Mandado de segurança. Crime ambiental. Trancamento de ação penal.
Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG.
Número do processo: 1.0000.09.500521-1/000(1)
Númeração Única: 5005211-80.2009.8.13.0000
Relator: ANTÔNIO CARLOS CRUVINEL
Relator do Acórdão: ANTÔNIO CARLOS CRUVINEL
Data do Julgamento: 29/09/2009
Data da Publicação: 15/01/2010
EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA - CRIME AMBIENTAL - TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL - EXISTÊNCIA DE TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA FIRMADO COM AUTARQUIA - CUMPRIMENTO DAS CONDIÇÕES AVENÇADAS - RECEBIMENTO DA DENÚNCIA E CONSEQUENTE INSTAURAÇÃO DE AÇÃO PENAL - ÓBICE - MATÉRIA PENAL DEFINITIVAMENTE DESCONSTITUÍDA - EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELO CUMPRIMENTO DAS CONDIÇÕES AVENÇADAS - CONSTRANGIMENTO ILEGAL - TRANCAMENTO QUE SE IMPÕE - ORDEM CONCEDIDA.
MANDADO DE SEGURANÇA CRIMINAL N° 1.0000.09.500521-1/000 - COMARCA DE SETE LAGOAS - IMPETRANTE(S): AVG SIDERURGIA LTDA - AUTORID COATORA: TURMA RECURSAL JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL COMARCA SETE LAGOAS - RELATOR: EXMO. SR. DES. ANTÔNIO CARLOS CRUVINEL
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 3ª CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM CONCEDER A SEGURANÇA E DETERMINAR O TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL.
Belo Horizonte, 29 de setembro de 2009.
DES. ANTÔNIO CARLOS CRUVINEL - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
Proferiu sustentação oral, pela Impetrante, AVG Siderurgia Ltda, o Dr. Marcelo Silveira Ferreira de Melo.
O SR. DES. ANTÔNIO CARLOS CRUVINEL:
Sr. Presidente.
Ouvi, atentamente, a sustentação oral proferida pelo ilustre causídico, tenho voto escrito e passo à sua leitura.
O SR. DES. ANTÔNIO CARLOS CRUVINEL:
VOTO
Trata a espécie de Mandado de Segurança (fls. 02/279), impetrado pelos Advogados: Dr. Gabriel Silveira Ferreira de Melo, OAB/MG 100.300; Dr. Ricardo Silveira Ferreira de Melo, OAB/MG 64.638; Dr. Marcelo Ferreira Silveira de Melo,
OAB/MG 52.579; e Dr. José Guimarães Ferreira de Melo, OAB/MG 5.359, em favor de AVG SIDERÚRGICA LTDA.
Os Impetrantes assentam constrangimento ilegal no ato da 2.ª TURMA RECURSAL CRIMINAL - GRUPO JURISDICIONAL DA COMARCA DE SETE LAGOAS/MG, que recebeu a denúncia oferecida pelo Parquet, pela suposta prática de crime ambiental; e posteriormente denegou a segurança em mandamus impetrado contra o mencionado ato.
Argumentam que, com a resposta à acusação, a Paciente invocara o advento de Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta - TAC, celebrado com o Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais - IEF/MG, a acarretar ausência de justa causa para a ação penal, suplicando pela rejeição da denúncia.
Aduzem que referido TAC, além de outras autuações, comporta aquela alusiva à conduta versada na peça ministerial de ingresso, e que "...referido procedimento administrativo deu azo à restauração da ordem jurídica e, por conseguinte, à luz do princípio da intervenção mínima, o direito penal não está legitimado a intervir" (in verbis).
Asseveram que a celebração do TAC inviabiliza a ação penal. Todavia, ainda assim, a denúncia fora recebida e instaurada a ação penal, tendo início a instrução.
Face ao efetivo recebimento da denúncia, a Paciente houve por bem impetrar Mandado de Segurança perante a 2.ª TURMA RECURSAL CRIMINAL - GRUPO JURISDICIONAL DA COMARCA DE SETE LAGOAS/MG, que culminou por denegar a ordem implorada.
