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sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

JURID - Indenização por dano moral. Revista. [12/02/10] - Jurisprudência


Indenização por dano moral. Revista.
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Tribunal Regional do Trabalho - TRT 3ª Região.

Processo: 00306-2009-134-03-00-1 RO

Data de Publicação: 07/12/2009

Órgão Julgador: Sexta Turma

Juiz Relator: Des. Jorge Berg de Mendonca

Juiz Revisor: Des. Emerson Jose Alves Lage

Recorrente: Scala Bar e Danceteria Ltda. -ME

Recorrido: Crícia Vital de Oliveira

EMENTA: INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - REVISTA - A fiscalização dos empregados deve ser exercida através de mecanismos disponíveis e capazes de evitar a sua submissão a situações desrespeitosas e humilhantes, como as que envolvem atentado ao pudor natural do ser humano e ao direito à intimidade destes. A revista íntima de empregadas é vedada pelo art. 373-A, VI, da CLT. Tal medida extrapola o poder diretivo do empregador e, ainda mais quando abusiva, viola os direitos de personalidade das obreiras, dando ensejo à compensação por dano moral conforme prevista no art. 5º, X, da Constituição Federal.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos em destaque, DECIDE-SE:

RELATÓRIO

A MM. 5ª Vara do Trabalho de Uberlândia, por meio da sentença de fls. 85/89, proferida na reclamação trabalhista movida por Crícia Vital de Oliveira contra Scala Bar e Danceteria Ltda. - ME, afastando as preliminares de coisa julgada e de carência de ação, argüidas pela reclamada, condenou esta a cumprir as obrigações especificadas às fls. 88/89.

A reclamada recorre ordinariamente dessa decisão, pedindo a sua reforma, conforme razões que expõe às fls. 96/107.

Custas processuais pagas e depósito recursal recolhido conforme documentos de fls. 108/109.

Contra-razões do reclamante às fls. 115/119, nas quais ela alega a litigância de má-fé da reclamada.

É o relatório.

VOTO

ADMISSIBILIDADE

Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso interposto pela reclamada, assim como, das contra-razões oferecidas pelo reclamante.

MÉRITO

CONTRADITA DE TESTEMUNHA

A reclamada alega que a contradita da testemunha KEILA LEMES DA SILVA deveria ter sido acolhida, pois esta depoente possui ação idêntica contra ela, tendo, portanto, interesse no sucesso da presente lide. Afirma que referida ação foi julgada improcedente no âmbito deste Regional. Diz que não pode se aplicar ao caso a Súmula 357 do TST, invoca os art. 405, § 3º, IV, e parágrafo 4º, e 406, inciso I, ambos do CPC e pede a desconsideração do referido depoimento testemunhal.

Sem razão.

A testemunha em questão foi contraditada apenas ao fundamento de possuir reclamação trabalhista em face da recda e interesse no resultado do litígio, conforme consta da assentada de fls. 81/83.

A reclamada, ali, a rigor, sequer alegou que as ações seriam idênticas.

Além disso, o simples fato de a testemunha estar litigando contra o mesmo empregador, ainda que em ação com o mesmo objeto e patrocinada pelo mesmo advogado, não a torna suspeita, conforme entendimento já pacificado pela Súmula 357/TST.

Ações ajuizadas em face do mesmo empregador, aliás, podem possuir similaridade de pedidos e causa de pedir, já que a situação dentro da mesma empresa pode atingir um grupo de trabalhadores, e não apenas um indivíduo.

Em casos assim, torna-se difícil para o empregado produzir prova testemunhal, pois muitas vezes seus ex-colegas de trabalho são também titulares de ações contra o empregador comum.

O interesse na causa, no entanto, revela-se quando manifesta a troca de favores, determinante de suspeição, a qual não se presume, devendo restar cabalmente demonstrada, sob pena de violação do princípio constitucional da ampla defesa (art. 5º, LV).

