Instalação de linha telefônica não solicitada pelo pretenso devedor. Fraude de terceiro.
Tribunal de Justiça do Mato Grosso - TJMT.
SEXTA CÂMARA CÍVEL
APELAÇÃO Nº 21573/2009 - CLASSE CNJ - 198 - COMARCA CAPITAL
APELANTE: BRASIL TELECOM S.A. - FILIAL MATO GROSSO
APELANTE: RONALDO SILVA NETO
APELADO: RONALDO SILVA NETO
APELADA: BRASIL TELECOM S.A. - FILIAL MATO GROSSO
Número do Protocolo: 21573/2009
Data de Julgamento: 13-01-2010
EMENTA
RECURSOS DE APELAÇÃO CÍVEL E ADESIVO - DANO MORAL - INSTALAÇÃO DE LINHA TELEFÔNICA NÃO SOLICITADA PELO PRETENSO DEVEDOR - FRAUDE DE TERCEIRO - INSCRIÇÃO EM ÓRGÃO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO - DÍVIDA INEXISTENTE - CONFIGURAÇÃO - INDENIZAÇÃO DEVIDA - ADEQUAÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO - CORREÇÃO MONETÁRIA INCIDENTE DESDE A CONDENAÇÃO - AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL - JUROS DE MORA - A PARTIR DA PRÁTICA ILÍCITA - PROIBIÇÃO DA REFORMA PARA PIOR - APELAÇÃO PARCIALMENTE CONHECIDA E DESPROVIDA - RECURSO ADESIVO DESPROVIDO.
Na realização de suas atividades, cumpre a empresa prestadora de serviço de telefonia conferir adequadamente a procedência e veracidade dos dados cadastrais no momento da solicitação, sob pena de se responsabilizar por dano que causar a terceiro.
A inscrição em registro de cadastro de inadimplentes, por dívida inexistente, resulta em reparação por dano moral.
Não há interesse recursal sobre a incidência da correção monetária na indenização por dano moral desde a condenação, se a determinação judicial é nesse sentido.
O termo inicial dos juros moratórios na responsabilidade extracontratual é a data do evento danoso, a teor da Súmula n° 54 do STJ. Todavia, mantém-se a incidência desde a citação prevista sentença, na impossibilidade de se acolher o pleito recursal para a contagem desde o arbitramento em face do princípio da proibição da reforma para pior.
R E L A T Ó R I O
EXMO. SR. DES. JURACY PERSIANI
Egrégia Câmara:
Recursos de apelação e adesivo da condenação da Brasil Telecom S.A. em indenização por dano moral em R$6.000,00 (seis mil reais), decorrente de inscrição em cadastro de inadimplentes por dívida inexistente (fls. 70/79).
Brasil Telecom S.A. argúi cerceamento de defesa pelo julgamento antecipadamente da lide, pois pretendia provar a regular utilização do terminal telefônico.
No mérito, sustenta a legalidade da conduta da empresa, que no exercício regular do direito, somente informou aos órgãos de restrição ao crédito por ausência de pagamento de fatura; há excludente de responsabilidade prevista no art. 14, § 3º, II, do Código de Defesa do Consumidor; alternativamente, requer a redução da indenização; a incidência dos juros de mora a partir da prolação da sentença, e "a correção monetária(...) a partir da condenação" (fl. 96) (fls. 93/97).
Ronaldo Silva Neto, no recurso adesivo, sustenta a majoração do dano moral, pois "só assim a recorrida seria desestimulada à praticar atos semelhantes aos causados ao recorrente" (fl. 105) (fls. 103/110).
Em contrarrazões, Ronaldo Silva Neto pugna pela manutenção da sentença (fls. 111/120), e a Brasil Telecom S.A. pelo desprovimento do recurso adesivo (fls. 122/128).
É o relatório.