Invocam a ilegalidade quando trazem a lume a prévia celebração do TAC aliada à comprovação de que a Paciente vem cumprindo as obrigações ali acordadas, pois, "... muito antes do aperfeiçoamento da relação processual, a questão restou dirimida na seara administrativa, através da autarquia (IEF/MG), legalmente legitimada para tal mister, sendo imposta à Impetrante obrigação dos AIs (autos de infração) lavrados, além de adotar medidas para a prevenção de eventual dano ambiental" (in verbis).
Retratam a expressividade e magnitude das obrigações avençadas no TAC - reestruturação e reforma de centro de treinamento e fiscalização ambiental - orçado em R$ 310.000,00.
Dizem da legitimidade do IEF para o termo, ex vi da Lei 7347/85. c.c. o art. 79-A, caput, da Lei 9605/98.
Pugnam pela concessão da ordem para o trancamento da ação penal, por ausência de justa causa, eis que "... considerando que os fatos narrados na denúncia foram abarcados pelo TAC - Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta - firmado, somente na hipótese de descumprimento do que fora ajustado é que restaria corporificada, em tese, a viabilidade do direito de ação, face ao princípio da intervenção mínima do direito penal." (in verbis).
A autoridade apontada como coatora prestou informações, às fls. 290/310.
Manifesta-se a douta Procuradoria-Geral de Justiça, às fls. 312/316, pela concessão da segurança.
Relatados os autos.
A ordem é de ser concedida.
Conhece-se do mandamus.
Cuida-se de mandado de segurança contra Acórdão proferido em Mandado de segurança por Turma Recursal de Juizado Especial.
Segundo orientação jurisprudencial do C. STJ, não cabe recurso ordinário contra Acórdão proferido em mandado de segurança emanado das Turmas Recursais, haja vista que não são tribunais e não se subsumem aos rigores da alínea "b" do inciso II do art. 105 da Constituição Federal.
De outra parte, tampouco cabe apelação, no caso em apreço, à luz do vetusto art. 12 da Lei 1.533/51 - atual art. 14 da novel Lei 12.016/09 - pois os dispositivos aludem especificamente ao recurso de apelação contra sentença de juiz (monocrático, diga-se), e a decisão em comento fora colegiada.
A Lei 9.099/95, por seu turno, não dispõe de modo específico sobre a matéria.
No Magistério de Humberto Theodoro Júnior:
"Não há hierarquia entre os Tribunais de segundo grau ordinários (de Justiça e Alçada) e as "Turmas de Recurso", de sorte que a solução encontrada nos acórdãos destas é final e definitiva" (in Curso de Direito Processual Civil, Editora Forense, 26.ª edição, vol. III, p. 438).
Resta à parte tão-somente a ação constitucional de mandado de segurança para sanar ilegalidade primo ictu oculi, razão porque conheço da ação.
Impõe-se consignar, acerca de sua pertinência, precedente desta Corte:
"Mandado de Segurança - Crime Ambiental - Existência de Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta - Ausência de justa causa - Deve ser trancada a ação penal por falta de justa causa na hipótese em que a impetrante assinou termo de compromisso de ajustamento de conduta ambiental junto aos órgãos competentes antes do oferecimento da denúncia - Mandamus concedido". (TJMG - MS n.º 1.0000.03.400377 - Rel. Des.ª Jane Silva).
É consabida a excepcionalidade do trancamento de ação penal em via de cognição sumária. Sobre do tema, paradigmático julgado:
"Ementa HABEAS CORPUS. CRIME DE RESPONSABILIDADE ATRIBUÍDO A PREFEITO. ART. 1º, XIV, DO DL 201/67. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ORDEM CONCEDIDA. 1. O trancamento de ação penal, pela via estreita do habeas corpus, conforme pacífico magistério jurisprudencial, somente é possível quando, pela mera exposição dos fatos narrados na peça acusatória, verifica-se que há imputação de fato penalmente atípico ou que não existe nenhum elemento indiciário demonstrativo da autoria do delito imputado ao paciente ou, ainda, quando extinta encontra-se a punibilidade. 2. Inexistente o dolo, elemento subjetivo do tipo penal inscrito no art. 1º, inciso XIV, do Decreto-lei 201/67, resulta atípica a conduta imputada ao paciente. 3. Ordem concedida para determinar o trancamento da ação penal originária 36608/2005." (STJ - HC 64478 / MT -2006/0176198-9. Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA. Órgão Julgador - QUINTA TURMA. Data do Julgamento: 27/03/2008. Data da Publicação/Fonte: DJe 12/05/2.008).
