila o seguinte julgado:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO - ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - EXCOMBATENTE - PENSÃO ESPECIAL - 1. Para que seja deferida a antecipação de tutela é indispensável a existência de prova inequívoca e convencimento, por parte do juiz, da verossimilhança da alegação, somado a isto que haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação ou fique caracterizado o abuso de direito de defesa, o que não ocorre no presente caso. 2. Recurso improviso." (TRF 4ª R. - AI n. 2006.04.00.002801-2 - 4ª T. - Relª Juíza Fed. Loraci Flores de Lima - DJU de 31-5-06 - p. 770)

Na espécie presente, o que se tem é a pretensão de suspender os efeitos da decisão que determinou à Agravante que adote, no prazo de três meses, a sistemática de venda fracionada de medicamentos nos termos da Resolução da Diretoria Colegiada da ANVISA - RDC n. 80/2006 -, sob pena de multa diária no valor de quinhentos reais, sem prejuízo da imposição de outras sanções legais cabíveis.

Nessa perspectiva, cabe ao juiz analisar o direito aduzido pelo requerente e, diante de seu cotejo com a indispensável prova inequívoca das alegações e o fundado receio de dano, formar, ou não, um juízo positivo sobre a concessão da tutela antecipatória, como se tivesse que, naquele momento processual, em face tão somente dos elementos de convicção postos à sua apreciação, proferir sentença de mérito.

Além dos requisitos enfocados, não se pode olvidar ainda a possibilidade da reversibilidade do provimento jurisdicional antecipado, de modo que a medida concedida não tenha o caráter definitivo, podendo, a qualquer tempo, ser revogada, restabelecendo-se, o quanto possível, o status quo anterior.

No caso em comento, o Agravado demonstrou a presença dos requisitos necessários à concessão da tutela antecipada, qual seja a prova inequívoca que convença da verossimilhança das alegações, porque ficou demonstrada a abusividade da conduta da Agravante, ao infringir o art. 39, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor, que veda expressamente ao fornecedor a vinculação, sem justa causa, do fornecimento de produtos a limites quantitativos, bem como a sua recusa em adotar o sistema de fracionamento de medicamentos, previsto no Decreto Federal n. 5.775/2006.

Não bastasse isso, denota-se que o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação também ficou evidente nos autos, visto que se relaciona, diretamente, com a situação socioeconômica, a saúde e a vida dos cidadãos do Município de Sorriso, que atualmente estão privados de exercer o direito de adquirir medicamentos fracionados, submetendo-se indignamente às aquisições desnecessárias, e que lhes tira a possibilidade ao restabelecimento da saúde com menores custos, em prejuízo de sua qualidade de vida.

Ante todo o exposto, nego provimento ao recurso de Agravo.

É como voto.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do DES. JOSÉ SILVÉRIO GOMES, por meio da Câmara Julgadora, composta pelo DES. MÁRCIO VIDAL (Relator), DES. JOSÉ SILVÉRIO GOMES (1º Vogal) e DES. GUIOMAR TEODORO BORGES (2º Vogal convocado), proferiu a seguinte decisão: RECURSO IMPROVIDO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. DECISÃO UNÂNIME.

Cuiabá, 19 de janeiro de 2010.

DESEMBARGADOR JOSÉ SILVÉRIO GOMES - PRESIDENTE DA QUARTA CÂMARA CÍVEL

DESEMBARGADOR MÁRCIO VIDAL - RELATOR

PROCURADOR DE JUSTIÇA

Publicado em 26/01/10




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