Nesse sentido, o julgado abaixo transcrito:

TESTEMUNHA - SUSPEIÇÃO - LITÍGIO EM FACE DO EMPREGADOR COMUM - IDENTIDADE DE OBJETO - 1. Não é suspeita a testemunha que litiga, ou que litigou contra o mesmo empregador, ainda que a pretensão jurídica de direito material deduzida em juízo seja comum, no todo ou em parte. Do contrário, também as testemunhas indicadas pelo empregador demandado deveriam ser reputadas suspeitas porquanto, em geral, depõem ainda na condição de empregadas e, como tais, mostram-se, em tese, suscetíveis à coação econômica patronal. 2. O interesse na causa determinante de suspeição, a par de não se presumir, não comporta interpretação que implique rigor excessivo e comprometa de forma indelével o direito de defesa de qualquer das partes, mormente quando importe absoluto cerceamento de produção de prova testemunhal, essencial no processo trabalhista. 3. A adoção do princípio da livre convicção racional da prova (CPC, art. 131) e a relevância de que se reveste a prova testemunhal no processo trabalhista recomendam ao Juiz uma atitude liberal na admissão desse meio de prova, aplicando aos casos duvidosos a norma inscrita no art. 405, § 4º, do CPC, sem prejuízo de o bom senso igualmente aconselhar uma cautelosa valoração do testemunho colhido em situações tais. 4. Viola princípio constitucional da ampla defesa (CF/88, art. 5º, inc. LV) decisão que chancela o indeferimento do depoimento de testemunha que também litiga com o empregador comum, mesmo que haja postulação judicial idêntica. 5. Embargos não conhecidos - TST-E-RR-337.469/97, Rel. Min. João Oreste Dalazen, SBDI-1.

No caso dos autos, a recorrente sequer aduziu que a reclamante depôs ou deporia como testemunha da depoente contraditada em qualquer processo.

A testemunha disse não possuir qualquer interesse no resultado desta demanda (fl. 81).

Inexiste, no caso, prova robusta de qualquer das condições previstas no art. 829 da CLT, ou no art. 405 do CPC, especialmente no que toca a ter a testemunha interesse no litígio (§ 3º, IV), sendo que a situação da depoente não extrapolou os limites traçados pela Súmula n. 357 do TST, a qual preceitua que não torna suspeita a testemunha o simples fato de estar litigando ou de ter litigado contra o mesmo empregador.

A troca de favores não foi provada.

O simples exercício do direito constitucional de ação não torna suspeita nem impedida a testemunha, sendo, como visto, inaplicável ao caso o art. 405, § 3º, inc. IV do CPC.

Por fim, eventual falsidade no depoimento em questão pode ser aferida objetivamente, valendo-se o juiz do princípio da livre convicção racional da prova, inserto no art. 131 do CPC.

Nego provimento.

DANO MORAL

A sentença recorrida condenou a reclamada a pagar à reclamante compensação de dano moral no valor de R$6.000,00, por causa de constrangimentos a que esta teria sido submetida durante o contrato de trabalho, causado pela atitude do gerente da empresa classificada como abusiva e ofensiva à intimidade, à privacidade e à dignidade da reclamante.

A reclamada alega que não foi provado que ela tratou a reclamante de forma desumana, sendo que o processo movido pela testemunha KEILA LEMES DA SILVA com base nas mesmas alegações foi julgado improcedente por falta de prova e que deve prevalecer o depoimento da testemunha LUIZ ANTÔNIO SILVA RIBEIRO, o qual afasta as alegações da inicial e foi considerado naquele outro feito. Aponta, ademais, aspectos dos depoimentos tomados que infirmariam o prestado pela testemunha trazida pela autora. Pede, sucessivamente, que o valor da compensação deferida seja reduzido para patamar mais razoável e que guarde proporção com a capacidade financeira da empresa.