Em verdade, à vista do material de cognição, o trancamento da ação penal é medida que se impõe, ante a extinção da punibilidade da Paciente.
A Paciente foi autuada pelo IEF por infração ambiental através do Auto de Infração n.º 393/06 (fls. 54/55), que rendeu ensejo ao e ao Boletim de Ocorrência n.º 30231 (fls. 44/48), originando o processo n.º 0672.06.194.662-6, perante a JESP Criminal da Comarca de Sete Lagoas.
Infere-se que o Ministério Público deixou de oferecer proposta de transação penal e, em 26 de setembro de 2.006, denunciou a Paciente pelo cometimento, em tese, do crime ambiental inscrito no art. 46, caput, c.c. o art. 21, ambos da Lei 9605/98, porque em 25 de julho de 2.006, na BR 040, km 468, Bairro Indústrias no Município de Sete Lagoas, durante a fiscalização ambiental realizada pelo IEF, foi constatado que a Paciente adquirira, para fins industriais, de 90 m³ de carvão vegetal sem exigir a exibição da licença do vendedor, outorgada pela autoridade competente e sem munir-se da via que deveria acompanhar o produto, até final beneficiamento, devidamente atualizada.
Narra inda a peça ministerial de ingresso que, assim agindo, por intermédio de pessoa física não identificada, a Paciente adquiriu carvão vegetal de origem desconhecida em proveito da sociedade, por comando de representante legal ou contratual ou de seu órgão colegiado, estando implícita que a deliberação para a compra do carvão surgiu para satisfazer o interesse da garantia do resultado da produção de ferro gusa.
Já às fls. 18/29 divisa-se o advento de TAC (Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta) firmado entre a Paciente e o IEF/MG em 11 de dezembro de 2.007 - antes do recebimento da denúncia - versando sobre a mesma conduta imputada à Paciente na denúncia (além de outras) - eis que comporta o objeto do Auto de Infração n.º 393/06 (fl. 19), idêntico objeto da ação penal.
Abram-se parênteses para invocar a legitimidade do IEF/MG para a celebração de TAC, sob os auspícios do art. 5.º, inciso IV, § 6.º da Lei 7.347/85, c.c. o art. 79-A, caput, da Lei 9605/98, a preconizar, ademais, que o TAC tem força de título executivo extrajudicial, passível de extinguir a punibilidade do agente e, como corolário cartesiano, impedir a propositura da ação criminal.
Senão vejamos:
Art. 5º da Lei 7347/85 - "Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:
IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista;
§ 6°- Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial".(g.n.)
Com efeito, o IEF é autarquia e integra o SISNAMA:
"Instituto Estadual de Florestas - IEF é uma autarquia criada pela Lei nº 2.606, de 5 de janeiro de 1962, vinculada à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, dotada de personalidade jurídica de direito público, com autonomia administrativa e financeira, sede e foro na Capital do Estado e jurisdição em todo território estadual.
...
O IEF - integra o Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA criado pela Lei Federal nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, alterada pela Lei nº 7.804, de 18 de julho de 1989" (in http://servicos.meioambiente.mg.gov.br/instituto/instituto.asp).
E
Art. 79-A da - "Para o cumprimento do disposto nesta Lei, os órgãos ambientais integrantes do SISNAMA, responsáveis pela execução de programas e projetos e pelo controle e fiscalização dos estabelecimentos e das atividades suscetíveis de degradarem a qualidade ambiental, ficam autorizados a celebrar, com força de título executivo extrajudicial, termo de compromisso com pessoas físicas ou jurídicas responsáveis pela construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, considerados efetiva ou potencialmente poluidores." (g.n.)
Tornando à quaestio, tem-se que, na Audiência de Instrução e Julgamento realizada em 30 de julho de 2008 (fls. 216/218), a Magistrada repeliu a preliminar levantada pela Paciente - proclamando a ausência de justa causa para a ação penal - nada obstante a comprovação da existência da TAC, ao fundamento de que o referido Termo diz apenas com a esfera administrativa, sem interferência na penal; e de que o Ministério Público não houvera chancelado o TAC. Por fim a Juíza recebeu a denúncia.