V O T O (PRELIMINAR - CERCEAMENTO DE DEFESA)
EXMO. SR. DES. JURACY PERSIANI (RELATOR)
Egrégia Câmara:
Para a Brasil Telecom S.A. o julgamento antecipado da lide a impediu de comprovar "a regular utilização do terminal telefônico, mormente pela evidência de que diversas faturas foram pagas, com exceção apenas da última em valor irrisório se comparado aos devidamente quitados" (fl. 84).
A apelante, para rebater os fundamentos do autor de ausência de relação contratual entre as partes e de que a dívida lhe era inexistente, juntou uma papelada de registros produzidos unilateralmente e não exibiu o contrato que alegou existir.
Ocorre que o momento processual para o réu a juntar documento preexistente ao processo é o da contestação.
Se não o fez, precluiu-lhe a prova.
É a lição de Nelson Nery Junior:
"A prova documental preexiste à lide e deve vir acompanhado a inicial (CPC 283), ou a contestação (CPC 297), se for indispensável à propositura da ação ou à defesa do réu (CPC 396). Depois, pode a parte fazer a juntada de documentos novos (CPC 397) e o autor contrapor com prova documental as preliminares opostas pelo réu (CPC 327)." (in "CPC..."; Revista dos Tribunais; 10ª edição; 2008, pág. 626).
O cerceamento de defesa não se configura.
Rejeito a preliminar.
V O T O (MÉRITO)
EXMO. SR. DES. JURACY PERSIANI (RELATOR)
Egrégia Câmara:
A Brasil Telecom S.A., ora apelante, atendeu solicitação de instalação de linha telefônica por meio do call center, em nome do apelante/autor e o inscreveu no cadastro de inadimplentes por débito pendente. Ao se defender do pedido de indenização por dano moral, sustentou a inadimplência do apelado, e que ele havia liquidado grande parte das faturas emitidas.
A apelante não demonstrou a existência entre as partes de qualquer relação obrigacional a justificar o suposto débito e a inclusão do nome do apelado em cadastro de inadimplentes, nem mesmo comprovou que o autor teria adimplido grande parte das faturas.
A celebração de contrato de prestação de serviço telefônico por meio do call center se revela frágil e sujeito a fraudes. Na realização de suas atividades, cumpre à apelante conferir adequadamente a procedência e veracidade dos dados cadastrais no momento da solicitação, o que, à evidência, não fez no caso em apreço, no que assumiu o risco de lesar terceiros de boa-fé.
A evidência da falha na prestação do serviço encontra respaldo no fato de não ter sido juntado cópia do documento de identidade e do comprovante de endereço que foram utilizados na solicitação, a fim de verificar a idoneidade dos dados fornecidos pelo solicitante.
Assim, a alegada fraude na solicitação do serviço telefônico, por terceiro, com a indevida utilização do nome do apelado, não vem em socorro da empresa de telefonia. Não a isenta de responder pelo dano causado, pois na ânsia do lucro não se forrou das precauções inerentes ao seu negócio.
O caso retrata o dano moral puro, o que significa que ele se esgota na lesão à personalidade. A prova do referido dano cingir-se-á à existência do próprio ato ilícito, pois o dano moral puro atinge, fundamentalmente, bens incorpóreos, o que torna extremamente difícil a prova da efetiva lesão, motivo pelo qual é dispensada sua demonstração em juízo.
Nesse sentido, a jurisprudência:
"APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. BRASIL TELECOM. INSTALAÇÃO DE LINHA TELEFÔNICA COM UTILIZAÇÃO DE CNPJ DE TERCEIRO. POSTERIOR CADASTRAMENTO EM ÓRGÃO RESTRITIVO DE CRÉDITO.