Na inicial, a autora alegou que, trabalhando para a reclamada como auxiliar de bar e caixa de 01/10/07 a 06/10/08, era submetida diariamente a situações constrangedoras e humilhantes, sendo obrigada a ficar em espaço pequeno e trancada, necessitando bater para que alguém a soltasse nas idas ao banheiro ou saídas para alimentação. Disse também que não podia usar blusa de frio e era diariamente revistada pelo funcionário de nome Carlão, que a obrigava a tirar os sapatos e passava a mão pelos bolsos da calça e da blusa da mesma, tocando-a de uma forma dissimulada e abusiva.

A prova, no caso, limita-se aos depoimentos testemunhais de fls. 81/83.

A única testemunha trazida pela autora, KEILA LEMES DA SILVA (fls. 81/82), que trabalhou para a reclamada ao mesmo tempo que a recte, assegurou que esta no exercício de suas funções, ficava trancada em uma sala com 06 lugares, sendo que a chave de referida sala ficava com o gerente da recda; que se o gerente não abrisse a sala a recte não tinha como sair de dentro dela; que a sala em que a recte ficava era apertada; que caso a recte quisesse ir ao banheiro ou tomar água; tinha que ficar batendo na porta até que alguém ouvisse para abri-la; que a recte ficava gritando para que a porta fosse aberta; que a recte não podia usar roupa de frio e apenas era permitida a autorização de roupa sem bolso, para evitar que a recte levasse dinheiro do local; que a recte era revistada em todos os dias na recda, isto na entrada, na saída e em todos os momentos em que ia ao banheiro; que o recdo pedia inclusive para recte tirar os sapatos para fazer revista; que por algumas vezes o recte (sic) chegou até a colocar a mão no corpo da recte para análise; que a revista na recte era feita pelo gerente da casa, Sr. Carlos; que a depoente também foi caixa na recda e passou por situação semelhante a da recda (sic); (...) que o Sr. Carlos, como gerente da recda, chegou a afirmar que analisar apenas o bolso da recte não era suficiente, que tinha receio de que até mesmo havia o risco dela guardar dinheiro na calcinha ou sutiã, apesar de não ter feito revista nestas peças; que acontecia da depoente e recte ficarem trancadas no caixa sem conseguir chamar alguém para poder abrir a porta; que a decisão de trancar a recte e a depoente no caixa, ficando a chave deste com o gerente, foi tomada pela diretoria da recda.

Já a testemunha única trazida pela reclamada, LUIZ ANTÔNIO DA SILVA RIBEIRO JÚNIOR (fls. 82/83), produtor de eventos que trabalhou como gerente da reclamada de setembro/06 a novembro/08, mas sem registro na CTPS, afirma que o local em que ficava o caixa tinha a porta destrancada; que não havia qualquer revista na recte; (...) que caso a recte quisesse, poderia sair do caixa para ir ao banheiro; que não há norma na recda para não utilização de roupa de frio; que a recte podia entrar com bolsa no caixa;que não havia fiscalização em relação a pessoa que ficava no caixa.

Empresto maior valor ao depoimento da testemunha KEILA, trazida pela autora, porque a testemunha LUIZ ANTÔNIO demonstrou buscar favorecer a reclamada ao dizer que não havia qualquer fiscalização em relação aos caixas, caso da reclamante, o que não nos parece verossímil.

Vale registrar que se trata de empresa dedicada ao ramo de atividades noturnas, como se extrai de seu objeto social (bar, restaurante e danceteria - fl. 54), sendo, portanto, a princípio verossímil que ali fossem tomados cuidados especiais relacionados à segurança do patrimônio e, mesmo, dos empregados da reclamada, ainda que excessivas ou abusivas.

A atividade-fim da reclamada realmente justifica a utilização de medidas de segurança especiais, as quais poderiam, em tese, ser adotadas até mesmo no que toca aos empregados, tanto mais em relação àqueles que manuseavam dinheiro da empresa.

O fato de a testemunha KEILA ter dito que na época da depoente o gerente da empresa era casado com a mãe do dono desta; que a mãe do proprietário sempre estava no local, sendo inclusive a pessoa que cozinhava não contradiz os termos anteriores de seu depoimento, nem torna claro que os fatos ali narrados não poderiam acontecer por causa da presença da esposa do gerente envolvido no estabelecimento da ré.