Impetrado Mandado de Segurança perante a 2.ª TURMA RECURSAL CRIMINAL - GRUPO JURISDICIONAL DA COMARCA DE SETE LAGOAS/MG, a ordem restou denegada (fls. 267/273).
Na hipótese enfocada, a Paciente está em vias de adimplir a totalidade da avença fixada no TAC, com a ressalva de que na hipótese de inadimplemento, seria a Paciente passível de sofrer execução.
Observa-se, à primeira vista d´olhos, a documentação comprobatória de que a Paciente vem paulatina e constantemente cumprindo as condições ali firmadas, com 80% da obra realizada, e o restante em pleno prazo de efetivação, só não se tendo cumprido em razão de embaraços emanados do próprio IEF (fls. 31/32 e 34).
Em última análise, o acordo vale pelo que contém. É um acordo-realidade: não é a forma que compõe a situação, mas a essência, o objeto do acordo que faz imutável a composição penal.
Nem se diga da imprescindibilidade de chancela do Ministério Público a validar o TAC, porquanto a legislação específica de regência da matéria é silente a respeito e a melhor exegese é aquela que não pretenda restringir o direito da parte, quando o legislador não o fez expressamente.
Parta-se da premissa de que, igualmente, não há lei que obrigasse a Paciente e o IEF à celebração do TAC.
Como decorrência lógica, o TAC afigura-se uma faculdade e até mais: uma expressão legítima de boa vontade das partes, uma escolha crucial em prol da restauração do meio ambiente, sem delongas e sem debates, sem empecilhos nem -- restaurar - como no caso - a ordem ambiental sem delongas e sem debates, e como tal, há que receber o merecido prestígio.
Assim é que a matéria penal ficou definitivamente desconstituída, sem a possibilidade de instauração da ação penal, donde decaiu toda a noção de justa causa para a ação penal.
Solicito escusas e licenças para transcrever, na íntegra, pela similitude, o paradigmático Acórdão desta e. 3.ª Câmara Criminal, de Relatoria da mui sapiente Desª. Jane Silva, em que este ora Relator figurou então como Revisor:
"Número do processo: 1.0000.09.494459-2/000(1)
Relator: JANE SILVA
Relator do Acórdão: JANE SILVA
Data do Julgamento: 25/06/2009
Data da Publicação: 31/07/2009
EMENTA: PENAL - "HABEAS CORPUS" - CRIME AMBIENTAL - DENÚNCIA OFERECIDA DEPOIS DE FIRMADO TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA COM O ACUSADO - DENÚNCIA QUE SE LIMITA A REPRODUZIR O MESMO CONTEXTO QUE RESULTOU NO TAC VALIDAMENTE FIRMADO - CARÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A PERSECUÇÃO PENAL DO AGENTE EM JUÍZO - ORDEM CONCEDIDA PARA TRANCAR A AÇÃO PENAL. I. Firmado Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre o Ministério Público e o agente causador do dano ambiental, possibilita-se o oferecimento de denúncia pela prática de crime dessa natureza apenas caso o acusado permaneça praticando atos atentatórios contra o meio ambiente, pois o TAC não pode servir como salvo-conduto para a prática de novas infrações. Precedentes do STF e do STJ. II. Por outro lado, inadmissível que o Ministério Público ofereça denúncia contra o agente em concomitância com a assinatura do TAC sem que nenhum fato novo aconteça, mormente quando as condições do termo venham sendo regularmente cumpridas. III. Ausente justa causa para a persecução penal do paciente em juízo, impõe-se o trancamento da ação penal contra ele ajuizada, possibilitando-se novo oferecimento de denúncia apenas caso ele volte a adotar novas condutas criminosas. IV. Ordem concedida para trancar a ação penal.
HABEAS CORPUS N° 1.0000.09.494459-2/000 - COMARCA DE DIVINÓPOLIS - PACIENTE(S): JOÃO EVANGELISTA SILVA - AUTORID COATORA: 1º TURMA RECURSAL CRIMINAL COMARCA DIVINÓPOLIS - RELATORA: EXMª. SRª. DESª. JANE SILVA
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 3.ª CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM CONCEDER O "HABEAS CORPUS".
