Furto qualificado. Apelação criminal. Fixação da pena-base e da pena de multa.
Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios - TJDFT.
Órgão: PRIMEIRA TURMA CRIMINAL
Classe: APR - APELAÇÃO CRIMINAL
N. Processo: 2007 03 1 021566-2
Apelante: IURI BENTO RAMOS LIMA
Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS
Relator Des.: EDSON ALFREDO SMANIOTTO
Revisor: MÁRIO MACHADO
EMENTA
PENAL. FURTO QUALIFICADO. APELAÇÃO CRIMINAL. FIXAÇÃO DA PENA-BASE E DA PENA DE MULTA. MAUS ANTECEDENTES. PROPORCIONALIDADE.
1) Não há óbice em considerar os inquérito policiais em curso e os processos sem trânsito em julgado, anteriores ao fato, como maus antecedentes para elevar a pena-base um pouco acima do mínimo legal.
2) A quantidade de dias-multa deve guardar proporcionalidade com a pena privativa de liberdade imposta.
ACÓRDÃO
Acordam os Senhores Desembargadores da PRIMEIRA TURMA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, EDSON ALFREDO SMANIOTTO - Relator, MÁRIO MACHADO - Revisor, GEORGE LOPES LEITE - Vogal, sob a presidência da Desembargadora SANDRA DE SANTIS, em PROVER O RECURSO, À UNANIMIDADE, de acordo com a ata do julgamento e as notas taquigráficas.
Brasília-DF, 29 de outubro de 2009.
Des. EDSON ALFREDO SMANIOTTO
Relator
EXPOSIÇÃO
IURI BENTO RAMOS LIMA, devidamente qualificado nos autos, foi condenado à pena de 03 (três) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 20 (vinte) dias-multa, calculados, unitariamente, à base de 1/30 do salário mínimo vigente à época do fato, pela prática do crime tipificado no artigo 155, §4º, inciso I, do Código Penal.
Inconformado com a r. sentença de fls. 156/161, recorre o réu, fls. 172/178, buscando a reforma da dosimetria da pena, por entender que esta restou exasperada em razão das circunstâncias judiciais, bem como da penalidade pecuniária. Alega que as certidões indicativas de seus maus antecedentes não são aptas a sustentar o aumento da pena, tendo em vista que são relativas a processos em andamento e um deles teve extinta a punibilidade. Requer, assim, seja a pena fixada em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 12 (doze) dias multa.
Contrarrazões do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, fls. 218/225, asseverando pela manutenção da r. sentença.
Parecer da douta Procuradoria de Justiça, fls. 244/249 opinando pelo parcial provimento do recurso no que tange somente à redução da pena pecuniária imposta.
É o que consta.
VOTOS
O Senhor Desembargador EDSON ALFREDO SMANIOTTO - Relator.
Senhor Presidente,
Conheço do recurso.
IURI BENTO RAMOS LIMA, devidamente qualificado nos autos, foi condenado à pena de 03 (três) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e ao pagamento de 20 (vinte) dias-multa, calculados, unitariamente, à base de 1/30 do salário mínimo vigente à época do fato, pela prática do crime tipificado no artigo 155, §4º, inciso I, do Código Penal.
Consta da r. denúncia (fls. 02/03) que:
"No dia 11 de julho de 2007, por volta das 07h30min, na Mater Clínica, localizada na QNM 18, conjunto F, lote 04, sala 102, Ceilândia/DF, o acusado, de forma livre e consciente, subtraiu para si, com destruição ou rompimento de obstáculo, os objetos descritos no Auto de Apresentação e Apreensão de fls. 20/21, pertencentes ao proprietário da Clínica, Ademilson Naves.
Consta dos autos que o acusado arrombou a porta da clínica e subtraiu os objetos descritos. Ato contínuo, pediu que dois carroceiros que se encontravam nas proximidades o auxiliassem no transporte dos objetos.
Em seguida, policiais que realizavam patrulhamentos na área, avistaram o acusado nas proximidades da QNM 03, conjunto K, e resolveram abordá-lo, pois o mesmo apresentou nervosismo com a aproximação da viatura.
Realizada a revista pessoal, lograram êxito em encontrar no interior da mochila que trazia consigo, vários instrumentos clínicos odontológicos. Em seguida, identificaram o proprietário da clínica e verificaram que os objetos eram produto de furto, razão pela qual o acusado foi preso em flagrante.