A revista deve ser admitida como recurso extremo e somente utilizada se impossível a adoção de outras medidas preventivas, dado que implica violação à intimidade dos empregados, tanto mais quando já se dispõe de amplos e variados recursos da tecnologia para o fim em questão.

Note-se que o art. 373-A, VI, da CLT, proíbe a revista íntima nas empregadas ou funcionárias.

Na hipótese dos autos, a conduta adotada pelo gerente da reclamada de nome CARLOS extrapolava, em muito, os limites do poder diretivo conferido ao empregador pelo o art. 2º da CLT, pois, segundo a testemunha KEILA praticava revista diária e praticamente íntima nas empregadas, incluindo-se a autora.

A forma como era feita a revista desrespeitava e humilhava as empregadas, chegando a beira do assédio sexual.

Tal conduta mantida pelo empregador traduzia-se em atentado ao pudor natural do ser humano e violava a intimidade das empregadas, emergindo, daí, incontestável dano moral, por violação aos direitos de personalidade, dos quais o direito à intimidade constitui uma espécie.

O art. 5º, X, da Constituição Federal garante às pessoas a inviolabilidade de sua intimidade, assegurando-lhes o direito a indenização por dano moral decorrente de sua violação.

Esse direito à intimidade dos empregados, é verdade, sofre limitações pelo poder diretivo do empregador, mas este poder, por sua vez, não pode ser ampliado a ponto de ferir a dignidade da pessoa humana nem ensejar a criação de um estado de sujeição total do obreiro, no qual são desrespeitados até mesmo direitos fundamentais do ser humano.

A responsabilidade de reparação surge tão logo se verifica o fato da violação (damnun in re ipsa), o que dispensa a autora da prova do dano moral, já que não se exige da vítima a demonstração de seu sofrimento.

Constatado o dano e reconhecida a responsabilidade da reclamada pela sua reparação, resta quantificá-lo.

Considerando-se a gravidade da situação demonstrada nos autos, reveladora de profundo desrespeito pela pessoa da reclamante, entendo que a quantia de R$6.000,00 fixada pela sentença recorrida mostra-se proporcional. Equivale a pouco mais de 1 salário da autora por mês em que foi vivenciado tal constrangimento.

Não há prova nos autos de que a empresa condenada não tenha condições financeiras de suportar este pagamento, sendo que seu capital social, aliás, foi estimado em R$30.000,00 (fl. 55).

Nada a reparar.

LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ ARGÜIDA EM CONTRA-RAZÕES

O exercício pela reclamada de seu direito à ampla defesa, que inclui o de discutir a decisão tomada e, inclusive, a análise da prova empreendida, não caracteriza, por si só, a litigância de má-fé, sendo que, no caso dos autos, não se demonstrou que ela tenha incorrido em qualquer das condutas previstas no art. 17 do CPC e assim classificadas.

Rejeito a litigância de má-fé sustentada pela autora em contra-razões.

CONCLUSÃO

Conheço do recurso da reclamada e, no mérito, nego-lhe provimento. Rejeito a litigância de má-fé argüida em contra-razões. Determino a remessa dos autos ao d. Ministério Público do Trabalho, após publicação do acórdão, para as medidas que entender cabíveis.

FUNDAMENTOS PELOS QUAIS,

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em Sessão da sua Sexta Turma, hoje realizada, preliminarmente, à unanimidade, conheceu do recurso da reclamada; no mérito, sem divergência, negou-lhe provimento, rejeitada a litigância de má-fé argüida em contra-razões, determinou a remessa dos autos ao d. Ministério Público do Trabalho, após publicação do acórdão, para as medidas que entender cabíveis.

Belo Horizonte, 24 de novembro de 2009.

JORGE BERG DE MENDONÇA
DESEMBARGADOR RELATOR




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