Belo Horizonte, 25 de junho de 2009.
DESª. JANE SILVA - Relatora
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
A SRª. DESª. JANE SILVA:
VOTO
Trata-se de habeas corpus com pedido de liminar impetrado em benefício de JOÃO EVANGELISTA SILVA, por meio de procurador legalmente habilitado, no qual alegou suportar constrangimento ilegal exercido pela 1ª Turma Recursal Criminal da Comarca de Divinópolis.
Argumentou que a ação penal contra ele ajuizada, imputando-lhe a suposta prática do crime previsto no artigo 48 da Lei 9.605/1998, deve ser trancada, pois carente de justa causa. Disse ter firmado termo de ajustamento de conduta com o Ministério Público justamente com relação aos fatos narrados na denúncia.
A liminar foi indeferida pelo eminente Desembargador Antônio Armando dos Anjos (fl. 128).
Prestadas as informações (fls. 135/254), a Procuradoria-Geral de Justiça opinou pela concessão da ordem (fls. 256/257).
Em seguida, os autos foram redistribuídos à minha Relatoria, tendo em vista o afastamento temporário do então Relator (fl. 259).
É o relatório.
Verifiquei cuidadosamente as razões apresentadas pelo impetrante e, ao compará-las com a decisão ora impugnada, com as informações prestadas e com os documentos acostados aos autos, vejo que devo acolher sua pretensão.
Em 01 de agosto de 2007, o representante do Ministério Público, baseado em documentação que levava a crer que o ora paciente poderia ter praticado alguns crimes ambientais, requisitou à Polícia Civil a instauração de inquérito policial para apurar a possível prática dos delitos previstos nos artigo 38 e 48 da Lei 9.605/1998 (f. 150), os quais possuem a seguinte redação:
Artigo 38. Destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente, mesmo que em formação, ou utilizá-la com infringência das normas de proteção:
Pena - detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena será reduzida à metade.
Artigo 48. Impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação:
Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa.
O inquérito policial foi concluído em 11 de junho de 2008, consoante relatório de f. 175/176.
Em 28 de julho daquele ano, o Ministério Público ofereceu sugestão de transação penal ao agente, oportunidade em que propôs a reparação do dano ambiental causado e o pagamento de prestação pecuniária (f. 177/180).
Diante da recusa defensiva (f. 186), ofertou-se denúncia imputando-lhe tão-somente a prática do crime capitulado no supracitado artigo 48 (f. 188/189).
Porém, durante esse período, mais precisamente em 22 de fevereiro de 2008, o Ministério Público firmou termo de ajustamento de conduta com o paciente (f. 211/215).
Antes de adentrar no mérito do pedido, mister salientar que os Tribunais Superiores admitem a possibilidade de oferecimento de denúncia caso o agente, mesmo depois de firmar termo de ajustamento de conduta, permaneça degradando o meio ambiente.
Nesse sentido já decidiu o colendo Superior Tribunal de Justiça, consoante o seguinte aresto:
HABEAS CORPUS - CRIME AMBIENTAL - TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL - AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA - INOCORRÊNCIA - TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA FIRMADO ENTRE A EMPRESA DOS ACUSADOS E O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL - OBJETIVO DE PRESERVAR RIO DA UNIÃO - LEGITIMIDADE DO PARQUET ESTADUAL PARA FAZÊ-LO CONCORRENTEMENTE COM O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - VIGÊNCIA DO ARTIGO 5º, §6º DA LEI DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA - INDÍCIOS DE AUTORIA APTOS A EMBASAR A DENÚNCIA - INÉPCIA DA INICIAL ACUSATÓRIA - INOCORRÊNCIA - DENÚNCIA GERAL QUE NARROU SATISFATORIAMENTE AS CONDUTAS IMPUTADAS AOS ACUSADOS - ORDEM DENEGADA, CASSANDO-SE A LIMINAR ANTERIORMENTE DEFERIDA.
(...).
III. Ainda que o Ministério Público Estadual certifique que o objeto do Termo de Ajustamento de Conduta foi devidamente cumprido pela parte, é cabível o oferecimento de denúncia embasada em fatos supostamente criminosos decorridos da continuidade da suposta prática delitiva.