Posteriormente, outra viatura, comandada pelo Sargento Reginaldo Chaves, identificou os referidos carroceiros e localizou dois aparelhos de ar condicionado em uma vala próxima ao corpo de bombeiros. (...)".
Inicialmente, destaco que a autoria e a materialidade restaram demonstradas conforme se verifica pelo Auto de Prisão em Flagrante (fls. 06/15), pelo Auto de Apresentação e Apreensão (fls. 24/25), pelo Termo de Restituição (fl. 26/27), pela Ocorrência Policial (fls. 32/34), pelo Laudo de Avaliação Econômica Indireta (fls. 82/83), pelo Laudo de Exame de Local (fl. 123/125), pelo Laudo de Perícia Papiloscópica (fls. 132/136) e pelas provas orais produzidas tanto na fase policial quanto na fase judicial.
Nas razões de fls. 172/178, IURI BENTO RAMOS LIMA busca a reforma da dosimetria da pena, por entender que esta restou exasperada em razão das circunstâncias judiciais, bem como da penalidade pecuniária. Alega que as certidões indicativas de seus maus antecedentes não são aptas a sustentar o aumento da pena, tendo em vista que são relativas a processos em andamento e em um deles teve extinta a punibilidade. Requer, assim, seja a pena fixada em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 12 (doze) dias multa.
Ao proceder a dosimetria da pena, o MM. Juiz a quo assim consignou:
"(...) Atento às diretrizes dos artigos 59 e 68 do CPB, passo à individualização da pena:
Considerando que: a) a culpabilidade do acusado vem demonstrada por meio de índice regular de reprovabilidade, tendo em vista que possuía o potencial conhecimento da ilicitude do fato, sendo socialmente reprovável sua conduta quando dele se exigia comportamento diverso; b) não possui bons antecedentes, contando, inclusive, com condenação anterior transitada em julgado. Registro que utilizarei a condenação de fl. 47, para os efeitos da REINCIDÊNCIA, tão somente e exclusivamente na 2ª fase da dosimetria da penal (fls. 42/48, 104/110); c) sua conduta social não foi devidamente investigada, mas seu reiterado envolvimento em práticas delitivas asseveram a inadequação de sua conduta, ao menos por ora, ao convívio em sociedade; d) sua personalidade dá indícios de, lamentavelmente, encontrar-se distorcida e voltada para o submundo das práticas delitivas. Registro que IURI necessita de um período de profunda reflexão sobre seus atos para que possa arrepender-se verdadeiramente e retornar aos estudos e ao trabalho honesto, únicas formas das pessoas de bem conseguirem tudo aquilo que seus espíritos anseiam; e) os motivos são injustificáveis e reprováveis, evidenciando a cupidez de seu espírito e a vontade de lucro fácil em detrimento do patrimônio alheio; f) as circunstâncias nas quais o delito foi praticado foram as comuns do tipo; g) as consequências, conquanto lastimáveis, foram, praticamente as de rotina para delitos desta espécie; h) o comportamento da vítima em nada contribuiu para a ação delitiva.
Sendo assim, após detida análise de suas circunstâncias judiciais, as quais não lhes são favoráveis, FIXO-LHE A PENA BASE um pouco acima do mínimo legal para a imputação que lhe é feita, ou seja, em 02 (DOIS) ANOS E 06 (SEIS) MESES DE RECLUSÃO.
Diante do comando do art. 68 do CPB, verifico a ausência de Circunstâncias Atenuantes e a presença da Circunstância Agravante da REINCIDÊNCIA (art. 61, I, c/c art. 63 do CPB, fl. 47), razão pela qual, e nesta fase, majoro a reprimenda em 06 (SEIS) MESES, TORNANDO-A DEFINITIVA E CONCRETA, EM 03 (TRÊS) ANOS DE RECLUSÃO, à míngua de quaisquer outras causas de aumento ou de diminuição de pena.
Condeno-o, ainda, ao pagamento de 20 (vinte) dias-multa, que face à situação econômica do sentenciante deverão ser calculados à razão de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época do fato, devidamente corrigido, para cada dia multa. (...)
Em que pesem as doutas alegações recursais, razão não está com o apelante.
Ao analisar as certidões citadas pela ilustre defesa, verifiquei que estas estão aptas sim a caracterizar os maus antecedentes do acusado. Isso porque, excetuando-se a indicação delitiva constante da fl. 42, em que houve a extinção da punibilidade, todas as demais incidências (fls. 42/44) indicam o cometimento de delitos anteriores ao fato ora em análise, em que pese não haver o trânsito em julgado.
Neste prisma, tenho entendido que os inquéritos em andamento e processos em curso devem ser considerados como maus antecedentes, sem que haja qualquer violação ao princípio da não presunção de culpabilidade, segundo precedente do STF(1).
Sendo assim, agiu com acerto o MM. Juiz ao aplicar a pena-base um pouco acima do mínimo legal, tendo em vista a análise negativa principalmente dos antecedentes do réu.
Verifico, porém, que o MM. Juiz indicou a folha penal do acusado como indicativa da personalidade desajustada do agente. Porém, em que pese a reiteração criminosa do agente, não há nos autos elementos a indicar a personalidade, tendo em vista que não há notícia de fatos posteriores ao ora analisado.
Ainda assim, entendo ser o aumento efetuado na pena-base razoável em virtude dos maus antecedentes do acusado.
Mantenho, igualmente, a majoração referente à reincidência devidamente caracterizada a fl. 47.
Desta feita, incólume a dosimetria da pena privativa de liberdade.
Quanto à pena pecuniária verifico que esta restou fixada de maneira exacerbada. Isso porque a quantidade de dias-multa deve guardar proporcionalidade com a pena privativa de liberdade. Diante disso, fixo-a definitivamente em 15 (quinze) dias-multa, atento ao exame das circunstâncias judiciais e da exasperação relativa à reincidência.
Do exposto, conheço do recurso e DOU PARCIAL PROVIMENTO, somente para reduzir a pena pecuniária imposta, mantendo-se o decisum por seus próprios fundamentos.
É como voto.
O Senhor Desembargador MÁRIO MACHADO - Revisor.
O pleito recursal merece prosperar.
Houve bis in idem. Os registros penais acostados às fls. 42/43 foram utilizados para aferir os antecedentes, a conduta social e a personalidade do acusado.
A jurisprudência recente das Cortes Superiores tem-se firmado no sentido de que inquéritos policiais não podem servir como indicativos de maus antecedentes no momento da fixação da pena base e do regime de cumprimento de pena, sob pena de lesão ao princípio constitucional da não culpabilidade. A condenação acostada à fl. 47 foi considerada na segunda fase da dosimetria para efeitos de reincidência. Portanto, os antecedentes do réu são favoráveis.
Todavia, apesar de afastados da vetorial antecedentes, utilizo, sem contrariar posicionamento do STJ e do STF, tais registros penais - vale dizer, os mesmos fatos - para valorar negativamente a circunstância relativa à conduta social, porquanto evidenciam um comportamento deturpado do apelante, o que exige a aplicação de um tratamento diferenciado em relação ao indivíduo portador de folha penal imaculada. Escorreita a sentença neste ponto.
Assim, inadequada a análise negativa da personalidade com base nesses fundamentos.
Portanto, evidenciada que a única circunstância judicial desfavorável ao réu é a relativa à conduta social, diminuo a pena base para 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de reclusão. Ausentes circunstâncias atenuantes. Presente a agravante da reincidência, acresço a pena em 6 (seis) meses. Não há causas de aumento ou de diminuição. Estabeleço a pena definitiva em 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão.
Reduzo a pena de multa para 18 (dezoito) dias multas, no valor unitário mínimo legal. Os mesmos critérios que norteiam a fixação da pena base deverão lastrear a determinação da pena de multa, sob pena de ferir o equilíbrio das sanções.
Pelo exposto, dou provimento ao recurso para fixar a pena do réu Iuri Bento Ramos Lima em 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de reclusão, mais 18 (dezoito) dias multas, no valor unitário mínimo legal. Mantenho, no mais, a r. sentença de primeiro grau.
É o voto.
O Senhor Desembargador EDSON ALFREDO SMANIOTTO - Relator.
Após ouvir o douto voto do eminente Revisor, hei por bem reformular o meu voto para reduzir a pena do recorrente nos termos do voto de S. Ex.ª.
O Senhor Desembargador GEORGE LOPES LEITE - Vogal.
Acompanho o Relator.
DECISÃO
Provido. Unânime.
DJ-e: 11/02/2010
Notas:
1 - HC 73.394-8/SP, Rel. Min. Moreira Alves, HC 81759/SP, Rel. Min. Maurício Corrêa, e APR 20040410106697, de minha relatoria. [Voltar]
JURID - Furto qualificado. Apelação criminal. Fixação da pena-base. [17/02/10] - Jurisprudência
Nenhum comentário:
Postar um comentário