É de se esperar que para proceder à instalação de linha telefônica venha a se certificar a empresa concessionária de serviço público acerca da presteza dos dados que lhe são postos. Se aceita cadastramento feito unicamente pela via telefônica, deixando de exigir posterior comprovação, havendo fraude praticada por terceira pessoa, responde pelos danos ocorridos, os quais são presumidos em face da inscrição restritiva de crédito. (...)." (TJRS, 5ª Câmara Cível, RAC 70008075046, Rel. Dr. Antônio Vinícius Amaro da Silveira, Julg. 27-5-2004; in www.tj.rs.gov.br)
Quanto à fixação do valor da indenização, o Juiz deve sempre ter como princípios norteadores a razoabilidade, a moderação e o bom senso, sopesar as condições econômicas e sociais das partes, as circunstâncias do fato, a repercussão do ato danoso e os propósitos compensatório e pedagógico-punitivo do instituto.
O Superior Tribunal de Justiça tem consagrado a doutrina da dupla função na indenização do dano moral, compensatória e penalizante:
"RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DANOS MORAIS. ACIDENTE DE TRÂNSITO. LESÃO PERMANENTE.
A indenização por dano moral deve atender a uma relação de proporcionalidade, não podendo ser insignificante a ponto de não cumprir com sua função penalizante, nem ser excessiva a ponto de desbordar da razão compensatória para a qual foi predisposta.
(...)" (REsp 318379/MG; 3ª Turma; Rela. Ministra Nancy Andrighi; Julg. 20-9-2001; DJU 04-02-2002, p. 352; in www.stj.gov.br).
No caso, o valor arbitrado pela MM.ª Juíza de R$6.000,00 (seis mil reais) é consentâneo com os elementos dos autos. Não há reduzi-lo, como pretendido pela apelante e nem majorar como quer o recorrente adesivo.
Restou incontroverso o arrazoado da petição inicial de que a ré, ora apelante, cientificada da inscrição indevida do nome do apelado em cadastro de inadimplentes, se comprometeu a baixar o registro em 48 (quarenta e oito) horas mas não cumpriu.
Somente com a ordem liminar de suspensão dos registros é que cessou a negativação.
Por outro lado, o recorrente adesivo não demonstrou maiores repercussões em detrimento dos seus interesses do autor/apelante, e considerados os recentes julgados dessa turma julgadora, a quantia arbitrada se mostra suficiente para cumprir os objetivos compensatório, pedagógico e punitivo da indenização.
Quanto à incidência da correção monetária da condenação, falta interesse recursal da Brasil Telecom S.A., uma vez que nesse sentido decidiu a MM.ª Juíza.
O termo inicial dos juros moratórios não é a data da condenação, como pretendido pela apelante, mas desde a prática do ilícito quando a responsabilidade é extracontratual:
"... A jurisprudência pacificada nesta Corte é no sentido de que os juros moratórios incidem desde a data do evento danoso quando a responsabilidade é extracontratual, aplicando-se ao caso a Súmula 54 deste Superior Tribunal de Justiça..." (AgRg no Ag 1006599/RJ; Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª T.; Julg. 07-10-2008; DJU 23-10-2008; in www.stj.jus.br)
Todavia, a MM.ª Juíza estabeleceu a contagem dos juros moratórios desde a citação, mas, por respeito ao princípio da "proibição da reforma para pior", prevalece o estabelecido na r. sentença.
Ante ao exposto, conheço dos recursos, o de apelação em parte, e nego-lhes provimento.
É como voto.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEXTA CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do DES. JURACY PERSIANI, por meio da Câmara Julgadora, composta pelo DES. JURACY PERSIANI (Relator), DES. GUIOMAR TEODORO BORGES (Revisor) e DRA. CLEUCI TEREZINHA CHAGAS (Vogal), proferiu a seguinte decisão: PRELIMINAR REJEITADA. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDA EM PARTE E DESPROVIDO. APELO ADESIVO DESPROVIDO, À UNANIMIDADE.
Cuiabá, 13 de janeiro de 2010.
DESEMBARGADOR JURACY PERSIANI - PRESIDENTE DA SEXTA CÂMARA CÍVEL EM SUBSTITUIÇÃO LEGAL E RELATOR
Publicado em 22/01/10
JURID - Instalação de linha telefônica não solicitada. Fraude. [12/02/10] - Jurisprudência
Nenhum comentário:
Postar um comentário