Anúncios


quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

JURID - Apelação Criminal. Réu sentenciado e condenado. Receptação. [04/02/10] - Jurisprudência


Apelação Criminal. Réu sentenciado e condenado pelo crime de receptação (artigo 180, caput, do Código Penal). Recurso.
Conheça a Revista Forense Digital


Tribunal de Justiça do Paraná - TJPR.

APELAÇÃO CRIME Nº 598.429-4, DA COMARCA TOLEDO - 2ª VARA CRIMINAL.

APELANTE: EDSON FERNANDES DE LIMA.

APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ.

RELATOR: DES. MARCUS VINÍCIUS DE LACERDA COSTA.

RELATOR CONVOCADO: JUIZ ROGÉRIO ETZEL.

Apelação Criminal. Réu sentenciado e condenado pelo crime de receptação (artigo 180, caput, do Código Penal). Recurso. Juízo de prelibação positivo. Apelação conhecida. Mérito. Pedido de desclassificação ante a suposta ausência de provas. Impossibilidade. Provas de materialidade suficientes. Indícios de autoria que se comprovaram durante a instrução. Bem com procedência ilícita. Entendimento jurisprudencial de inversão do ônus da prova, quando o bem é encontrado sob a posse do réu. Caso concreto onde o bem, apesar de não estar fisicamente com o apelante, estava sob seu domínio, na casa de sua esposa. Ônus probatório invertido. Necessidade de comprovar que desconhecia a proveniência dos bens. Precedentes. No caso em comento, ciência inequívoca do réu desta procedência. Manutenção da condenação imposta em sentença. Individualização da pena corretamente fixada. Recurso conhecido e não provido. Sentença mantida quanto a condenação e pena.

Trata-se de Processo Crime em que, o ilustre representante do Ministério Público ofereceu denúncia em face de: Edson Fernandes de Lima brasileiro, solteiro, costureiro, nascido em 01 de abril de 1977, na Comarca de Toledo/PR, portador de R.G. nº 6.502.624-4/PR, filho de Horácio Chagas de Lima e Rosa Fernandes de Lima, à época dos fatos com 28 (vinte e oito) anos de idade, residente na Rua Francisco Alves, nº 06, bairro Vila Boa Esperança, na Comarca de Toledo/PR.

Denunciado no mesmo momento os co-réus Robson Roberto dos Santos, Elias Pires e Marcos Roberto Pereira, que, neste oportunidade, não recorreram à instância superior.

Foi-lhe (ao ora apelante) imputada a prática do crime previsto no art. 180, caput, do Código Penal, em razão do 4º fato.

4º Fato.

"No mês de novembro de 2005, em data e horários não esclarecidos, na 20ª Subdivisão Policial deste Município e Comarca de Toledo/PR, situada na Rua Armando Luiz Arrosi, nº 633, Centro, o denunciado EDSONN FERNANDES LIMA, com vontade livre e consciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, adquiriu, em proveito próprio, ciente de que se tratava de produto de crime, pela quantia de R$ 100,00 (cem reais), 01 (uma) câmera fotográfica digital, marca Olympus D-395 (cf. auto de exibição e apreensão de fl. 38) avaliada em R$ 850,00 (oitocentos e cinquenta reais), conforme auto de Avaliação de fl. 41, furtada dias antes pelo denunciado ROBSON ROBERTO DOS SANTOS e adquirida pelo denunciado MARCOS ROBERTO PEREIRA."

A denúncia foi recebida em 21 de fevereiro de 2006 (fl. 132).

Durante a instrução probatória foram interrogados os réus (fls. 170, 172, 174 e 176) e demais testemunhas arroladas pela acusação (fls. 187/192). A desistência de oitiva das testemunhas arroladas pela defesa foi homologada pelo Juízo através do despacho de fl. 197.

Na fase do art. 499, do Código de Processo Penal, o Ministério Público requereu a certificação de antecedentes criminais dos réus (fl. 199).