IV. O trancamento da ação penal por esta via justifica-se somente quando verificadas, de plano, a atipicidade da conduta, a extinção da punibilidade ou a ausência de indícios de autoria e prova da materialidade, o que não se vislumbra na hipótese dos autos. Precedentes.
(...).
VI. Ordem denegada, cassando-se a liminar anteriormente deferida. (STJ - HC 61.199/BA - Quinta Turma - DJ de 22.10.2007, p. 321).
Examinando o mesmo caso, o egrégio Supremo Tribunal Federal esposou entendimento similar:
PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIME AMBIENTAL. HABEAS CORPUS PARA TUTELAR PESSOA JURÍDICA ACUSADA EM AÇÃO PENAL. ADMISSIBILIDADE. INÉPCIA DA DENÚNCIA: INOCORRÊNCIA. DENÚNCIA QUE RELATOU a SUPOSTA AÇÃO CRIMINOSA DOS AGENTES, EM VÍNCULO DIRETO COM A PESSOA JURÍDICA CO-ACUSADA. CARACTERÍSTICA INTERESTADUAL DO RIO POLUÍDO QUE NÃO AFASTA DE TODO A COMPETÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA E BIS IN IDEM. INOCORRÊNCIA. EXCEPCIONALIDADE DA ORDEM DE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ORDEM DENEGADA.
(...).
V - Em crimes ambientais, o cumprimento do Termo de Ajustamento de Conduta, com conseqüente extinção de punibilidade, não pode servir de salvo-conduto para que o agente volte a poluir.
VI - O trancamento de ação penal, por via de habeas corpus, é medida excepcional, que somente pode ser concretizada quando o fato narrado evidentemente não constituir crime, estiver extinta a punibilidade, for manifesta a ilegitimidade de parte ou faltar condição exigida pela lei para o exercício da ação penal.
VII - Ordem denegada. (STF - HC 92.921/BA - Relator: Ministro Ricardo Lewandowski - Primeira Turma - DJe de 25.09.2008)
Como se vê, referidos precedentes, oriundos de nossas Cortes Superiores, são bastante recentes, constituindo-se, assim, em relevante ponto de partida para o exame da quaestio posta sob debate.
Cinge-se a matéria, portanto, em examinar se a denúncia ora impugnada se limitou ou não a reproduzir o mesmo contexto fático delineado no termo de ajustamento de conduta.
Compulsando os autos, percebo, assim como o ilustre Procurador de Justiça, que total razão assiste ao impetrante.
O termo de ajustamento de conduta, firmado em 22 de fevereiro de 2008, foi o resultado do procedimento preparatório 670/2002, o qual, por sua vez, se originou do boletim de ocorrência de f. 197, consoante se infere à f. 196.
Já a denúncia, ao invés de inovar no contexto fático tido por criminoso, se limitou a reproduzir o mesmo já delineado no termo de ajustamento de conduta, pois esteada apenas no relatório policial de f. 175/176, resultado do inquérito policial baseado no mesmo boletim (f. 150/151).
Apenas para esclarecer a questão, transcrevo o teor da denúncia na parte referente à conduta imputada ao acusado (f. 188/189):
(...).
Consta do Boletim de Ocorrência nº 201.126 que o denunciado impediu a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação.
Segundo consta no boletim de ocorrência em apreço, no dia 17/07/2007, a PMMA - Polícia Militar do Meio Ambiente compareceu propriedade do denunciado, localizada na Comunidade do Choro, e constatou que este realizou destoca de uma área de 01 há (sic) de mata nativa, e, ainda, executou roçada de pasto suprimindo vegetação constituída de capim e pequenos arbustos, sem autorização do órgão ambiental competente.
(...).
Como se vê, o representante do Ministério Público não trouxe qualquer inovação capaz de possibilitar o oferecimento da denúncia.
Em momento algum foi narrado que o agente teria, por exemplo, permanecido na senda criminosa mesmo após firmar o termo de ajustamento de conduta, circunstância que possibilitaria sua persecução penal em juízo, como esclarecido nos precedentes supracitados.
O que se percebe, então, é que o membro do Parquet não apenas firmou o termo de ajustamento de conduta com o ora paciente como, também, o denunciou em concomitância, o que não se pode admitir.
