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quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

JURID - Doação de bens envolvendo pai e filhos. Ineficácia do ato. [18/02/10] - Jurisprudência


Doação de bens envolvendo pai e filhos. Ineficácia do ato jurídico em relação à empregada doméstica do doador.


Tribunal Regional do Trabalho - TRT 3ª Região.

Processo: 00702-2009-074-03-00-0 RO

Data de Publicação: 19/01/2010

Órgão Julgador: Turma Recursal de Juiz de Fora

Juiz Relator: Des. Jose Miguel de Campos

Juiz Revisor: Des. Heriberto de Castro

Recorrente: ANA ALÓISA CHAVES MARIANO E OUTRAS

Recorrida: ROSILAINE MARIA DA SILVA

EMENTA: DOAÇÃO DE BENS ENVOLVENDO PAI E FILHOS - INEFICÁCIA DO ATO JURÍDICO EM RELAÇÃO À EMPREGADA DOMÉSTICA DO DOADOR. A doação de bem imóvel envolvendo pai e filhos, quando o primeiro já se encontra em idade avançada e com a saúde debilitada, tem o nítido intuito de evitar futuros gastos com inventário, honorários advocatícios, dispêndio de tempo etc. Esta Especializada não pode, contudo, coadunar com a consequência prática advinda desse negócio jurídico que, inevitavelmente, atingiria negativamente os direitos do trabalhador doméstico, caso o autor da herança não deixe outros bens capazes de suportar a execução trabalhista. Nesta toada, qualquer disposição, onerosa ou gratuita, por parte dos donatários do bem imóvel será ineficaz em relação àquele trabalhador que já tem favorável a ele uma sentença que certifica seus direitos trabalhistas.

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de recurso ordinário, interposto de decisão proferida pelo Juízo da Vara do Trabalho de Ponte Nova, em que figuram, como recorrentes, ANA ALÓISA CHAVES MARIANO, TEREZINHA ISABEL CHAVES DE CASTRO, MARIA DO CARMO DA GAMA, RITA DE CÁSSIA CHAVES DE CASTRO e SÔNIA RITA CHAVES e, como recorrida, ROSILAINE MARIA DA SILVA.

R E L A T Ó R I O

A Exma. Juíza Rosângela Alves da Silva Paiva, em exercício na Vara do Trabalho de Ponte Nova, pela v. sentença de fls. 73/76, afastou a preliminar de inépcia da inicial, extinguiu o processo, sem resolução do mérito, em relação ao pedido de recolhimento previdenciário sobre os valores pagos no decorrer do contrato de trabalho, em razão da incompetência desta Justiça Especializada, nos termos do art. 267, IV, do CPC e, no mérito, julgou procedentes, em parte, os pedidos formulados pela autora, condenando as reclamadas a pagar à reclamante: aviso prévio indenizado; férias com 1/3 de 2006/2007, em dobro; férias com 1/3 de 2007/2008, de forma simples; 2/12 de férias com 1/3 de 2008/2009; 6/12 de natalinas de 2006; natalinas de 2007; 8/12 de natalinas de 2008; diferenças salariais de todo o período contratual; feriados nacionais trabalhados, em dobro, durante o período de 20.06.2006 a 07.08.2008.

As reclamadas aviaram recurso ordinário às fls. 77/79, insurgindo-se contra o reconhecimento da relação de emprego e contra a determinação de que o imóvel residencial, localizado na propriedade rural denominada "Jangada", constitua garantia dos créditos trabalhistas, uma vez que, quando do falecimento do Sr. Agostinho, empregador da autora, tal bem já era de propriedade das mesmas.

Contrarrazões pela autora às fls. 84/88.

É o relatório.

V O T O

JUÍZO DE CONHECIMENTO

Conheço do recurso interposto pelas reclamadas, vez que tempestivamente protocolizado, comprovados o recolhimento das custas e a efetivação do depósito (fls. 80/81), estando regular a representação.

JUÍZO DE MÉRITO

DA RELAÇÃO EMPREGATÍCIA

Insurgem-se as reclamadas contra o reconhecimento da relação de emprego, argumentando que não há prova nos autos.

Analisa-se.

A obreira afirma, na petição inicial, que foi contratada pelo Sr. Agostinho Alves Chaves, no dia 26.06.2006, como doméstica, prestando-lhe serviços até o dia 07.08.2008, data em que o mesmo faleceu (certidão de óbito, fls. 25).

Vejamos o depoimento pessoal da reclamante, fls. 68:

[...] que é conhecida pelo nome Rosa; que foi contratada por Sr. Agostinho e trabalhou em sua residência localizada na propriedade rural de 26.06.2006 até 21.11.2008; que o Sr. Agostinho faleceu em 07.08.2008, salvo engano; que foi dispensada pela esposa do Sr.Agostinho; que arrumava casa, lavava roupa, desfazia milho, rachava lenha, e fazia comida na ausência da esposa do reclamado; que recebia R$180,00 por mês; que de segunda a sábado a reclamante dormia na casa do reclamado; que trabalhava durante todo o dia; que no sábado ia para sua casa localizada na zona rural, na fazenda do Peão, distante da propriedade do réu; que recebia do Sr. Agostinho, que também lhe dava ordens; que o reclamado ficou doente a partir de março/2008 e veio para casa de sua filha em Ponte Nova; que a esposa do reclamado permaneceu na zona rural até a morte deste; que não se recorda até quando o reclamado cuidou pessoalmente na propriedade do réu; que passou a receber salário da esposa do reclamado quando este veio para Ponte Nova; que via o reclamado pagando salários aos demais trabalhadores da propriedade (grifei).

A primeira testemunha das reclamadas, Sebastião Marcelino, afirmou haver empregada doméstica na fazenda, fls. 70:

[...] que havia uma empregada doméstica mas não sabe informar seu nome; que a empregada doméstica lavava, cozinhava..

Por sua vez, a primeira testemunha da reclamante, Geraldo Moreira Guimarães, confirmou o fato, ligando tal afirmação à pessoa da reclamante, fls. 68:

que nunca prestou serviços aos reclamados; que o depoente mora na cidade mas sempre frequentava a propriedade rural do Sr.Agostinho, de quem o depoente era muito amigo; que o depoente ia a referida propriedade uma vez por mês, isto durante 20 anos, e até a morte do mesmo [...] que sempre houve uma empregada doméstica na casa do Sr. Agostinho, não se recordando do nome da última empregada, mas sabendo que ela se encontra no saguão desta Vara; que viu esta pessoa trabalhando dois anos antes do reclamado falecer [...] (grifei).

Espancando qualquer dúvida que ainda subsistisse quanto ao fato de na fazenda Jangada haver empregada doméstica e esta ser a reclamante, a testemunha Pedro Nunes de Oliveira, arrolada pelas próprias reclamadas, disse que "a última empregada doméstica do reclamado foi Rosa, ou seja, Rosilaine" (fls. 71).

Conforme amplamente fundamentado, ficou cabalmente provada a relação de emprego doméstica.

Pelo exposto, nego provimento.

DA GARANTIA DOS CRÉDITOS TRABALHISTAS

As recorrentes não se conformam com determinação sentencial de que o imóvel residencial, localizado na propriedade rural denominada "Jangada", constitua garantia dos créditos trabalhistas, uma vez que, quando do falecimento do Sr. Agostinho, tal bem já era de propriedade das mesmas.

Pois bem.

Analisando o registro de imóvel juntado às fls. 11/13, verifica-se que o Sr. Agostinho doou a fração de 96,8970131% do imóvel descrito na matrícula 22.688 - a fazenda Jangada - no dia 22.09.2004, para suas filhas (que integram o polo passivo da presente demanda).

Tendo em vista que não mais restavam bens do Sr. Agostinho a serem inventariados, o Juízo a quo estabeleceu que o imóvel doado constituiria garantia dos créditos trabalhistas deferidos na sentença, nos termos do art. 3º, I, da lei nº 8.009/90.

Entendo correta a posição adotada em primeira instância. Referida doação "de pai para filhas" teve o nítido intuito de evitar futuros gastos com inventário, honorários advocatícios, dispêndio de tempo etc.

Esta Especializada não pode, contudo, coadunar com a consequência prática advinda desse negócio jurídico que, inevitavelmente, atingiria negativamente os direitos da obreira, tendo em vista que o autor da herança não deixou outros bens capazes de suportar a execução trabalhista.

Nesta toada, ficam as reclamadas advertidas que qualquer disposição, onerosa ou gratuita, de referido bem imóvel será ineficaz em relação à reclamante, pois configurará fraude contra credores, nos termos do art. 158 e seguintes do Código Civil Brasileiro.

Apesar de lhes falecer razão recursal, as reclamadas exerceram a faculdade que lhes foi conferida pelo ordenamento jurídico de interpor recursos. Não vislumbro nenhuma atitude protelatória, pois havia interesse recursal e, por isso, não acolho o pedido formulado, em sede de contrarrazões, no sentido de que lhes fosse aplicada a multa por litigância de má-fé.

Nego provimento ao apelo.

C O N C L U S Ã O

Conheço do recurso interposto. No mérito, nego-lhe provimento.

Fundamentos pelos quais,

o Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, pela sua Turma Recursal de Juiz de Fora, à unanimidade, conheceu do recurso interposto; no mérito, sem divergência, negou-lhe provimento.

Juiz de Fora, 09 de dezembro de 2009.

DES. JOSÉ MIGUEL DE CAMPOS
RELATOR E PRESIDENTE




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