Encerrada a instrução criminal, o douto Juízo a quo prolatou a sentença de fls. 267/279, julgando parcialmente procedente o pedido contido na denúncia para condenar o réu/apelante Edson Fernandes de Lima como incurso nas sanções do art. 180, caput, do Código Penal. Fixou a pena definitiva em 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão e 20 (vinte) dias-multa, com o valor correspondente a 1/30 (um trigésimo) do valor do salário mínimo vigente à época dos fatos.

Inconformado, o réu Edson Fernandes de Lima apelou (fl. 285) e, em suas razões (fls. 317/320), cindiu suas teses defensivas em: confissão do apelante sobre o fato de que, realmente adquiriu a máquina fotográfica sem, contudo, saber que provinha de furto. Por tal razão, requereu a desclassificação do delito para a tipificação de receptação culposa.

Ao final, pleiteou o conhecimento e provimento do apelo, no intuito de se reformar a r. sentença no teor de sua fundamentação e quanto à pena imposta.

O il. representante do Parquet, em primeiro grau, contra arrazoou o apelo, (fls. 332/336) pugnando pelo não provimento das argüições neste aduzidas, merecendo manutenção a sentença condenatória.

Vieram os autos a este Tribunal de Justiça (fl. 338)

Nesta instância, a douta Procuradoria Geral de Justiça emitiu parecer de fls. 347/350, onde opinou pelo conhecimento e desprovimento do apelo.

Por força de substituição, os autos foram conclusos à esta Relatoria.

É o relatório.

Segundo a classificação tradicional dos requisitos de admissibilidade dos recursos penais, este preenche os pressupostos objetivos (cabimento, adequação, tempestividade, regularidade procedimental e inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer) e subjetivos (interesse em recorrer, - falando alguns em sucumbência -, e, legitimação dos recursos).

Da detida análise dos autos, em confronto com a r. sentença, razões, contrarrazões recursais e parecer da d. Procuradoria de Justiça, o apelo não merece provimento.

Pois bem, a materialidade do delito, de fato, foi devidamente comprovada através da Portaria de fls. 08, auto de exibição e apreensão (fl. 44) auto de avaliação direta (fl. 47) e auto de entrega (fl. 48).

No que tange à autoria do delito, levando em consideração os argumentos expendidos na apelação, a fundamentação da r. sentença e o parecer da D. Procuradoria Geral de Justiça, ao que parece, existem provas suficientes nos autos para embasar e manter a condenação imposta ao apelante.

O apelante, inclusive, confessou a compra da máquina fotográfica, apenas escusando-se admitir conhecer sua procedência ilícita.

Como é cediço "Receptação é o crime que produz a manutenção, consolidação ou perpetuidade de uma situação patrimonial anormal, decorrente de um crime anterior praticado por outrem".(1) É um crime que, como afirma a doutrina, dependente, pois só ocorre em função de outro crime.

Claudeor Teodoro, policial civil responsável pela carceragem onde estavam recolhidos os réus, relatou em Juízo que

"É o responsável pelo setor de carceragem temporária da 20ª SDP; afirma que foram furtadas três câmeras fotográficas digital da marca Olympus, pertencentes à delegacia de polícia; duas câmeras foram furtadas no setor de carceragem e outra no setor de plantão; (...)" (fl. 187)

Ainda, Silmar João Zanete, policial civil, consignou em seu depoimento judicial que:

"É investigador de polícia na Delegacia de Polícia Civil de Toledo (20ª SDP); afirma que por ocasião dos fatos, diante do furto de três câmeras fotográficas digitais na Delegacia, instalou-se uma situação de desconforto entre os funcionários; o carcereiro Clauder obteve informações dentro da cadeia de que uma das câmeras digitais tinha sido furtada pelo detento Robson, sendo que estaria em poder de Roseli, esposa do detento Edson; (...)" (fl. 189)

E ainda, importante consignar o que foi reduzido a termo do depoimento da testemunha Cândido Norberto Cabral, igualmente policial civil:

"É investigador de Polícia da Delegacia de Polícia Civil de Toledo (20ª SDP); sobre os fatos narrados na denúncia tem a dizer que uma das câmeras fotográficas desapareceu após ser utilizada para fotografar o detento Robson; o Superintendente Ravedutti substitui por outra câmera fotográfica digital que também acabou sendo furtada; ambas as câmeras fotográficas foram subtraídas no interior da carceragem; uma terceira câmera fotográfica que ficava no plantão e também na carceragem igualmente desapareceu da Delegacia; segundo o Investigador Antonio o autor do furto de uma das câmeras fotográficas foi o detento Robson; soube que o detento Robson 'negociou' esta câmera fotográfica digital dentro da cadeia; (...)" (fl. 190)

Desta maneira, em razão da similitude entre os objetos furtados e aqueles apreendidos, não se pode afastar um dos requisitos típicos do crime de receptação, qual seja, ser de procedência ilícita os bens receptados.

No que pertine a discussão sobre a ciência, ou não de origem dos bens, de igual maneira, tem-se que o réu conhecia a procedência destes. Não obstante, a jurisprudência hodierna vem posicionando-se no sentido de que se o agente é surpreendido com o objeto receptado, cabe a si o ônus de comprovar sua posse.

"O dolo na receptação é de difícil comprovação, devendo ser extraído do comportamento da pessoa e das demais circunstâncias que cercam o fato, sendo que a jurisprudência', a exemplo do que ocorre nos casos de roubo ou furto, 'tem entendido que a apreensão do bem subtraído em poder do agente ocasiona a presunção de sua responsabilidade, operando-se a inversão do ônus probatório, cabendo a ele justificar a sua posse, sob pena de condenação." (TJRS - 8ª Câmara Criminal, Apelação crime n. 70010226504, Relator Desembargador MARCO ANTÔNIO RIBEIRO DE OLIVEIRA, julgado em 02/03/2005)

"RECEPTAÇÃO SIMPLES. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. CIÊNCIA DA ORIGEM ILÍCITA DOS OBJETOS. COMPROVAÇÃO ATRAVÉS DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO. DOLO CARACTERIZADO. CONJUNTO PROBATÓRIO APTO A RESPALDAR O DECRETO CONDENATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE DE ABSOLVIÇÃO POR FALTA DE PROVAS. DOSIMENTRIA ESCORREITA. ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA CORRETAMENTE NÃO RECONHECIDA. RÉU REINCIDENTE. ADEQUADO O REGIME SEMIABERTO ESTABELECIDO PARA INICIAR O CUMPRIMENTO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO. 1- Comete o crime de receptação o agente que mantém em seu poder objeto que sabe ser de origem espúria. A apreensão do bem subtraído em poder do agente ocasiona a presunção de sua responsabilidade, operando-se a inversão do ônus probatório, cabendo a ele justificar a sua posse. 2- Ao réu reincidente não se fixa regime aberto para iniciar o cumprimento de pena privativa de liberdade. Inteligência da alínea 'c', do § 2°, do art. 33 do Código Penal." (TJPR - AP. Crim. nº 546.084-2, da 4ª CCrim. Rel. Des. Miguel Pessoa. J. em 546.084-2)

"APELAÇÃO CRIMINAL - RECEPTAÇÃO - PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO - ALEGADO DESCONHECIMENTO DA ORIGEM ILÍCITA DO BEM - DESCABIMENTO - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - RECEBIMENTO INJUSTIFICADO DA RES FURTIVA - RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO "Não compete tão somente ao órgão ministerial a produção de provas porque é matéria pacífica que, no crime de receptação, cabe ao agente a demonstração da licitude do bem, com inversão do ônus da prova." (TJPR - ApCr 456699-4)" (TJPR - AP. Crim. nº 509.436-6, da 5ª CCrim. Rel. Des. Marcus Vinícius de Lacerda Costa. j. em 05/02/2009)

Apesar de não encontrada em seu poder, a câmera digital foi recuperada junto à sua esposa. As provas dos autos, assim como afirma o apelante (fl. 176) e a própria esposa (que confirmou a entrega e sua posterior posse), conduzem ao convencimento de que, mesmo não estando fisicamente consigo, o objeto jamais saiu de sua esfera de poder, restando plenamente aplicável o teor jurisprudencial exposto.