Nesse sentido caminha a jurisprudência deste Tribunal de Justiça. Vejamos:
PROCESSO-CRIME DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA - PREFEITO MUNICIPAL - CRIME AMBIENTAL - EXISTÊNCIA DE TERMO DE COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA - AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. A assinatura do Termo de Compromisso de Ajustamento da Conduta Ambiental (TAC) junto aos órgãos competentes antes de oferecimento da denúncia pelo Ministério Público obsta a propositura da mesma, ante a ausência de justa causa para a instauração da respectiva ação penal.
Denúncia rejeitada. (TJMG - PCO 1.0000.07.465445-0/000 - Relator: Desembargador Antônio Armando dos Anjos - Terceira Câmara Criminal - DJ de 11.02.2009).
Habeas Corpus. Trancamento de ação penal. Crime ambiental. Existência de Termo de Ajustamento de Conduta. Justa causa que não se verifica. Denúncia que não individualiza a conduta do paciente. Direito de defesa prejudicado. Inépcia. Ordem concedida. (TJMG - HC 1.0000.06.445201-4/000 - Relator: Desembargador Reynaldo Ximenes Carneiro - Segunda Câmara Criminal - DJ de 11.01.2007).
Portanto, ausente justa causa para a persecução penal do paciente em juízo, de rigor o trancamento da ação penal contra ele ajuizada.
Ante tais fundamentos, CONCEDO A ORDEM impetrada para trancar a ação penal nº 0223.08.245230-9, ajuizada contra o paciente perante o Juizado Especial Criminal da Comarca de Divinópolis.
Sem custas.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): ANTÔNIO CARLOS CRUVINEL e FORTUNA GRION".
Este Relator se tem orientado no mesmo sentido:
"Habeas Corpus - Acordo firmado com força de título executivo extrajudicial - Matéria penal definitivamente desconstituída que impede a apresentação de denúncia sobre o mesmo fato - Denúncia oferecida e recebida - Constrangimento ilegal caracterizado - Trancamento da ação penal ordenado - Ministério Público - Parte ilegítima para instauração de inquérito administrativo com a finalidade de persecução penal - Ordem concedida" (TJMG - HC nº 1.0000.04.410063-4/000 - Rel. Des. Antônio Carlos Cruvinel).
O constrangimento ilegal sobressai quando aflora a só celebração de Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta entre Paciente e IEF - envolvendo o mesmo fato eventualmente nocivo ao meio ambiente - pois repita-se - nos termos do art. 79-A da Lei 9.605/98, o TAC tem força de título executivo extrajudicial, extinguindo-se a punibilidade do agente.
E, numa extensão lógica e orgânica, sobrevém inegável o óbice à instauração da ação penal, sobretudo quando se tem em conta que a plenitude da obrigação está por um fio de se concretizar.
Essa situação jurídica se avulta primo ictu oculi e sobreleva à excepcionalidade do trancamento de ação penal, via mandado de segurança.
Porto isso, CONCEDE-SE A ORDEM para determinar o trancamento da ação penal.
O SR. DES. PAULO CÉZAR DIAS:
Ouvi, atentamente, a sustentação oral feita pelo Dr. Marcelo Silveira Ferreira de Melo e ponho-me de acordo com o voto do Relator.
O SR. DES. ANTÔNIO ARMANDO DOS ANJOS:
Sr. Presidente.
Registro que ouvi, com muita atenção, a sustentação oral feita pelo ilustre Advogado e acuso o recebimento de substancioso memorial, ao qual, também, dei a devida atenção.
Com relação à questão de fundo, estou inteiramente de acordo com o eminente Relator.
O SR. DES. FORTUNA GRION:
Sr. Presidente.
Embora não tenha recebido o mesmo substancioso memorial, tive a oportunidade, hoje, de ouvi a brilhante sustentação oral do Dr. Marcelo Silveira Ferreira de Melo e o excelente e escorreito voto do eminente Relator, com o qual estou inteiramente de acordo.
A SRª. DESª. JANE SILVA:
De acordo com o Relator.
SÚMULA: SEGURANÇA CONCEDIDA E DETERMINARAM O TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL.
JURID - Mandado de segurança. Crime ambiental. [04/02/10] - Jurisprudência
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