O conjunto probatório tende a incriminar o réu, pois os depoimentos dos policiais já citados neste Voto, direcionam a prova no sentido de que o ora apelante tinha conhecimento da origem ilícita da câmera digital:

"(...) certo dia quando um detento estava saindo mediante alvará de soltura, este lhe disse para prestar atenção porque o réu Robson teria furtado uma câmera digital e repassado para o réu Marcos; disse ainda que a outra câmera digital foi furtada pelo réu Elias provavelmente um sábado quando ele pediu para ir ao médico e, por distração da carceragem, acabou levando com ele a câmera digital para o interior da cela; soube que esta câmera fotográfica teria sido repassada por Elias ao réu Edson ou ao réu Marcos; não se recorda qual deles disse que a câmera estava em poder de Roseli, esposa do réu Edson; em contato com Roseli esta confirmou que Edson lhe entregou a câmera fotografia digital e pediu para que lhe guardasse em casa; (...)" (fl. 187)(2) (g. n.)

"(...) o carcereiro Clauder obteve informações dentro da cadeia de que uma das câmeras digitais tinha sido furtada pelo detento Robson, sendo que estaria em poder de Roseli, esposa do detento Edson; em diligências, foi até a casa de Roseli, a qual confirmou ter recebido do detento Edson uma câmera uma câmera fotográfica digital pra guardar em casa; (...)" (fl. 189) (g. n.)

Roseli Michalski, então esposa do apelante, em seu depoimento judicial, não comprometeu a situação deste, apenas afirmando que recebeu, para que mantivesse em sua casa e sob seu poder por mais de um mês, uma câmera digital (fl. 192).

Contudo, verifica-se que a entrega da câmera à esposa foi com intuito de retirar da carceragem o produto receptado, garantindo, deste modo, a manutenção da posse e o não prejuízo pelo valor pago. Aliás, há que se ressaltar que é prática comum no mercado negro de produtos com origem ilícita, o preço vil. Não é concebível imaginar que uma câmera fotográfica digital, por mais simples que fosse, mesmo já usada, custasse tão pouco (R$ 100,00), tendo avaliação de R$ 850,00.

Assim, com a inversão do ônus probatório restava ao ora apelante produzir prova que abonasse sua tese de desclassificação do tipo penal, o que não ocorreu durante a instrução criminal.

Desta maneira, resta inalterada a r. sentença neste quesito, mantendo-se a condenação ao réu nos termos do art. 180, caput, do Código Penal.

Individualização da pena.

Nesta fase da r. sentença, esta Relatoria crê que o Magistrado singular bem analisou todas as circunstâncias judiciais do art. 59, do Código de Processo Penal, assim como compensou as circunstâncias: agravante de reincidência e atenuante de confissão, conforme o entendimento pacificado no Superior Tribunal de Justiça. Como não haviam quaisquer causas de aumento ou diminuição de pena, a pena definitiva restou fixada pouco acima do mínimo legal, ou seja, em 01 (um) ano e 03 (três) meses de reclusão e 20 (vinte) dias-multa, sendo o valor pecuniário deste correspondente a 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo em vigor ao tempo dos fatos.

Diante do exposto, voto no sentido de conhecer do recurso e negar-lhe provimento.

ACORDAM os Senhores Desembargadores integrantes da 5.ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso.

O julgamento foi presidido pelo Senhor Desembargador Lauro Augusto Fabrício de Melo, sem voto, e dele acompanhou a Senhora Desembargadora Maria José de Toledo Marcondes Teixeira e o Senhor Desembargador Jorge Wagih Massad.

Curitiba, 17 de dezembro de 2009.

ROGÉRIO ETZEL
Juiz de Direito Substituto em 2.º Grau

DJ: 15/01/2010



Notas:

1 - HUNGRIA, Nélson. Comentário ao Código Penal. Apud. BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte especial, vol. 3. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p 308. [Voltar]

2 - Depoimento de Clauder Teodoro. [Voltar]




JURID - Apelação Criminal. Réu sentenciado e condenado. Receptação. [04/02/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário